Decisão Monocrática nº 50874696820228210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Quarta Câmara Cível, 30-09-2022

Data de Julgamento30 Setembro 2022
ÓrgãoDécima Quarta Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50874696820228210001
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoDecisão monocrática

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002788375
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

14ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5087469-68.2022.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Alienação fiduciária

RELATOR(A): Des. ROBERTO SBRAVATI

APELANTE: EDISON CARLOS RODRIGUES (AUTOR)

APELADO: OMNI S/A CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO (RÉU)

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. AÇÃO REVISIONAL. DECISÃO MONOCRÁTICA. ART. 932, V, ‘A’ e ‘B’, DO CPC.

PRELIMINAR

IMPUGNAÇÃO AO VALOR DA CAUSA. NO CASO, FOI ATRIBUÍDO O VALOR DE ALÇADA À AÇÃO REVISIONAL, E NÃO DO VALOR TOTAL CONTRATADO, COMO ALEGADO PELO APELADO. PRELIMINAR REJEITADA.

BOA-FÉ CONTRATUAL. O Código de Defesa do Consumidor implementou uma nova ordem jurídica, viabilizando a revisão contratual e a declaração de nulidade absoluta das cláusulas abusivas. O fato de que o Autor pagou poucas parcelas não o impede de revisar o contrato, por ser um direito básico do consumidor o equilíbrio da relação contratual. PRELIMINAR REJEITADA.

MÉRITO

SEGURO DE PROTEÇÃO FINANCEIRA. APLICAÇÃO DO ENTENDIMENTO EXARADO NOS RESP N. 1.639.259/SP E RESP N. 1.639.320/SP – TEMA 972/STJ. “NOS CONTRATOS BANCÁRIOS EM GERAL, O CONSUMIDOR NÃO PODE SER COMPELIDO A CONTRATAR SEGURO COM A INSTITUIÇÃO FINANCEIRA OU COM SEGURADORA POR ELA INDICADA.” VENDA CASADA CONFIGURADA, AFASTADA SUA PACTUAÇÃO.

COMPENSAÇÃO DE VALORES E REPETIÇÃO DO INDÉBITO. A FIM DE EVITAR O ENRIQUECIMENTO ILÍCITO DE UMA DAS PARTES, A COMPENSAÇÃO DE VALORES E A REPETIÇÃO DO INDÉBITO SÃO DEVIDAS, RESPEITANDO O DISPOSTO NOS ARTIGOS 369 E 876, AMBOS DO CC. A RESTITUIÇÃO DEVE OCORRER DE FORMA SIMPLES, E COMO CONSEQUÊNCIA LÓGICA DO JULGADO.

DA MORA. É a constatação da existência de abusividade no período da normalidade que tem o condão de afastar a mora do devedor. Presente a ilegalidade contratual, a mora deve ser afastada.

DA TUTELA ANTECIPADA. Estando presentes todos os requisitos necessários para a concessão da tutela antecipada, seu deferimento está condicionado à realização dos depósitos nos valores recalculados conforme esta decisão. Fixação de multa diária em caso de descumprimento de ordem judicial.

PRELIMINARES CONTRARRECURSAIS REJEITADAS. APELO PARCIALMENTE PROVIDO. EM DECISÃO MONOCRÁTICA.

DECISÃO MONOCRÁTICA

Trata-se de apelação interposta por EDISON CARLOS RODRIGUES contra sentença proferida nos autos da Ação de Revisão de Contrato que, o ora apelante, litiga em face de OMNI S/A CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO.

A sentença recorrida assim decidiu:

Assim, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a ação revisional ajuizada por EDISON CARLOS RODRIGUES contra OMNI S/A CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO, para:

1) determinar a revisão do(s) contrato(s) objeto(s) dos autos para:

- limitar os juros remuneratórios à taxa média de mercado, para o mês da contratação, permitida a capitalização, na forma da fundamentação.

2) condenar a parte ré a compensar o débito com o crédito da parte autora decorrente desta revisão, corrigindo-se monetariamente cada pagamento a maior pelo IGP-M, com juros moratórios de 1% ao mês desde a citação e, remanescendo saldo credor em favor da parte autora, os valores deverão ser restituídos, na forma simples, com a mesma forma de atualização monetária e juros determinados na compensação;

3) revogar a antecipação de tutela, em razão do descumprimento dos requisitos impostos na decisão concessiva da liminar, mantendo-se hígida a mora contratual;

4) rejeitar os demais pedidos, com fundamento no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil.

Condeno cada uma das partes ao pagamento de 50% das custas processuais, além de honorários advocatícios ao procurador da parte contrária, os quais fixo em 10% sobre o valor atualizado da causa. Suspensa a exigibilidade da parte autora em tendo havido o deferimento da AJG.

Apela o Autor (evento 25). Requer o provimento do recurso para a reforma da sentença a fim de possibilitar a revisão das quantias cobradas em excesso, pleiteando pelo seguro prestamista; pela declaração da inexistência da mora; e pelo deferimento da tutela antecipada, com a cominação de multa diária em caso de descumprimento de ordem judicial.

Em contrarrazões (evento 30) o réu alega, em preliminar, a ausência de boa-fé objetiva do autor, e impugna o valor dado à causa. No mérito, postula pela manutenção das cláusulas conforme contratadas.

Subiram os autos a este Tribunal.

É o relatório.

Decido.

Na forma do art. 932, V, alíneas ‘a’ e ‘b’, do CPC, rejeito as preliminares contrarrecursais, e dou parcial provimento ao recurso, tendo em vista que a decisão profligada encontra-se em dissonância parcial com as Súmulas e o entendimento firmado em recursos repetitivos julgados pelo Superior Tribunal de Justiça quanto ao tema, senão vejamos.

Em 01.06.2021 as partes ajustaram um contrato de financiamento com cláusula de alienação fiduciária, Cédula de Crédito Bancário n. 101777000050321, referente à aquisição de um automóvel modelo Audi / A3, placa LSH0G94, objeto da presente revisão.

PRELIMINARES

IMPUGNAÇÃO AO VALOR DA CAUSA

Na hipótese dos autos, não há atribuição do valor total contratado, como alegou o apelado, pois o autor atribuiu o valor de alçada à demanda, não havendo óbice quanto ao ponto.

Nesse sentido:

APELAÇÃO CÍVEL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO. ATENDIMENTO AO DISPOSTO NO ART. 330 DO CPC/2015. A parte autora discriminou o(s) encargo(s) contratual(is) controvertido(s) e apontou o valor incontroverso, restando atendidos os requisitos do art. 330, §§2º e 3º, do CPC/2015. Ademais, em se tratando de ação cujo objeto é a revisão de contrato, há possibilidade de atribuição, na inicial, de valor diverso daquele do contrato, podendo tratar-se do valor de alçada, visto que apenas no final da cognição, quando do julgamento definitivo, é que se chegará a valor certo e determinado. Precedentes. Desconstituição da sentença para que o processo tenha regular tramitação. APELAÇÃO PROVIDA. SENTENÇA DESCONSTÍTUIDA.(Apelação Cível, Nº 70082022963, Décima Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Miriam A. Fernandes, Julgado em: 26-09-2019)

APELAÇÃO CÍVEL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. AÇÃO DE REVISÃO CONTRATUAL. 1. Tendo sido atendidos os requisitos inscritos no artigo 330, §§ 2º e 3º, do CPC/2015, não há falar em inépcia da petição inicial. 2. Em se tratando de ação revisional, mostra-se viável a atribuição do valor de alçada, porquanto não pretende a parte autora a modificação integral do contrato – sendo inaplicável, assim, o disposto no artigo 292, inciso II, do CPC/2015 –, mas apenas a parte que considera abusiva, insuscetível de dimensionamento nesta fase processual. APELAÇÃO PROVIDA. SENTENÇA DESCONSTITUÍDA.(Apelação Cível, Nº 70082486077, Décima Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Mário Crespo Brum, Julgado em: 26-09-2019)

Portanto, se mostra adequado o valor indicado pelo demandante, razão pela qual rejeito a preliminar.

BOA-FÉ CONTRATUAL

A pactuação bancária do crédito configura autêntico instrumento de adesão, e como assim é, um dos contratantes detém o poder unilateral de estabelecer suas cláusulas oportunizando ao aderente tão-só a opção de aceitá-las como postas, jamais de alterá-las. Assim, ingressa no mundo jurídico inquinada de abusividades, ostentando juros extorsivos, ou outros encargos não autorizados, contexto que impõe seja o negócio apreciado à luz do Código de Defesa do Consumidor, tendo como critério primeiro a boa-fé objetiva.

É, destarte, um direito básico do consumidor o equilíbrio da relação contratual, inclusive mediante a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou a sua revisão em razão de fatos supervenientes, com base nas disposições do artigo 6º, inciso V, do CDC. Está, pois, superado o antigo princípio do pacta sunt servanda em face do princípio da relatividade do contrato, aplicável diante do fato de que a realidade social não é estanque e as situações modificam-se vertiginosamente, devendo o próprio contrato acompanhar esse novo contexto social e econômico, buscando, sempre, a necessária igualdade entre os contratantes.

Por conclusão, sendo um direito básico do consumidor o equilíbrio da relação contratual, não é crível que se impeça o consumidor de revisar o contrato, ainda que não tenha pago a totalidade das parcelas pactuadas, razão pela qual rejeito a preliminar.

MÉRITO

SEGURO DE PROTEÇÃO FINANCEIRA

Conforme restou definido no julgamento dos Recursos Especiais representativos de controvérsia nºs 1.639.259/SP e 1.639.320/SP – Tema 972/STJ: “Nos contratos bancários em geral, o consumidor não pode ser compelido a contratar seguro com a instituição financeira ou com seguradora por ela indicada.”

Portanto, tanto a contratação de seguro pelo consumidor, quanto com qual seguradora contratar, devem ser uma opção a ele oferecida, sob pena de configurar-se venda casada, prática esta vedada pelo disposto no art. 39, I, do CDC.

No caso em tela, em que pese tenha sido deferida a inversão do ônus da prova, verifica-se que não houve interesse pelo réu em acostar aos autos o termo de adesão ao seguro prestamista, impossibilitando o exame de eventual abusividade na contratação. Assim, respeitando a hipossuficiência do mutuário e admitindo como verdadeiros os fatos alegados pelo autor, tenho que deve ser declarada a nulidade requerida por ferir o dever de informação consubstanciado no art. 6º, II e III, do CDC.

COMPENSAÇÃO DE VALORES E REPETIÇÃO DO INDÉBITO

A fim de evitar o enriquecimento ilícito de uma das partes, a compensação de valores e a repetição do indébito são devidas, respeitando o disposto nos artigos 369 e 876, ambos do CC. Mesmo porque, o Superior Tribunal de Justiça já possui sólida jurisprudência em admitir sua ocorrência nos casos de cobranças indevidas de valores:

RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE...

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