Decisão Monocrática nº 51968359420228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Nona Câmara Cível, 11-10-2022

Data de Julgamento11 Outubro 2022
ÓrgãoDécima Nona Câmara Cível
Classe processualAgravo de Instrumento
Número do processo51968359420228217000
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoDecisão monocrática

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002817079
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

19ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Instrumento Nº 5196835-94.2022.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Duplicata

RELATOR(A): Desa. MYLENE MARIA MICHEL

AGRAVANTE: ALISUL ALIMENTOS S.A.

AGRAVADO: LAILA DUARTE VIEIRA 12032776600

EMENTA

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO. AÇÃO DE EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. carta DE CITAÇÃO. RECEBIMENTO POR TERCEIRO ESTRANHO AO FEITO. NULIDADE reconhecida pelo juízo a quo. DECISÃO AGRAVADA mantida.

Conforme previsão dos arts. 238 e 239 do CPC, a citação é o ato pelo qual são convocados o réu, o executado ou o interessado para integrar a relação processual, sendo indispensável a obediência aos preceitos legais para a validade do processo.

A nulidade da citação pode ser declarada, de ofício ou a requerimento da parte, a qualquer tempo e grau de jurisdição, por intermédio de simples manifestação ou de ação própria, haja vista se tratar de vício transrescisório que inquina de nulidade não só o ato, mas a própria relação processual desde a sua origem, conforme interpretação conjunta dos arts. 278, parágrafo único, e 280 do CPC. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça.

caso concreto em que a citação da executada, ora agravante, FOI RECEBIDA POR PESSOA ESTRANHA AO FEITO. inobstante a carta de CITAÇÃO TENHA SIDO RECEBIDA SEM ressalvas PELo TERCEIRo estranho à lide, O ARTIGO 242 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DETERMINA QUE A CITAÇÃO DA PESSOA FÍSICA SEJA PESSOAL, DEVENDO CONSTAR a assinatura da citanda NO AVISO DE RECEBIMENTO, CASO A CITAÇÃO SEJA efetuada pela via postal. decisão que reconheceu a nulidade da citação mantida. PRECEDENTES DESTa corte.

AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO, POR DECISÃO MONOCRÁTICA.

DECISÃO MONOCRÁTICA

Trata-se de agravo de instrumento interposto por ALISUL ALIMENTOS S.A. contra LAILA DUARTE VIEIRA, irresignada com a decisão interlocutória que declarou inválida a citação da executada, nos autos da ação de execução por si manejada.

Eis a decisão agravada (evento 15):

Vistos.

Verifico que o demandado é empresário individual e que o AR de citação (evento 11, AR1) não foi recebido pessoalmente por ele.

Assim, para evitar futura arguição de nulidade processual, INTIME-SE a parte exequente para, em 15 dias, dizer se pretende a citação por Oficial de Justiça, ou então para declinar novo endereço.

Indefiro, por ora, o pedido de bloqueio de valores e de inscrição no Sistema Serasajud uma vez que não há processo executivo em andamento e a constituição do crédito ainda está sub judice.

Intime-se.

Em suas razões, sustenta, em síntese, que a carta de citação em nome da executada foi devidamente recebida na sede da empresa da ora recorrida. Argumenta que deve prevalecer a Teoria da Aparência, para que seja validado o ato citatório. Assevera que reputa-se regularmente citada a pessoa jurídica por meio daquele que, nas dependências da sede, recebe a citação. Garante que a devedora é pessoa jurídica, ainda que registrada na modalidade de empresário individual. Afirma que é ônus da recorrida comparecer em juízo e provar que a pessoa que estava nas dependências da sua empresa é estranha à pessoa jurídica. Pugna pelo provimento do recurso.

É o relatório.

Decido.

Recebo o recurso, pois tempestivo e preparado.

Em que pesem os argumentos invocados pela agravante, entendo que o recurso não comporta provimento.

Inicialmente, convém destacar que a nulidade ou a inexistência de citação constitui vício transrescisório, não havendo óbice a que o magistrado de primeira instância o declare ex officio ou a requerimento da parte interessada, a qualquer tempo e grau de jurisdição.

Conforme dicção do art. 238 do CPC, “Citação é o ato pelo qual são convocados o réu, o executado ou o interessado para integrar a relação processual”.

Como anota, Daniel Amorim Assumpção Neves1, a previsão legal não está completamente certa, na medida em que o réu, o executado e o interessado são automaticamente integrados ao polo passivo da ação, não se tratando de convocação propriamente dita, in verbis:

O art. 238 do Novo CPC prevê que a citação é o ato pelo qual se convoca o réu, o executado ou o interessado (o termo “demandado” seria mais adequado) para integrar a relação jurídica processual. Apesar de não estar integralmente correto, já que a citação não convoca o demandado a coisa alguma, integrando-o automaticamente à relação jurídica processual, o conceito é melhor que o anterior.”

Seja como for, a citação, é indispensável para a própria existência da relação processual, e a sua validade igualmente indispensável para a validade do processo judicial, pelo que deve zelar o Poder Judiciário em todas as suas instâncias por força do devido processo legal, garantia constitucional de índole processual positivada no art. 5º, LIV, da CF/88.

Daí estabelecer o art. 239 do CPC que o ato citatório é indispensável para a validade do processo, in verbis:

Art. 239. Para a validade do processo é indispensável a citação do réu ou do executado, ressalvadas as hipóteses de indeferimento da petição inicial ou de improcedência liminar do pedido.

§ 1º O comparecimento espontâneo do réu ou do executado supre a falta ou a nulidade da citação, fluindo a partir desta data o prazo para apresentação de contestação ou de embargos à execução.

§ 2º Rejeitada a alegação de nulidade, tratando-se de processo de:

I - conhecimento, o réu será considerado revel;

II - execução, o feito terá seguimento.”

Neste particular, insta colacionar o escólio doutrinário de Nelson Nery Júnior2:

2. Pressuposto processual de existência. Muito embora com o despacho da petição inicial já exista relação angular entre autor e juiz, para que seja instaurada, de forma completa, a relação jurídica processual, é necessária a realização da citação. Portanto, a citação é pressuposto de existência da relação processual, assim considerada em sua totalidade (autor, réu, juiz)). Sem a citação não existe processo (Liebman. Est., 179). Em suma, pressuposto de existência da relação processual: citação. Havendo sido feita a citação, mesmo que invalidamente, o processo existe, mas estará viciado. Citação é pressuposto de existência do processo; citação válida é pressuposto de validade do processo.”

Partindo-se dessa premissa, a citação, por expressa disposição legal, deve observar todas as formalidades que lhe são inerentes, sob pena de restar inquinado o ato por nulidade absoluta, e, como tal insanável, a qual, em razão da sua gravidade, não só pode, como deve ser proclamada de ofício pelo magistrado, como se extrai da interpretação conjunta dos arts. 278, parágrafo único, e 280 do CPC:

Art. 278. A nulidade dos atos deve ser alegada na primeira oportunidade em que couber à parte falar nos autos, sob pena de preclusão.

Parágrafo único. Não se aplica o disposto no caput às nulidades que o juiz deva decretar de ofício, nem prevalece a preclusão provando a parte legítimo impedimento.”

Art. 280. As citações e as intimações serão nulas quando feitas sem observância das prescrições legais.”

Com efeito, é dever do magistrado zelar pela higidez e validade da relação jurídico-processual, razão pela qual a lei lhe confere o poder-dever de declarar as nulidades absolutas que constatar no trâmite processual, a qualquer tempo e grau de jurisdição.

Neste particular, calha invocar o teor do art. 139, IX, do CPC:

Art. 139. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe:(...)

IX - determinar o suprimento de pressupostos processuais e o saneamento de outros vícios processuais;(...).”

Nelson Nery Júnior3 inclusive ressalta a imprescritibilidade da pretensão relativa à declaração de nulidade de atos processuais nulos, bem como a não sujeição desses mesmos atos processuais à preclusão, in verbis:

6. “Preclusão” da nulidade absoluta. A nulidade absoluta recebe tratamento severo da legislação civil: nunca convalida, deve ser decretada de ofício, a declaração de nulidade tem eficácia ex tunc e prescinde de ação para ser reconhecida. Justamente porque a nulidade absoluta, sua declaração tem caráter imprescritível. Demais disso, como a nulidade deve ser decretava ex officio, não há que se falar em preclusão da declaração de nulidade absoluta, nos termos do CPC/1973 245 par. Ún. [CPC 278 par. Ún]. As matérias de ordem pública podem, e devem, ser decretadas pelo juiz a qualquer tempo e grau ordinário de jurisdição.”

Sobre as nulidades processuais absolutas e a possibilidade de decretação ex officio pelo magistrado, oportuna a lição Humberto Theodoro Júnior4:

O ato absolutamente nulo já dispõe da categoria de ato processual; não é mero fato como o inexistente; mas sua condição jurídica mostra-se gravemente afetada por defeito localizado em seus requisitos essenciais. Compromete a execução normal da função jurisdicional e, por isso, é vício insanável. Diz respeito a interesse de ordem pública, afetando, por isso, a própria jurisdição (falta de pressupostos processuais ou condições da ação).

Comprovada a ocorrência de nulidade absoluta, o ato deve ser invalidado, por iniciativa do próprio juiz, independentemente de provocação da parte interessada. Na realidade, a vida do ato absolutamente nulo é aparente ou artificial, pois não é apta a produzir a eficácia de ato jurídico. Perdura, exteriormente, apenas até que o juiz lhe reconheça o grave defeito e o declare privado de validade.(...)

Exemplo de ato absolutamente nulo é o da citação, com inobservância das prescrições legais (art. 280); e, consequente, nula de pleno direito será também a sentença que vier a ser proferida no processo, se tiver ocorrido a revelia do réu (arts. 525, § 1º, I, e 535, I). A invalidade, no caso, afetou toda a relação processual, não só para a parte ausente como para o próprio órgão jurisdicional, que não se...

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