Decisão Monocrática nº 51131445120238217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Quarta Câmara Cível, 02-05-2023

Data de Julgamento02 Maio 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualAgravo de Instrumento
Número do processo51131445120238217000
Tipo de documentoDecisão monocrática
ÓrgãoDécima Quarta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003690956
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

14ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Instrumento Nº 5113144-51.2023.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Alienação fiduciária

RELATOR(A): Des. ROBERTO SBRAVATI

AGRAVANTE: CREDITAS SOLUCOES FINANCEIRAS LTDA.

AGRAVADO: MATHEUS DOS REIS BOTEGA

EMENTA

AGRAVO DE INSTRUMENTO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. AÇÃO REVISIONAL. MORA. CADASTROS EM ÓRGÃOS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO E MANUTENÇÃO NA POSSE DO BEM. CONDICIONAMENTO AOS DEPÓSITOS.

1. O BENEFÍCIO DA AJG DEVE SER CONCEDIDO ATRAVÉS DO SIMPLES PEDIDO DA PARTE, PRESUMINDO-SE VERDADEIRA A SUA ALEGAÇÃO DE INSUFICIÊNCIA.

2. Estando presentes todos os requisitos necessários para a concessão da tutela antecipada, seu deferimento está condicionado à realização dos depósitos das parcelas em valores recalculados, extirpando-se do cálculo as ilegalidades contratuais.

RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.

DECISÃO MONOCRÁTICA

Trata-se de agravo de instrumento interposto por CREDITAS SOLUCOES FINANCEIRAS LTDA. contra decisão proferida na ação revisional que o ora agravante litiga contra MATHEUS DOS REIS BOTEGA, a qual deferiu as tutelas cautelares nos seguintes termos:

Defiro o pedido de AJG.

Os requisitos para a concessão da tutela de urgência encontram-se presentes.

De acordo com o tema 27 do STJ, “é admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada artigo 51, §1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto".

Embora a regra seja a liberdade de pactuação dos juros, no caso, foram fixados juros superiores a 50% da taxa média apurada pelo Banco Central1 para este tipo de contrato, o que caracteriza desvantagem exagerada ao consumidor.

Assim, DEFIRO A TUTELA DE URGÊNCIA, para determinar:

a) PROIBIÇÃO de inclusão ou de manutenção do nome da parte autora em cadastros de proteção ao crédito relativamente a débitos discutidos neste processo;

b) MANUTENÇÃO da parte autora na posse do veículo.

As medidas são condicionadas ao depósito mensal dos valores incontroversos, conforme memória de cálculo apresentada pela parte autora.


Outras disposições:

1) Reconheço a parte autora como hipossuficiente e declaro a inversão do ônus probatório, na forma do art. 6º, inciso VIII, do CDC.

2) Cite-se a parte ré para apresentar contestação, no prazo de 15 dias, sob pena de revelia.

3) Com a resposta, à réplica.

4) Tratando-se de matéria exclusivamente de direito, já que envolve apenas a interpretação de cláusulas contratuais, desnecessária a dilação probatória. Assim, com o contrato, voltem os autos conclusos para julgamento após a réplica.

5) Eventual interesse na realização de audiência de conciliação deverá ser ratificado por ambas as partes, sob pena de indeferimento.

6) A presente decisão, assinada digitalmente, vale como ofício, a ser encaminhado pela parte interessada para cumprimento das determinações acima.

Intime-se.2

Em suas razões, a parte agravante requer a revogação das liminares e do benefício da gratuidade da justiça.

Vieram os autos conclusos e em condições de julgamento.

É o relatório.

Decido.

Na forma do art. 311, II, c/c art. 932, V, ‘a’ e ‘b’, ambos do CPC, dou parcial provimento ao presente recurso, conforme ora passo a expor.

DO BENEFÍCIO DA AJG

Requer o demandado a revogação da AJG concedida ao autor, alegando que a parte não teria comprovado documentalmente a necessidade do benefício.

Ainda que tenha a faculdade de impugnar a concessão da assistência judiciária gratuita, nos termos do art. 100, do CPC, cabe ao impugnante trazer prova cabal da eventual capacidade econômica da parte contrária para custear as despesas processuais. Ora, consoante preconizado no art. 99, § 2º, do CPC dispõe que ao julgador somente é dado o direito de indeferir preambularmente o benefício pleiteado caso haja indicativos concretos nos autos que demonstrem a suficiência de recursos da parte.

Assim, não demonstrado pelo demandado elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a isenção do pagamento das despesas processuais, mantendo a AJG concedida no primeiro grau.

DA MORA

Da análise da exordial da ação revisional de contrato se extrai que a parte agravada ajuizou a presente ação arguindo existir abusividades no contrato de financiamento firmado perante a instituição financeira, postulando pela revisão das cláusulas contratuais que seriam contrárias ao disposto no Código de Defesa do Consumidor.

A concessão da tutela, como remédio processual capaz de dar efetiva aplicação ao direito, merece cuidadosa interpretação, para que não venha a se transformar em verdadeira panaceia, em prejuízo das relações jurídicas e do sistema processual vigente.

Segundo orientação sedimentada no REsp paradigma nº 1061530/RS, “A abstenção da inscrição/manutenção em cadastro de inadimplentes, requerida em antecipação de tutela e/ou medida cautelar, somente será deferida se, cumulativamente: i) a ação for fundada em questionamento integral ou parcial do débito; ii) houver demonstração de que a cobrança indevida se funda na aparência do bom direito e em jurisprudência consolidada do STF ou STJ; iii) houver depósito da parcela incontroversa ou for prestada a caução fixada conforme o prudente arbítrio do juiz.”

No caso, a parte agravante alega inexistir abusividades contratuais capazes de afastar a mora, postulando, então, pela revogação da tutela.

Quanto à mora, entende-se, na esteira do acórdão paradigmático (RESP 1.061.530/RS) e da Súmula nº 380, que o ajuizamento isolado de ação revisional não descaracteriza a mora. Tal faz sentido, porquanto a demanda pode vir sem qualquer substrato jurídico consistente, por primeiro, ou em face de situações em que o inadimplemento se faz presente desde o começo da contratação, e já advém a ação revisional que não denotaria um agir de boa-fé por parte do consumidor.

Ademais, sustenta-se que o reconhecimento da abusividade sobre os encargos incidentes para o período de inadimplência contratual tampouco arreda a mora solvendi, uma vez que já se verificou o inadimplemento.

Portanto, entendo que apenas descaracterizaria a mora o reconhecimento da abusividade em relação aos encargos cobrados no período da normalidade contratual – i.é., juros remuneratórios e capitalização. Quando, no período da normalidade, o credor está a exigir do devedor mais do que o correto, mais do que o devido, a mora não resta configurada. É a constatação da existência de abusividade no período da normalidade contratual que tem o condão de afastar a mora do devedor.

Tudo na esteira do acórdão paradigma acima referido (voto da relatora, p. 22):

“(...) o eventual abuso em algum dos encargos moratórios não descaracteriza a mora. Esse abuso deve ser extirpado ou decotado sem que haja interferência ou reflexo na caracterização da mora em que o consumidor tenha...

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