Decisão Nº 08095981520208200000 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Câmara Criminal, 11-11-2020

Data de Julgamento11 Novembro 2020
Classe processualHABEAS CORPUS CRIMINAL
Número do processo08095981520208200000
ÓrgãoCâmara Criminal
Tipo de documentoDecisão monocrática

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
Gabinete do Desembargador Saraiva Sobrinho

Habeas Corpus Com Liminar 0809598-15.2020.8.20.0000

Impetrantes: Jorge Ricard Jales Gomes e Felix Gomes Neto

Paciente: Leonardo Bezerra de Medeiros

Aut. Coatora: Juiz da Comarca de Patu

Relator: Dr. Roberto Guedes (Juiz Convocado)

DECISÃO

1. Habeas Corpus impetrado pelos advogados Jorge Ricard Jales Gomes e Felix Gomes Neto em favor de Leonardo Bezerra de Medeiros, apontando como autoridade coatora o Juiz da Comarca de Patu, o qual nos autos 0100105-68.2020.8.20.0125, onde o Paciente se acha incurso nos arts. 33 e 35 da Lei 11.343/06, decretou a custódia cautelar (ID 7816072).

2. Como razões (ID 7194932), sustentam:

i) negativa de autoria e fragilidade probatória quanto ao fummus comissi delicti;

ii) inépcia da denúncia por ausência de justa causa e atipicidade das condutas;

iii) inidoneidade da preventiva;

iv) a necessidade de substituir a reclusão pela modalidade domiciliar, porquanto o Inculpada é genitor de 02 (duas) crianças e 01 (um) adolescente, sendo imprescindível aplicar o precedente do STF no HC 165704;

v) possibilidade de aplicação de cautelares diversas.

3. Pugnam, ao cabo, pela concessão da liminar.

4. Juntam os documentos constantes do ID 7815154 e ss.

5. É o relatório.

6. Conheço parcialmente da ordem.

7. Ora, a determinação de cautelarmente segregar se acha condicionada à indicação de dados concretos, extraídos do caderno processual, denotando a existência de materialidade e de indícios de autoria delitiva (fumus comissi delicti) e a necessidade da clausura (periculum libertatis).

8. Adentrar no âmago da negativa de autoria da conduta imputada (ponto i), além de representar ofensa ao Princípio do Juiz Natural, implicaria na supressão de instância, devendo a tese ser revolvida junto ao primeiro grau, a quem compete o controle da legalidade do encarceramento e o cotejo probatório.

9. Nesse compasso:

“...A tese de que não há prova suficiente de autoria em relação ao agravante consiste em alegação de inocência, a qual não encontra espaço de análise na estreita via do habeas corpus ou do recurso ordinário, por demandar exame do contexto fático-probatório...”.(AgRg no RHC 125.973/SP, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 23/06/2020, DJe 30/06/2020).

10. Daí, não conheço do mandamus nesta parte.

11. Igualmente, a matéria soerguida no ponto iv (prisão domiciliar fulcrada no precedente do STF) deve ser deduzida, primeiramente, junto ao primeiro grau, mormente pelo noticiado na exordial (dependência integral do genitor), sob pena de constituir hipótese de análise per saltum.

12. Logo, malgrado o esforço argumentativo do Impetrante, revela-se inadmissível o processamento do writ quanto a tal temática.

13. De outro bordo, dou seguimento ao remédio constitucional no respeitante às demais objeções.

14. No mais, é de ser negada a medida de urgência.

15. Com efeito, em análise perfunctória, não vislumbro vício formal na denúncia (ponto ii), ao revés, entendo individualizada as condutas típicas do Increpado, na forma do art. 41 do CPP, conforme se denota da peça acusatória constante do ID 7815154 – págs. 02/09.

16. Ora, resta sedimentado na doutrina e jurisprudência o entendimento de que o trancamento da ação penal na via do habeas corpus é medida excepcional, somente cabível quando exsurge, a ausência de justa causa para a sua deflagração e/ou continuidade, a exemplo de Vicente Greco Filho (in Manual de processo penal. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, p. 394):

"No habeas corpus , não se deve fazer o exame da prova de processo em tela, o que é cabível através dos meios de defesa de que dispõe o réu no curso da ação. Todavia, aliando-se o inc. VI do art. 648 com o inc. I, que considera ilegal a coação sem justa causa, a jurisprudência e a doutrina têm trancado a ação penal quando não houver base para a acusação, fazendo, assim, análise das provas. O exame, contudo, não é o mesmo que seria feito pelo juiz ao proferir sentença condenatória ou absolutória. Trata-se de um exame de que deve resultar, inequivocadamente, a ausência, em tese, de possibilidade da acusação, de forma que a absoluta inviabilidade de processo signifique constrangimento indevido. Seria o caso, por exemplo, de ação penal por fato atípico ou em que alguém é acusado sem nenhuma prova que sustente a imputação que lhe é feita".

17. Nessa linha, vem decidindo o STJ, “(...) o trancamento da ação penal somente é possível na via estreita do habeas corpus em caráter excepcional, quando se comprovar, de plano, a inépcia da denúncia, a atipicidade da conduta, a incidência de causa de extinção da punibilidade ou a ausência de indícios de autoria ou de prova da materialidade do delito (...)” (RHC 102.393/SC, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 23/10/2018, DJe 31/10/2018).

18. Na hipótese, todavia, reputo presente o lastro probatório mínimo (materialidade e indícios de autoria) hábil a legitimar a persecução penal, máxime pelos depoimentos de supostos traficantes presos e usuários colhidos na fase investigativa, muito bem esmiuçados no Relatório Policial (IDs 7816101 e ss), mencionando o Paciente como traficante contumaz na região de Patu/RN.

19. Daí, inviável e deveras prematuro o almejado alijamento da instrução, sendo imprescindível seu maior aprofundamento para dirimir qualquer controvérsia na autoria dos crimes imputados.

20. Noutro vértice, não se vê motivação hábil a reformar a decisão vergastada (ponto iii), uma vez lastreada no resguardo do meio social, havendo a Autoridade Coatora fundamentado objetivamente sua imprescindibilidade ante a casuística reportada nos autos e a gravidade concreta do delito (ID 7816072):

“(...) A materialidade do delito encontra-se demonstrada pelos documentos colhidos, notadamente, o Auto Circunstanciado de Destruição de Plantação de Maconha Apreendida em Olho D'Água dos Borges (fls. 191/193) que, segundo a autoridade policial, seria responsável por abastecer os municípios da região (inclusive esta cidade); Extração Preliminar de Aparelhos Celulares (fls. 194/210) dos flagranteados envolvidos com a plantação de maconha retromencionada com mensagens que apontam um possível esquema de tráfico de drogas no eixo Olho D'Água dos Borges/Patu, vejamos:"E disse que os povos de Caraúbas, Patu e lá na rua estão atrás de maconha. Noite já tem um pouco aqui que dá pra vender (...) mande deixar só mais arroz. E as sementes da maconha" (fl. 199). Ato contínuo, as conversas extraídas pelos agentes policiais, prima facie, que os responsáveis pelo cultivo da maconha teriam uma lista de clientes/controle de conta com os nomes dos ora investigados (fl. 201); os depoimentos colhidos no inquérito em testilha, ouvidos policiais militares, pessoas envolvidas com o tráfico e consumo de drogas indicaram os nomes dos investigados como possíveis traficantes, supostamente donos de "Bocas de Fumo" distribuídas pelos bairros desta urbe (fls. 164/190).

De igual modo, há indícios de autoria recaindo nas pessoas dos denunciados, conforme se colhe dos depoimentos obtidos no procedimento investigativo, a saber, os senhores Ramonny Rellison Soares (fls. 175/176), Jackson Leno da Silva Henrique (fls. 177/178), Erenildo Simão de Araújo (fls. 180/181), Edvânio Gomes da Silva (fls. 182/183), Ailton Ferreira Farias (fls. 184/186) e Fernando Calixta de Oliveira (fls. 187/188) apontaram que adquiriam os entorpecentes maconha, cocaína e crack das pessoas de ROBINHO, PRETINHO, MARIA JAINE, JOÃO CAMELO, JOÃO FILHO, CARLOS DO FOMENTO, BETINHO, BRANQUINHO DE ZÉ PINTADA – todos no bairro fomento – MATHEUS DE ALCIDEMA (bairro nova patu), KILMY DA OFICINA (bairro joão pereira), KARILOU (bairro centro), ZECA DE MENINO NOVO (bairro girassol)[1], TAGNO MECÂNICO (oficina) e WESLEY (festas na boate).

Ademais, pelo depoimento da senhora Larissa Abílio Targino (fls. 172/174) há informações de que facções criminosas atuariam no financiamento dos crimes de tráfico de drogas.

Saliento que o tráfico de drogas se enquadra no conceito de crime permanente, com risco constante para as vítimas imediatas, que são os usuários, clientes da mercancia ilícita e a sociedade, vítima mediata. E isso constitui razão suficiente para a prisão preventiva de todo aquele que se dedica a essa atividade, o que se justifica para a garantia da ordem pública...

Registre-se que a garantia da ordem pública visa, entre outros motivos, a evitar a reiteração delitiva, resguardando, assim, a sociedade de maiores danos. Diante da gravidade do delito de tráfico de drogas, materializada concretamente pelos fatos acima narrados, perfeitamente cabível a decretação da prisão dos agentes para resguardar a sociedade de outros crimes dessa natureza, como garantia da ordem pública e como resposta à prestação jurisdicional.

Nesse sentido, entendo que a segregação preventiva é medida que se impõe, pelo menos nesse momento processual, como forma de evitar a prática de novos delitos de natureza grave, com a garantia da ordem pública.

A ideia da garantia da ordem pública não se limita a prevenir a reiteração de fatos criminosos, mas também assegurar o meio social e a própria credibilidade da justiça em face da gravidade do crime e sua repercussão.

A medida de exceção, portanto, tem por escopo evitar que os investigados voltem a cometer delitos da mesma natureza, porque, em liberdade, encontraria o mesmo estímulo relacionado com a infração cometida (...)”.

21. Destarte, observa-se a proficuidade da fundamentação com base em elementos sólidos e sua convergência com as circunstâncias fáticas esmiuçadas na peça acusatória (ID 7815154 – págs. 02/09), decorrente de uma complexa investigação prévia, sinalizando o envolvimento do Inculpado na narcotraficância.

22. De passagem, insubsistente a alegativa de desproporcionalidade da constrição, máxime pelas circunstâncias delineadas, inexistindo...

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