Decisão Nº 08043933920198200000 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Câmara Criminal, 23-07-2019

Data de Julgamento23 Julho 2019
Classe processualHABEAS CORPUS CRIMINAL
Número do processo08043933920198200000
ÓrgãoCâmara Criminal
Tipo de documentoDecisão monocrática

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
Gabinete do Desembargador Gilson Barbosa

Habeas Corpus nº 0804393-39.2019.8.20.0000

Impetrante: Dr. Anesiano Ramos de Oliveira OAB/RN 5.628

Paciente: Vanklaus Cordeiro Bezerra Cabral

Aut. Coatora: Juiz de Direito da Vara Única da Comarca de Parelhas/RN

Relator: Desembargador Gilson Barbosa

DECISÃO

Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado pelos advogado Anesiano Ramos de Oliveira, em favor de Vanklaus Cordeiro Bezerra Cabral, sob a alegação de estar o paciente sofrendo constrangimento ilegal por parte da Juíza de Direito da Vara Única da Comarca de Parelhas/RN.

Em suas razões alegou que o paciente encontra-se preso preventivamente, desde o dia 06 de fevereiro de 2018, em virtude de acusação do delito tipificado no art. 2º, §2º, da Lei nº 12.850/2013 e art. 33 e 35 da Lei de drogas.

Ressaltou, em síntese, que a prisão preventiva foi decretada para garantir à ordem pública e aplicação da lei penal, sob o argumento de que há suspeitas de envolvimento do paciente com organização criminosa.

Alegou o constrangimento ilegal suportado pelo paciente, uma vez transcorridos mais de 510 (quinhentos e dez dias) do encarceramento cautelar, sem o término da instrução processual.

Por fim, requereu a concessão liminar da ordem impetrada, com a expedição do competente Alvará de Soltura em favor do paciente. No mérito, a confirmação da liminar, acaso deferida.

No pedido subsidiário, o impetrante requereu a concessão da ordem de Habeas corpus, para que fosse determinado à autoridade coatora o prazo máximo de 30 dias para realização e conclusão da instrução processual no processo da Carta Precatória nº 0100764-51.2019.8.20.0145 e no feito principal, processo nº 010028476.2018.8.20.0123, por ser medida necessária e justa.

Na certidão de ID. 3755604, expedida pela Secretaria Judiciária deste Tribunal, não consta a existência de ordem anterior de habeas corpus impetrada em favor do paciente.

É o que cumpre relatar. Passo a decidir.

A concessão de liminares em habeas corpus somente é cabível em casos excepcionalíssimos, máxime quando o constrangimento ilegal a que é submetido o paciente se apresenta de plano.

No caso dos presentes autos, pelo menos nesse momento de cognição sumária, vejo que os documentos acostados não são hábeis a demonstrar o apontado constrangimento ilegal.

Isso porque, é sabido que o eventual excesso de prazo não resulta de mera soma aritmética, podendo o magistrado, diante da complexidade da causa, extrapolar os limites estabelecidos na legislação, desde que obedecido ao princípio da razoabilidade.

Nesse contexto, cumpre esclarecer que a hipótese retratada refere-se a processo complexo, com mais de 30 de acusados, os quais se encontram custodiados em estabelecimentos prisionais sob a jurisdição de comarcas diversas, demandando a necessidade de expedição de diversas cartas precatórias.

Nesse sentido, o magistrado em decisão afirmou que: o presente processo não se encaixa na categoria dos feitos "normais", uma vez que possui mais de 30 réus (...) não há qualquer atraso irrazoável, estando o feito tramitando de forma célere para as circunstâncias da causa.”

Por conseguinte, ante a peculiaridade do caso em espécie, há de ser observada aparente razoabilidade no andamento processual.

Ademais, é cediço nos tribunais pátrios que a demora na instrução processual, por si só, não configura excesso de prazo, a exemplo cito:

“PROCESSUAL PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA ARMADA. TRANCAMENTO. INÉPCIA DA PEÇA ACUSATÓRIA NÃO EVIDENCIADA. PRISÃO PREVENTIVA. EXCESSO DE PRAZO NA INSTRUÇÃO CRIMINAL. NÃO OCORRÊNCIA. COMPLEXIDADE DA CAUSA. RAZOABILIDADE. RECURSO DESPROVIDO. RECOMENDAÇÃO DE CELERIDADE NO JULGAMENTO DA AÇÃO PENAL ORIGINÁRIA.

1. Nos termos do entendimento consolidado desta Corte, o trancamento da ação penal por meio do habeas corpus é medida excepcional, que somente deve ser adotada quando houver inequívoca comprovação da atipicidade da conduta, da incidência de causa de extinção da punibilidade ou da ausência de indícios de autoria ou de prova sobre a materialidade do delito.

2. A alegação de inépcia da denúncia deve ser analisada de acordo com os requisitos exigidos pelos arts. 41 do CPP e 5º, LV, da CF/1988. Portanto, a peça acusatória deve conter a exposição do fato delituoso em toda a sua essência e com todas as suas circunstâncias, de maneira a individualizar o quanto possível a conduta imputada, bem como sua tipificação, com vistas a viabilizar a persecução penal e o exercício da ampla defesa e do contraditório pelo réu. Precedentes.

3. Na hipótese em apreço, a inicial acusatória preenche os requisitos exigidos pelo art. 41 do CPP, porquanto descreve que a conduta atribuída ao ora paciente, tendo havido a explicitação do liame entre os fatos descritos e a pessoa do réu, permitindo-lhe rechaçar os fundamentos acusatórios.

4. Deve ser destacado, ainda, ser desnecessária maior pormenorização das condutas, até pelas comuns limitações de elementos de informações angariados em hipótese de coautoria, sob pena de inviabilizar a persecução penal nesses crimes.

5. Para o oferecimento da denúncia, exige-se apenas a descrição da conduta delitiva e a existência de elementos probatórios mínimos que corroborem a acusação. Provas conclusivas acerca da materialidade e da autoria do crime são necessárias apenas para a formação de um eventual juízo condenatório. Embora não se admita a instauração de processos temerários e levianos ou despidos de qualquer sustentáculo probatório, nessa fase processual, deve ser privilegiado o princípio do in dubio pro societate. De igual modo, não se pode admitir que o Julgador, em juízo de admissibilidade da acusação, termine por cercear o jus accusationis do Estado, salvo se manifestamente demonstrada a carência de justa causa para o exercício da ação penal.

6. O excesso de prazo não pode ser estimado de modo meramente aritmético, devendo ser considerado em razão das peculiaridades de cada caso. Em verdade, para ser considerado injustificado o excesso na custódia cautelar, deve a demora ser de responsabilidade da acusação ou do Poder Judiciário, situação em que o constrangimento ilegal pode ensejar o relaxamento da segregação antecipada.

7. Não se verifica, in casu, ilegal mora processual atribuível ao Poder Judiciário ou aos órgãos encarregados da persecução penal. O feito tramita de maneira regular e conforme a sua complexidade, a considerar a existência de 26 corréus, com defensores diversos, a necessidade de expedição de diversas cartas precatórias, assim como a oitiva de dezenas de testemunhas.

8. Trata-se, por certo, de intricada rede criminosa dedicada à prática de delitos de furto, roubo, receptação, adulteração de sinal identificador de veículo automotor, falsidade material, falsidade ideológica, falsa comunicação de crime, corrupção ativa e passiva, prevaricação e coação no curso do processo, que seria composta por policiais civis e empresários da região, com tentáculos em diversos municípios limítrofes, tendo sido necessário realizar diversas diligências e perícias, tais como a quebra do sigilo telefônico de 10.410 (dez mil, quatrocentos e dez) números e a análise de informações prestadas por 20 vinte) instituições financeiras.

9. Conforme o noticiado nos autos, a defesa de coacusado concorreu para a delonga no desfecho da instrução processual, tendo impetrado mandado de segurança com vistas a suspender a audiência designada nos autos, no qual foi deferida liminar pela Corte de origem, além de ter manejado exceção de suspeição contra o Magistrado de 1º grau, a quem atribui inimizade pessoal. Outrossim, foram atribuídos inúmeros atos procrastinatórios aos coacusados e seus defensores, tais como a demora na apresentação de resposta à acusação, conquanto tenham sido devidamente intimados, tendo sido necessário advertir as defesas que, caso permanecem inertes, seria decretado o abandono das causas e fixada pena de multa, e que seria determinada a remessa dos autos à Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais, a fim de que promovesse a defesa dos réus.

10. Recurso desprovido, com recomendação de celeridade no julgamento da ação penal n. 0043146-45.2017.8.13.0071.”

(RHC 97.874/MG, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 21/06/2018, DJe 28/06/2018) (Grifo acrescido).

Destarte, ausente o fumus boni iuris, indefiro o pedido de liminar.

Assim, expeça-se ofício à autoridade coatora, a fim de que preste as informações sobre o alegado na inicial, no prazo de 05 (cinco) dias.

Após, remetam-se os autos à Procuradoria-Geral de Justiça para emissão de parecer.

Em seguida, retornem os autos conclusos.

Publique-se. Intime-se.



Natal/RN, 24 de julho de 2019.



Desembargador Gilson Barbosa

Relator

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