Decisão Monocrática nº 50496080320228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sétima Câmara Cível, 29-04-2022

Data de Julgamento29 Abril 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualAgravo de Instrumento
Número do processo50496080320228217000
Tipo de documentoDecisão monocrática
ÓrgãoSétima Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001918900
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

7ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Instrumento Nº 5049608-03.2022.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Inventário e Partilha

RELATOR(A): Des. CARLOS EDUARDO ZIETLOW DURO

AGRAVANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

AGRAVADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

EMENTA

AGRAVO DE INSTRUMENTO. SUCESSÕES. AÇÃO DE INVENTÁRIO. FIDEICOMISSO. PLURALIDADE DE FIDEICOMISSÁRIOS. INSTITUIÇÃO PELOS TESTADORES EXPRESSAMENTE EM FAVOR DOS FILHOS do casal FORMADO PELO ora inventariado e sua então esposa. PRETENSÃO DA FILHA BIOLÓGICA DA VIÚVA E ADOTIVA DO INVENTARIADO DE SER INCLUÍDA NA CONDIÇÃO DE FIDEICOMISSÁRIA. DESCABIMENTO. VONTADE DOS FIDEICOMITENTES.

A vontade dos fideicomitentes foi clara e expressa no sentido de institutir como fideicomissários os filhos do casal formado pelo ora inventariado e sua então esposa, dentre os quais a recorrente não se encontra, na medida em que não é filha da primeira esposa do inventariado, sendo filha biológica da viúva e inventariante.

Hipótese em que a condição para figurar como fideicomissário depende necessariamente da observância não apenas da linha descendente paterna, mas também da linha descendente materna, esta não cumprida pela agravante, adotada pelo "de cujus" muitos anos após a morte dos testadores, que não pretenderam incluir netos que não fossem filhos do casal formado pelo ora inventariado e sua então esposa.

Necessidade de observância da vontade dos testadores, nos termos do art. 1.899 do Código Civil, redação similar à do art. 1.666 do Código Civil/1916.

Agravo de instrumento desprovido.

DECISÃO MONOCRÁTICA

JULIANA O. DA F., nascida em 17/07/1980, filha biológica da viúva e inventariante Cecília O. da F. e adotiva do "de cujus", interpõe agravo de instrumento diante da decisão do Evento 149 do processo originário, "ação de abertura de inventário" pelo falecimento de OSCAR M. C. DA F., óbito ocorrido em 24/03/2020 (documento 3 do Evento 1), decisão assim lançada:

"Vistos em saneador.

Trata-se de processo de inventário dos bens deixados por Oscar M. C. da F., falecido em 24/03/2020 (certidão de óbito no evento 1, doc. 3). O falecido era casado com Cecilia O. da F., deixou testamento e os seguintes herdeiros: a) Oscar – filho; b) João – filho; c) Pedro – filho; d) Juliana – filha; e) Cláudia F. T. - filha (pré-morta), e que deixou uma filha, Gabriela F. B. B., herdeira por representação.

Em primeiro lugar, saliento que a ação de inventário destina-se a identificar os bens deixados pela falecida, identificar seus herdeiros, fazer o pagamento de dívidas e outorgar a propriedade dos bens aos sucessores na proporção de seus quinhões.

Para isso, eventuais questões pessoais e diferenças que reflitam desarmonia entre os herdeiros não interessam ao processo de inventário e devem ficar reservadas aos interessados.

Posta questão, o genitor do inventariado, OSCAR F. (fideicomitente), deixou testamento lavrado em 26.04.1973, através do qual instituiu fideicomisso sobre uma área de 557,26 hectares, indicando o filho de cujus OSCAR M. C. DA F. e sua ex-esposa Eunice F. (fiduciários) como fiduciários e os filhos legítimos do casal como (fideicomissários): João, Pedro, Oscar Neto e Cláudia.

O ato de última vontade do genitor do inventariado veio aos autos no evento 142, doc. 04, cujo trecho destaco:

“...que por minha morte, entregue aos fiduciários, ora instituídos, Oscar M. C. da F. e sua esposa, dona Eunice N. D. da F., para que, por morte dos fiduciários, seja ela entregue aos fideicomissários, ora instituídos, quais sejam todos os filhos legítimos de Oscar M. C. da F. – Eunice N. D. da F., (sic), meus netos (...)”.

A área de terras, conforme demonstram as partes, diz com a FAZENDA POSTO ALTO (LIVRAMENTO), cuja proposta de partilha apresentada nas primeiras declarações, foi a seguinte:

PARCELA IDEAL DE 48,31%, EQUIVALENTE A 844,25 HECTARES, DA FAZENDA POSTO ALTO (LIVRAMENTO): área total da Fazenda: 1.747,38 hectares; destes, 440 hectares eram de propriedade exclusiva do autor da herança; 155 hectares resultaram da meação do autor da herança com sua cônjuge Eunice; 249,25 hectares são decorrentes do fideicomisso em favor da filha pré-morta Cláudia, que reverte em favor do fideicomitente por caducidade (art. 1.738 do CCB/1916) e 747,75 hectares constituem fideicomisso em favor dos herdeiros João, Oscar Neto e Pedro. Valor estimado da parte inventariada: R$ 16.885.000,00 conforme avaliação anexa

O fideicomitente utilizou-se da faculdade, hoje prevista no artigo 1951 do Código Civil, que assim reza:

Art. 1.951. Pode o testador instituir herdeiros ou legatários, estabelecendo que, por ocasião de sua morte, a herança ou o legado se transmita ao fiduciário, resolvendo-se o direito deste, por sua morte, a certo tempo ou sob certa condição, em favor de outrem, que se qualifica de fideicomissário

Ocorre que, fato nos autos, a morte da fideicomissária Cláudia, ocorreu em 05 de março de 2010, anterior, portanto, à morte dos fiduciários Eunice (em 05.08.2010), e Oscar (em 24.03.2020).

E aqui inicia a primeira discussão que merece atenção desse juízo, uma vez que refletirá sobre a retificação do esboço apresentado, divergência que pode ser resolvida com a interpretação estrita das normas sucessórias.

A herdeira por representação, Gabriela F. B. B., defende direito à partilha da referida área, afirmando que, com o falecimento do fiduciário, seu direito real decorrente do fideicomisso transformou-se em usufruto, tocando aos fideicomissários a nua-propriedade.

Os demais herdeiros, outrossim, rebatem a tese, por entenderem que, tendo a morte da fideicomissária ocorrido previamente à dos fiduciários, o bem em fideicomisso deve passar aos demais fideicomissários, pautando-se pelo direito de acrescer.

Com efeito, rezam os artigos 1941, 1942 e 1956 do Código Civil:

Art. 1.941. Quando vários herdeiros, pela mesma disposição testamentária, forem conjuntamente chamados à herança em quinhões não determinados, e qualquer deles não puder ou não quiser aceitá-la, a sua parte acrescerá à dos co-herdeiros, salvo o direito do substituto.

Art. 1.942. O direito de acrescer competirá aos co-legatários, quando nomeados conjuntamente a respeito de uma só coisa, determinada e certa, ou quando o objeto do legado não puder ser dividido sem risco de desvalorização.

Art. 1.956. Se o fideicomissário aceitar a herança ou o legado, terá direito à parte que, ao fiduciário, em qualquer tempo acrescer.

Equivoca-se Gabriela, porquanto, a questão é anterior ao falecimento do autor da herança, então fiduciário, não podendo ser validada sua interpretação. Com efeito, a discussão refere-se ao quinhão que era de Cláudia, mas que, com sua morte, já adianto, passa a ser dos demais fideicomissários João, Oscar Neto e Pedro.

Isso porque, além de expressamente reconhecido o direito de acrescer, veja-se que, não houve disposição testamentária expressa do fideicomitente prevendo a hipótese de substituição do fideicomissário pré morto, sendo que, a única suposição legal que aceita a substituição fideicomissária é a do não concebido ao tempo da morte do testador:

Art. 1.952. A substituição fideicomissária somente se permite em favor dos não concebidos ao tempo da morte do testador.

O testamento, como se sabe, não admite interpretação extensiva, flexível.

Ademais, a substituição não pode ir além do segundo grau, ou seja, ir além da figura do fideicomissário, de acordo com o que determina o artigo 1959 do Código Civil:

Art. 1.959. São nulos os fideicomissos além do segundo grau.

Nesse sentido, o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça:

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA. FIDEICOMISSO. FIDEICOMISSÁRIO PREMORIENTE. CLÁUSULA DO TESTAMENTO ACERCA DA SUBSTITUIÇÃO DO FIDEICOMISSÁRIO. VALIDADE. COMPATIBILIDADE ENTRE A INSTITUIÇÃO FIDUCIÁRIA E A SUBSTITUIÇÃO VULGAR. CONDENAÇÃO DE TERCEIRO AFASTADA. EFEITOS NATURAIS DA SENTENÇA.

1. Se as questões trazidas à discussão foram dirimidas pelo tribunal de origem de forma suficientemente ampla, fundamentada e sem omissões, deve ser rejeitada a alegação de contrariedade do art. 535 do Código de Processo Civil.

2. A sentença não prejudica direitos de pessoa jurídica que não foi citada para integrar a relação processual (CPC, art. 472). Como ato estatal imperativo produz, todavia, efeitos naturais que não pode ser ignorados por terceiros.

3. O recurso de apelação e a ação cautelar são instrumentos processuais distintos e visam a diferentes objetivos. O ajuizamento de ambos para questionar diferentes aspectos do mesmo ato judicial não configura preclusão consumativa a obstar o conhecimento da apelação.

4. De acordo com o art. 1959 do Código Civil, "são nulos os fideicomissos além do segundo grau". A lei veda a substituição fiduciária além do segundo grau. O fideicomissário, porém, pode ter substituto, que terá posição idêntica a do substituído, pois o que se proíbe é a sequência...

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