Decisão Nº 08030471420238200000 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Segunda Câmara Cível, 22-03-2023
Data de Julgamento | 22 Março 2023 |
Classe processual | AGRAVO DE INSTRUMENTO |
Número do processo | 08030471420238200000 |
Órgão | Segunda Câmara Cível |
Tipo de documento | Decisão monocrática |
AGRAVO DE INSTRUMENTO 0803047-14.2023.8.20.0000
AGRAVANTE: HAP VIDA Assistência Médica Ltda
Advogados: Igor Macêdo Facó (OAB/CE 16.470), Nelson Wilians Fratoni Rodrigues (OAB/RN 725-A) e outros
AGRAVADO: Francisco Fernandes de Araujo Filho
Advogada: Raissa Fernandes de Oliveira (OAB/RN 1.420)
RELATORA: Desembargadora Maria Zeneide Bezerra
DECISÃO
Francisco Fernandes de Araujo Filho ajuizou pedido de Tutela Cautelar Antecedente nº 0801291-75.2023.8.20.5300 contra a HAP VIDA Assistência Médica Ltda.
Ao decidir o pleito, a MM. Juíza do Plantão Noturno Cível e Criminal deferiu a pretensão e determinou ao plano de saúde que “que autorize, imediatamente, a contar da intimação da presente, a internação do autor em Unidade de Terapia Intensiva, conforme solicitação médica de ID n.º 95692937, devendo se abster de realizar qualquer cobrança relacionada aos procedimentos realizados até ulterior decisão do Juízo competente, sob pena de multa no valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais)”.
Descontente, a ré protocolou agravo de instrumento com os seguintes argumentos (Id 18710380, págs. 01/23):
a) não houve falha, ineficiência ou prática de ato ilícito na prestação dos serviços em debate, tendo, inclusive sido prestado atendimento à parte recorrida;
b) foram realizadas minuciosas avaliações clínicas, exames investigativos, prescrição de medicamentos indicados ao caso, tudo a fim de estabilizar o paciente e afastar qualquer risco porventura existente;
c) conforme Resolução nº 13, de 03/11/1998, do Conselho de Saúde Suplementar – CONSU, durante o período de carência e nos casos de urgência e emergência, a cobertura do plano hospitalar se equipara a do plano ambulatorial, ou seja, restringe-se ao atendimento de 12 (doze) horas e, após esse interstício, o paciente deve ser encaminhado ao SUS ou custear o atendimento com recursos próprios;
d) a internação solicitada foi negada em decorrência da ausência de cumprimento de período de carência, eis que na data em que buscou o expediente de internação, em 20/02/2023, o recorrido contava com apenas 62 (sessenta e dois) dias de plano, sendo necessário para o atendimento vindicado o cumprimento de carência de 180 (cento e oitenta) dias, logo, a operadora agiu no exercício regular do seu direito;
e) há perigo de irreversibilidade da medida eis se tratar de ônus elevado à agravante e que não terá como ser ressarcido, em caso de improcedência da ação, pois a parte adversa se declarou pobre na forma da lei.
Pediu, então, que seja concedido efeito suspensivo ao presente agravado e, no mérito, busca o provimento do recurso, com a cassação definitiva do decisum em questão.
O preparo foi recolhido (Id´s 18717229 – 18702680).
É o relatório.
Presentes os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso e passo ao exame do pedido de sobrestamento da decisão questionada, cujo deferimento depende do preenchimento concomitante dos requisitos previstos no art. 995, do NCPC, que estabelece:
Art. 995. Os recursos não impedem a eficácia da decisão, salvo disposição legal ou decisão judicial em sentido diverso.
Parágrafo único. A eficácia da decisão recorrida poderá ser suspensa por decisão do relator, se da imediata produção de seus efeitos houver risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação, e ficar demonstrada a probabilidade de provimento do recurso.
Pois bem. Ao analisar o feito, vejo que a HAP VIDA Assistência Médica Ltda busca a reforma da decisão agravada que lhe impôs a obrigação de autorizar a internação do agravado em Unidade de Terapia Intensiva – UTI, procedimento necessário ao restabelecimento da saúde do agravado.
Como justificativa, a recorrente alega não ter obrigação de arcar com os custos do pleito vindicado por estar em curso o período de carência previamente estabelecido na relação jurídica firmada entre os litigantes.
Sem razão, todavia. Explico.
Em consulta à ação ordinária, observo que Francisco Fernandes de Araujo Filho aderiu ao plano de saúde em 20.12.22 (Id 9968147).
Vejo, também, que de acordo com o formulário de emergência clínica emitido em 23.02.23, o paciente foi admitido em 18.02.23 no hospital de Tenente Laurentino/RN, município onde reside, e em 20.02.23, foi encaminhado em ambulância ao Hospital Antônio Prudente, em Natal/RN, com queixa de tosse de longa data e evolução há 02 (dois) dias com piora no cansaço, inclusive devendo ser considerada a possibilidade de acometimento inflamatório/infeccioso (pneumonia).
Além disso, há declaração médica da Dra. Karoline M. Maia Correia (CRM/RN 9547), emitida em 24.02.23, noticiando que o paciente necessita internação hospitalar em leito de unidade de terapia intensiva com urgência.
Nesse cenário, ainda que o conveniado esteja cumprindo o período de carência contratual previsto para internação, não há dúvida quanto à abusividade na conduta da contratada ao negar a autorização no caso concreto ante a urgência do procedimento prescrito, inclusive, nesse pensar, trago o enunciado da Súmula 30 desta Corte Potiguar, in verbis:
É abusiva a negativa de cobertura pelo plano de saúde de atendimento de urgência ou emergência a pretexto de estar em curso período de carência que não seja o prazo de 24 (vinte e quatro) horas estabelecido no art. 12, V, “c”, da Lei n. 9.656/1998.
Além disso, o direito pleiteado pelo autor encontra respaldo no art. 12 da Lei nº. 9.656/1998, que estabelece:
Art. 12. São facultadas a oferta, a contratação e a vigência dos produtos de que tratam o inciso I e o § 1º do art. 1º desta Lei, nas segmentações previstas nos incisos I a IV deste artigo, respeitadas as respectivas amplitudes de cobertura definidas no plano-referência de que trata o art. 10, segundo as seguintes exigências mínimas:
(...)
V – quando fixar períodos de carência:
a) prazo máximo de trezentos dias para prazo a termo;
b) prazo máximo de cento e oitenta dias para os demais casos;
c) prazo máximo de vinte e quatro horas a cobertura dos casos de urgência e emergência;
(...)
Logo, restando evidente que a legislação de regência limita o período de carência ao prazo máximo de 24 (vinte e quatro horas) para a cobertura em casos de urgência e emergência, não há razão para reforma da decisão de primeira instância, eis que patente a necessidade de internação urgente de Francisco Fernandes de Araujo Filho, paciente com 68 anos e que, no caso concreto, possui várias enfermidades, a saber: diabetes mellitus, hipertensão arterial, doença renal crônica, hiperplasia prostática benigna, doença pulmonar obstrutiva crônica, aneurisma da aorta abdominal e grande histórico tabagista.
E mais: mister observar que, no caso concreto:
a) o que está em risco é a saúde do beneficiário da operadora, bem jurídico extremamente relevante e que deve se sobrepor em relação a qualquer outro, especialmente porque se o enfermo não for colocado como prioridade, poderá sofrer sérias consequências, inclusive vir a óbito;
b) nada impede que se a ação ordinária for julgada improcedente, o plano de saúde adote os meios cabíveis e que lhe são perfeitamente acessíveis, naturalmente, para reaver os prejuízos suportados pelas despesas decorrentes do cumprimento da obrigação de fazer imposta na decisão precária proferida pelo juízo de origem e ratificada nessa instância.
Desse modo, considero, a princípio, ausente o fumus boni iuris, o que torna desnecessário o exame do risco de dano, eis que o deferimento da medida de urgência depende do preenchimento concomitante de ambos os requisitos.
Com estes fundamentos, INDEFIRO o pedido de efeito suspensivo.
Intimem-se o agravado para, querendo, apresentar contrarrazões ao recurso no prazo de 15 (quinze), sendo-lhe facultando juntar cópias das peças que entender convenientes.
Em seguida, à douta Procuradoria Geral de Justiça para emissão de parecer.
Após, retorne concluso.
Intimem-se.
Cumpra-se.
Desembargadora Maria Zeneide Bezerra
Relatora
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