Decisão Nº 08093042620218200000 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Tribunal Pleno, 24-08-2021

Data de Julgamento24 Agosto 2021
Classe processualCONFLITO DE COMPETÊNCIA CÍVEL
Número do processo08093042620218200000
ÓrgãoTribunal Pleno
Tipo de documentoDecisão monocrática


PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
Gab. Des. Amaury Moura Sobrinho no Pleno

DECISÃO

Trata-se de Conflito Negativo de Competência envolvendo o Juízo de Direito do 4.º Juizado Especial Cível, Criminal e da Fazenda Pública (suscitante) e o Juízo de Direito da 3.ª Vara da Fazenda Pública (suscitado, ambos da Comarca de da Comarca de Mossoró/RN, nos autos da Ação Ordinária sob o nº 0804562-97.2020.8.20.5106, na qual a parte autora busca o reconhecimento do exercício de atividade insalubre.

O Juízo suscitado (Juízo de Direito da 3.ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Mossoró/RN), para quem a ação foi originalmente distribuída, declinou da sua competência ponderando que as causas envolvendo entes públicos, cujo valor não ultrapasse 60 (sessenta) salários mínimos, são de competência dos Juizados Especiais da Fazenda Pública, na forma do art. 1.°, da Resolução n.° 47/2014-TJRN.

Por sua vez, o Juízo suscitante (Juízo de Direito do 4.º Juizado Especial Cível, Criminal e da Fazenda Pública da Comarca de Mossoró) alegou que, muito embora seja absoluta a competência dos Juizados da Fazenda Pública em feitos com valor da causa inferior a 60 (sessenta) salários mínimos, os procedimentos do microssistema dos juizados especiais na simplicidade, informalidade e celeridade, nos termos que dispõe o art. 98, I da CF/88, não comporta o processamento de feitos que demandem a realização de perícia, vez que demanda instrução probatória incompatível com seus primados retores.

É o que importa relatar. Decido.

O presente Conflito preenche os requisitos de admissibilidade, razão pela qual dele conheço.

De início, levando-se em conta que a matéria, objeto deste conflito, encontra-se pacificada no Superior Tribunal de Justiça e nesta Corte de Justiça, pelo que, em analogia ao inciso I do parágrafo único do art. 955 do CPC, bem ainda nos princípios da economia, efetividade e celeridade processuais, de plano, entendo que assiste razão à autoridade suscitante (Juízo de Direito do 4.º Juizado Especial Cível, Criminal e da Fazenda Pública da Comarca de Mossoró/RN).

Com efeito, ressai dos autos que se discute o cabimento ou não de perícia em processos que tramitam nos Juizados Especiais da Fazenda Pública dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios e, neste desiderato, registro que o art. 10 da Lei n.° 12.153/2009 prescreve:

"Art. 10. Para efetuar o exame técnico necessário à conciliação ou ao julgamento da causa, o juiz nomeará pessoa habilitada, que apresentará o laudo até 5 (cinco) dias antes da audiência".

Outrossim, infere-se que o art. 2º da Lei 12.153/2009, ao estabelecer os critérios legais de competência, não fixou qualquer impedimento de processamento de ações em razão da necessidade de prova pericial, quando observados os critérios de valor da causa e as hipóteses ali excepcionadas. Confira-se:


Art. 2º É de competência dos Juizados Especiais da Fazenda Pública processar, conciliar e julgar causas cíveis de interesse dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios, até o valor de 60 (sessenta) salários mínimos.

§ 1º Não se incluem na competência do Juizado Especial da Fazenda Pública:

I – as ações de mandado de segurança, de desapropriação, de divisão e demarcação, populares, por improbidade administrativa, execuções fiscais e as demandas sobre direitos ou interesses difusos e coletivos;

II – as causas sobre bens imóveis dos Estados, Distrito Federal, Territórios e Municípios, autarquias e fundações públicas a eles vinculadas;

III – as causas que tenham como objeto a impugnação da pena de demissão imposta a servidores públicos civis ou sanções disciplinares aplicadas a militares.

Discorrendo sobre o preceptivo legal acima, o doutrinador Joel Dias Filgueira Jr[1] leciona que o art. 2º da citada Lei é norma de exclusão da competência, conclui-se, sem maiores dificuldades, que todas as demais ações não arroladas nesse dispositivo (desde que instalados os JEFP) serão ajuizadas nessas unidades especializadas. Trata-se, por assim dizer, de competência residual a ser delineada para as ações passíveis de ajuizamento perante os Juizados Especiais, isto é, por exclusão daquelas ações, matérias, pessoas e valores definidos nesse art. 2º, salvo se ainda não instaladas as unidades ou o valor ultrapassar sessenta salários mínimos”.

Dito isto, urge destacar que a despeito de no primeiro momento esta Corte de Justiça ter se posicionado no sentido de que, quando a ação envolvesse perícia judicial, cuja complexidade fosse além do conceito de exame técnico previsto no art. 10 suso citado, seria incompatível com o rito dos Juizados Especiais, recentemente, passou a se acostar a orientação do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que o fato de se exigir a produção de perícia, por si só, não afasta a competência dos Juizados Especiais, dado que a complexidade probatória deve ser real e onerosa para obstar a competência daquele Juízo, a qual é absoluta nas localidades em que instalado.

Pontue-se que à conclusão acima foi reforçada pela circunstância fática atual de que foi instalado Núcleo de Perícias Judiciais (NUPEJ), com regulamentação estabelecida pela Resolução nº 05-TJ, de 28 de fevereiro de 2018, órgão responsável pelo gerenciamento do cadastramento de interessados em prestar serviços de perícia, exame técnico, dentre outros, com a disponibilização de lista de peritos credenciados, na qual consta diversos profissionais habilitados na área de medicina do trabalho, fatos que lançaram novas luzes sobre o tema, de modo que, repise-se, a jurisprudência desta Corte de Justiça, a qual me filio, alinhou-se no entendimento de que a mera necessidade de realização de perícia para aferir a insalubridade não afronta os critérios da simplicidade, oralidade e celeridade, afastando a competência dos Juizados Especiais.

A propósito:

EMENTA: PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. APLICABILIDADE. JUIZADOS ESPECIAIS DA FAZENDA PÚBLICA. VALOR ATRIBUÍDO À CAUSA. COMPETÊNCIA ABSOLUTA. COMPLEXIDADE DA LIDE. IRRELEVÂNCIA. ARGUMENTOS INSUFICIENTES PARA DESCONSTITUIR A DECISÃO ATACADA. APLICAÇÃO DE MULTA. ART. 1.021, § 4º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. DESCABIMENTO.

I - Consoante o decidido pelo Plenário desta Corte na sessão realizada em 09.03.2016, o regime recursal será determinado pela data da publicação do provimento jurisdicional impugnado. In casu, aplica-se o Código de Processo Civil de 2015.

II - O acórdão recorrido adotou entendimento consolidado nesta Corte segundo o qual a competência dos Juizados Especiais da Fazenda Pública, sendo absoluta, é firmada segundo o valor atribuído à causa, independentemente do grau de complexidade da lide.

III - Não apresentação de argumentos suficientes para desconstituir a decisão recorrida.

IV - Em regra, descabe a imposição da multa, prevista no art. 1.021, § 4º, do Código de Processo Civil de 2015, em razão do mero improvimento do Agravo Interno em votação unânime, sendo necessária a configuração da manifesta inadmissibilidade ou improcedência do recurso a autorizar sua aplicação, o que não ocorreu no caso.

V - Agravo Interno improvido.

(AgInt no RMS 61.265/CE, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, julgado em 09/03/2020, DJe 12/03/2020).

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO DOS ARTS. 165, 458 E 535, II DO CPC/1973. JUIZADOS ESPECIAIS DA FAZENDA PÚBLICA. CRITÉRIOS DE FIXAÇÃO DE COMPETÊNCIA. NECESSIDADE DE REALIZAÇÃO DE PERÍCIA QUE NÃO AFETA A COMPETÊNCIA. AGRAVO INTERNO DA CONTRIBUINTE A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

1. Não há falar em violação dos arts. 165, 458 e 535, II do CPC/1973, tendo em vista que o Tribunal de origem apreciou a lide de forma clara e adotou fundamentação suficiente para negar a pretensão da parte recorrente. Portanto, em não havendo omissão, contradição ou obscuridade no julgado, rejeita-se a tese de violação dos mencionados artigos.

2. A jurisprudência desta Corte entende que a competência dos Juizados Especiais deve ser fixada segundo o valor da causa, que não pode ultrapassar 60 salários mínimos, sendo irrelevante a necessidade de produção de prova pericial, ou seja, a complexidade da matéria.Precedentes: AgRg no AREsp. 753.444/RJ, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 18.11.2015; AgRg no REsp. 1.214.479/SC, Rel. Min. OG FERNANDES, DJe 6.11.2013; AgRg no REsp. 1.222.345/SC, Rel. Min. HAMILTON CARVALHO, DJe 18.2.2011.

3. Agravo Interno da Contribuinte a que se nega provimento.

(AgInt no AREsp 572.051/RS, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 18/03/2019, DJe 26/03/2019).

PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO PROPOSTA CONTRA O ESTADO DO RIO DE JANEIRO. JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA. ARTIGO 2º DA LEI 12.153/2009. NECESSIDADE DE PROVA PERICIAL COMPLEXA. VALOR DA CAUSA INFERIOR A 60 SALÁRIOS MÍNIMOS. COMPETÊNCIA ABSOLUTA.

1. O art. 2º da Lei 12.153/2009 possui dois parâmetros - valor e matéria - para que uma ação possa ser considerada de menor complexidade e, consequentemente, sujeita à competência do Juizado Especial da Fazenda Pública.

2. A necessidade de produção de prova pericial complexa não influi na definição da competência dos juizados especiais da Fazenda Pública. Precedente: REsp 1.205.956/SC, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, DJe 01.12.2010; AgRg na Rcl 2.939/SC, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, Primeira Seção, DJe 18.09.2009; RMS 29.163/RJ, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Quarta Turma, DJe 28.04.2010.

3. Agravo Regimental não provido.

(AgRg no AREsp 753.444/RJ, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 13/10/2015, DJe 18/11/2015). (Grifos acrescidos).

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