Os Desafios do Planejamento Tributário Internacional na Era Pós - BEPS

AutorPaulo Ayres Barreto e Caio Augusto Takano
Ocupação do AutorDoutor em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo ? PUC/SP/Doutorando e Mestre em Direito Econômico, Financeiro e Tributário pela Universidade de São Paulo ? USP
Páginas989-1028
989
OS DESAFIOS DO PLANEJAMENTO
TRIBUTÁRIO INTERNACIONAL NA ERA
PÓS-BEPS
Paulo Ayres Barreto1
Caio Augusto Takano2
I – Introito
O momento é de significativa transformação no Direito
Tributário Internacional. Se até há pouco tempo praticamente
não havia resistência à ideia de que seria perfeitamente legí-
tima a economia tributária decorrente de estruturas empre-
sariais verdadeiras, erigidas segundo formas jurídicas permi-
tidas e que não configurassem artifícios dolosos para evitar a
incidência tributária – como impecavelmente ensina
PAULO DE
BARROS CARVALHO
3
–, a intensificação do fenômeno da erosão
1.
Doutor em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo –
PUC/SP. Livre Docente pela Universidade de São Paulo – USP. Professor Associado da
Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo – USP. Professor do Instituto Brasi-
leiro de Estudos Tributários – IBET.
2.
Doutorando e Mestre em Direito Econômico, Financeiro e Tributário pela Universida-
de de São Paulo – USP. Especialista em Direito Tributário pelo IBET. Juiz do Tribunal
de Impostos e Taxas. Conselheiro Julgador do Conselho Municipal de Tributos. Profes-
sor Convidado da Pós-Graduação da FGV Management. Advogado em São Paulo.
3. Cf. CARVALHO, Paulo de Barros. Derivação e positivação no direito tributário.
990
IBET - INSTITUTO BRASILEIRO DE ESTUDOS TRIBUTÁRIOS
da base tributária mundial nas últimas décadas tem gerado,
em contrapartida, uma maior atenção dos Estados no combate
a práticas elisivas das empresas transnacionais, que passaram
a buscar instrumentos para limitar, com maior rigor, o espaço
dentro do qual o contribuinte pode estruturar seus negócios
para otimizar sua carga tributária, sob o pretexto de se garan-
tir a obtenção dos meios econômicos necessários para custear
suas atividades essenciais.
A constante integração econômica e a diminuição de
fronteiras num cenário de acelerado processo de globalização
criaram oportunidades para a estruturação de modelos opera-
cionais em escala mundial, ou planejamentos tributários de na-
tureza global – para referir à expressão de
MICHAEL LENNARD
4
–,
que, dentro dos limites legais, permitem que os contribuintes
possam transferir seus resultados a jurisdições com regras de
tributação mais favoráveis, o que é facilitado pela intensa mo-
bilidade do capital e dos meios de produção.
Tal fenômeno, de erosão da base tributária, não é atribuível
somente a condutas dos contribuintes. As oportunidades para
se reduzirem os tributos devidos em operações transacionais
decorrem, por vezes, de atos de decisão legislativa dos diversos
Estados que deliberadamente oferecem incentivos fiscais de
toda sorte, ou, ainda, em virtude da ausência de uma adequa-
da interação normativa entre o conjunto de regras tributárias
impostas por cada país
5
, que não apenas poderá resultar numa
dupla tributação, mas igualmente em uma dupla não tributa-
ção de um determinado rendimento pelos países envolvidos
6
.
Volume I. São Paulo: Noeses, 2011, p. 88.
4. Cf. LENNARD, Michael. Base erosion and profit shifting and developing country
tax administrations. Intertax, v. 44, n. 10. Alphen aan Den Rijn: Kluwer Law Inter-
national, 2016, p. 740.
5. Cf. SCHOUERI, Luís Eduardo. O Projeto BEPS: ainda uma estratégia militar. In.
GOMES, Marcus Lívio; SCHOUERI, Luís Eduardo (Coord.). A tributação interna-
cional na Era Pós-BEPS: soluções globais e peculiaridades de países em desenvolvi-
mento. Volume I. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2016, p. 30.
6. Cf. OCDE. Action plan on base erosion and profit shifting. Amsterdam: OECD
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Nesse contexto é que deve ser compreendido o projeto
BEPS (Base Erosion and Profit Shifting – BEPS), liderado pela
OCDE. Constatando que os planejamentos tributários das
empresas transnacionais consistiam na exploração de opor-
tunidades decorrentes de tratamentos legislativos conferidos
pelos diferentes países (mismatches), bem como de conceitos
de tributação internacional que não acompanharam o de-
senvolvimento da atividade econômica dos contribuintes7, as
administrações tributárias dos países-membros da OCDE se
viram compelidas a tomar alguma atitude que, a um só tempo,
atendesse à crescente necessidade de receitas para políticas
públicas dos Estados e restabelecesse a legitimidade e a esta-
bilidade do regime tributário internacional8.
Tratando-se de iniciativa dos próprios Estados, não é de
se espantar que a quase totalidade das medidas propostas
no Plano de Ação do Projeto BEPS seja destinada a comba-
ter – direta ou indiretamente9 – aquilo que convencionaram
ser a principal causa da erosão da base tributária: os pla-
nejamentos tributários empreendidos por empresas trans-
nacionais, em especial aqueles considerados “abusivos” ou
“agressivos”, isto é, decorrentes da tomada de posições fis-
cais “audaciosas”10 e que permitem uma economia tributária
Publishing, 2013, p. 9.
7. Cf. OECD. Addressing Base Erosion and Profit Shifting. Paris: OECD, 2013, p. 47.
8. Cf. BRAUNER, Yariv. What the BEPS? Florida Tax Review, n. 2, v. 16. Gainesvil-
le: University of Florida College of Law, 2014, p. 60.
9. Diretamente, por meio de ações que visam especificamente à implementação de
medidas para combater tais planejamentos pela alteração das normas de direito in-
ternacional que propiciaram erosão de base tributária (p. ex.: Ação 6 – “Prevenção
de abuso dos tratados”) ou, indiretamente, por intermédio de ações que visam a
aumentar a cooperação entre Estados ou entre Estados e contribuintes, bem como
permitir a troca de informações em matéria tributária (p. ex.: Ação 11 – “Estabele-
cer metodologias para coleta e análise de dados sobre BEPS e as ações para seu
enfrentamento”).
10. Cf. SCHOUERI, Luís Eduardo. O Projeto BEPS: ainda uma estratégia militar.
In. GOMES, Marcus Lívio; SCHOUERI, Luís Eduardo (Coord.). A tributação inter-
nacional na Era Pós-BEPS: soluções globais e peculiaridades de países em desenvol-
vimento. Volume I. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2016, p. 31.

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