Decisão Monocrática nº 51003430620238217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Primeira Câmara Cível, 17-04-2023

Data de Julgamento17 Abril 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualAgravo de Instrumento
Número do processo51003430620238217000
Tipo de documentoDecisão monocrática
ÓrgãoVigésima Primeira Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003629226
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

21ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Instrumento Nº 5100343-06.2023.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: ISS/ Imposto sobre Serviços

RELATOR(A): Desa. LISELENA SCHIFINO ROBLES RIBEIRO

AGRAVANTE: MUNICÍPIO DE CANOAS

AGRAVADO: SULTEPA CONSTRUÇÕES E COMÉRCIO LTDA (Em Recuperação Judicial)

EMENTA

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. PENHORA ONLINE ATRAVÉS DO SISTEMA SISBAJUD. LEGALIDADE. INAPLICABILIDADE DO ART. 36 DA LEI DE ABUSO DE AUTORIDADE. PRECEDENTES.

O INDEFERIMENTO BASEADO NO ART. 36 DA LEI 13.869/19 NÃO ENCONTRA RESPALDO, HAJA VISTA QUE O DISPOSITIVO MENCIONADO NÃO IMPEDE A REALIZAÇÃO DA PENHORA ONLINE, MAS APENAS TIPIFICA COMO CRIME, A CONSTRIÇÃO DE QUANTIA INDEVIDA QUE, O MAGISTRADO AO SER NOTIFICADO, NÃO VENHA A REALIZAR SUA CORREÇÃO.

A PENHORA DE ATIVOS FINANCEIROS, VIA SISTEMA BACENJUD (ATUAL SISBAJUD), É LÍCITA, HAJA VISTA QUE O DINHEIRO ESTÁ EM PRIMEIRO LUGAR NA ORDEM DE PREFERÊNCIA ESTABELECIDA NO ART. 835, INCISO I, DO CPC, BEM COMO NO ART. 11 DA LEF.

RECURSO PROVIDO.

DECISÃO MONOCRÁTICA

Trata-se de agravo de instrumento do MUNICÍPIO DE CANOAS, postulando a reforma da decisão que, nos autos da execução fiscal movida em face de SULTEPA CONSTRUÇÕES E COMÉRCIO LTDA, indeferiu-lhe o pedido de penhora via SISBAJUD, nos seguintes termos:

Vistos.

Requereu o exequente a penhora de valores via SISBAJUD. Juntou cálculo no evento 15, doc2.

Impõe-se esclarecer que o atual procedimento de bloqueio de valores online alcança todas as contas de titularidade do obrigado, conduzindo à inevitável penhora de valores superiores àqueles buscados no processo, havendo disponibilidade nas referidas contas bancárias.

Tal sistemática foi exemplarmente descrita pelo Ilustre Des. Luiz Felipe Silveira Difini, nos autos do Agravo de Instrumento nº 70083037515, conforme reproduzo:

"Na atual sistemática de bloqueios on line, é inerente à realização do bacenjud a possibilidade de constrição em quantia superior à efetivamente executada.

Isso porque, ao emanar a ordem para o Banco Central, todas as quantias encontradas, nas mais diversas instituições, sofrerão o bloqueio, no montante informado pelo juiz, podendo ocorrer a penhora dúplice – dois valores bloqueados em instituições financeiras diversas. Por certo que o desbloqueio é efetuado pelo juiz, após a devida consulta ao protocolo por ele realizado."

Acrescente-se que, dependendo de iniciativa do devedor, a verificação de penhora excessiva ou inadequada, exigirá prévia oportunização de ouvida do credor, sob pena de descumprimento do disposto no art. 10 do Código de Processo Civil.

Portanto, a demora na verificação e eventual desobstrução de valores indevidamente penhorados, depende não só das peculiaridades do próprio sistema SISBAJUD, mas também das peculiaridades de cada unidade judiciária e de expressa determinação legal acerca do contraditório, base constitucional de um processo justo.

Assim, considerada a publicação da Lei 13.869/19 – Lei de Abuso de Autoridade – necessário considerar a possibilidade de tipificação de ato judicial de constrição patrimonial em crime previsto em norma penal de tipo aberto. Veja-se a respeito, mais uma vez, a lição do Des. Luiz Felipe Silveira Difini, extraída dos autos do Agravo de Instrumento nº 70083037515:

"Todavia, a lei não esclarece qual o alcance das expressões “exacerbadamente” e “excessividade da medida”. Também não refere qual o prazo para que reste configurada a omissão do julgador disposta na parte final do tipo penal.

Ainda que se encontre em “vacatio legis” por certo que os atos executórios se alongam no tempo, provavelmente alguns sendo praticados após a entrada em vigor da lei.

Em suma, a norma, contrariando a técnica legislativa penal, é aberta, admitindo interpretação nos mais variados sentidos. Criminaliza conduta atrelada à atividade-fim do julgador, responsável pela condução dos processos e pela determinação do bloqueio on line."

Por consequência, impõe-se reconhecer que o tipo penal descrito no art. 36 da Lei nº 13.869/20191 afronta o direito penal moderno, constituindo tipo penal aberto, cuja principal característica é a imprecisão sobre a conduta proibida e a conduta permitida, dificultando o discernimento do destinatário da norma penal.

Tal compreensão não decorre de percepção subjetiva, ou temor no exercício da jurisdição, mas da necessidade de reafirmação do Estado Democrático de Direito neste momento de aparente retrocesso.

De outro lado, segundo lição do eminente desembargador Nereu José Giacomolli2, a defesa de um direito penal com tipos abertos é característica de um direito penal autoritário, incompatível com o atual estado de desenvolvimento da civilização.

Logo, no atual contexto, pendente pronunciamento da Corte Suprema nos autos das ADINS – Ações direta de Inconstitucionalidade nº 6238 e nº 6239, temerária a determinação de penhora online neste instante processual.

Por tais razões, indefiro o pedido de penhora online deduzido pelo exequente no evento 15, doc1.

Intime-se, inclusive, para, no prazo de 60 (sessenta) dias, manifestar-se sobre o prosseguimento.

Diligências legais.

Sustenta a possibilidade da penhora postulada, e que para que se criminalize a conduta, exige-se que o julgador, dolosamente, efetue constrição judicial de quantia indevida e , notificado do equívoco, não realiza a sua correção. Refere que o Bacenjud advém do convênio criado entre o Conselho Nacional de Justiça – CNJ e o Banco Central do Brasil – BACEN, com o objetivo de facilitar a comunicação entre o Poder Judiciário e as instituições financeiras, pois agiliza a solicitação de informações e o envio de ordens judiciais ao Sistema Financeiro Nacional, via internet.

Requer a reforma da decisão, determinando-se a realização da penhora online nas contas do executado.

Pede, por isso, o provimento ao recurso.

Vieram os autos.

É o relatório.

Nos termos do art. 932, VIII, do CPC/2015, e do art. 206, XXXVI, do Regimento Interno desta Corte de Justiça, possível o julgamento monocrático do feito.

Com razão o recorrente.

Primeiramente, destaco que a penhora de ativos financeiros, via sistema SISBAJUD, é lícita, haja vista que o dinheiro ocupa o primeiro lugar na ordem de preferência trazida pelo art. 835, inciso I, do Código de Processo Civil, bem como naquilo que estabelce o art. 11 da LEF.

Nessa linha, o indeferimento da penhora online, via sistema SISBAJUD, sob a fundamentação de que a penhora ora mencionada estaria infringindo o disposto no art. 36 da Lei de Abuso de Autoridade, não prospera.

A Lei nº 13.869/2019 (Lei de Abuso de Autoridade), recentemente aprovada, não deve ser interpretada de modo a inviabilizar a determinação dos atos previstos na legislação processual que concedam efetividade ao processo de execução, pois o valor da penhora possui como limite/teto, o valor da dívida executada.

Em mesmo sentido, cabe mencionar que, caso haja a localização de valores que excedam aos estabelecidos no crédito tributário, o excedente não será bloqueado e, caso eventualmente tal constrição aconteça, o valor deverá ser liberado a partir de um simples pedido das partes ou de ofício pelo próprio magistrado.

Desta forma, o indeferimento baseado no art. 36 da Lei de Abuso de Autoridade não encontra respaldo, pois o referido dispositivo não impede a realização da penhora via SISBAJUD, mas apenas tipifica como crime a constrição de quantia indevida, que o magistrado ao ser notificado, não realize a correção necessária.

Destaco as decisões do Superior Tribunal de Justiça nos recursos repetitivos (REsp 1.112.943/MA e REsp 1.184.765/PA), entendendo pela legalidade da constrição de valores via BACENJUD (atual SISBAJUD):

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO CIVIL. PENHORA. ART. 655-A DO CPC. SISTEMA BACEN-JUD. ADVENTO DA LEI N.º 11.382/2006. INCIDENTE DE PROCESSO REPETITIVO. I - JULGAMENTO DAS QUESTÕES IDÊNTICAS QUE CARACTERIZAM A MULTIPLICIDADE. ORIENTAÇÃO – PENHORA ON LINE.

a) A penhora on line, antes da entrada em vigor da Lei n.º 11.382/2006, configura-se como medida excepcional, cuja efetivação está condicionada à comprovação de que o credor tenha tomado todas as diligências no sentido de localizar bens livres e desembaraçados de titularidade do devedor.

b) Após o advento da Lei n.º 11.382/2006, o Juiz, ao decidir acerca da realização da penhora on line, não pode mais exigir a prova, por parte do credor, de exaurimento de vias extrajudiciais na busca de bens a serem penhorados.

II - JULGAMENTO DO RECURSO REPRESENTATIVO - Trata-se de ação monitória, ajuizada pela recorrente, alegando, para tanto, titularizar determinado crédito documentado por contrato de adesão ao “Crédito Direto Caixa”, produto oferecido pela instituição bancária para concessão de empréstimos. A recorrida, citada por meio de edital, não apresentou embargos, nem ofereceu bens à penhora, de modo que o Juiz de Direito determinou a conversão do mandado inicial em título executivo, diante do que dispõe o art.

1.102-C do CPC.

- O Juiz de Direito da 6ª Vara Federal de São Luiz indeferiu o pedido de penhora on line, decisão que foi mantida pelo TJ/MA ao julgar o agravo regimental em agravo de instrumento, sob o fundamento de que, para a efetivação da penhora eletrônica, deve o credor comprovar que esgotou as tentativas para localização de outros bens do devedor.

- Na espécie, a decisão interlocutória de primeira instância que indeferiu a medida constritiva pelo sistema Bacen-Jud, deu-se em 29.05.2007 (fl. 57), ou seja, depois do advento da Lei n.º 11.382/06, de 06 de dezembro de 2006, que alterou o CPC quando incluiu os depósitos e aplicações em instituições financeiras como bens preferenciais na ordem da penhora como se fossem dinheiro em...

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