Decisão Nº 08057923520218200000 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Segunda Câmara Cível, 14-06-2021

Data de Julgamento14 Junho 2021
Classe processualAGRAVO DE INSTRUMENTO
Número do processo08057923520218200000
ÓrgãoSegunda Câmara Cível
Tipo de documentoDecisão monocrática

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
GABINETE DA DESEMBARGADORA JUDITE NUNES

Agravo de Instrumento nº 0805792-35.2021.8.20.0000

Origem: 13ª Vara da Cível da Comarca de Natal

Agravante: Gabriella Berglund, rep. p. Øyvind Reidar Berglund

Advogado: André Dantas de Araújo (OAB/RN 8822)

Agravados: Késsia Cardoso do Vale e outros

Relatora: Desembargadora Judite Nunes

D E C I S Ã O

Trata-se de Agravo de Instrumento com pedido de efeito ativo interposto por Gabriella Berglund, assistida por seu genitor, Øyvind Reidar Berglund, em face de decisão proferida pelo Juízo da Décima Terceira Vara da Cível da Comarca de Natal, que nos autos da “ação de nulidade da doação inoficiosa c/c tutela de urgência” autuada sob o nº 0822412-57.2021.8.20.5001, ajuizada em desfavor de Jéssica Berglund, Késsia Cardoso do Vale e José Raimundo do Vale, indeferiu a tutela de urgência requerida na inicial.

Em suas razões recursais argumentou que a decisão recorrida não atentou às flagrantes ilegalidades que colocam em risco de perecimento o seu direito sucessório, haja vista a possibilidade de venda do bem com a consequente perda do objeto.

Narrou, em seguida, que a ré Késsia Cardoso do Vale (mãe da agravante) teria passado procuração pública de caráter comercial para o seu genitor, o réu José Raimundo do Vale, gerir seus bens e negócios, sendo que, um mês após o nascimento da agravante, aquele réu teria doado o único bem (um imóvel) de Késsia Cardoso do Vale para a ré Jéssica Berglund (irmã da agravante).

Asseverou que José Raimundo do Vale não possuía poderes para representar agravante, que era absolutamente incapaz, pois tinha apenas dez anos de idade, visto que a procuração que ele possuía tinha caráter exclusivamente comercial e não seria um instrumento válido em substituição do poder familiar ou termo de tutela, não restando comprovado, outrossim, que Késsia Cardoso do Vale era proprietária de outros bens.

Sustentou que a doação objeto desta demanda é nula de pleno direito, pois no momento da doação a demandada Késsia Cardoso do Vale tinha como único bem o imóvel doado, sem prejuízo do vício de representação de Jéssica Berglund na escritura de doação, uma vez que o mandatário não tinha legitimidade para representar a donatária.

Requereu, assim, a concessão de efeito ativo ao recurso para suspender os efeitos da doação, provendo-se o agravo ao final com a reforma da decisão agravada.

Juntou documentos.

É o relatório. DECIDO.

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso instrumental.

É cediço que a permissibilidade de concessão do efeito suspensivo ou ativo ao agravo de instrumento decorre atualmente dos preceitos insculpidos nos artigos 995, parágrafo único, e 1.019, inciso I, ambos do Código de Processo Civil, sendo o deferimento da suspensividade condicionado à demonstração, pelo recorrente, da possibilidade de ocorrência de grave lesão, de difícil ou impossível reparação, sendo ainda relevante a fundamentação do pedido para fins de provável provimento do recurso.

In casu, ao menos neste momento processual, cujo exame é perfunctório, verifica-se que a agravante cuidou em demonstrar, ainda que parcialmente, existência dos requisitos necessários a alcançar o pleito liminar pretendido.

A questão discutida nestes autos gravita em torno da nulidade da doação do imóvel descrito na exordial, pois a agravada Késsia Cardoso do Vale, mãe da agravante e então proprietária do bem, teria passado procuração pública de caráter comercial para o agravado José Raimundo do Vale, o qual, por sua vez, a despeito de se tratar do único bem da doadora e da suposta ausência de legitimidade do mandatário para tanto, teria doado aquele imóvel para Jéssica Berglund, irmã da doadora.

Com efeito, a magistrado de primeiro grau, ao indeferir a medida de urgência de suspensão dos efeitos do referido negócio jurídico, tomou por base ausência de verossimilhança das alegações autorais, por subsistir ainda a controvérsia sobre a propriedade do imóvel em discussão, notadamente diante as seguintes circunstâncias: (i) o Juízo da 22ª Vara Cível da Comarca de Natal deferiu a reintegração na posse do bem, em favor de Jéssica Berglund, em decisão confirmada pelo E. TJRN, representando um contrassenso se debruçar sobre o que já foi examinado por aquele Juízo; e (ii) para se reconhecer como inoficiosa a doação seria necessário conhecimento acerca da integralidade do patrimônio da doadora, ao passo que, em processo conexo, consta informação de que ela possuía outros bens à época da doação.

No entanto, a despeito dos argumentos empregados no decisum, cumpre destacar que a concessão de medida liminar destinada a evitar a possível alienação do bem litigioso não tem o condão de resultar na apontada ausência de segurança jurídica, na medida em que a decisão mencionada não se imiscuiu na análise da propriedade do imóvel, limitando-se a entender que a demandada Jéssica Berglund teria sido ofendida em sua posse, assegurando-lhe, portanto, a tutela jurisdicional correspondente.

Quanto à suposta existência de outros bens integrantes do patrimônio da doadora, é certo que a própria agravada Késsia Cardoso do Vale, ao ajuizar ação anulatória da doação do imóvel (processo nº 0822412-57.2021.8.20.5001), afirmou que não era proprietária de qualquer outro bem à época da realização do negócio, sendo relevante ainda que a alegação de propriedade de outros bens, seja nos autos de origem ou nos processos conexos, não veio ratificada por qualquer documentação idônea.

Existe, dessa forma, plausibilidade nas alegações recursais, havendo elementos suficientes para autorizar a decretação, ao menos neste momento de cognição sumária, de medida menos gravosa, isto é, a indisponibilidade do bem, diante das evidências de que a doação em comento não teria observado a reserva da legítima e do patrimônio suficiente para subsistência da doadora. Mostra-se presente, por outro lado, o periculum in mora, tendo em vista o fundado risco de alienação do bem.

Por todo o exposto, ainda que em juízo preliminar e sem qualquer intuito de antecipar posicionamento de mérito, DEFIRO PARCIALMENTE a antecipação da tutela recursal para decretar a indisponibilidade do imóvel situado à Rua Capitão Euclides Moreira da Silva, nº 1809, Bairro Nossa Senhora de Nazaré, Natal/RN, CEP 59060-540, com a comunicação de tal informação ao 6º Ofício de Notas de Natal/RN.

Comunique-se o teor desta decisão ao digno Juízo de primeiro grau, para o devido cumprimento.

Intime-se a parte agravada para, querendo, oferecer resposta ao presente recurso, no prazo legal, sendo-lhe facultado juntar documentos que entender convenientes.

Em seguida, remetam-se os autos à Procuradoria Geral de Justiça para os devidos fins.

Cumpridas as diligências, à conclusão.

Publique-se. Intimem-se.

Natal, 14 de junho de 2021.

Desembargadora JUDITE NUNES

Relatora

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