Decisão Monocrática nº 52391472220218217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Segunda Câmara Cível, 17-03-2022

Data de Julgamento17 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualConflito de competência
Número do processo52391472220218217000
Tipo de documentoDecisão monocrática
ÓrgãoSegunda Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001457705
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

2ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Conflito de Competência (Câmara) Nº 5239147-22.2021.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Consulta

RELATOR(A): Des. RICARDO TORRES HERMANN

SUSCITANTE: JUÍZO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL DA COMARCA DE CACHOEIRA DO SUL

SUSCITADO: JUÍZO DA 2ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE CACHOEIRA DO SUL

EMENTA

CONFLITO DE COMPETÊNCIA. FORNECIMENTO DE fisioterapia. adolescente. COMPETÊNCIA ABSOLUTA DO JUIZADO DA INFÂNCIA E JUVENTUDE. LEI ESPECIAL. PREVALÊNCIA SOBRE A REGRA GERAL DO ARTIGO 5º DA LEI Nº 12.153/09.

Em se tratando de ação ajuizada por adolescente, pela qual se busca o fornecimento de tratamento de saúde, a competência para processamento e julgamento do feito é do Juizado da Infância e da Juventude, haja vista o disposto nos artigos 98, inc. I, 148, inc. IV, 208, inc. VII e 209, todos da Lei nº 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente). O regramento contido no ECA, por ser lei especial de proteção à criança e ao adolescente, se sobrepõe ao regramento geral de definição de competência do Juizado Especial da Fazenda Pública, previsto no art. 5º Lei nº 12.153/09. Precedentes.

CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA JULGADO PROCEDENTE.

DECISÃO MONOCRÁTICA

Vistos.

Trata-se de conflito negativo de competência suscitado pelo juízo do JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE CACHOEIRA DO SUL, em face da decisão proferida pelo JUIZADO DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE – JIJ (ADJUNTO À 2ª VARA CRIMINAL) DA MESMA COMARCA, que declinou da competência para processar e julgar a ação ajuizada por SOFIA DUARTE FERREIRA, menor absolutamente incapaz.

Em síntese, o juízo suscitante (evento 1, DESPDECOFIC1) aduziu a competência da 2ª Vara Criminal, a qual está vinculada o Juizado da Infância e Juventude daquela comarca, para julgamento da presente demanda, na esteira do entendimento jurisprudencial preconizado pelo e. STJ e pela Corte Estadual.

O juízo suscitado, em decisão declinatória (evento 75, DESPADEC1), referiu que o juízo competente seria o Juizado Especial da Fazenda Pública - JEFAZ, já que por meio da ação se busca a tutela do direito à saúde de menor e o valor da causa é inferior a 60 salários mínimos.

Foi designada a eminente julgadora suscitada para resolver, em caráter provisório, as medidas urgentes (evento 5, DESPADEC1).

Em Parecer, o Ministério Público opinou pelo acolhimento do conflito de competência.

Vêm os autos à conclusão para julgamento.

É o relatório.

O incidente comporta julgamento monocrático, na forma do art. 955, § único, do CPC, "in verbis":

Art. 955. O relator poderá, de ofício ou a requerimento de qualquer das partes, determinar, quando o conflito for positivo, o sobrestamento do processo e, nesse caso, bem como no de conflito negativo, designará um dos juízes para resolver, em caráter provisório, as medidas urgentes.

Parágrafo único. O relator poderá julgar de plano o conflito de competência quando sua decisão se fundar em:

I - súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal;

II - tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em incidente de assunção de competência.

Consoante já referido, o que se discute nestes autos é o fornecimento de tratamento de saúde para menor de idade, nascida em 11.08.2015 (evento 1, RG2), sendo que a ação foi proposta perante o Juizado da Infância e Juventude da Comarca de Cachoeira do Sul.

Dessa forma, afigura-se caracterizada a competência absoluta do Juizado da Infância e da Juventude para processamento e julgamento do feito, haja vista o disposto nos artigos 98, I, 148, IV, 208, VII e 209, todos da Lei nº 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA).

Por oportuno, transcrevo os referidos dispositivos:

Art. 98. As medidas de proteção à criança e ao adolescente são aplicáveis sempre que os direitos reconhecidos nesta Lei forem ameaçados ou violados:
I - por ação ou omissão da sociedade ou do Estado;

Art. 148. A Justiça da Infância e da Juventude é competente para:
(...)
IV - conhecer de ações civis fundadas em interesses individuais, difusos ou coletivos afetos à criança e ao adolescente, observado o disposto no art. 209;

Art. 208. Regem-se pelas disposições desta Lei as ações de responsabilidade por ofensa aos direitos assegurados à criança e ao adolescente, referentes ao não oferecimento ou oferta irregular:
(...)
VII - de acesso às ações e serviços de saúde;

Art. 209. As ações previstas neste Capítulo serão propostas no foro do local onde ocorreu ou deva ocorrer a ação ou omissão, cujo juízo terá competência absoluta para processar a causa, ressalvadas a competência da Justiça Federal e a competência originária dos tribunais superiores.

O regramento contido no ECA, por ser lei especial de proteção à criança e ao adolescente, se sobrepõe ao regramento geral de definição de competência do Juizado Especial da Fazenda Pública, previsto no art. 5º Lei nº 12.153/09.

Nesse sentido tem reiteradamente se manifestado o Superior Tribunal de Justiça:

PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. INTERESSES INDIVIDUAIS, DIFUSOS OU COLETIVOS VINCULADOS À CRIANÇA E AO ADOLESCENTE. VIOLAÇÃO AO ART. 535. ALEGAÇÕES GENÉRICAS. SÚMULA 284. ACÓRDÃO QUE SE FUNDA EM LEI LOCAL. SÚMULA 280 DO STF. JURISPRUDÊNCIA DO STJ QUE RECONHECE A COMPETÊNCIA ABSOLUTA DA VARA DA INFÂNCIA E JUVENTUDE.
1. O julgado proferido na origem foi publicado na vigência do CPC/1973, razão pela qual os requisitos de admissibilidade do apelo nobre devem seguir a sistemática processual correspondente, nos termos do Enunciado Administrativo n. 2/STJ. 2. As razões recursais não indicam de forma percuciente qual seria a omissão verificada, tampouco a maneira como teria ocorrido a violação sustentada; ao revés, mostram-se genéricas e destituídas de concretude, pelo que é inadmissível o Recurso Especial. Aplicação da Súmula 284/STF.
3. Inviável discussão em Recurso Especial acerca de suposta ofensa a dispositivo constitucional, porquanto seu exame é de competência exclusiva do Supremo Tribunal Federal, conforme dispõe o art. 102, III, da Constituição. Não se pode, portanto, conhecer do apelo em relação à contrariedade ao art. 5º, XXXVII, da Constituição Federal.
4. A análise da pretensão recursal pressupõe necessariamente a apreciação de norma de direito local, na medida que o Tribunal de origem baseou seu decisum na Lei Complementar Estadual 14/1991, o Código de Divisão e Organização Judiciária do Maranhão. Aplica-se, pois o óbice da Súmula 280/STF, in verbis: "por ofensa a direito local não cabe recurso extraordinário".
5. Ainda que se conhecesse do mérito recursal, melhor sorte não assistiria ao recorrente, pois a competência da Vara da Infância e da Juventude é absoluta e justifica-se pelo relevante interesse social e pela importância do bem jurídico a ser tutelado, nos termos do art. 208, VII do ECA, bem como por se tratar de questão afeta a direitos individuais, difusos ou coletivos do infante, nos termos dos arts. 148, inciso IV, e 209, do Estatuto da Criança e do Adolescente. Precedentes do STJ.
6. O Estatuto da Criança e Adolescente é lex specialis e prevalece sobre a regra geral de competência das Varas de Fazenda Pública, quando o feito envolver Ação Civil Pública em favor da criança ou adolescente, na qual se pleiteia acesso às ações ou serviços e saúde, independentemente de a criança ou o adolescente estar em situação de abandono ou risco (REsp 1251578/SE, Relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 10/10/2012).

7. Recurso Especial não conhecido.
(REsp nº 1.684.694-MA, 2ª Turma, rel.
Ministro Herman Benjamin, j. em 21NOV17, DJe 19DEZ17) (grifos meus)

PROCESSUAL CIVIL. COMPETÊNCIA. VARA DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE.
1. Admite-se o recebimento de embargos de declaração opostos à decisão monocrática do relator como agravo regimental em atenção aos princípios da economia processual e da fungibilidade recursal.
2. A pretensão deduzida na demanda enquadra-se na hipótese contida no art. 148, IV, c/c art. 209 do ECA, sendo da competência absoluta do Juízo da Vara da Infância e da Juventude a apreciação das controvérsias fundadas em interesses individuais, difusos ou coletivos vinculados à criança e ao adolescente. Precedentes.
3. Embargos de declaração recebidos como agravo regimental. Agravo regimental não provido.
(EDcl-AREsp 24.798-SP, 2ª Turma, rel.
Ministro Castro Meira, j. em 07FEV12, DJe 16FEV12) (grifos meus)

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