Decisão Monocrática nº 52197183520228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Terceira Câmara Cível, 04-11-2022

Data de Julgamento04 Novembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualAgravo de Instrumento
Número do processo52197183520228217000
Tipo de documentoDecisão monocrática
ÓrgãoTerceira Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002928527
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

3ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Instrumento Nº 5219718-35.2022.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Padronizado

RELATOR(A): Des. EDUARDO DELGADO

AGRAVANTE: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

AGRAVADO: VANESSA DA SILVA GAUTERIO

MINISTÉRIO PÚBLICO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

EMENTA

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. SAÚDE – HIPERTENSÃO ARTERIAL PULMONAR ASSOCIADA À CARDIOPATIA CONGÊNITA (CID 10 I27.8). FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO - SELEXIPAG (UPTRAVI). GRUPO 1B - PORTARIA 1.554/13 DO MINISTÉRIO DA SAÚDE. LITISCONSÓRCIO COM A UNIÃO. TEMA 793 DO E. STF - ED NO RE Nº 855.178/SE. FORNECIMENTO DO MEDICAMENTO MANTIDO - ART. 64, § 4º, DO CPC.

não obstante a afetação da questão no e. STJ - IAC nº 187.276/RS -, demonstrado o pressuposto do litisconsórcio passivo necessário com a União, em razão da classificação do fármaco - Selexipag - no Grupo 1B - Portaria 1.554/13 do Ministério da Saúde -, a indicar a responsabilidade para o fornecimento, consoante a novel jurisprudência no e. STF, na exegese do Tema 793 e embargos de declaração no RE nº 855.178/SE.

DE OUTRA PARTE, MANTIDOS, DE FORMA PRECÁRIA, OS EFEITOS DA TUTELA DE URGÊNCIA DA ORIGEM, EM RAZÃO DA ESTATURA DO BEM JURÍDICO TUTELADO –SAÚDE -; A RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DO AGRAVANTE; COM BASE NO ART. 64, §4º, DO CPC.

PRECEDENTES DO E. STF; TJRS E TRF.

AGRAVO DE INSTRUMENTO PARCIALMENTE PROVIDO.

DECISÃO MONOCRÁTICA

Trata-se de recurso de agravo de instrumento interposto por parte do ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL contra decisão interlocutória -evento 8, DESPADEC1 -, proferida nos autos da presente ação ajuizada por VANESSA DA SILVA GAUTERIO.

Os termos da decisão hostilizada:

(...)

Vistos.

VANESSA DA SILVA GAUTÉRIO ajuizou ação de obrigação de fazer com pedido de tutela de urgência em face do ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. Alega a parte autora, em síntese, ser portadora de Hipertensão Arterial Pulmonar Associada à Cardiopatia Congênita (CID L 27.8), necessitando fazer uso do medicamento SELEXIPAG (UPTRAVI) 0,2 mg, na razão de 02 vezes ao dia. Aduziu que o medicamento não faz parte da lista do SUS, não possuindo condições de arcar com o alto custo mensal do tratamento. Sustentou urgência em seu fornecimento, uma vez que o não uso dos fármacos poderá acarretar em piora da doença,agravamentoda insuficiência cardíaca e morte súbita. Requereu a concessão da tutela de urgência para compelir o ente público ao fornecimento do medicamento e, no mérito, a procedência dos pedidos. Pugnou pela concessão da gratuidade de justiça. Juntou documentos (evento 01).

Foi determinada a intimação do E-NATJUS para parecer (evento 4, DESPADEC1).

Sobreveio aos autos nota técnica no seguinte sentido (evento 6, NOTATEC2):

"Conclusão: Considerando as evidências científicas disponíveis e as informações acostadas nos autos, conclui-se que há elementos técncos que permitem sustentar parecer favorável à demanda apresentada."

É o breve relato. Decido.

Defiro a gratuidade de justiça à parte autora.

O artigo 300 do Código de Processo Civil, acerca da tutela de urgência, dispõe o que segue:

"Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo."

Na hipótese dos autos, o requerente possui Hipertensão Arterial Pulmonar Associada à Cardiopatia Congênita (CID L 27.8), necessitando fazer uso do medicamento SELEXIPAG (UPTRAVI) 0,2 mg, caso não faça o tratamento com urgência, há risco de o não uso dos fármacos poderá acarretar em piora da doença,agravamentoda insuficiência cardíaca e morte súbita, conforme atestado pelo médico que assiste a parte autora (evento 1, DOC16).

Outrossim, há parecer favorável pelo NatJus.

O princípio da separação dos poderes tem por finalidade precípua impedir que todas as funções estatais sejam concentradas em uma única estrutura, produzindo um sistema de freios e contrapesos que permita que “o poder controle o próprio poder”. O poder é distribuído a “sujeitos” diversos, que exercem competências diversas e controle recíproco.

Assim, a cada um dos Poderes do Estado é atribuído um conjunto de atribuições específicas, não havendo subordinação de um Poder a outro.

Diante disso, ao Poder Executivo foi deferida a função administrativa, que consiste no conjunto de atribuições destinadas a promover a satisfação de interesses essenciais à população, relacionados com a promoção de direitos fundamentais.

A função do Poder Executivo, portanto, é garantir a concretização dos direitos fundamentais previstos na Constituição Federal, inclusive aqueles de natureza prestacional, diante do que não está a função administrativa imune ao controle judicial, cabendo ao Poder Judiciário garantir que o administrador público não se desvie deste objetivo.

A separação dos poderes é um instrumento destinado a garantir os direitos fundamentais democráticos, não podendo ser transformada em instrumento a impedir o controle, pelo Poder Judiciário, do cumprimento ou não dos mandamentos constitucionais fundamentais pelo Poder Executivo.

Assim, é possível atribuir ao Poder Judiciário, ainda que excepcionalmente, a incumbência de fazer implementar políticas públicas ordenadas pela Constituição Federal ou de garantir a satisfação dos direitos básicos conferidos aos indivíduos pela Carta Magna.

O direito à saúde é previsto como direito fundamental social na Constituição Federal. Trata-se, pois, de direito fundamental de segunda dimensão, que estabelece um dever prestacional ao Estado, de caráter positivo, que exige dos entes públicos a realização de políticas públicas visando à sua concretização no maior grau possível.

Nesse sentido, o artigo 196 da Carta Republicana determina que a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantida por meio de políticas sociais que permitam o acesso universal e igualitário às ações e serviços para a sua promoção, proteção e recuperação.

Além disso, é competência comum de todos os entes federados cuidar da saúde da população, cabendo a todos eles realizar políticas públicas para a sua promoção.

A saúde, ainda, relaciona-se diretamente com a Dignidade da Pessoa Humana, integrando o patrimônio mínimo necessário para que o ser humano possa se viver dignamente e se desenvolver no meio social em que inserida.

Nota-se, diante disso, que o direito à saúde faz parte de um conjunto de direitos cuja promoção deve ser vista com prioridade pelos entes públicos, de modo que eventuais falhas em sua prestação, atingindo diretamente determinada pessoa, faz surgir um direito subjetivo de cobrar de qualquer um dos entes federados (ou de todos eles) que preste a assistência necessária à promoção, proteção ou recuperação da saúde do lesado.

Convém frisar, no ponto, que apesar de ser preferível que o direito à saúde seja implementado por meio de políticas de acesso universal, sem que um ou outro cidadão seja beneficiado por determinadas circunstâncias não é razoável, sobre tal pretexto, que se permita que o exercício deste direito seja suprimido das pessoas, por evidente falha estatal.

Dessarte, suficientemente preenchidos os requisitos do art. 300 do Código de Processo Civil.

Pelo exposto, DEFIRO o pedido de antecipação de tutela para determinar que o ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL forneçam à parte autora, no prazo de 48 (quarenta e oito horas), a contar da ciência deste provimento, o medicamento ELEXIPAG (UPTRAVI) 0,2 MG, conforme requerido na inicial, nas quantias estabelecidas no laudo médico, sob pena de bloqueio de valores suficientes para custear o tratamento (artigo 536 do CPC).

Cite-se e intime-se.

Sobrevindo a contestação, intime-se a parte autora para réplica.

Cumpra-se com urgência.

Diligências legais.

(...)

Nas razões, o Estado do Rio Grande do Sul, ora agravante, defende o litisconsórcio passivo necessário com a União, e a competência da Justiça Federal para o julgamento do feito, haja vista a responsabilidade no custeio de medicamento do Grupo 1B, em atenção ao decidido no e. STF no julgamento do RE 855.178/SE - Tema 793.

Colaciona jurisprudência.

Requer a atribuição de efeito suspensivo. Ao final, pede o provimento do recurso, para os fins da inclusão da União no polo passivo e remessa do feito à Justiça Federal -evento 1, INIC1.

Os autos vieram conclusos.

É o relatório.

Decido.

Passo ao julgamento na forma monocrática, com base no art. 932, IV, b, do CPC de 20151, no Enunciado da Súmula 568 do e. STJ2; e no art. 206, XXXVI do RITJRS3.

A matéria devolvida reside no litisconsórcio passivo necessário com a União, e a competência da Justiça Federal para o julgamento do feito, haja vista a responsabilidade no custeio de medicamento do Grupo 1A, em atenção ao decidido no e. STF no julgamento do RE 855.178/SE - Tema 793.

Sobre o litisconsórcio passivo necessário, cumpre frisar a novel interpretação do e. STF, sem embargo de posição definitiva das Cortes Superiores, senão vejamos.

Inicialmente, cumpre frisar a posição da jurisprudência dos egrégios STF e STJ, bem como deste Tribunal, sobre a natureza da relação jurídica controvertida, e a discussão acerca do pressuposto da citação da União, diante das premissas constantes do art. 23, II, da Constituição da República4, no sentido da competência comum dos entes federados - União, Estados, Municípios e Distrito Federal - para a prestação da saúde, com vistas à incidência do art. 114 do CPC5.

Neste sentido, a questão foi objeto de julgamento no e. STF, nos autos do RE nº 855178/RG -, em 16.03.2015, na forma do art. 543-B6, do Código de Processo Civil de 1973 - repercussão geral, com a fixação do Tema 793:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. DIREITO À SAÚDE. TRATAMENTO MÉDICO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS...

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