Decisão Nº 08029996020208200000 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Câmara Criminal, 24-04-2020

Data de Julgamento24 Abril 2020
Classe processualRECURSO EM SENTIDO ESTRITO
Número do processo08029996020208200000
ÓrgãoCâmara Criminal
Tipo de documentoDecisão monocrática


Poder Judiciário

Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte

Gabinete do Desembargador Gilson Barbosa

Recurso em Sentido Estrito n° 0802999-60.2020.8.20.0000

Recorrente: Ministério Público

Recorrido: Ailton Berto da Silva

Advogado: Dr. Manoel Fernandes Braga - OAB/RN 8.674

Relator: Desembargador Gilson Barbosa



DECISÃO



Trata-se de Recurso em Sentido Estrito, com pedido de liminar, interposto pelo Ministério Público, contra decisão do Juiz de Direito da Vara Única da Comarca de Extremoz (ID. 5720279, fl. 23), que revogou a prisão preventiva de Ailton Berto da Silva, concedendo-lhe a liberdade provisória, sob as condições de não se ausentar da comarca onde reside sem prévia autorização judicial e uso de tornozeleira eletrônica.

Nas razões recursais (ID. 5718994, fl. 02), o recorrente pleiteou a suspensão imediata dos efeitos da decisão recorrida e o consequente restabelecimento da custódia cautelar do acusado Ailton Berto da Silva. No mérito, pugnou pela confirmação da medida.

Acostou aos autos documentos de fls. 02/25 (ID. 5718994 a 5720281).

O juízo a quo manteve a decisão proferida por seus próprios fundamentos (ID. 5783492, fl. 29).

É o que cumpre relatar. Passo a decidir.

A título de fundamentação, o representante do Ministério Público afirmou que a decisão proferida pelo magistrado a quo, no sentido de conceder a revogação da prisão preventiva do recorrido, deixou de observar as peculiaridades do caso concreto, de modo que utilizou de justificativas genéricas, que poderiam ser aplicadas em qualquer caso.

Ademais, ressaltou que o referido julgador se limitou a reproduzir atos normativos na decisão, sem ao menos explicar a relação destes com a causa, assim como admitiu ser ela contraditória em relação aos argumentos que ensejaram a custódia cautelar do paciente.

Ao final, afirmou que não houve mudança no quadro fático a justificar a revogação da prisão preventiva imposta ao acusado (ID. 5718994, fl. 02), de tal modo que a prisão cautelar resta imprescindível para garantia da ordem pública, conveniência da instrução criminal e aplicação da lei penal. Por conseguinte, ressaltou a periculosidade do acusado, o risco de reiteração delitiva e a possibilidade de fuga do distrito da culpa.

Em análise, verifico que razão assiste ao recorrente.

Inicialmente, imperioso consignar a possibilidade de adiantamento, em caráter liminar, dos efeitos do provimento do Recurso em Sentido Estrito interposto em face de decisão de primeiro grau. É o que se denomina de efeito suspensivo ativo, instituto que representa a antecipação da tutela recursal na medida em que ao relator do recurso é dada a possibilidade de adiantar os efeitos de seu provimento.

Pois bem.

Cumpre registrar que a prisão cautelar deve ser considerada exceção, uma que, por meio desta medida, priva-se o réu de seu jus libertatis antes do pronunciamento condenatório definitivo, consubstanciado na sentença transitada em julgado. É por isso que tal medida constritiva só se justifica caso demonstrada sua real indispensabilidade para assegurar a ordem pública, a instrução criminal ou a aplicação da lei penal.

A prisão preventiva, portanto, enquanto medida de natureza cautelar, não pode ser utilizada como instrumento de punição antecipada do indiciado ou do réu, nem permite complementação de sua fundamentação pelas instâncias superiores (HC 287232/CE HABEAS CORPUS 2014/0014243-0, Ministro FELIX FISCHER, T5-QUINTA TURMA, Data do Julgamento: 02/06/2015, DJe 11/06/2015).

Dos autos, observo que o recorrido foi denunciado pela prática do crime tipificado no art. 121, §2º, II e IV, do Código Penal, contra a vítima Fantone Henry Filgueira Maia, e dos delitos previstos nos arts. 121, §2º, II e IV c/c art. 14, II, do mesmo diploma legal contra as vítimas Michael Jackson da Silva, Ivo Bruno Oliveira de Souza e Mac Arthur Macedo de Lima e, ainda, pela conduta delitiva prevista no art. 12 da Lei n. 10.826/03, por ter sido apreendida em sua casa munições de pistola cal. 40.

Desse modo, o Código Penal prevê a pena privativa de liberdade de 12 (doze) a 30 (trinta) anos de reclusão nos casos de homicídio qualificado. Neste ponto, importa consignar que é possível a decretação da prisão preventiva, com fulcro no art. 313, I, do Código de Processo Penal.

Em relação ao art. 312 do mesmo diploma legal, o qual exige a concomitância do fumus comissi delicti e do periculum libertatis, verifico que ambos restam caracterizados diante do caso concreto, uma vez que se encontram presentes a materialidade do delito e indícios suficientes de autoria, bem como a necessidade de garantia da ordem pública e aplicação da lei penal.

No que concerne à garantia da ordem pública, entendo pela necessidade de estabelecer a segregação cautelar, sobretudo em decorrência do modus operandi empregado na conduta delitiva, revelador da periculosidade do agente. Isso porque, constam dos autos informações capazes de ensejar tal conclusão, visto que apontam Ailton Berto da Silva como autor da prática do delito de homicídio consumado em face de Fantone Henry Filgueira Maia, assim como da prática do crime de homicídio tentado contra Michael Jackson da Silva, Ivo Bruno Oliveira de Souza e Mac Arthur Macedo de Lima, após mero desentendimento com a segunda vítima.

Segundo consta do Inquérito Policial, tal situação fática ocorreu em uma festa de confraternização de final de ano, realizada na praia de Santa Rita, em Extremoz/RN, mais precisamente no dia 30 de novembro de 2019, por volta das 22h30min, ocasião em que, após desavença com a vítima Michael Jackson da Silva, desferiu-lhe sucessivos disparos com uma pistola de calibre .38, atingindo ainda - de forma proposital - as pessoas de Ivo Bruno Oliveira de Souza, Mac Arthur Macedo de Lima e Fantone Henry Filgueira Maia, ocasionando a morte deste último.

Desta feita, reitero ser possível restabelecer a prisão preventiva do paciente com base na garantia da ordem pública, atentando-se ao modus operandi empregado na conduta delitiva, revelador da periculosidade do paciente, consistente na participação na prática, em tese, de 03 (três) delitos de homicídio - um consumado e os outros dois tentados - ocorridos em uma festa familiar, a qual celebrava a amizade entre amigos do mesmo clube de passeio de veículos do tipo 4x4, mais precisamente após uma desavença em razão de uma brincadeira realizada por Michael Jackson em relação ao paciente.

Ademais, subsistem nos autos as informações de que o paciente chegou à festa aborrecido, pois gostaria que tivesse sido realizada em sua residência, bem como proferiu palavras no sentido de afirmar que naquele local haviam pessoas falsas, tendo dito inclusive que se ouvisse alguém falando mal dele, iria "calar a boca" dessa pessoa. Em outro momento, questionou se alguém presente na confraternização estava armado.

Esse foi, inclusive, o posicionamento do magistrado a quo, antes do decreto prisional ter sido revogado, a ver:

“No caso em tela, verifica-se que todas as exigências legais para justificar a prisão preventiva do acusado se fazem presentes. Com efeito, sua prisão preventiva é admissível no caso em virtude de o crime pelo qual está sendo acusado ser punível com pena privativa de liberdade máxima superior a 4 (quatro) anos (art. 313 do Código de Processo Penal), posto que diz respeito aos crimes de um homicídio qualificado consumado e dois homicídios qualificados na forma tentada. No que tange às hipóteses autorizadores, verifico que o acusado praticou o crime de forma violenta contra as vítimas, agindo de surpresa e impossibilitando a defesa das vítimas, além de ter cometido os crimes por motivo fútil. Ocorre, que o denunciado portava uma arma de fogo, sem autorização em um ambiente festivo, onde se encontravam em momento de confraternização e lazer, e em razão de uma brincadeira feita por um dos participantes, efetuou diversos disparos de arma de fogo, fazendo três vítimas, sendo uma delas fatal e duas ainda internadas em estado grave. Assim, é inegável que o meio social necessita ser acautelado contra a prática que se verificou, o que não ocorreria se permanecer, o seu autor, em absoluta liberdade, propenso a repetir, quanto necessário, a sua prática delituosa, gerando insegurança e medo na sociedade. Se vislumbra ainda a referida medida, tendo em vista que o agente após o cometimento do crime se evadiu do local e ficou um período se furtando da aplicação da lei penal, conforme consta no caderno...

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