Decisão Monocrática nº 51732553520228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Terceira Câmara Cível, 16-11-2022

Data de Julgamento16 Novembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualAgravo de Instrumento
Número do processo51732553520228217000
Tipo de documentoDecisão monocrática
ÓrgãoTerceira Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002983483
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

3ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Instrumento Nº 5173255-35.2022.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Consulta

RELATOR(A): Des. EDUARDO DELGADO

AGRAVANTE: GABRIEL MELLO MASCHKA (AUTOR)

ADVOGADO: CRISTIANO VIEIRA HEERDT (DPE)

AGRAVADO: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RÉU)

AGRAVADO: MUNICÍPIO DE CANOAS (RÉU)

MINISTÉRIO PÚBLICO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (MINISTÉRIO PÚBLICO)

EMENTA

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. SAÚDE – Colite Ulcerativa – (CID K 51.0). FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO - Vedolizumabe. GRUPO 1A - PORTARIA 1.554/13 DO MINISTÉRIO DA SAÚDE. LITISCONSÓRCIO COM A UNIÃO. TEMA 793 DO E. STF - ED NO RE Nº 855.178/SE. LIMINAR MANTIDA - ART. 64, § 4º, DO CPC.

NÃO OBSTANTE A AFETAÇÃO DA QUESTÃO NO E. STJ - IAC Nº 187.276/RS -, DEMONSTRADO O PRESSUPOSTO DO LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO COM A UNIÃO, EM RAZÃO DA CLASSIFICAÇÃO DO FÁRMACO - Vedolizumabe- NO GRUPO 1A - PORTARIA 1.554/13 DO MINISTÉRIO DA SAÚDE -, A INDICAR A RESPONSABILIDADE PARA O FORNECIMENTO, CONSOANTE A NOVEL JURISPRUDÊNCIA NO E. STF, NA EXEGESE DO TEMA 793 E EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RE Nº 855.178/SE.

DE OUTRA PARTE, PELO MENOS POR ORA, TENDO EM VISTA A FALTA DE INSURGÊNCIA RECURSAL SOBRE O MÉRITO – OBRIGAÇÃO DO FORNECIMENTO DO FÁRMACO -; MANTIDOS OS EFEITOS DA TUTELA DE URGÊNCIA NA ORIGEM, HAJA VISTA A ESTATURA DO BEM DA VIDA PERSEGUIDO – SAÚDE -; E A RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS AGRAVADOS, COM BASE NO ART. 64, §4º, DO CPC/15.

AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO.

DECISÃO MONOCRÁTICA

Trata-se de recurso de agravo de instrumento interposto por GABRIEL MELLO MASCHKA contra decisão interlocutória - evento 77, DESPADEC1, dos autos originários- , proferida nos autos da ação proposta contra o ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL e o MUNICÍPIO DE CANOAS.

Os termos da decisão hostilizada:

(...)

Vistos.

Requer o autor o bloqueio de valores das contas dos réus, sob o fundamento de que descumpriram a decisão que determinou o fornecimento do medicamento VEDOLIZUMABE 300 mg, no valor de R$ 18.671,62, necessário para a compra de uma ampola.

Para tanto, junta receita atualizada (evento 76, doc2), três orçamentos atualizados da rede privada, sendo o menor valor unitário de R$ 18.671,62 (doc3), negativa administrativa (doc6 e doc7) e comprovante da última aplicação do medicamento (doc8).

Com efeito, em consulta ao histórico do paciente registrado no Sistema AME - Medicamentos, nesta data, verifica-se que, em que pese o deferimento do pedido de fornecimento do medicamento, o medicamento não está disponível, na medida em que o estoque está zerado.

Além disso, considerando que a última aplicação se deu em 04/07/2022, e que o lapso temporal de oito semanas finda em 29/08/2022, reconheço a necessidade da compra do medicamento nesta data, considerando o trâmite processual até a expedição de alvará.

Ainda, registro que mantenho o posicionamento no sentido da necessidade da compra do medicamento em conformidade com os valores indicados pelo Projeto Preço de Referência, decorrente de orientação da Corregedoria Geral de Justiça, conforme expediente SEI nº 8.2020.0010.000801-1, no entanto, considerando o provimento do agravo de instrumento interposto pelo autor (70084452804, fls. 340-346 do evento 31, doc11), contra a decisão por mim proferida nesse sentido, o deferimento do pedido na hipótese é medida impositiva.

De outro lado, embora não desconheça da instauração do incidente de assunção de competência nº 14 do STJ, conforme voto do Ministro Relator Gurgel de Faria, não houve suspensão nacional dos processos em tramitação, individuais ou coletivos, que versem sobre a questão, aliado ao fato de somente ter sido designado o Juízo estadual para decidir, em caráter provisório, as medidas urgentes, nos casos em que suscitado conflito de competência pelo Juízo Federal, impõe-se o prosseguimento regular da demanda.

De acordo com a descrição do Tema 793, no RE 855.178, com repercussão geral reconhecida, o Supremo Tribunal Federal pôs em discussão "... à luz dos arts. e 198 da Constituição Federal, a existência, ou não, de responsabilidade solidária entre os entes federados pela promoção dos atos necessários à concretização do direito à saúde, tais como o fornecimento de medicamentos e o custeio de tratamento médico adequado aos necessitados".

Em sede de embargos declaratórios, o Supremo Tribunal Federal firmou entendimento reafirmando jurisprudência de que há litisconsórcio passivo necessário da União nas demandas relativas à saúde, desde que (i) a pretensão veicule pedido de tratamento, procedimento, material ou medicamento não incluído nas políticas públicas, ou, (ii) nas hipóteses em que o medicamento postulado integre as listas do SUS, mas seu financiamento seja de responsabilidade da União, e, por fim, (iii) quando ausente registro do medicamento na ANVISA, conforme trecho do voto do Ministro Edson Fachin:

"(...) 2ª espécie de pretensão: a que veicula pedido de medicamentos, tratamentos, procedimentos ou materiais não constantes das políticas públicas instituídas.

A respeito desta espécie, constou na STA 175 uma subdivisão, nas subespécies (1), (2) e (3):

"Se a prestação de saúde pleiteada não estiver entre as políticas do SUS, é imprescindível distinguir se a não prestação decorre de (1) uma omissão legislativa ou administrativa, (2) de uma decisão administrativa de não fornecê-la ou (3) de
uma vedação legal a sua dispensação.

Como regra geral, nas três “subespécies” apontadas, a União comporá o polo passivo da lide.

Isso porque, segundo a lei orgânica do SUS, é o Ministério da Saúde, ouvida a CONITEC (Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS) que detém competência para a incorporação, exclusão ou alteração de novos medicamentos, produtos, procedimentos, bem como constituição ou a alteração de protocolo clínico ou de diretriz terapêutica (art. 19-Q, Lei 8.080/90).

A União poderá, assim, esclarecer, entre outras questões: a) se o medicamento, tratamento, produto etc. tem ou não uso autorizado pela ANVISA; b) se está ou não registrado naquela Agência; c) se é ou não padronizado para alguma moléstia e os motivos para isso; d) se há alternativa terapêutica constante nas políticas públicas, etc.

Aplicando essas considerações genéricas às subespécies (1), (2) e (3) referidas na STA 175, supratranscritas, apresentam-se as seguintes consequências processuais:

· Se houver alegação de (1) omissão administrativa ou legislativa na incorporação do tratamento pretendido, a União (pelas mesmas razões supra) poderá estar na demanda, ainda que eventual condenação não lhe seja diretamente dirigida, por haver prévia definição da responsabilidade financeira pelo seu fornecimento a outro ente, pactuada na Comissão Intergestores Tripartite (artigo 19-U, Lei 8.080/90).

A mesma lógica se aplica ao caso de (3) vedação legal a sua dispensação: como regra geral, a União comporá a lide, ainda que para esclarecer o motivo do uso vedado pela ANVISA ou a ausência de registro na mesma Agência.

Por fim, a situação (2): de haver uma decisão administrativa de não fornecer o medicamento ou o tratamento, normalmente está ligada aos itens (1) ou (3) retro: porque o objeto do pedido ou não está padronizado (o medicamento ou tratamento) para dispensa na rede pública, mas possui registro na ANVISA; ou, sobre ele incide a vedação legal de dispensa administrativa, pela incidência do artigo 19-T, Lei 8.080/90, in verbis:

São vedados, em todas as esferas de gestão do SUS : I - o pagamento, o ressarcimento ou o reembolso de medicamento, produto e procedimento clínico ou cirúrgico experimental, ou de uso não autorizado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária - ANVISA;

II - a dispensação, o pagamento, o ressarcimento ou o reembolso de medicamento e produto, nacional ou importado, sem registro na Anvisa.”

E embora haja vedação legal à dispensa administrativa pela rede pública, a lei orgânica do SUS não silenciou quanto à definição do responsável pela obrigação, quando esta decorrer de condenação judicial à aquisição e à dispensa de medicamentos, procedimentos, tratamentos ou produtos experimentais ou de uso não autorizado pela ANVISA:

Art. 19-U. A responsabilidade financeira pelo fornecimento de medicamentos, produtos de interesse para a saúde ou procedimentos de que trata este Capítulo será pactuada na Comissão Intergestores Tripartite

A partir dessa importante alteração na Lei do SUS (posterior ao julgamento na STA 175 e certamente por ele influenciada) há regra expressa de divisão de responsabilidade (pelo financiamento ou custeio) inclusive para prestações de saúde que não constam das políticas públicas, mas que são determinadas judicialmente.

(...)

VI) DIANTE DE TODO O EXPOSTO:

1) Conheço dos embargos opostos pela União para o seguinte fim dúplice:

a) atribuir ao conhecimento do recurso, sem repercussão no juízo de mérito da pretensão recursal, efeito de desenvolvimento do tema da solidariedade e de detalhamento do sentido e do alcance de precedentes, especialmente quanto aos termos enunciados na STA n. 175;

b) desprover, no mérito, o recurso examinado.

2) Em decorrência do conhecimento dos embargos sem acolhimento do mérito , a título de detalhamento, esta Corte reconhece que a tese da responsabilidade solidária como reconhecida na STA 175 se mantém hígida e que é inerente à natureza do Supremo Tribunal Federal, na condição de Corte de Vértice do sistema constitucional, dispor de instrumentos aptos a efetivar seu “poder-dever” de aprimoramento ou desenvolvimento do direito constitucional, por meio de seus precedentes, para fim de esclarecimento, sem efeito modificativo.

3) Quanto ao desenvolvimento da tese da solidariedade enuncia-se o seguinte:

i) A obrigação a que se relaciona a...

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