Decisão Monocrática nº 52542512020228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Primeira Câmara Cível, 16-12-2022

Data de Julgamento16 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualAgravo de Instrumento
Número do processo52542512020228217000
Tipo de documentoDecisão monocrática
ÓrgãoDécima Primeira Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003128882
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

11ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Instrumento Nº 5254251-20.2022.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Contratos Bancários

RELATOR(A): Des. AYMORE ROQUE POTTES DE MELLO

AGRAVANTE: LEONILSON DA LUZ MENDES

AGRAVADO: FACTA FINANCEIRA S.A. CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO

EMENTA

AGRAVO DE INSTRUMENTO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. ação ORDINÁRIA COM PEDIDO DE TUTELA PROVISÓRIA. GRATUIDADE DA JUSTIÇA. PESSOA NATURAL. INDEFERIMENTO DO BENEFÍCIO. DECISÃO REFORMADA. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.

É VIÁVEL DEFERIR O BENEFÍCIO DA GRATUIDADE DA JUSTIÇA À PESSOA NATURAL QUE NÃO TENHA CONDIÇÕES ECONÔMICO-FINANCEIRAS DE SUPORTAR OS ENCARGOS PROCESSUAIS SEM PREJUÍZO DO SEU PRÓPRIO SUSTENTO E DE SUA FAMÍLIA.

NO CASO, O ACERVO DOCUMENTAL PRODUZIDO NO CADERNO PROBATÓRIO EVIDENCIA A HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICO-FINANCEIRA DO AGRAVANTE, IMPENDENDO PROVER O AGRAVO DE INSTRUMENTO E DEFERIR-LHE O BENEFÍCIO DA GRATUIDADE DA JUSTIÇA NO PROCESSO DE ORIGEM, PARA TODOS OS EFEITOS LEGAIS.

RECURSO PROVIDO.
M/AI 5.351 - JM 16.12.2022

DECISÃO MONOCRÁTICA

Vistos.

1. Trata-se de agravo de instrumento interposto por LEONILSON DA LUZ MENDES em combate à decisão (evento 3, DESPADEC1 - origem) proferida nos autos da ação ordinária (processo nº 5005007-94.2022.8.21.0020) que move contra FACTA FINANCEIRA S/A - CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO perante a 2ª Vara Cível da Comarca de Palmeira das Missões, que lhe deferiu parcialmente o benefício da justiça gratuita, para que arque com o valor de R$ 300,00.

Nas razões (evento 1, INIC1), o agravante alega que não detém condições econômico-financeiras para arcar com as despesas processuais, pois sua renda mensal é inferior a 5 salários mínimos. Assim, requer o provimento do recurso, para obter o benefício da gratuidade da justiça.

2. O recurso é típico, próprio, tempestivo (eventos 5 e 8 - origem) e não está preparado, pois a sua causa de pedir e pedido objetivam o benefício da gratuidade da justiça.

3. Analisando a decisão recorrida e o acervo documental acostado à peça vestibular deste recurso, passo ao seu julgamento monocrático, nos termos do art. 206, inc. XXXVI, do RITJRS, combinado com o disposto no art. 932, inciso VIII, do CPC.

4. À partida, para melhor descortínio da controvérsia, transcrevo a decisão recorrida, verbis:

"Vistos, etc.
A Assistência Judiciária Gratuita é tema que passou por uma série de regulamentações.

Inicialmente, na época colonial, as Ordenações Filipinas exigiam que o postulante, dentre diversos requisitos, dissesse em audiência um “Pater Noster pela alma del Rey Don Diniz”.

Sob o regime do Código de Processo Civil de 1939, a gratuidade judiciária exigia um “atestado de pobreza” emitido pela autoridade policial, sendo superado este sistema com o advento da Lei 1.060/1950.

Atualmente o tema vem regulamentado pelo Código de Processo Civil de 2015 nos arts. 98 e ss, revogando parcialmente a Lei nº 1060/1950.
A Constituição Federal prevê em seu art. 5º, inciso LXXIV, que: o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos.
As custas e despesas judiciárias, de uma forma geral, possuem natureza de taxa.
Significa uma contraprestação por um serviço público específico e divisível prestado ao contribuinte, no conceito estabelecido no artigo 77 do Código Tributário Nacional.
Cabe ao Poder Judiciário a concessão da imunidade prevista no Texto Constitucional, por ser o que possui melhor aptidão a analisar as circunstâncias do caso concreto, especialmente também em face de constituir-se como requisito processual objetivo intrínseco.

Forçoso reconhecer que vigora uma cultura de que a assistência judiciária gratuita é regra, quando deveria ser exceção.
O excesso em que se concede o benefício acarreta graves prejuízos à estrutura jurisdicional.
Torna-se necessária uma reanálise da atual prática jurídica.
Em muitas oportunidades, os Magistrados “passam por cima”, dando-se uma concessão automática, por ser considerada acessória a sua constatação em detrimento da análise da própria lide em si e, diante do grande volume de processos, a análise das condições econômicas das partes torna-se situação excepcional para a concessão ou não da gratuidade judiciária.
Contudo este comportamento vicioso acarreta uma série de problemas adjacentes.
Dentre eles: i) a diminuição considerável da arrecadação de recursos frente a um serviço público efetivamente prestado; ii) multiplicação do volume de processos, pois se concede um verdadeiro estimulo às chamadas lides temerárias; iii) descaso das partes com o Poder Judiciário, pois a sua utilização (ainda que infundada) não lhe acarretará qualquer ônus; iv) estabelecimento de um verdadeiro programa social por um ente ilegítimo, qual seja, o Poder Judiciário.
Não se desconhece a previsão do parágrafo §3º do artigo 99 do Código Civil o qual preceitua “Presume-se verdadeira a alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural”.
Contudo, o mesmo somente possui aplicabilidade quando for extremamente dificultoso a comprovação dos gastos oriundos pela pessoa natural, pois nesta hipótese seria punir duplamente ao que não tem condições econômicas.
Ademais, a aplicação do dispositivo acima mencionado tinha razão de ser quando em vigor o sistema processual anterior, em que valia a regra do “tudo ou nada” no que tange à concessão de custas.
Com a nova forma de concessão, há de se exigir a devida comprovação daquele que postula o benefício COMO DETERMINA O TEXTO CONSTITUCIONAL.
Explica-se: o Constituinte expressamente exigiu a comprovação da insuficiência de recursos para a concessão da assistência judiciária gratuita, em seus três aspectos: assistência jurídica, assistência judiciária e gratuidade judiciária.

Há uma razão para a exigência do Constituinte, qual seja, evitar-se com que a gratuidade judiciária venha a tornar-se um programa social concedido indistintamente.

Contudo, em que pese estas razões, as custas não podem ser utilizada como razão para tolher o direito de todos de acesso ao Poder Judiciário.
Nesse sentido, DIDIER JR, Fredie; DE OLIVEIRA, Rafael Alexandria. Benefício da Justiça Gratuita. 6ª ed. Salvador: ed. Juspodivm, 2016, p. 21. :
O benefício da justiça gratuita consiste na dispensa do adiantamento de despesas processuais (em sentido amplo).
O seu objetivo é evitar que a falta de recursos financeiros constitua um óbice intransponível ao acesso à justiça. O direito à justiça gratuita, como visto, constitui direito fundamental do jurisdicionado (art. 5º, LXXIV, CF).
Os direitos fundamentais tem como característica primordial a relatividade.
Como já pacificado no âmbito dos tribunais, não há direito constitucional absoluto, nesse sentido colaciono palavras traçadas por este Magistrado em outro trabalho, LOPES, Davi De Sousa. O DIREITO AO SIGILO DO DOADOR DE MATERIAL GENÉTICO VERSUS O PRINCÍPIO DA PARENTALIDADE RESPONSÁVEL E O DIREITO À INFORMAÇÃO DO CONCEPTO. DinCE: 2014.:
Esta é uma característica contraposta a uma ideia da existência de um direito absoluto, de forma que seu conteúdo não possui aplicação plena e indistinta.
Assim, torna-se possível restrições aos direitos e garantias fundamentais, seja por um outro direito fundamental, ou seja por um preceito constitucional.
Justifica-se o entendimento com base no princípio da segurança jurídica, pois, em um Estado Democrático de Direito, pautado no império de lei e da impessoalidade, não há de se admitir uma aplicação absoluta de um direito, sob pena de práticas de atitudes desarrazoadas.

E ainda neste sentido veja-se a lição de Paulo Gustavo Gonet Branco, in MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet.
Curso de direito constitucional. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 275.:
A leitura da Constituição brasileira mostra que essas limitações são, às vezes, expressamente previstas no Texto Até o elementar direito à vida tem limitação explícita o inciso XLVII, a, do art. 5º, em que se contempla a pena de morte em caso de guerra formalmente declarada.
Não há, portanto, em princípio, que falar, entre nós, em direitos absolutos. Tanto outros direitos fundamentais como outros valores com sede constitucional podem limitá-los.
Surge então a necessidade de buscar-se um equilíbrio entre o direito alegado pela parte, o seu exercício e os custos com a atividades judiciária (insumos, pagamento de servidores e etc).

Desta feita, andou bem o legislador ao prever no artigo 98 do Código de Processo Civil:

Art. 98. A pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios tem direito à gratuidade da justiça, na forma da lei.

[…]

§ 5º A gratuidade poderá ser concedida em relação a algum ou a todos os atos processuais, ou consistirna redução percentual de despesas processuais que o beneficiário tiver de adiantar no curso do procedimento.

Esta inovação estabelecida pelo Legislador no §5º do artigo 98 do Código de Processo Civil resume-se em um verdadeiro avanço, pois ao mesmo tempo em que permite ao jurisdicionado o acesso ao Judiciário, faz com que aquele que exerceu seu...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT