Decisão Nº 08152276120188205004 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, 3ª Turma Recursal, 22-05-2019

Data de Julgamento22 Maio 2019
Classe processualRECURSO INOMINADO CÍVEL
Número do processo08152276120188205004
Órgão3ª Turma Recursal
Tipo de documentoDecisão monocrática

PODER JUDICIÁRIO

JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS E CRIMINAIS

1ª TURMA RECURSAL

RECURSO CÍVEL VIRTUAL Nº 0815227-61.2018.8.20.5004

ORIGEM: 15º JUIZADO ESPECIAL CÍVEL DA COMARCA DE NATAL

JUIZ MONOCRÁTICO: JOÃO HENRIQUE BRESSAN DE SOUZA

RECORRENTE: MARIA DE FATIMA LEITAO

ADVOGADA: JESSYKA BYANKA BASILIO MOREIRA

RECORRIDO: BANCO BMG SA

ADVOGADA: ANA TEREZA DE AGUIAR VALENCA

JUIZ RELATOR: VALDIR FLÁVIO LOBO MAIA

EMENTA: RECURSO INOMINADO. DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. DESCONTOS ATRELADOS Á CARTÃO DE CRÉDITO. VIOLAÇÃO AO DIREITO DE INFORMAÇÃO CLARA PRECONIZADA NO CDC. ONEROSIDADE EXCESSIVA. HIPOSSUFICIÊNCIA DO CONSUMIDOR. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. REFORMA QUE SE IMPÕE. DEVER DE RESTITUIÇÃO EM DOBRO DOS VALORES DESCONTADOS, AUTORIZADA A COMPENSAÇÃO DO VALOR DISPONIBILIZADO MEDIANTE SAQUE. DANO MORAL ARBITRADO EM R$ 3.000,00 (TRÊS MIL REAIS). RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. PRIORIDADE DE TRAMITAÇÃO NOS TERMOS DO ESTATUTO DO IDOSO.

ACÓRDÃO

VISTOS e relatados e discutidos estes autos do Recurso Inominado acima identificado, decidem os Juízes da Primeira Turma Recursal de Natal, Estado do Rio Grande do Norte, à unanimidade de votos, conhecer do recurso e dar-lhe provimento parcial, para determinar a restituição em dobro de todas as parcelas efetivamente descontadas que tenham relação com o cartão de crédito objeto da presente lide, ficando o banco recorrido autorizado a compensar no valor das parcelas a ser restituído à recorrida, os saques realizados e não impugnados por esta, acrescidos de juros e correção a contar da citação, fixando ainda, indenização por danos morais no valor de R$ 3.000,00 (três mil reais), acrescidos de juros de 1% (um por cento) ao mês a contar da citação e correção monetária pelo INPC-A a partir desta decisão, nos termos do voto do relator.

Sem condenação em custas e honorários processuais, em virtude do provimento parcial do recurso.

Natal/RN, 09 de maio de 2019.

VALDIR FLÁVIO LOBO MAIA

JUIZ RELATOR

RELATÓRIO



Trata-se de Recurso Inominado interposto por MARIA DE FATIMA LEITAO em face da sentença que, nos autos da AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE CONTRATUAL C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E REPETIÇÃO DO INDÉBITO, julgou improcedente a demanda, entendendo pela regular contratação entre as partes.

Segue sentença cujo relatório adoto:



  1. I – FUNDAMENTAÇÃO

  2. - DA PREJUDICIAL DE MÉRITO – PRESCRIÇÃO

  3. Considerando que o termo inicial do prazo prescricional somente se dá com o término da avença, não há que se falar em prescrição, haja vista que, embora entabulado em 2012, os descontos questionados jamais tiveram fim, sendo esse justamente o cerne da controvérsia.

  4. Assim, impõe-se reconhecer a inocorrência de qualquer prejudicialidade.

  5. - DO MÉRITO

  6. Presentes os pressupostos de constituição e desenvolvimento válido e regular do processo e atendidas as condições da ação, passa-se ao exame do mérito.

  7. Impende anotar que a lide em apreço comporta julgamento antecipado, por força do disposto no art. 355, I, do CPC, tendo em vista que não há necessidade de produção de outras provas.

  8. No caso, a parte demandada firmou com a parte autora contrato de cartão de crédito consignado, o qual, apesar de tratar-se de contrato atípico, pois não tem previsão no CC nem na legislação esparsa, possui validade diante da permissão contida no art. 425 do CC.

  9. Nesta espécie contratual, o aderente/consumidor contrata empréstimo ou realiza compras e o pagamento ocorre, em parte, pelo desconto, no contracheque, do valor mínimo da fatura do cartão de crédito, sendo o restante cobrado por meio da própria fatura do cartão.

  10. Embora em outros feitos semelhantes este Juízo tenha reconhecido a ofensa ao dever de informação, por parte das instituições financeiras, entendo que o caso sob exame se apresente de modo diverso daqueles, eis que há elementos que permitem concluir que a parte autora tinha e tem conhecimento da lógica de funcionamento do cartão de crédito, tanto que já fez uso do mesmo com a finalidade de crédito.

  11. As faturas anexadas à peça contestatória (não infirmadas pela parte autora) dão conta de que realizou compras (ID 33758285 – Pags. 25 e 26) e efetuou saque (ID 33758285 – Pag. 1), utilizando-se do cartão de crédito fornecido por tal instituição, demonstrando que tem pleno conhecimento da disponibilidade de crédito, bem como da modalidade de quitação do mesmo (por meio do desconto em folha de pagamento de parcela mínima da fatura), tanto que não efetuou qualquer pagamento avulso das faturas: a consequência lógica é que sabia que o débito das operações por ele contratadas seriam debitadas de sua folha de pagamento em percentual mínimo contratualmente estabelecido.

  12. Quanto à alegação de que não lhe teria sido oportunizado o cancelamento do contrato de cartão de crédito, melhor sorte não lhe assiste, na medida em que, para que validamente ponha fim à avença, basta que quite o saldo devedor da fatura.

  13. II – DISPOSITIVO

  14. Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pleitos autorais, nos termos do art. 487, I, do CPC.

Em suas razões recursais, a autora/recorrente alega a nulidade da contratação, asseverando que não obteve informação clara acerca dos termos da avença, incorrendo a instituição financeira recorrida em má-fé. Pugna ao final, pelo conhecimento e provimento do recurso inominado ora interposto, para reformar a sentença, em todos os seus termos, julgando procedente a ação, condenando o recorrido ao pagamento de uma indenização por danos morais, bem como a restituir em dobro os valores pagos a maior, compensando-se a quantia efetivamente utilizada pela autora.

Contrarrazões pelo desprovimento.

É o relatório.

VOTO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso e passo a apreciá-lo.

Compulsando os autos, tenho que merece parcial provimento ao recurso ora interposto.

A relação jurídica travada entre o banco recorrido e a parte autora/recorrente é relação de consumo, na forma dos arts. e e 29 da Lei n. 8.078/90 do CDC. Desta forma, evidente se torna a incidência das regras previstas na mencionada lei para o caso dos autos.

Ademais, o STJ sedimentou a discussão no enunciado sumular de sua jurisprudência dominante de n. 297, verbis: “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”.

O caso em análise versa acerca de desconto realizado pela Recorrente no contracheque da Autora, referente ao contrato de cartão de crédito consignado.

Em relação ao contrato objeto da lide, verifica-se por parte do banco recorrido a clara falha na prestação de serviço, por ferir diretamente normas de proteção ao consumidor e impor a este onerosidade excessiva.

A parte autora, ora recorrente, reconhece que pretendia celebrar contrato de empréstimo consignado, afirmando que não solicitou o cartão de crédito, não sendo esclarecida das reais condições do contrato.

O banco explica que a transação realizada teria ocorrido por meio de um cartão comum onde o titular do cartão autoriza o banco a ser realizado o desconto da fatura diretamente no contracheque ou benefício, respeitado a Reserva de Margem Consignável para obrigações dessa natureza. No caso de cartão de crédito consignado, o art. 1º, §1º da Lei n. 10.820/2003 fixou o percentual de 5% (cinco por cento).

A lei não fixou os critérios de cálculo desses 5%. A Instrução Normativa do INSS n. 28, de 16 de maio de 2008, modificada pela IN INSS/PRES nº 80, de 14/08/2015, reiterou a reserva de até 5% (trinta por cento) para as operações de cartão de crédito? (art. 3º, §1º, II).

Quanto às exigências para a emissão do cartão de crédito consignado, a matéria está devidamente normatizada nos artigos 15 e seguintes da resolução. No particular, destaco os seguintes dispositivos:

Art. 15. Os titulares dos benefícios previdenciários de aposentadoria e pensão por morte, pagos pela Previdência Social, poderão constituir RMC para utilização de cartão de crédito, de acordo com os seguintes critérios, observado no que couber o disposto no art. 58 desta Instrução Normativa:

I - a constituição de RMC somente poderá ocorrer após a solicitação formal firmada pelo titular do benefício, por escrito ou por meio eletrônico, sendo vedada à instituição financeira: emitir cartão de crédito adicional ou derivado; e cobrar taxa de manutenção ou anuidade;

...

Art. 16. Nas operações de cartão de crédito serão considerados, observado, no que couber, o disposto no art. 58 desta Instrução Normativa...

§ 2º A instituição financeira não poderá aplicar juros sobre o valor das compras pagas com cartão de crédito quando o beneficiário consignar a liquidação do valor total da fatura em uma única parcela na data de vencimento.

§ 3º É PROIBIDA A UTILIZAÇÃO DO CARTÃO DE CRÉDITO PARA SAQUE.

Art. 17. A instituição financeira deverá encaminhar aos titulares dos benefícios com quem tenha celebrado contrato de cartão de crédito, mensalmente, extrato com descrição detalhada das operações realizadas, onde conste o valor de cada operação e local onde foram efetivadas, bem como o número de telefone e o endereço para a solução de dúvidas.

Considerando que o banco recorrido teria autorizado saque no cartão, o que é expressamente vedado, já há razão satisfatória para reconhecer a nulidade da contratação mediante SAQUE.

No entanto, passo a analisar as exigências no que diz respeito ao limite de uso do cartão de crédito consignado bem como à taxa de juros.

Atendendo as disposições dos incisos II e VI do art. 58 da Instrução Normativa INSS/PRES nº 28, de 16 de maio de 2008, o Presidente do INSS expediu a Portaria do INSS n. 1.959, publicada no DOU n. 215, de 9 de novembro de 2017, que fixou a taxa de juros e o limite de reserva de margem consignável no cartão de crédito. Eis a redação:

Art. 1º Ficam regulamentados os incisos II e VI do art. 58 da Instrução Normativa INSS/PRES nº 28, de 2008, reduzindo-se o teto máximo de...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT