Decisão Monocrática nº 52192879820228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Terceira Câmara Cível, 16-12-2022

Data de Julgamento16 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualAgravo de Instrumento
Número do processo52192879820228217000
Tipo de documentoDecisão monocrática
ÓrgãoTerceira Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003127760
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

3ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Instrumento Nº 5219287-98.2022.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Oncológico

RELATOR(A): Des. LEONEL PIRES OHLWEILER

AGRAVANTE: ENI ALVES SOARES

AGRAVADO: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

EMENTA

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. DIREITO À SAÚDE. PLEITO DE FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. Olaparibe (Lynparza). adenocarcinoma de ovário. NECESSIDADE DE INCLUSÃO DA UNIÃO NO POLO PASSIVO.

1. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE nº 855.178/PE (TEMA 793), reafirmou o entendimento no sentido da responsabilidade solidária dos entes públicos nas demandas prestacionais na área da saúde.

2. Ao julgar os embargos de declaração do citado TEMA 793, a Corte Superior estabeleceu as situações em que é obrigatória a inclusão da União na relação jurídico-processual.

3. Segundo o STF, é obrigatória a presença da União no polo passivo da ação nas hipóteses em que a pretensão versar sobre tratamento, procedimento, material ou medicamento não inserto nas políticas públicas, em razão do que incumbe ao Ministério da Saúde incorporar, excluir ou alterar protocolo clínico de diretriz terapêutica, nos termos do art. 19-Q da Lei nº 8.080/90. E ainda constante da RENAME e padronizado, ser a União, via Ministério da Saúde, legalmente responsável por financiar o medicamento – fármacos relacionados nos Grupos 1A (aquisição centralizada pelo Ministério da Saúde e responsabilidade das Secretarias de Saúde dos Estados e do Distrito Federal pelo armazenamento, distribuição e dispensação).

4. A parte autora/agravante requereu o fornecimento, em sede de tutela de urgência, do medicamento Olaparibe 150mg (Lynparza), necessário para o tratamento da moléstia que é portadora - adenocarcinoma de ovário com implantes peritoneais _ FIGO IIIC - CID C56.

5. Como se trata de medicamento oncológico, cujo financiamento é responsabilidade da União que promove, por intermédio do Ministério da Saúde, o ressarcimento dos estabelecimentos de saúde habilitados na alta complexidade em oncologia (CACONS/UNACONS), tem-se a hipótese de litisconsórcio passivo necessário envolvendo a União Federal, a qual deve ser incluída na relação jurídico-processual, com a consequente remessa do feito à Justiça Federal (art. 109, inciso I, da CF), na linha do decidido pelo juízo de primeiro grau, em observância ao definido no TEMA 793 e nas citadas reclamações julgadas pelo STF.

6. Não se desconhece a instauração do Incidente de Assunção de Competência (IAC) nos Conflitos de Competência nº 187.533/SC, 187.276/RS e 188.002/SC e as respectivas determinações do STJ, mas prepondera nesta Corte a observância do que foi decidido pelo STF no Tema 793, a quem cabe a competência constitucional na matéria do direito à saúde. Ademais, mesmo após a admissão do aludido IAC 14, o STF tem reformado decisões no sentido de fixar a necessidade da União fazer parte do polo passivo e do feito tramitar junto à Justiça Federal, razão pela qual, por ora, deve prevalecer tal entendimento.

7. Precedentes do TJ/RS.

AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO.

DECISÃO MONOCRÁTICA

Trata-se de agravo de instrumento interposto por ENI ALVES SOARES contra a decisão proferida nos autos da ação movida em face do ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, nos seguintes termos:

1. Defiro a gratuidade judiciária à parte autora.

2. Recebo a inicial, pois presentes os requisitos legais mínimos (artigo 319 do CPC).

3. Da tutela de urgência

Em atenção à recomendação do Ofício-Circular nº 71/2020-CGJ, considerando a existência de extrema urgência na pretensão declinada, havendo risco de perecimento do direito, passo ao exame da tutela de urgência.

Trata-se de Ação ordinária de fornecimento de medicamento contra o Estado do Rio Grande do Sul, em que a parte autora relata ter sido diagnosticada com adenocarcinoma de ovário com implantes peritoneais (CID10 C65) e necessita de tratamento com a medicação Olaparibe 150mg, 120 cp./mês. Aduziu que o fármaco não é fornecido pelo SUS, e a família não tem condições financeiras de arcar com os custos do tratamento. Requereu o fornecimento do tratamento pelo demandado, sob pena de bloqueio de valores.

É o breve relato. Decido.

Merece deferimento o pedido de antecipação de tutela formulado pelo requerente, restando preenchidos, em juízo de sumária cognição, os requisitos elencados no artigo 300 do Diploma Processual Civil.

Com efeito, a Constituição Federal, em seu artigo 23, inciso III, dispõe que é competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios cuidar da saúde e da assistência pública.

E isso se dá, no âmbito da saúde, também conforme a Magna Carta, por meio de Sistema Único, financiado com recursos do orçamento da seguridade social, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, além de outras fontes (CF, art. 198, caput e parágrafos).

Por sua vez, é pacífico o entendimento de que o fornecimento de medicamentos não disponibilizados pelo SUS deve limitar-se aos casos em que estar comprovada a necessidade do tratamento e impossibilidade de substituição dos medicamentos/tratamentos/equipamentos por algum disponibilizado pelo SUS, bem como a hipossuficiência da parte.

Sobre o tema, em decisão no Recurso Especial n° 1.657.156/RJ (Incidente de Demandas Repetitivas, Tema 106), o Superior Tribunal de Justiça estabeleceu critérios objetivos a serem observados para o provimento de tratamentos não fornecidos pelo SUS, quais sejam: (I) comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS; (II) incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito; (III) existência de registro na ANVISA do medicamento.

No caso em exame, foi comprovado que a parte autora foi diagnosticada com adenocarcinoma de ovário com implantes peritoneais (CID10 C65) e necessita de tratamento com a medicação Olaparibe 150mg, 120 cp./mês, conforme laudo e receituário da médica que assiste a paciente (1.9 e 1.10).

Cabível, portanto, a concessão da tutela de urgência porque preenchidos os requisitos legais para tanto, restando demonstrada a necessidade da parte requerente e, desta forma, a verossimilhança do direito alegado.

4. Da necessidade de emenda à inicial

Considerando a pretensão da inicial, mostra-se necessária a inclusão da União no polo passivo, decorrente da matéria tratada no Tema 793 do STF, quanto às divisões a atribuições dentro da rede pública para a dispensação de medicamentos.

Isso, porque o Supremo Tribunal Federal, no julgamento dos Embargos de Declaração no Recurso Extraordinário nº 855.178/SE (Tema 793/STF), sob a sistemática do art. 1.036 do CPC, firmou o entendimento de que:

Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde, e diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro”. Grifado.

O redator do acórdão, Ministro Edson Fachin, em seu voto, enumerou seis conclusões, cujos excertos se transcrevem:

1ª) a obrigação solidária de prestar o serviço de saúde decorre da competência material comum contemplada no art. 23, II, c/c os arts. 196 e ss. da Constituição Federal;
2ª) por força da solidariedade obrigacional, a parte autora poderá propor a demanda contra quaisquer dos entes da Federação, isolada ou conjuntamente.
No entanto, cada ente tem o dever de responder pelas prestações específicas que lhe impõem as normas de organização e funcionamento do SUS, as quais serão observadas pelo órgão judicial em suas consequências de composição do polo passivo e eventual deslocamento de competência;
3ª) ainda que as normas de regência (Lei n. 8.080/1990 e Decreto n. 7.508/2011) imputem a determinado ente a responsabilidade principal (financiamento e aquisição), é lícito à parte incluir outro ente no polo passivo como responsável pela obrigação, Agravo de Instrumento nº 0016817-26.2020.8.16.0000 para ampliar sua garantia como decorrência da adoção da tese da solidariedade pelo dever geral de prestar saúde;
4ª) se o ente legalmente responsável pelo financiamento da obrigação principal não compuser o polo passivo da relação jurídico-processual, sua inclusão deverá ser levada a efeito pelo órgão judicial, ainda que isso signifique deslocamento de competência;
5ª) se a pretensão veicular pedido de tratamento, procedimento, materiais ou medicamentos não incluídos nas políticas públicas, a União comporá necessariamente o polo passivo, considerando que o Ministério da Saúde detém competência para a incorporação, exclusão ou alteração de novos medicamentos, produtos, procedimentos, bem como constituição ou alteração de protocolo clínico ou diretriz terapêutica.
De modo que recai sobre ela [União] o dever de indicar o motivo ou as razões da não padronização, e eventualmente iniciar o procedimento de análise de inclusão;
6ª) a dispensação judicial de medicamentos, materiais, procedimentos e tratamentos pressupõe a ausência ou ineficácia da prestação administrativa, e comprovada necessidade, observando, para tanto, os parâmetros definidos no art. 28 do Decreto Federal n. Agravo de Instrumento nº 0016817-26.2020.8.16.0000 7.508/2011.

Neste cenário, a despeito de o STF reafirmar a solidariedade existente entre os entes da Federação nas demandas por tratamento de saúde, cumpre ao julgador averiguar, segundo as divisões e atribuições administrativas e de funcionamento do SUS, qual ente público seria o responsável pelo...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT