Decisão Nº 08071259020198200000 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Segunda Câmara Cível, 16-10-2019

Data de Julgamento16 Outubro 2019
Classe processualAGRAVO DE INSTRUMENTO
Número do processo08071259020198200000
ÓrgãoSegunda Câmara Cível
Tipo de documentoDecisão monocrática


PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte
Gabinete do Desembargador Virgílio Macedo Jr.

AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 0807125-90.2019.8.20.0000

AGRAVANTE: UNIMED NATAL

ADVOGADO: ANTÔNIO EDUARDO GONÇALVES DE RUEDA

AGRAVADA: M. R. L. DE M., REPRESENTADA POR SUA GENITORA, SONNIS SOARES DANTAS RIBEIRO

ADVOGADO: ROBERTO ALEXSANDRO LISBOA CÂMARA

RELATOR: DESEMBARGADOR VIRGÍLIO MACEDO JR.

DECISÃO

1. Trata-se de Agravo de Instrumento interposto por UNIMED NATAL contra decisão interlocutória (Id. 4403489 - págs. 54/57) proferida pelo Juízo da 16ª Vara Cível da Comarca de Natal/RN, que, nos autos de Ação de Obrigação de Fazer (Proc. nº 0836971-87.2019.8.20.5001), promovida por M. R. L. DE M., REPRESENTADA POR SUA GENITORA, SONNIS SOARES DANTAS RIBEIRO, deferiu o pedido de tutela de urgência para determinar à agravante, no prazo de 05 (cinco) dias, o fornecimento e custeio, de forma contínua, de tratamento de fonoaudiologia pelo Método PAC - Processamento Auditivo Central, conforme prescrito pela médica assistente, a ser realizado nas quantidades de sessões semanais prescritas pelo médico assistente ou pela fonoaudióloga, até a recuperação da menor ou determinação de alta, sob pena de multa diária de R$ 500,00 (quinhentos reais), limitada ao valor total de R$ 40.000,00 (quarenta mil reais).

2. Aduziu a parte agravante, em suas razões, a ausência dos requisitos autorizadores da antecipação dos efeitos da tutela por falta de documentos que comprovem a negativa de custeio pela operadora.

3. Defendeu que o tratamento requerido pela agravada não está previsto no contrato, ou muito menos na legislação específica sobre o assunto, não estando atendido o requisito da probabilidade do direito.

4. Alegou o tratamento pretendido não está previsto no Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde estabelecido no Anexo I da Resolução Normativa nº 428/2017 da ANS.

5. Pugnou pela atribuição de efeito suspensivo ao recurso ou pela realização da terapia conforme parâmetros do contrato.

6. No mérito, requereu o conhecimento e provimento do agravo de instrumento para reformar a decisão agravada.

7. É o relatório. Decido.

8. Em primeiro lugar, conheço do recurso porque preenchidos os requisitos de admissibilidade, especialmente sendo hipótese do rol taxativo do art. 1.015 do Código de Processo Civil de 2015.

9. A questão trazida ao debate enseja a análise acerca da decisão proferida na primeira instância que deferiu o pedido de tutela de urgência para determinar à agravante, no prazo de 05 (cinco) dias, o fornecimento e custeio, de forma contínua, de tratamento de fonoaudiologia pelo Método PAC - Processamento Auditivo Central, conforme prescrito pela médica assistente, a ser realizado nas quantidades de sessões semanais prescritas pelo médico assistente ou pela fonoaudióloga, até a recuperação da menor ou determinação de alta, sob pena de multa diária de R$ 500,00 (quinhentos reais), limitada ao valor total de R$ 40.000,00 (quarenta mil reais).

10. Consoante disposto no art. 1.019, I, do Código de Processo Civil, o relator poderá, a requerimento do agravante, suspender o cumprimento da decisão até o pronunciamento definitivo da turma ou câmara, ou deferir, em antecipação de tutela, total ou parcialmente, a pretensão recursal, nos casos dos quais possa resultar lesão grave e de difícil reparação, sendo relevante a fundamentação:

"Art. 1.019. Recebido o agravo de instrumento no tribunal e distribuído imediatamente, se não for o caso de aplicação do art. 932, incisos III e IV, o relator, no prazo de 5 (cinco) dias:

I - poderá atribuir efeito suspensivo ao recurso ou deferir, em antecipação de tutela, total ou parcialmente, a pretensão recursal, comunicando ao juiz sua decisão;"

11. No caso em tela, não assiste razão à parte agravante.

12. A despeito da existência de limites de cobertura, por ano de contrato, no Anexo II da Resolução Normativa nº 387/2015 da ANS, a jurisprudência do STJ é firme no sentido de que, ainda que admitida a possibilidade de o contrato de plano de saúde conter cláusulas limitativas dos direitos do consumidor (desde que escritas com destaque, permitindo imediata e fácil compreensão, nos termos do § 4º do artigo 54 do Código de Defesa do Consumidor), revela-se abusivo o preceito excludente do custeio dos meios e materiais necessários ao melhor desempenho do tratamento clínico ou do procedimento cirúrgico coberto ou de internação hospitalar.

13. Destarte, os contratos de plano de saúde se submetem ao Código de Defesa do Consumidor (art. 3º, §2º), de forma que as cláusulas do contrato devem respeitar as formas de elaboração e interpretação consumeristas, conforme disposição da Súmula 469 do STJ:

"Súmula 469: Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde."

14. Ademais, a jurisprudência do STJ é firme no sentido de que, ainda que admitida a possibilidade de o contrato de plano de saúde conter cláusulas limitativas dos direitos do consumidor (desde que escritas com destaque, permitindo imediata e fácil compreensão, nos termos do § 4º do artigo 54 do Código de Defesa do Consumidor), revela-se abusivo o preceito excludente do custeio dos meios e materiais necessários ao melhor desempenho do tratamento clínico ou do procedimento cirúrgico coberto ou de internação hospitalar (STJ, AgInt no AREsp 919.368/SP, Rel. Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, j. 25/10/2016, DJe 07/11/2016; AgRg no AREsp 708.082/DF, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Terceira Turma, j. 16/02/2016, DJe 26/02/2016).

15. No que tange ao tratamento de fonoaudiologia pelo Método PAC - Processamento Auditivo Central, tem-se que a ausência de contemplação no rol de procedimentos determinados pela Agência Nacional de Saúde - ANS como cobertura mínima obrigatória não impede a sua imposição em ação judicial.

16. Isto porque a aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor, consoante previsto na mencionada súmula, possibilita a concretização dos direitos fundamentais à vida e à saúde, à luz da dignidade da pessoa humana, sendo vedado ao plano de saúde limitar os tratamentos terapêuticos indicados pelo profissional para a cura do paciente.

17. Logo, in casu, resguarda-se o direito da agravada à assistência de saúde com fonoaudiólogos a despeito de não constar na cobertura mínima obrigatória definida pelo órgão regulador.

18. Assim, a cobertura do plano de saúde não pode ser negada pelo fato de o tratamento não estar previsto no rol da Agência Nacional de Saúde - ANS, eis que se trata de rol meramente exemplificativo, cuja finalidade é estabelecer quais são os procedimentos mínimos que devem ser observados pelas operadoras de plano de saúde.

19. Com efeito, no caso concreto, mostra-se justificada a necessidade do tratamento, inclusive da utilização do Método PAC - Processamento Auditivo Central, considerando se tratar de criança que apresenta dificuldade na escrita, atraso no desenvolvimento da fala e discriminação auditiva, visando evitar maiores danos ao processo de aprendizagem escolar e melhorar o prognóstico (Id. 4403489 - págs. 32/33).

20. Logo, diante de prescrição médica específica acerca da premência do tratamento de fonoaudiologia pelo Método PAC - Processamento Auditivo Central, resta demonstrada, nessa fase processual e no exercício do juízo de cognição sumária, a necessidade da agravada de extrapolação da cobertura que tem sido oferecida pelo plano de saúde.

21. Ademais, ao limitar o tratamento com psicólogos, terapeutas ocupacionais e fonoaudiólogos, a parte agravante impede a expectativa legítima da prestação dos serviços de saúde contratados, em afronta à prescrição médica.

22. Na mesma esteira, colaciono julgados desta Corte:

“EMENTA: CIVIL. PROCESSO CIVIL. DIREITO DO CONSUMIDOR. AGRAVO DE INSTRUMENTO. DECISÃO QUE DEFERIU ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. PLANO DE SAÚDE. USUÁRIO PORTADOR DE DOENÇA DE PARALISIA CEREBRAL E SÍNDROME DE WEST. RECUSA DA AGRAVANTE EM FORNECER O TRATAMENTO PRESCRITO PELA MÉDICA ASSISTENTE. ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DO MÉTODO SOLICITADO NO ROL DA AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE - ANS, BEM COMO INEXISTÊNCIA DE CLÁUSULA CONTRATUAL QUE AMPARE O PEDIDO. ROL MERAMENTE EXEMPLIFICATIVO. APLICAÇÃO DO CDC AOS CONTRATOS REALIZADOS JUNTO AS OPERADORAS DE PLANO DE SAÚDE. SÚMULA 469 DO STJ. INSTRUMENTO QUE DEVE SER INTERPRETADO DE FORMA FAVORÁVEL AO CONSUMIDOR. INTELIGÊNCIA DO ART. 47 DO CDC. IMPOSSIBILIDADE DE CLÁUSULA QUE RESTRINJA A TENTATIVA DE RECUPERAÇÃO DO USUÁRIO. PROVA DA NECESSIDADE DO MÉTODO TERAPÊUTICO. RISCO DE DANO A SAÚDE DO PACIENTE. DIREITO À VIDA. PRECEDENTE DO STJ E DESTA CORTE DE JUSTIÇA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.”

(TJRN, Ag nº 2016.019059-7, Rel. Des. Cláudio Santos, 1ª Câmara Cível, j. 14/12/2017)

"EMENTA: DIREITO CONSTITUCIONAL E CIVIL. PLANO DE SAÚDE. TRATAMENTO MULTIDISCIPLINAR DE CRIANÇA. LIMITAÇÃO DE SESSÕES. IMPOSSIBILDADE. INCIDÊNCIA DA LEI Nº 9.656/98. ENUNCIADO N° 100 DA SÚMULA DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO. INCIDÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. NEGATIVA INDEVIDA. DESNECESSIDADE DE PRESTAÇÃO DE CAUÇÃO. RECURSO DESPROVIDO."

(TJRN, Ag nº 2017.010682-3, Rel. Des. Ibanez Monteiro, 2ª Câmara Cível, j. 24/10/2017)

23. Assim, não merece guarida a pretensão recursal, na medida em que pode ser imposto o tratamento médico, independente da previsão contratual expressa.

24. Vislumbra-se, diante de tais elementos, a ausência de probabilidade do direito da parte recorrente, de modo que se torna despiciendo analisar acerca do risco de lesão grave ou de difícil reparação, na medida em que a presença concomitante de ambos é necessária para a concessão da liminar recursal.

25. Por essas razões, indefiro o pedido de suspensividade.

26. Intime-se a parte agravada para, querendo, apresentar resposta ao presente recurso no prazo de 15 (quinze) dias, facultando-lhe a juntada dos documentos que julgar...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT