Decisão Monocrática nº 51400459020228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Segunda Câmara Cível, 10-10-2022
Data de Julgamento | 10 Outubro 2022 |
Órgão | Vigésima Segunda Câmara Cível |
Classe processual | Agravo de Instrumento |
Número do processo | 51400459020228217000 |
Tribunal de Origem | Tribunal de Justiça do RS |
Tipo de documento | Decisão monocrática |
PODER JUDICIÁRIO
Documento:20002829657
22ª Câmara Cível
Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906
Agravo de Instrumento Nº 5140045-90.2022.8.21.7000/RS
TIPO DE AÇÃO: Padronizado
RELATOR(A): Des. MIGUEL ANGELO DA SILVA
AGRAVANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA
AGRAVADO: SEGREDO DE JUSTIÇA
EMENTA
DIREITO À SAÚDE (ECA E IDOSO). ESTADO. FORNECIMENTO DE MEDICAÇÃO/TRATAMENTO. GARANTIA CONSTITUCIONAL. DIREITOS SOCIAIS PRESTACIONAIS. DISPENSAÇÃO DE SERVIÇO DE ATENDIMENTO DOMICILIAR. “HOME CARE”. LEI Nº 10.424/2002, REGULAMENTAÇÃO DA MATÉRIA PELA PORTARIA Nº 2.048/2009 DO MINISTÉRIO DA SAÚDE. TRATAMENTO NÃO INCOORADO AO SUS. AQUISIÇÃO CENTRALIZADA PELO MINISTÉRIO DA SAÚDE. LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO. DETERMINAÇÃO DE INTIMAÇÃO DA PARTE AUTORA PARA INCLUIR A UNIÃO NO POLO PASSIVO DO FEITO, SOB PENA DE EXTINÇÃO. TEMA 793/STF. TESE REINTERETADA PELA 1ª TURMA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.
Ao reinterpretar o Tema 793 da repercussão geral, em 22-03-2022, a 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal assentou a necessidade de se incluir a União no polo passivo não só das ações que visem à obtenção de medicamentos não padronizados, mas também daquelas atinentes a fármacos padronizados de competência da União, ou oncológicos, dando ensejo à formação de litisconsórcio passivo necessário.
Situação concreta em que se discute a dispensação de tratamento cujo financiamento cabe à União, devendo-se oportunizar à parte autora que inclua aquela no polo passivo do feito, na forma do art. 115, parágrafo único, do CPC, ainda que disso resulte posterior deslocamento de competência à Justiça Federal.
Mantida, contudo, a tutela de urgência deferida em cognição sumária, até nova análise pelo juízo competente ou até a extinção do feito, acaso ocorra, em atenção ao disposto no art. 64, § 4º, do CPC.
RECURSO PROVIDO EM PARTE.
DECISÃO MONOCRÁTICA
1 - De saída, reporto-me ao relatório do parecer ministerial exarado nesta instância (evento 19, PARECER1), "in verbis":
"Trata-se de agravo de instrumento interposto pelo Município de Bagé contra a decisão que, nos autos da ação ordinária promovida por Ariella Batista da Trindade, representada por Rodrigo Ferreira da Trindade, também contra o Estado do rio Grande do Sul, determinou a expedição de alvará no valor de R$ 11.519,00 (onze mil, quinhentos e dezenove reais) para o pagamento do serviço home care, realizado durante o mês de maio/2022, em favor da parte autora, com 3 anos de idade, diagnosticada com hipoventilação congênita central (CID10:J96.1), quadro de apneia (pausa da respiração), necessitando de ventilação mecânica (Evento 253 – DESPADEC1 dos autos originários).
O Município, em razões de agravo, busca a reforma da decisão. Após historiar o feito, sustenta, em síntese, sua ilegitimidade passiva. Assevera que o direito à saúde, constitucionalmente reconhecido, é regionalizado quanto às suas competências, de acordo com a Gestão de Atenção Básica e Gestão de Atenção Plena da Saúde, sendo o Município responsável pela Gestão de Atenção Básica. Aduz que cabe ao Estado do Rio Grande do Sul a viabilização e ou responsabilização pelo total do gasto com o tratamento. Cita o Tema 793 do STF. Discorre acerca do direito aplicável. Colaciona precedentes. Pugna, ao final, pela atribuição de efeito suspensivo e pelo provimento do recurso (Evento 1 – INIC1).
O recurso foi recebido, sendo deferido em parte o pedido de efeito suspensivo postulado para determinar que a parte autora promova na origem a inclusão da União no polo passivo do feito, mantendo-se, contudo, a tutela de urgência deferida pelo Juízo “a quo” (Evento 5 – DESPADEC1).
Foram apresentadas contrarrazões (Evento 15 – CONTRAZ1)."
A douta Procuradoria de Justiça exarou parecer opinando pelo conhecimento e desprovimento do recurso.
Vieram os autos conclusos.
É o relatório.
2 - O recurso comporta julgamento monocrático realizado de plano, com amparo no art. 932, inciso V, alínea "b" do CPC.
Segundo o relato da inicial, a parte autora tem dignóstico de síndrome genétrica e necessita da dispensação do serviço de home care, nestes termos (evento 2, INIC1):
A Certidão da SES ajuntada ao autos atestada que o serviço de atendimento home care postulado pela parte autora não é disponibilizado no âmbito do SUS ("ut" evento 272, CERTNEG2).
Estou provendo parcialmente o agravo de instrumento, reportando-me, de saída, aos motivos por mim declinados ao recebê-lo e deferir, em parte, o efeito suspensivo ativo postulado, quando tive o ensejo de sublinhar (evento 5, DESPADEC1), “in verbis”:
"Em cognição sumária, vislumbro, em parte, a necessária relevância da fundamentação esgrimida no recurso, apta a ensejar a concessão parcial da antecipação de tutela recursal postulada.
“In casu”, a parte autora (menor absoluta incapaz) postula a dispensação do serviço de home care, pois é portadora de SÍNDROME GENÉTICA, com histórico de INSUFICIÊNCIA RESPIRATÓRIA CRÔNICA (CID 10 96.1).
A prova documental aportada aos autos contém indicativos idôneos de que a autora da ação está gravemente enferma e necessita de cuidados de saúde por profissionais especializados, não dispondo de meios para custear os serviços pretendidos.
Pois bem.
O Supremo Tribunal Federal, no julgamento dos Embargos de Declaração no Recurso Extraordinário nº 855.178/SE (Tema 793/STF), sob a sistemática do art. 1.036 do CPC, sufragou o entendimento de que:
“Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde, e diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro”.
O Ministro EDSON FACHIN, designado para redigir o acórdão, em seu voto, estabeleceu as seis conclusões abaixo listadas (acórdão ainda não publicado):
“1ª) a obrigação solidária de prestar o serviço de saúde decorre da competência material comum contemplada no art. 23, II, c/c os arts. 196 e ss. da Constituição Federal;
2ª) por força da solidariedade obrigacional, a parte autora poderá propor a demanda contra quaisquer dos entes da Federação, isolada ou conjuntamente. No entanto, cada ente tem o dever de responder pelas prestações específicas que lhe impõem as normas de organização e funcionamento do SUS, as quais serão observadas pelo órgão judicial em suas consequências de composição do polo passivo e eventual deslocamento de competência;
3ª) ainda que as normas de regência (Lei n. 8.080/1990 e Decreto n. 7.508/2011) imputem a determinado ente a responsabilidade principal (financiamento e aquisição), é lícito à parte incluir outro ente no polo passivo como responsável pela obrigação, Agravo de Instrumento nº 0016817-26.2020.8.16.0000 para ampliar sua garantia como decorrência da adoção da tese da solidariedade pelo dever geral de prestar saúde;
4ª) se o ente legalmente responsável pelo financiamento da obrigação principal não compuser o polo passivo da relação jurídico-processual, sua inclusão deverá ser levada a efeito pelo órgão judicial, ainda que isso signifique deslocamento de competência;
5ª) se a pretensão veicular pedido de tratamento, procedimento, materiais ou medicamentos não incluídos nas políticas públicas, a União comporá necessariamente o polo passivo, considerando que o Ministério da Saúde detém competência para a incorporação, exclusão ou alteração de novos medicamentos, produtos, procedimentos, bem como constituição ou alteração de protocolo clínico ou diretriz terapêutica. De modo que recai sobre ela [União] o dever de indicar o motivo ou as razões da não padronização, e eventualmente iniciar o procedimento de análise de inclusão;
6ª) a dispensação judicial de medicamentos, materiais, procedimentos e tratamentos pressupõe a ausência ou ineficácia da prestação administrativa, e comprovada necessidade, observando, para tanto, os parâmetros definidos no art. 28 do Decreto Federal n. Agravo de Instrumento nº 0016817-26.2020.8.16.0000 7.508/2011.
Desse modo, quando o medicamento/tratamento postulado judicialmente não integrar as listas do SUS, cabe ao Ministério da Saúde, órgão da União, o exame da pretendida incorporação, circunstância a impor a inclusão dessa no polo passivo das respectivas demandas, ainda que tal acarrete o deslocamento da competência à Justiça Federal.
De igual forma, conforme decidiu a 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal ao reinterpretar, por maioria, em 22-03-2022, o Tema 793 da repercussão geral, não só as demandas envolvendo medicamentos não padronizados impõem o litisconsórcio passivo necessário da União, mas também aquelas atinentes a fármacos padronizados de competência da União no SUS, ou oncológicos, por ela financiados (Rcl nºs 49890, 50414, 49909, 50726, 50715, 50866, 49919, 50481, 50907, 50649 e 50458).
Isso porque, o egrégio STF, inobstante reafirme a solidariedade existente entre os entes da Federação nas demandas envolvendo prestações de saúde, exige que se avalie, segundo as divisões e atribuições administrativas e de funcionamento do SUS, qual ente público é o responsável pelo custeio da obrigação, para fins de integrar o polo passivo da ação.
Desse modo, quando o tratamento não integra as listas do SUS e/ou seu financiamento é de responsabilidade da União, tem-se hipótese de litisconsórcio passivo necessário, a ensejar que se oportunize à parte autora a inclusão daquela no polo passivo, nos termos do art. 115, parágrafo único, do CPC1, sob pena de extinção do feito2.
Assim, considerando que o serviço de Home Care não consta elencados nas listas do SUS tem aplicação ao caso o disposto no Tema nº 793 do STF.
A propósito, por seu conteúdo elucidativo, reproduzo excerto da decisão lançada no Agravo de Instrumento nº...
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