Decisão Nº 08060594120208200000 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Seção Cível, 29-09-2020

Data de Julgamento29 Setembro 2020
Classe processualRECLAMAÇÃO
Número do processo08060594120208200000
ÓrgãoSeção Cível
Tipo de documentoDecisão monocrática

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
Gabinete da Desembargadora Judite Nunes na Seção Cível

Reclamação N° 0806059-41.2020.8.20.0000

Origem: Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte

Reclamante: Banco Bradesco S/A

Advogado: Antonio de Moraes Dourado Neto (OAB/PE 23.255)

Reclamada: Terceira Turma Recursal do Poder Judiciário do RN

Entre Partes: Dulcinea Soares Batista

Advogado: Carlos Adelson de Araújo Filho

Relatora: Desembargadora Judite Nunes

D E C I S Ã O

Trata-se de Reclamação proposta pelo Banco Bradesco S/A, em face de decisão proferida pela Terceira Turma Recursal do Rio Grande do Norte, nos autos do Recurso Inominado nº 0010432-73.2015.8.20.0114, interposto em ação declaratória de inexistência de débito c/c indenização por danos morais, movida por Dulcinea Soares Batista.

Em apertada síntese, a autora ajuizou a referida demanda em virtude da inserção de seu nome em cadastro restritivo de crédito, a partir de débito cuja origem não reconhecia, obtendo decisão favorável desde a seara antecipatória, que determinou ao banco que excluísse a restrição creditícia, sob pena de pagamento de multa, decisão que acabou confirmada na sentença de mérito, bem como no julgamento do recurso inominado.

Sustenta o Reclamante, nesse contexto, que a parte demandante requereu execução da multa cominatória antes mesmo da sentença de mérito, e que teria comprovado o cumprimento da ordem liminar em janeiro de 2018, também antes da sentença meritória, aduzindo que a execução da multa seguiu tramitando “sem a limitação imposta na decisão que a fixou”, o que – entretanto – não foi reconhecido no âmbito da Turma reclamada.

Acresce que a decisão da Terceira Turma Recursal, especialmente ao confirmar a rejeitar dos embargos à execução opostos, feriu o artigo 537, § 1º, do CPC, além de precedentes desta Corte e do Superior Tribunal de Justiça, uma vez que permitiu a “execução de astreintes sem limitação e com juros moratórios, malgrado a decisão que arbitrou a multa tenha estipulado um teto”, afirmando, ao final, que a sentença “arbitrou a quantia de R$ 1.500,00 a título de danos morais”, o que tornaria a “decisão impugnada – que está chancelando uma execução de mais de R$ 73.000,00 por uma multa que tinha um teto inobservado de 40 salários mínimos” em descompasso com a jurisprudência apresentada.

Requer, assim, a admissão da reclamação com a atribuição de efeito suspensivo à execução que tramita na origem, e, no mérito, a sua procedência, mediante a cassação da decisão reclamada, “determinando que a execução prossiga com base em valor razoável”, ou com base no teto fixado desde a decisão liminar.

Trouxe ao feito documentos elencados do ID. 6702624 ao ID. 6702662, incluindo cópia integral da ação de origem.

É o relatório. DECIDO.

Compulsando os autos com a atenção devida, entendo, de imediato, sem necessidade de maiores digressões, que o caso reclama o indeferimento de plano da inicial.

Como bem registrado pelo Reclamante, já em sede prefacial, a competência deste Tribunal para a apreciação de reclamações voltados contra acórdãos das Turmas Recursais é restrita às hipóteses elencadas na Resolução nº 003/2016-STJ, partindo de delegação excepcional daquela Corte Superior.

O artigo 1º da citada Resolução prevê que “caberá às Câmaras Reunidas ou à Seção Especializada dos Tribunais de Justiça a competência para processar e julgar as Reclamações destinadas a dirimir divergência entre acórdão prolatado por Turma Recursal Estadual e do Distrito Federal e a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, consolidada em incidente de assunção de competência e de resolução de demandas repetitivas, em julgamento de recurso especial repetitivo e em enunciados das Súmulas do STJ, bem como para garantir a observância de precedentes.

Importante estabelecer, desde logo, pelo menos duas premissas básicas em relação a essa espécie de reclamação: 1) a divergência potencialmente existente deve ser entre a decisão reclamada e a jurisprudência do STJ, não havendo sentido na tentativa de demonstrar eventual incongruência com base em julgados deste Tribunal de Justiça; e 2) essa divergência não pode partir do confronto com qualquer precedente ou julgado isolado, mesmo a parte final do citado artigo (“bem como para garantir a observância de precedentes”) deve ser lida, naturalmente, em sintonia com o espírito da norma, que visa a proteção de jurisprudência consolidada naquele Tribunal Superior, razão pela qual, em regra, essa reclamação se destina à confirmação de julgados oriundos de demandas repetitivas, verbetes sumulados, ou incidentes de assunção de competência.

Observando a situação descrita na exordial, nota-se que a intenção do Reclamante foi enquadrar este instrumento exatamente na parte final do citado dispositivo, defendendo que decisão reclamada estaria em confronto com “precedentes” do Superior Tribunal de Justiça.

Porém, ainda que examinássemos a admissão da reclamação sem o viés mais acima ressaltado (de jurisprudência efetivamente sedimentada), entendo evidente que os julgados trazidos ao feito não se revelam suficientes para gerar o entendimento almejado.

Observa-se que trouxe o Reclamante, a princípio, dois arestos oriundos deste Tribunal de Justiça, tratando da necessidade de fixação de teto máximo para as astreintes (arestos inservíveis, conforme já acentuado). Em seguida, transcreveu ementas de 3 (três) julgados do STJ, e outros 2 (dois) ainda do TJRN, todos tratando da possibilidade de revisão (excepcional) do valor atribuído a título de multa cominatória, quando irrisória ou exorbitante.

Finalmente, citou um aresto do STJ “a respeito da incidência dos juros de mora em multa cominatória”, para defender que não incidem tais juros nas astreintes, sob pena de configuração de bis in idem, sendo esses os “precedentes” paradigmas que fundamentam o pedido proposto na reclamação.

É suficiente volver o olhar para a decisão colegiada reclamada, para constatar que a Turma Recursal não infirmou a possibilidade de revisão da multa cominatória, nem tampouco afirmou eventual permissibilidade de incidência de juros moratórios sobre as astreintes.

Pelo contrário, o colegiado inicia sua fundamentação afirmando precisamente o oposto, isto é, que a multa pode e deve ser minorada quando evidenciada a sua exorbitância, sendo que, em valoração própria do caso concreto, afasta a existência desse excesso. Logo, a insurgência do Reclamante se volta, na verdade, contra a valoração dada pelo colegiado às circunstâncias do caso concreto, e não em face de suposto desrespeito a entendimento jurisprudencial consolidado.

Ademais, não trouxe o Reclamante qualquer comprovação de que tenha a Reclamada autorizado a eventual incidência de juros de mora sobre a multa cominatória. A decisão reclamada explica, em verdade, que houve atualização do valor arbitrado desde a origem e incidência de multa de 10% (dez por cento) pelo não cumprimento voluntário da obrigação, não havendo qualquer menção à suposta aplicação de juros de mora.

Não há como afirmar, nesse contexto, que o valor do teto estabelecido foi desrespeitado, uma vez que a fixação de teto não impede a incidência de correção monetária, nem tampouco a aplicação de outra multa eventualmente prevista em lei.

Finalmente, ressalto que não caberia a este Juízo, na sede estreita desta reclamação, invadir seara relativa a juízo de valor sobre cálculos realizados na origem, ou a elementos alheios à própria jurisprudência que busca o Reclamante garantir.

Ante o exposto, com supedâneo no artigo 485, incisos I e IV, do Código de Processo Civil, c/c o artigo 183, inciso X, do RITJRN, indefiro, de plano, a inicial apresentada, julgando extinto o feito sem resolução de mérito, por inexistir qualquer indício concreto de desrespeito a comandos imperativos (aplicáveis à espécie) da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, não havendo a demonstração de preenchimento de qualquer das hipóteses do artigo 988, do Código de Processo Civil.

Transitada em julgado, arquivem-se os autos com a baixa na distribuição.

Publique-se. Cumpra-se.

Natal, 29 de setembro de 2020.

Desembargadora JUDITE NUNES

Relatora

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