Decisão Monocrática nº 52448607520218217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Segunda Câmara Cível, 16-03-2022

Data de Julgamento16 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualConflito de competência
Número do processo52448607520218217000
Tipo de documentoDecisão monocrática
ÓrgãoSegunda Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001897903
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

2ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Conflito de Competência (Câmara) Nº 5244860-75.2021.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Padronizado

RELATOR(A): Des. RICARDO TORRES HERMANN

SUSCITANTE: JUÍZO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL ADJUNTO DA COMARCA DE ESTÂNCIA VELHA

SUSCITADO: JUÍZO DA 2ª VARA JUDICIAL DA COMARCA DE ESTÂNCIA VELHA

EMENTA

CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO OU TRATAMENTO MÉDICO. CRIANÇA. LEI ESPECIAL. PREVALÊNCIA SOBRE A REGRA GERAL DO ARTIGO 5º DA LEI Nº 12.153/09.

Em se tratando de ação ajuizada por criança, pela qual se busca o fornecimento de tratamento de saúde, a competência para processamento e julgamento do feito é do Juizado da Infância e da Juventude, haja vista o disposto nos artigos 98, inc. I, 148, inc. IV, 208, inc. VII e 209, todos da Lei nº 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente). O regramento contido no ECA, por ser lei especial de proteção à criança e ao adolescente, se sobrepõe ao regramento geral de definição de competência do Juizado Especial da Fazenda Pública, previsto no art. 5º Lei nº 12.153/09. Precedentes.

CONFLITO DE COMPETÊNCIA JULGADO PROCEDENTE.

DECISÃO MONOCRÁTICA

Vistos.

Trata-se de CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA suscitado pelo JUÍZO DO JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE ESTÂNCIA VELHA, em razão de declinação da competência efetivada pela JUÍZA DE DIREITO DO JUIZADO DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE, ADJUNTO À 2ª VARA JUDICIAL DA MESMA COMARCA, nos autos da ação dita cominatória de obrigação de fazer promovida por Giuseppe Garibaldi Pereira, menor incapaz, representado por sua genitora, Marissol Vaz da Silveira, contra Estado do Rio Grande do Sul, em que se postula condenação ao fornecimento de tratamento de saúde (evento 2, PROCJUDIC1).

O Juízo suscitado, com fulcro no art. 5º da Lei nº 12.153/09 e no art. 148, inc. IV, da Lei nº 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente), bem como na Resolução nº 1.083/2015/COMAG e, ainda, invocando precedentes desta Corte, entende ser o Juizado Especial da Fazenda Pública o juízo competente para o processamento e julgamento da ação, já que por meio dela se busca a tutela do direito à saúde de menor e o valor da causa é inferior a 60 salários mínimos (evento 19, DESPADEC1).

O Juízo suscitante, por sua vez, entende que a competência é do Juizado da Infância e da Juventude, aduzindo que menor não pode ser parte no JEFAZ (evento 1, DESPDECOFIC1).

Foi designada o eminente juízo suscitante para resolver, em caráter provisório, as medidas urgentes (evento 5, DESPADEC1).

Em Parecer, o Ministério Público opinou pelo desacolhimento do conflito de competência.

Vêm os autos à conclusão para julgamento.

É o relatório.

O incidente comporta julgamento monocrático, na forma do art. 955, § único, do CPC, "in verbis":

Art. 955. O relator poderá, de ofício ou a requerimento de qualquer das partes, determinar, quando o conflito for positivo, o sobrestamento do processo e, nesse caso, bem como no de conflito negativo, designará um dos juízes para resolver, em caráter provisório, as medidas urgentes.

Parágrafo único. O relator poderá julgar de plano o conflito de competência quando sua decisão se fundar em:

I - súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal;

II - tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em incidente de assunção de competência.

Consoante já referido, o que se discute nestes autos é o fornecimento de tratamento de saúde para menor de idade, nascido em 30.10.2014 (fl. 13 dos autos de origem), sendo que a ação foi proposta perante o Juizado da Infância e Juventude da Comarca de Estância Velha, havendo a declinação posterior da competência ao JEFAZ.

Dessa forma, afigura-se caracterizada a competência absoluta do Juizado da Infância e da Juventude para processamento e julgamento do feito, haja vista o disposto nos artigos 98, I, 148, IV, 208, VII e 209, todos da Lei nº 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA).

Por oportuno, transcrevo os referidos dispositivos:

Art. 98. As medidas de proteção à criança e ao adolescente são aplicáveis sempre que os direitos reconhecidos nesta Lei forem ameaçados ou violados:
I - por ação ou omissão da sociedade ou do Estado;

Art. 148. A Justiça da Infância e da Juventude é competente para:
(...)
IV - conhecer de ações civis fundadas em interesses individuais, difusos ou coletivos afetos à criança e ao adolescente, observado o disposto no art. 209;

Art. 208. Regem-se pelas disposições desta Lei as ações de responsabilidade por ofensa aos direitos assegurados à criança e ao adolescente, referentes ao não oferecimento ou oferta irregular:
(...)
VII - de acesso às ações e serviços de saúde;

Art. 209. As ações previstas neste Capítulo serão propostas no foro do local onde ocorreu ou deva ocorrer a ação ou omissão, cujo juízo terá competência absoluta para processar a causa, ressalvadas a competência da Justiça Federal e a competência originária dos tribunais superiores.

O regramento contido no ECA, por ser lei especial de proteção à criança e ao adolescente, se sobrepõe ao regramento geral de definição de competência do Juizado Especial da Fazenda Pública, previsto no art. 5º Lei nº 12.153/09.

Nesse sentido tem reiteradamente se manifestado o Superior Tribunal de Justiça:

PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. INTERESSES INDIVIDUAIS, DIFUSOS OU COLETIVOS VINCULADOS À CRIANÇA E AO ADOLESCENTE. VIOLAÇÃO AO ART. 535. ALEGAÇÕES GENÉRICAS. SÚMULA 284. ACÓRDÃO QUE SE FUNDA EM LEI LOCAL. SÚMULA 280 DO STF. JURISPRUDÊNCIA DO STJ QUE RECONHECE A COMPETÊNCIA ABSOLUTA DA VARA DA INFÂNCIA E JUVENTUDE.
1. O julgado proferido na origem foi publicado na vigência do CPC/1973, razão pela qual os requisitos de admissibilidade do apelo nobre devem seguir a sistemática processual correspondente, nos termos do Enunciado Administrativo n. 2/STJ. 2. As razões recursais não indicam de forma percuciente qual seria a omissão verificada, tampouco a maneira como teria ocorrido a violação sustentada; ao revés, mostram-se genéricas e destituídas de concretude, pelo que é inadmissível o Recurso Especial. Aplicação da Súmula 284/STF.
3. Inviável discussão em Recurso Especial acerca de suposta ofensa a dispositivo constitucional, porquanto seu exame é de competência exclusiva do Supremo Tribunal Federal, conforme dispõe o art. 102, III, da Constituição. Não se pode, portanto, conhecer do apelo em relação à contrariedade ao art. 5º, XXXVII, da Constituição Federal.
4. A análise da pretensão recursal pressupõe necessariamente a apreciação de norma de direito local, na medida que o Tribunal de origem baseou seu decisum na Lei Complementar Estadual 14/1991, o Código de Divisão e Organização Judiciária do Maranhão. Aplica-se, pois o óbice da Súmula 280/STF, in verbis: "por ofensa a direito local não cabe recurso extraordinário".
5. Ainda que se conhecesse do mérito recursal, melhor sorte não assistiria ao recorrente, pois a competência da Vara da Infância e da Juventude é absoluta e justifica-se pelo relevante interesse social e pela importância do bem jurídico a ser tutelado, nos termos do art. 208, VII do ECA, bem como por se tratar de questão afeta a direitos individuais, difusos ou coletivos do infante, nos termos dos arts. 148, inciso IV, e 209, do Estatuto da Criança e do Adolescente. Precedentes do STJ.
6. O Estatuto da Criança e Adolescente é lex specialis e prevalece sobre a regra geral de competência das Varas de Fazenda Pública, quando o feito envolver Ação Civil Pública em favor da criança ou adolescente, na qual se pleiteia acesso às ações ou serviços e saúde, independentemente de a criança ou o adolescente estar em situação de abandono ou risco (REsp 1251578/SE, Relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 10/10/2012).

7. Recurso Especial não conhecido.
(REsp nº 1.684.694-MA, 2ª Turma, rel.
Ministro Herman Benjamin, j. em 21NOV17, DJe 19DEZ17) (grifos meus)

PROCESSUAL CIVIL. COMPETÊNCIA. VARA DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE.
1. Admite-se o recebimento de embargos de declaração opostos à decisão monocrática do relator como agravo regimental em atenção aos princípios da economia processual e da fungibilidade recursal.
2. A pretensão deduzida na demanda enquadra-se na hipótese contida no art. 148, IV, c/c art. 209 do ECA, sendo da competência absoluta do Juízo da Vara da Infância e da Juventude a apreciação das controvérsias fundadas em interesses individuais, difusos ou coletivos vinculados à criança e ao adolescente. Precedentes.
3. Embargos de declaração recebidos como agravo regimental. Agravo regimental não provido.
(EDcl-AREsp 24.798-SP, 2ª Turma, rel.
Ministro Castro Meira, j. em 07FEV12, DJe 16FEV12) (grifos meus)

...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT