Decisão Monocrática nº 50816217120208210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sétima Câmara Cível, 17-08-2022

Data de Julgamento17 Agosto 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50816217120208210001
Tipo de documentoDecisão monocrática
ÓrgãoSétima Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002596317
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

7ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5081621-71.2020.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Roubo (art. 157)

RELATOR(A): Des. CARLOS EDUARDO ZIETLOW DURO

EMENTA

APELAÇÕES CÍVEIS. RECONHECIMENTO PESSOAL. INOBSERVÂNCIA DO ART. 226 DO CPP. MERAS RECOMENDAÇÕES. NULIDADE INOCORRENTE.

Para fins de reconhecimento pessoal do agente, a inobservância do art. 226 do CPP, que contempla meras recomendações, não acarreta nulidade, amparada a condenação em outras provas, suficientes à verificação da autoria.

Precedentes do STJ e TJRS.

ATO INFRACIONAL EQUIPARADO AO DELITO DE ROUBO MAJORADO PELO CONCURSO DE AGENTES. ARTIGO 157, §2º, INCISO II DO CÓDIGO PENAL. RELEVÂNCIA DA PALAVRA DA VÍTIMA. IDONEIDADE DOS DEPOIMENTOS DOS POLICIAIS MILITARES. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. PROCEDÊNCIA DA REPRESENTAÇÃO.

Em atos infracionais análogos aos crimes contra o patrimônio, atribui-se relevância à palavra da vítima para fins de demonstração da autoria, mormente quando corroborada pelo restante do conjunto probatório.

Idoneidade dos depoimentos dos policiais militares, em consonância com as demais provas produzidas.

Precedentes do TJRS.

MEDIDA SOCIOEDUCATIVA. SEMILIBERDADE. PROPORCIONALIDADE. MEDIDA ADEQUADA A ATOS INFRACIONAIS EQUIPARADOS A DELITOS PRATICADOS MEDIANTE VIOLÊNCIA OU GRAVE AMEAÇA À VÍTIMA. SENTENÇA REFORMADA NO PONTO.

Monstrando-se insuficientes para os fins previstos no ECA as medidas socioeducativas de liberdade assistida e prestação de serviços à comunidade aplicadas na sentença, devem ser substituídas pela medida de semiliberdade, uma vez que adequada à gravidade dos fatos e às condições pessoais do adolescente infrator, que, embora seja réu primário, cometeu ato infracional mediante grave ameaça, subtraindo pertences da vítima, deste modo, cumpre-se evitar que fatos como estes se repitam futuramente, ato que revela ousadia e desajuste às normas sociais.

Precedentes do TJRS.

Apelação do réu desprovida e provida a apelação do Ministério Público.

DECISÃO MONOCRÁTICA

O MINISTÉRIO PÚBLICO e CRISTIAN RAFAEL DA R. R. apelam da sentença que julgou procedente a representação movida pelo primeiro contra o segundo e ALISSON GABRIEL B. D., dispositivo sentencial assim lançado (Evento 62 dos autos de origem):

ISSO POSTO, julgo procedente a representação para aplicar ao representado CRISTIAN RAFAEL DA R. R. as medidas socioeducativas de liberdade assistida, pelo período mínimo de seis meses, e de prestação de serviços à comunidade, pelo prazo de quatro meses, quatro horas semanais, nos termos dos artigos 117 e 118, ambos do ECA, por considerar sua conduta ajustada ao disposto no artigo 157, §2º, inciso II, do Código Penal.

Registre-se. Intimem-se.

Com o trânsito em julgado, encaminhem-se os entorpecentes apreendidos à incineração, através de ofício ao DENARC, e o simulacro à destruição, expeça-se o PEM e arquive-se.

Em suas razões (Evento 69 dos autos de origem), aduz CRISTIAN RAFAEL DA R. R., o reconhecimento do adolescente não observou as regras do art. 226 do Código de Processo Penal, o que inviabiliza a procedência da representação.

Destaca que a incerteza gerada pelo modo como identificado o adolescente impõe a sua absolvição por força do princípio do in dubio pro reo.

Requer a reforma da sentença para que seja julgada improcedente a representação por insuficiência de provas.

Apela também o MINISTÉRIO PÚBLICO. Em suas razões (Evento 66 dos autos de origem), propugna que as medidas socioeducativas aplicadas não são adequadas à gravidade do ato infracional perpetrado pelo adolescente, correspondente ao tipo penal de roubo majorado pelo concurso de agentes, daí por que devem ser substituídas pela medida de semiliberdade, a qual se mostra proporcional às circunstâncias em que praticada a conduta.

Cita jurisprudência que entende favorável a sua pretensão.

Ressalta que a aplicação de medidas brandas para atos graves acabam por desmoralizar o sistema estatal.

Pede o provimento do recurso para que seja aplicada ao adolescente a medida socioeducativa de semiliberdade.

Em contrarrazões (Evento 72 dos autos de origem), manifestou-se o MINISTÉRIO PÚBLICO pela manutenção da procedência da representação, uma vez que restaram comprovadas a autoria e a materialidade do ato infracional.

CRISTIAN RAFAEL DA R. R., por sua vez, apresentou contrarrazões em que rejeita o pedido ministerial de aplicação da medida de semiliberdade, tendo em vista a ausência de requisitos para a sua internação (Evento 73 dos autos de origem).

Nesta Corte, o MINISTÉRIO PÚBLICO ofereceu parecer favorável à aplicação da medida socioeducativa de semiliberdade. Quanto à apelação defensiva, manifestou-se pelo seu conhecimento e desprovimento (Evento 9).

É o relatório.

Efetuo o julgamento na forma monocrática, forte no art. 206, XXXVI, do RITJRS, combinado com o art. 932, VIII, do CPC.

As presentes apelações merecem ser conhecidas, devendo ser dado provimento ao recurso do MINISTÉRIO PÚBLICO, e negado provimento ao recurso de CRISTIAN RAFAEL DA R. R., observadas as disposições legais e a orientação jurisprudencial a respeito do tema.

Inicio pelo exame do apelo de CRISTIAN RAFAEL DA R. R..

Primeiramente, afasto a prefacial de nulidade do reconhecimento, pois, ainda que não observados os exatos termos do art. 226 do CPP, por contemplar tal dispositivo meras recomendações, não acarreta nulidade sua inobservância isoladamente, amparada a condenação em outras provas para verificar a autoria, como no caso dos autos.

É o entendimento desta Corte, conforme se verifica:

APELAÇÃO CÍVEL. ECA. ATO INFRACIONAL ANÁLOGO AO CRIME DE ROUBO MAJORADO (ARTIGOS 157, §2º, INCISO II, E §2º-A, INCISO I, DO CÓDIGO PENAL). AFASTADA A PRELIMINAR DA DEFESA, QUANTO À DESOBEDIÊNCIA AO ART. 226 DO CPP. COMPROVADAS A AUTORIA E A MATERIALIDADE, DEVE SER MANTIDA A MEDIDA SOCIOEDUCATIVA APLICADA. MANTIDA A MAJORANTE DE EMPREGO DE ARMA DE FOGO. VALIDADE DA PALAVRA DAS VÍTIMAS E DOS POLICIAIS MILITARES, EM CONSONÂNCIA COM O CADERNO PROBATÓRIO. RECURSO DESPROVIDO. (Apelação Cível, Nº 70083434779, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Liselena Schifino Robles Ribeiro, Julgado em: 10-12-2019)

APELAÇÃO CÍVEL. ATO INFRACIONAL. ECA. ROUBO. 1. PRELIMINAR DE NULIDADE DO LAUDO DE AVALIAÇÃO. DESCABIMENTO. 2. AUTORIA E MATERIALIDADE EVIDENCIADAS. 3. RECONHECIMENTO DO ADOLESCENTE. ART 226 CPP. VALIDADE. 4. DESCLASSIFICAÇÃO PARA FURTO. DESCABIMENTO. 5. MAJORANTE DE CONCURSO DE PESSOAS. IRRELEVÂNCIA. 6. MEDIDA SOCIOEDUCATIVA ADEQUADA. INTERNAÇÃO SEM ATIVIDADE EXTERNA (ISPAE). (...) A procedência da representação está amparada em elementos de prova suficientes para a tipicidade do ato praticado, bem como para comprovar a participação do representado. As formalidades do art. 226 do CPP constituem mera recomendação, não invalidando o reconhecimento, se não obedecidas. Ademais, as garantias constitucionais da ampla defesa e do contraditório foram preservadas na fase judicial, não havendo qualquer mácula no procedimento de reconhecimento do representado pela vítima. (...) Na especificidade do caso, a medida aplicada na sentença se afigura adequada, tendo em vista a gravidade do fato, praticado com ameaça a pessoa, e também a circunstância de que o representado já ostenta condenações anteriores também por ato infracional grave. NEGARAM PROVIMENTO. UNÂNIME.(Apelação Cível, Nº 70083534008, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Felipe Brasil Santos, Julgado em: 13-02-2020)

A mesma é a orientação do STJ, citando-se:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. FURTO QUALIFICADO. VIOLAÇÃO DO ART. 226 DO CPP. RECONHECIMENTO POR FOTOGRAFIA. ABSOLVIÇÃO. ROMPIMENTO DE OBSTÁCULO. DECOTE DE QUALIFICADORA. AUSÊNCIA DE PERÍCIA. DOSIMETRIA. MATÉRIA CONSTITUCIONAL. PREQUESTIONAMENTO. RECURSO DESPROVIDO.

1. As disposições insculpidas no art. 226 do CPP configuram uma recomendação legal, e não uma exigência absoluta, não se cuidando, portanto, de nulidade quando praticado o ato processual (reconhecimento pessoal) de modo diverso.

(...)

5. Agravo regimental a que se nega provimento.

(AgRg no REsp 1827892/MG, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 18/02/2020, DJe 28/02/2020)

AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS COUS. PROCESSUAL PENAL. DECISÃO EM QUE NÃO SE CONHECEU DE WRIT IMPETRADO PERANTE ESTA CORTE SUPERIOR. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. ATO INFRACIONAL EQUIPARADO AO HOMICÍDIO QUALIFICADO, NA FORMA TENTADA. RECONHECIMENTO PESSOAL DO AGENTE. TESE DE NULIDADE, POR INOBSERVÂNCIA DO DISPOSTO NO ART. 226 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. EXISTÊNCIA DE OUTRAS PROVAS A COMPROVAR A AUTORIA. NULIDADE NÃO CONFIGURADA. PREJUÍZO NÃO DEMONSTRADO. INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO PAS DE NULLITÉ SANS GRIEF. DECISÃO MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.

1. Consoante a jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça, no reconhecimento pessoal do agente, a inobservância do disposto no art. 226 do Código de Processo Penal não enseja, em si, nulidade da instrução criminal, mormente quando a sentença fundamenta-se em outras provas constantes nos autos para reconhecer a autoria delitiva.

2. No caso, a comprovação da autoria do ato infracional análogo ao crime de tentativa de homicídio, amparou-se não só no reconhecimento pessoal do Paciente pelas vítimas, o qual foi repetido em juízo, mas também nos depoimentos das testemunhas.

3. A declaração de nulidade do ato processual exige a demonstração da ocorrência de efetivo prejuízo ao réu - não evidenciado na espécie -, em face do princípio pas de nullité sans grief, insculpido no art. 563 do Código de Processo Penal.

4. Agravo regimental desprovido.

(AgRg no HC 272.660/ES, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 22/04/2014, DJe 30/04/2014)

Superada a prefacial,...

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