Decisão Nº 08067857820218200000 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Terceira Câmara Cível, 07-06-2021

Data de Julgamento07 Junho 2021
Classe processualAGRAVO DE INSTRUMENTO
Número do processo08067857820218200000
ÓrgãoTerceira Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
Gab. Des. Amaury Moura Sobrinho na Câmara Cível

Agravo de Instrumento nº 0806785-78.2021.8.20.0000

Origem: 5ª Vara Cível da Comarca de Natal (0808630-80.2021.8.20.5001)

Agravante: UNIMED NATAL – Sociedade Cooperativa de Trabalho Médico

Advogado: Murilo Mariz de Faria Neto

Agravado: Wendell Ferreira da Costa

Advogados: Caio Daniel Fernandes da Costa, Leonardo Lopes Pereira e Tuanny Raphael Andrade de Carvalho

Relatora: Juíza Berenice Capuxú (convocada)

DECISÃO

Trata-se de Agravo de Instrumento interposto pela UNIMED NATAL – Sociedade Cooperativa de Trabalho Médico em face de decisão do Juízo de Direito da 5ª Vara Cível da Comarca de Natal que, nos autos da ação ordinária ajuizada por Wendell Ferreira da Costa em desfavor da ora Agravante, deferiu a tutela de urgência que a requerida promova a inclusão do autor no seu quadro de médicos cooperados, quanto à especialidade de oncologia, no prazo de 10 (dez) dias, sob pena multa da incidência de multa diária, no valor de R$ 500,00(quinhentos reais), sem prejuízo de eventual instauração de procedimento penal por crime de desobediência.” Ordenou, ainda, que “deverá o autor promover o depósito judicial de sua quota parte, no valor de R$ 36.000,00 (trinta e seis mil reais), no prazo de 05 (cinco) dias.

Nas razões recursais, a UNIMED NATAL alega que, o fato de o médico comprovar a sua qualificação técnica – perspectiva individual da parte agravada – não é capaz de imbuir verossimilhança em suas alegações, afinal, a qualificação técnica para a qual a legislação pátria manda voltar os olhos é aquela qualificação coletiva, da cooperativa, afinal, estas são feitas para durar e para o bem da coletividade.

Pondera que o ingresso livre – invocado na decisão como lastro para deferimento do objeto deste agravo - guarda ponderação e justaposição com os princípios da autonomia e auto-organização garantidos às sociedades cooperativas, os quais são nortes salutares para a durabilidade e equilíbrio da sociedade cooperativa, o que não deve ser olvidado pelo Judiciário e coaduna a necessidade de modificação.

Prossegue tecendo considerações sobre a natureza das sociedades cooperativas e princípios norteadores; os critérios objetivos estabelecidos no Estatuto Social e Regimento Interno da Cooperativa; a necessidade de demonstração de que a sociedade tem, ou não, possibilidade técnica de prestar o serviço ao futuro cooperado.

Informa, ainda, que a Agravante majorou, regularmente, a quota-parte para ingresso de novos cooperados e assim o fez conforme ata de assembleia acostada aos autos, de modo que, ajuizado o feito em 2021, torna-se indelével que o montante a ser adimplido para integralização da quota-parte do cooperado é, de modo incontroverso, aquele vigente a data do ajuizamento, qual seja R$ 84.800 (oitenta e quatro mil e oitocentos reais).

Sustenta que no Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR) de nº 0807642-95.2019.8.20.0000 restou determinada a suspensão de todos os processos pendentes de julgamento que tratem especificamente da mesma matéria, seja em primeiro grau de jurisdição ou em instância recursal, nos moldes do Artigo 982, I do CPC.

Com isso, requer, ao final, a concessão de efeito suspensivo, “no sentido de SUSTAR a tutela antecipada ora recorrida, afastando o dever de incluir ou permanecer com a recorrida em seus quadros de cooperados na especialidade ‘CANCEROLOGIA’”. Alternativamente, ainda no efeito ativo, caso se entenda pela permanência da agravada como cooperada que o faça por meio da integralização da quota-parte no valor de R$ 84.800,00 (oitenta e quatro mil e oitocentos reais). No mérito, pugna pelo conhecimento e provimento do recurso, para reformar a decisão agravada.

É o relatório.

Decido.

Inicialmente, esclareço que o tema objeto do processo – ingresso de médico em cooperativa médica Unimed – está suspenso por determinação do TJRN até o julgamento do IRDR 0807642-95.2019.8.20.0000, processo sob a relatoria da Desa. Judite Nunes.

Todavia, o art. 982, § 2º, do Código de Processo Civil permite a concessão de tutelas de urgência, ainda que os processos estejam suspensos em virtude do IRDR, como é o caso dos autos.

Neste sentido, já decidiu esta Corte de Justiça:

PROCESSO CIVIL. INGRESSO DE MÉDICO EM COOPERATIVA MÉDICA. TEMA SUSPENSO NO IRDR 0807642-95.2019.8.20.0000. POSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DE MEDIDAS DE URGÊNCIAS MESMO COM A SUSPENSÃO. ART. 982, § 2º, DO CPC. PECULIARIDADE DO CASO CONCRETO: PAGAMENTO JÁ EFETUADO PELA MÉDICA. CERTIFICADOS OBTIDOS COM A UNIMED APÓS A CONCESSÃO DA TUTELA ANTECIPADA EM PRIMEIRO GRAU. DISTINÇÃO DESTE CASO EM RELAÇÃO AOS DEMAIS. DISTINGUISHING REALIZADO NO ACÓRDÃO EMBARGADO. INEXISTÊNCIA DE CONTRADIÇÃO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. - O tema objeto do processo – ingresso de médico em cooperativa médica Unimed – está suspenso no Estado do Rio Grande do Norte por determinação do TJRN até o julgamento do IRDR 0807642-95.2019.8.20.0000, processo sob a relatoria da Exma. Des. Judite Nunes. - O presente caso, todavia, possui uma peculiaridade que o distingue dos demais: entre a concessão da tutela antecipada em primeiro grau e o julgamento pelo Tribunal, a médica efetuou o pagamento e fez cursos perante a UNIMED. - Diante da peculiaridade citada, impedir a profissional de ingressar na cooperativa médica embargante seria atitude completamente desproporcional. - Assim, nessa situação específica, diante dessa nuance, realizou-se a distinção necessária, permitindo-se que a médica (Larissa Bastos Pimentel) ingressasse na UNIMED. Tal entendimento não se estende aos demais casos que devem ficar suspensos até o julgamento do IRDR acima mencionado. - O valor definido em sede de Agravo, objeto dos presentes embargos, não é o definitivo, pois a decisão quanto ao valor final será conhecido após o julgamento do IRDR, em processamento. - A questão posta nos Embargos de Declaração foi debatida no Acórdão recorrido, não havendo contradição a ser sanada. (AGRAVO DE INSTRUMENTO, 0802685-17.2020.8.20.0000, Dr. EDUARDO BEZERRA DE MEDEIROS PINHEIRO, Gab. Des. João Rebouças na Câmara Cível - Juiz convocado Dr. Eduardo Pinheiro, ASSINADO em 20/10/2020).

Superada essa questão, examino o pedido de suspensividade.

A permissibilidade de concessão do efeito suspensivo ao agravo de instrumento decorre dos preceitos insculpidos nos artigos 995, parágrafo único, e 1.019, ambos do Código de Processo Civil, sendo condicionado o deferimento da suspensividade à demonstração da possibilidade de ocorrência de grave lesão, de difícil ou impossível reparação, sendo ainda relevante à fundamentação do pedido para fins de provável provimento do recurso.

A UNIMED NATAL impugna decisão que deferiu a tutela provisória e a compeliu a incluir a parte autora nos quadros de médicos cooperados na especialidade de Oncologia, após o depósito judicial da quota-parte para ingresso na Cooperativa, no valor de R$ 36.000,00 (trinta e seis mil reais).

É fato que o ingresso de novos cooperados em sociedades cooperativas deve observar as disposições normativas da Lei nº 5.764/71 — que define a Política Nacional de Cooperativismo e institui o regime jurídico das sociedades cooperativas —, no Estatuto Social e no Regulamento Interno da cooperativa.

Por sua vez, nos termos do art. 4º, inciso I, e art. 29, ambos da Lei retromencionada, admite-se exceção ao livre e desmedido ingresso de cooperados quando houver impossibilidade técnica de prestação de serviços. Em outras palavras, quando a cooperativa não tiver mais condições de cumprir suas atividades por ter atingido o limite de sua capacidade.

Muito embora a legislação disponha que o ingresso nas sociedades cooperativas é livre àqueles que assim desejarem, condiciona-o ao atendimento das condições estatutárias, além de ressalvar expressamente o disposto no referido art. 4º, inciso I, vale dizer, excepcionando as hipóteses de ausência de viabilidade técnica.

E, não disciplinando a legislação de regência os critérios e requisitos ensejadores da aludida impossibilidade técnica, cabe ao estatuto da cooperativa fazê-lo. Na espécie, o Estatuto Social da Unimed Natal exige do candidato a associado, além da adesão aos instrumentos normativos da Cooperativa, que haja possibilidade técnica de prestação de serviço. Essa é a redação do artigo 3º do Estatuto Social da agravante.

Por sua vez, os critérios a serem obedecidos para se concluir pela impossibilidade técnica estão previstos no §1º do art. 7º, cuja redação transcrevo abaixo:

§ 1º - A impossibilidade técnica obedecerá aos seguintes critérios:

a) de mercado, que levará em conta o número de usuários e as necessidades de cada especialidade, considerando, sempre, a relação da qualidade do atendimento médico/paciente, estabelecida pela Cooperativa, através de estudo específico para este fim;

b) financeiro-estrutural, considerando-se as disponibilidades da Cooperativa para fazer face às novas admissões, de acordo com os investimentos em apoio logístico e recursos humanos e de forma específica, aumento de reserva técnica, controles e outros custos instituídos pela legislação que rege as operadoras de plano de saúde, observando-se para tanto, a proporcionalidade do número de usuários para cada cooperado.

Em resumo, a impossibilidade técnica excepcionada pelo art. 4º, inciso I da Lei nº 5.764/71 engloba, nos termos das disposições estatutárias da agravante, a inviabilidade operacional decorrente do número excessivo de profissionais em determinada área de atuação, preservando-se a viabilidade econômico-financeira da entidade cooperativa.

No entanto, o conceito de impossibilidade técnica de prestação dos serviços, na visão do Superior Tribunal de Justiça, não pode e não deve ser confundido com reserva de mercado para os profissionais já cooperados, considerando que a entrada de novos cooperados importaria em possível...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT