Decisão Monocrática nº 51219890920228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Quarta Câmara Cível, 22-06-2022
Data de Julgamento | 22 Junho 2022 |
Órgão | Décima Quarta Câmara Cível |
Classe processual | Agravo de Instrumento |
Número do processo | 51219890920228217000 |
Tribunal de Origem | Tribunal de Justiça do RS |
Tipo de documento | Decisão monocrática |
PODER JUDICIÁRIO
Documento:20002342029
14ª Câmara Cível
Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906
Agravo de Instrumento Nº 5121989-09.2022.8.21.7000/RS
TIPO DE AÇÃO: Cláusulas Abusivas
RELATOR(A): Des. ROBERTO SBRAVATI
AGRAVANTE: CINTHIA DANIELI DA SILVA SOUZA
AGRAVADO: OMNI S/A CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO
EMENTA
AGRAVO DE INSTRUMENTO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. AÇÃO REVISIONAL. MORA. CADASTROS EM ÓRGÃOS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO E MANUTENÇÃO NA POSSE DO BEM. CONDICIONAMENTO AOS DEPÓSITOS.
Estando presentes todos os requisitos necessários para a concessão da tutela antecipada, seu deferimento está condicionado à realização dos depósitos das parcelas em valores recalculados, extirpando-se do cálculo as ilegalidades contratuais.
RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
DECISÃO MONOCRÁTICA
Trata-se de agravo de instrumento interposto por CINTHIA DANIELI DA SILVA SOUZA contra decisão proferida na ação revisional que a ora agravante litiga contra OMNI S/A CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO, a qual não concedeu as tutelas antecipatórias de praxe postuladas.
Em suas razões, a parte agravante requer o deferimento da liminar de manutenção de posse do bem, mediante a efetivação de depósitos judiciais nos valores que entende devido, e a abstenção do réu em inscrever seu nome em cadastros de inadimplentes.
Vieram os autos conclusos e em condições de julgamento.
Relatei.
Decido.
Na forma do art. 311, II, c/c art. 932, V, ‘a’ e ‘b’, ambos do CPC, dou parcial provimento ao presente recurso, conforme ora passo a expor.
Primeiramente, concedo a AJG para fins de análise do agravo de instrumento.
DA MORA
Da análise da exordial da ação revisional de contrato se extrai que a agravante ajuizou a presente ação arguindo existir abusividades no contrato de financiamento firmado perante a instituição financeira, postulando pela revisão das cláusulas contratuais que seriam contrárias ao disposto no Código de Defesa do Consumidor. Em suas razões postula, em especial, pela limitação dos juros remuneratórios à taxa média de mercado.
A concessão da tutela, como remédio processual capaz de dar efetiva aplicação ao direito, merece cuidadosa interpretação, para que não venha a se transformar em verdadeira panacéia, em prejuízo das relações jurídicas e do sistema processual vigente.
Segundo orientação sedimentada no REsp paradigma nº 1061530/RS, “A abstenção da inscrição/manutenção em cadastro de inadimplentes, requerida em antecipação de tutela e/ou medida cautelar, somente será deferida se, cumulativamente: i) a ação for fundada em questionamento integral ou parcial do débito; ii) houver demonstração de que a cobrança indevida se funda na aparência do bom direito e em jurisprudência consolidada do STF ou STJ; iii) houver depósito da parcela incontroversa ou for prestada a caução fixada conforme o prudente arbítrio do juiz.”
No caso, a agravante alega existir abusividades contratuais capazes de afastar a mora, postulando, então, pela concessão da tutela.
Quanto à mora, entende-se, na esteira do acórdão paradigmático (RESP 1.061.530/RS) e da Súmula nº 380, que o ajuizamento isolado de ação revisional não descaracteriza a mora. Tal faz sentido, porquanto a demanda pode vir sem qualquer substrato jurídico consistente, por primeiro, ou em face de situações em que o inadimplemento se faz presente desde o começo da contratação, e já advém a ação revisional que não denotaria um agir de boa-fé por parte do consumidor.
Ademais, sustenta-se que o reconhecimento da abusividade sobre os encargos incidentes para o período de inadimplência contratual tampouco arreda a mora solvendi, uma vez que já se verificou o inadimplemento.
Portanto, entendo que apenas descaracterizaria a mora o reconhecimento da abusividade em relação aos encargos cobrados no período da normalidade contratual – i.é., juros remuneratórios e capitalização. Quando, no período da normalidade, o credor está a exigir do devedor mais do que o correto, mais do que o devido, a mora não resta configurada. É a constatação da existência de abusividade no período da normalidade contratual que tem o condão de afastar a mora do devedor.
Tudo na esteira do acórdão paradigma acima referido (voto da relatora, p. 22):
“(...) o eventual abuso em algum dos encargos moratórios não descaracteriza a mora. Esse abuso deve ser extirpado ou decotado sem que haja interferência ou reflexo na caracterização da mora em que o consumidor tenha eventualmente incidido, pois a configuração dessa é condição para incidência dos encargos relativos ao período da inadimplência, e não o contrário. - Os encargos abusivos que possuem potencial para descaracterizar a mora são, portanto, aqueles relativos ao chamado “período da normalidade”, ou seja, aqueles encargos que naturalmente incidem antes mesmo de configurada a mora”.
Quanto ao tema, o colendo STJ já o pacificou, preconizando que é livre a pactuação da taxa de juros entre os contraentes, exceto em havendo excesso manifestamente comprovado (na forma do decisório tornado paradigma – RESP 1.061.530/RS, rela. Min. Nancy Andrighi, j. 22/10/08), ocasião em que se limitam os juros.
Então, cumpre dizer que os juros serão limitados, a um patamar razoável, para expungir abusividade, e que a diretriz que se adota para fixar tal patamar é a taxa média do mercado, tal como fornecida pela BACEN em seu site, consoante estipulado no acórdão paradigma supramencionado. Os juros são limitados, então, em hipótese excepcional, qual seja, quando ultrapassada a taxa média de mercado.
No caso, o pacto prevê juros remuneratórios anuais no patamar de 54,83% a.a., superior ao patamar de uma vez e meia a taxa média de mercado apurada para o período em que se celebrou o ajuste, que era de 21,38% a.a. Presente, portanto, a abusividade contratual.
A capitalização dos juros em periodicidade inferior à anual tem suporte na Medida Provisória n....
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