Decisão Monocrática nº 70085610376 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Segundo Grupo de Câmaras Cíveis, 09-06-2022

Data de Julgamento09 Junho 2022
Classe processualAção Rescisória
Número do processo70085610376
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoDecisão monocrática

PODER JUDICIÁRIO




EU
Nº 70085610376 (Nº CNJ: 0010526-50.2022.8.21.7000)

2022/Cível


DECISÃO MONOCRÁTICA.
Ação rescisória. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. CONDENAÇÃO POR PRÁTICA DE ATOS ÍMPROBOS. ALTERAÇÃO LEGISLATIVA SUPERVENIENTE. Lei nº 14.230/2021. suposta afronta ao disposto no artIGO 966, v, do CPC. inÉpcia da inicial.

É inepta a petição inicial da presente ação rescisória (art. 330, I, c/c § 1º, inc.
III, do CPC), visto que da narração dos fatos e da disposição normativa apontada como violada não decorre logicamente a conclusão posta no pedido que nem minimamente apontou, de modo claro, as circunstâncias pelas quais as alterações introduzidas pela Lei nº 14.230/2021 conduziriam ao afastamento da tipificação dos atos ímprobos a que restaram condenados os autores, não obstante a oportunização de emenda à inicial rescisória. Pretensão de desconstituição de julgado que reconheceu a prática dolosa de ato de improbidade administrativa.
PETIÇÃO INICIAL INDEFERIDA.


PROCESSO EXTINTO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO.

Ação Rescisória


Segundo Grupo Cível



Nº 70085610376 (Nº CNJ: 0010526-50.2022.8.21.7000)


Comarca de Tapera



ERNOR WEBER


AUTOR

EDIO SHROEDER


AUTOR

MP/RS - MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL


REU


DECISÃO MONOCRÁTICA

Vistos.

Trata-se de ação rescisória proposta por ERNOR WEBER e EDIO SHROEDER em face de ação civil pública por improbidade administrativa ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, com fundamento no art. 966, inciso V, do Código de Processo Civil.


Alegaram que foram condenados na ação civil pública por ato de improbidade administrativa ajuizada pelo Ministério Público - processo nº 136/1.06.0000671-5 - por violação ao art. 10, caput, e incisos II, IX, XI e XIII, e art. 11, caput, e inciso VI, da Lei nº 8.429/92.
Conforme apontaram, a Lei nº 14.230/2021 mudou profunda e substancialmente o enquadramento de agentes em atos de improbidade administrativa, em especial quanto à necessidade de demonstração do agir de má-fé do agente, pois não mais se admite a possibilidade de atos culposos. Segundo argumentaram, o Ministério Público em momento algum esclareceu qual foi o dano ao erário, o que é requisito essencial para a caracterização do ato de improbidade, tampouco demonstrou o dolo por parte dos ex-Prefeitos de Lagoa dos Três Cantos. Sustentaram que com a vigência da nova lei, os fatos imputados aos réus não mais condizem com a condenação, pois os dispositivos que a lastrearam foram revogados ou alterados. Postularam, em sede de tutela de urgência, a suspensão do cumprimento do Acórdão proferido no julgamento do Recurso de Apelação nº 70025217613, até o julgamento da presente demanda.

Em atenção à decisão das fls.
89-91, os autores apresentaram emenda à inicial apontando que o Ministério Público não indicou qual seria o valor do dano ao erário ou perda patrimonial, tampouco demonstrou de forma robusta de que maneira os réus agiram com dolo, justamente porque não houve dano ao erário e muito menos dolo. Referiram que não houve prova de finalidade indevida e os fatos deixaram evidente que os ora autores não obtiveram proveito ou benefício indevido, razão pela qual não podem ser enquadrados no art. 11 da LIA. Defenderam que a Lei nº 14.230/21 leva ao afastamento das tipificações dos supostos atos ímprobos naquela Ação Civil Pública. Pediram a procedência da ação rescisória.
É o relatório.

Aprecio.

A parte autora ajuizou a presente demanda rescisória em face de condenação imposta em ação civil pública por ato doloso de improbidade administrativa, sustentando a ocorrência de manifesta violação à norma jurídica.

A Lei nº 14.230/2021
trouxe mudanças significativas procedimentais e materiais, de fato, e pode, em tese, autorizar a rescisão da coisa julgada.


Contudo, na presente ação rescisória, de nítida natureza constitutiva negativa porquanto forma autônoma especial de impugnação capaz de gerar a modificação da coisa julgada, a parte autora não elucidou de maneira circunstanciada e clara, não obstante a oportunização de emenda à petição inicial, no que as alterações introduzidas pela referida legislação conduziriam, no caso concreto, ao afastamento da tipificação dos atos ímprobos a que restaram condenados os ora autores pela coisa julgada pretendida desconstituir, sob o fundamento de violação à norma jurídica.

Ao exame do acórdão rescindendo acostado com a inicial, verifico que a condenação da parte autora deu-se pelo tipo do art. 10 da LIA, com o reconhecimento do dolo e, igualmente, com o reconhecimento de que o seu agir causou prejuízo ao erário municipal, sendo provido o recurso ministerial e condenados os dois ex-mandatários do Município ao pagamento de prejuízos a serem aferidos em liquidação de sentença.

A respeito, transcrevo trecho do acórdão rescindendo, oriundo da colenda 3ª Câmara Cível deste Tribunal de Justiça, julgado em abril de 2009, em que analisada a conduta dolosa dos ora autores e reconhecidos os prejuízos causados, caracterizando-se a ofensa ao art. 10 da LIA (o que absorveu a imputação pelo art. 11), a saber:

(...)

Fato de improbidade: ausência de prestação de contas associação
Passo ao enfrentamento das apelações das partes demandadas que atacaram a qualificação dos atos como de improbidade administrativa, enfrentando-as em cada um dos fatos imputados.


O primeiro fato diz respeito à ausência de prestação de contas em razão da cedência pela Prefeitura de equipamentos agrícolas, uma retroescavadeira nova, marca Fiatallis, cedida através das Leis Municipais n. 329/98, e um trator marca New Holland, pela Lei Municipal n. 418/00.


As autorizações legislativas permitiriam à Amagril utilizar os equipamentos, sendo o ato administrativo concretizado nos termos de 25.08.1998 e 21.10.2000, ambos subscritos pelo então Prefeito Ernor Weber.
A cessão previa a apresentação de demonstrativos de receitas e despesas e balanço financeiro mensal à Secretaria Municipal da Agricultura, Indústria, Comércio e Turismo, a qual, por sua vez, deveria emitir parecer sobre a prestação de contas com a participação do Conselho Municipal Agropecuário. Ocorre que não houve a prestação de contas, assim como não houve a exigência da prestação de contas, havendo contumácia no descumprimento da exigência legal, o que se estendeu durante o mandato do requerido Edio Shoroeder, que exerceu o mandato de Prefeito Municipal no período de 2001/2004.

A associação sustentou que era dever da Administração Pública exercer o seu poder de polícia sobre os bens públicos transferidos a terceiros particulares, sendo que o cumprimento dessa obrigação jamais foram fiscalizadas pelo Poder Público.
Apontou que a diretoria da Associação sempre foi composta por pessoas simples, em contraponto das tarefas executadas pelo servidor público, Airton Scheffer, junto à Secretaria da Agricultura do Município, que deveria fiscalizar as atividades. Os documentos da associação sempre estiveram dentro do ente público, nunca havendo exigência para entrega de uma prestação de contas formal. Com isso apontou ser de responsabilidade exclusiva da Administração Pública a ausência de prestação de contas pela associação.

Os acusados, por sua vez, apontam descabida a acusação, na medida em que não competiria aos administradores públicos a referida prestação de contas, exigência que era de responsabilidade da associação, consistente no fornecimento de relatórios periódicos.
Disseram da impossibilidade de aplicação do art. 11, inc. VI, da Lei de Improbidade, em conduta comissiva por omissão, resultando na impossibilidade de aplicação de multa do art. 12, inc. III, da Lei n. 8.429/92.

Vejamos que, se levadas em consideração as razões de recorrer de ambas as partes, ninguém tinha o dever de exigir ou fornecer a prestação de contas, decorrente de contrato firmado entre ambos.
Em verdade, era de ambas as partes que entabularam a relação jurídica o interesse e o dever de proceder à formalização da prestação de contas.

O Município detém o dever de exigir a prestação de contas da associação e esta o dever de fornecer a prestação de contas.
A vinculação entre o chefe do executivo da época, perpetrada pelo corréu que o substituiu, demonstra inequivocamente a proximidade entre a associação e os agentes públicos, que se valeram da associação, pessoa jurídica de direito privado, para usufruir de bem público à margem das rigorosas normas de controle de gastos públicos.

Constata-se da ata da assembléia geral de junho de 1998, em que está registrado em ato que o corréu Enor Weber, então Prefeito Municipal, colocou aos associados que tinha conseguido recursos no valor de vinte e cinco mil reais para aquisição de uma retroescavadeira e de que (sic) ?
a intenção da municipalidade era de repassar essa verba para Amagril, mas como a máquina teria de ser adquirida no nome da Prefeitura isso não seria possível e em conseqüência disso se a Amagril tivesse mesmo numa retroescavadeira deveria buscar o recurso que faltaria numa instituição financeira e doar para a Prefeitura que fará a aquisição da máquina.? (fl. 56-7)

Veja-se, portanto, que a intencionalidade do chefe do executivo estava bem explícita ao apontar que a sua intenção era de repassar recursos à referida entidade privada, tendo-a levado a efeito mediante os contratos de cessão de uso da retroescavadeira nova, marca Fiatallis, e do trator0 marca New Holland.


Constata-se dos autos que ambos foram objeto de contrato de cessão de uso, segundo se observa dos contratos de cessão datados de julho de 1996 (fls.69-71), de agosto de 1998 (fls.
73-5), de outubro de 2001 (fls. 76-9).

Conclui-se que a aquisição da retroescavadeira pelo Município ocorreu com verba obtida ao Município somada a verba doada pela Amagril (R$ 46.200,00 - fls.
99-101), com a finalidade de adquirir o referido maquinário. Com isso o então Prefeito Municipal, autorizado por lei local, celebrou os referidos contratos...

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