Demissão e qualificação profissional: a articulação entre o programa seguro-desemprego e o Pronatec

AutorInez Stampa - Moacyr Salles Ramos
CargoDoutora em Serviço Social pela PUC-Rio. Socióloga e assistente social. Pós-doutorado em Sociologia e Antropologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Professora adjunta do Departamento de Serviço Social e do Programa de Pós-graduação em Serviço Social da PUC-Rio. Servidora do Arquivo Nacional, onde coordena o Centro de Referência das ...
Páginas94-117
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Caderno s do CEAS, Salvador, n. 239, p. 771-794, 2016.
DEMISSÃO E QUALIFICAÇÃO PROFISSIONAL: A
ARTICULAÇÃO ENTRE O PROGRAMA SEGURO-DESEMPREGO E O
PRONATEC
Resumo
O artigo tem como objetivo analisar a
qualificação profissional dos trabalhadores que
acionam o Programa Seguro-Desemprego.
Atualmente, ela é desenvolvida através do
Programa Nacional de Acesso ao Ensino
Técnico e Emprego (Pronatec). Apresentamos
as implicações da crise do capital, iniciada no
início dos anos 1970, bem como suas
consequências para o processo de reforma do
Estado e o acirramento das disputas em torno
da proteção social e da política de educação
profissional no Brasil. Utilizamos fontes
primárias e secundárias, além de resultados de
pesquisa empírica. Foi possível constatar que o
pré-requisito do curso de qualificação para
acessar o Programa Seguro-Desemprego
entrou em vigor apenas com a criação do
Pronatec, exatamente num contexto de
diminuição da cobertura desse Programa.
Observou-se, também, que tanto a
obrigatoriedade de qualificação como a
diminuição da cobertura do seguro-
desemprego são exigências da Confederação
Nacional da Indústria, que tem disputado o
fundo público da seguridade social para
qualificar os trabalhadores em suas instituições
de educação. Assim, concluímos que a
qualificação profissional compulsória resulta
na subordinação da proteção social e da
qualificação profissional aos interesses do
mercado. Ademais, problemas
significativos no que tange à orientação e ao
encaminhamento do trabalhador para o
Pronatec, bem como resulta na precarização
dos processos formativos.
Palavras-chave: Programa Seguro-
Desemprego. Pronatec. Proteção Social.
Educação Profissional.
Inez Stampa
Doutora em Serviço Social pela PUC-Rio.
Socióloga e assistente social. Pós-doutorado em
Sociologia e Antropologia pela Universidade
Federal do Rio de Janeiro. Professora adjunta do
Departamento de Serviço Social e do Programa de
Pós-graduação em Serviço Social da PUC-Rio.
Servidora do Arquivo Nacional, onde coordena o
Centro de Referência das Lutas P olíticas no Brasil -
Memórias Reveladas. E-mail:
inestampa@ig.com.br
Moacyr Salles Ramos
Doutorando em Serviço S ocial p ela PUC -Rio.
Mestre em Educação pela Universidade Federal
Rural do Rio de Janeiro, graduado em p edagogia
pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
Pedagogo da Universidade Feder al Fluminense. E -
mail: mramos@id.uff.br
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Caderno s do CEAS, Salvador, n. 239, p. 771-794, 2016.
INTRODUÇÃO
A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad), relativa ao
trimestre junho-julho-agosto de 2016, aponta uma taxa nacional de desocupação de 11,3%.
Em 2015, essa taxa, no mesmo período, era de 8,3%. A mesma pesquisa também mostra que
houve significativa redução do emprego com carteira assinada (IBGE, 2016). Esse quadro
crítico se agrava num contexto em que se debate a possibilidade de congelar os gastos
públicos, implantar sem debate a reforma da previdência e a reforma trabalhista, deixando
o trabalhador em situação de extrema precarização das condições de vida e de
trabalhoEnquanto o desemprego aumenta, o Estado brasileiro adota o viés do “corte de
gastos”, tendendo a limitar, cada vez mais, o acesso dos trabalhadores às ações de proteção
social existentes. Nesse contexto de ampliação do desemprego, que vem se tornando uma
possibilidade real para ampla parcela da classe trabalhadora, ter um amparo financeiro nesse
momento tão difícil ainda é um “privilégio” de poucos. Isso se deve ao fato de o Programa
Seguro-Desemprego brasileiro ter baixa cobertura, conforme apontou o documento “Brasil:
uma estratégia inovadora alavancada pela renda”, divulgado pela Organização Internacional
do Trabalho (OIT) em 2011. O documento também sinalizou para a necessidade de integrar o
Programa Seguro-Desemprego com a política de educação profissional, a fim de aumentar as
possibilidades de reinserção dos trabalhadores no mercado de trabalho (OIT, 2011).
Estudos que apontam a necessidade de encaminhar os trabalhadores para cursos de
qualificação profissional vêm sendo realizados por vários pesquisadores, como Chahad
(1993), Ambrózio (2003), Teixeira (2013) e por institutos de pesquisa, como o Dieese (2003).
Em tempos de desemprego generalizado, a qualificação do trabalhador assume papel central
nos debates sobre a estabilização econômica. Tal importância sugere o deslocamento do
debate político para o campo técnico e o trato psicopedagógico (novas aprendizagens e
adequações) da questão social.
Portanto, a oferta de cursos de qualificação profissional se apresenta como um
mecanismo de “autoproteção” do trabalhador, sendo a sua “empregabilidade” o lócus de
investimentos. Esse movimento de associação do desemprego e da demissão à qualificação
profissional vem desde os anos 1990, com a criação do Plano Nacional de Formação
Profissional (Planfor) e de seu substituto, o Plano Nacional de Qualificação Profissional

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