Destinos, escolhas e a democratização do ensino superior

AutorMaria Ligia de Oliveira Barbosa
CargoProfessora associada da Universidade Federal do Rio de Janeiro, onde coordena o LAPES (Laboratório de Pesquisa em Ensino Superior/UFRJ/CNPq)
Páginas256-282
DOI: http://dx.doi.org/10.5007/2175-7984.2015v14n31p256
256 256 – 282
Destinos, Escolhas e a
Democratização do Ensino Superior
Maria Ligia de Oliveira Barbosa1
Resumo
Este artigo analisa algumas das diversas políticas (tanto governamentais quanto institucionais)
que visam a assegurar o acesso e a permanência dos estudantes até a conclusão dos cursos no siste-
ma brasileiro de ensino superior. Trata-se de uma tentativa de avançar na discussão sobre qual seria
uma democratização possível para esse sistema. O artigo busca verif‌icar se, apesar da manutenção
dos padrões de desigualdade estrutural, de prestígio e renda, seria possível encontrar políticas que
se contraponham a essa tendência. Foram analisadas as políticas de cotas raciais e sociais, o Reuni
e o ProUni, bem como o programa de interiorização da Universidade Federal Fluminense (UFF)
e de estágios e bolsas na Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-Minas). Foram
utilizadas pesquisas feitas por pesquisadores do LAPES/UFRJ/CNPq. O material analisado permite
conf‌irmar a existência de ações e políticas que criam probabilidades efetivas de que Escolhas dos
indivíduos e grupos possam prevalecer sobre os Destinos socialmente desenhados para eles.
Palavras-chave: Ensino Superior. Democratização. Políticas sociais. Acesso ao ensino superior.
Permanência no ensino superior.
1 Introdução
Nos últimos tempos, o tema do ensino superior saiu de sua discrição
usual e ganhou destaque, aparecendo, inclusive, como capa de uma revista
internacional de enorme circulação2, sendo objeto de inúmeras reportagens
em jornais brasileiros de grande circulação, possivelmente o nível terciário de
ensino tenha, nalmente, entrado na agenda pública. Para as famílias, e não
1 Professora associada da Universidade Federal do Rio de Janeiro, onde coordena o LAPES (Laboratório de
Pesquisa em Ensino Superior/UFRJ/CNPq).Tem experiência na área de Sociologia, com ênfase em Sociolo-
gia da Educação, atuando principalmente nos nostemas: desigualdades sociais, ensino superior e prof‌issões.
É Vice-Presidente para América Latina do RC04 - Sociology of Education - da ISA (International Sociological
Association) 2010-2014 e 2014-2018. http://lattes.cnpq.br/5436482713562659
2 The Economist, em 28 de março de 2015. (http://www.economist.com/printedition/2015-03-28 ) Nessa edição,
a revista britânica faz uma longa reportagem especial sobre as universidades no mudo de hoje. Começando
pela debate que opõe Excelência versus Equidade, passando pela instalação da New York University em Abu
Dhabi, a reportagem também mostra a desvalorização do ensino superior tecnológico, em todo mundo consi-
derado como “pouco classudo”, responsável pela desvalorização social desse segmento de formação.
Política & Sociedade - Florianópolis - Vol. 14 - Nº 31 - Set./Dez. de 2015
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apenas aquelas da classe média tradicional, a possível entrada de seus lhos na
universidade tornou-se assunto de interesse. Para os analistas dos mais diver-
sos matizes, o funcionamento adequado das instituições de ensino superior
tem se tornado um elemento central na armação dos princípios democráti-
cos e da igualdade de oportunidades nas sociedades modernas, como indicou
o então editor da revista internacional, John Micklethwait. A entrada do tema
na agenda pública pode ser um indicativo de que talvez Backer (2014) tenha
alguma razão na sua visão do sistema de ensino, principalmente superior, seja
o núcleo propulsor de uma revolução que alterou profundamente as socieda-
des ocidentais nos últimos 150 anos. De sua perspectiva, mais que um fator
associado à modernização da sociedade, a Educação Escolar – particularmente
nas instituições de ensino superior – seria a principal e grande matriz da or-
ganização da vida social. Não apenas uma das revoluções que conjuntamente
produziram a modernidade (segundo Raymond Williams: industrial, urbana,
cultural, educacional), mas A Revolução que, nos últimos 150 anos, redese-
nhou os critérios de hierarquização social, os padrões de produção cientí-
ca, as práticas médicas, as formas de organização familiar, o tecido urbano
(BACKER, 2014). Enm, a revolução que teria redesenhado o mundo social.
Mesmo se há exagero, o tema é incontornável atualmente: o sistema de ensino
superior tornou-se, mais que o “Destino” de uns poucos privilegiados, uma
escolha possível para muitos cidadãos.
No espaço do Laboratório de Pesquisa sobre Ensino Superior LAPES/
UFRJ/CNPq têm sido discutidas aquelas que parecem ser as questões centrais
colocadas pela expansão recente do sistema de ensino superior brasileiro. Exa-
minando a entrada signicativa de estudantes de origens sociais mais populares
ou a permanência do viés acadêmico, os trabalhos do LAPES buscam analisar
as condições sociais para uma possível democratização do ensino superior bra-
sileiro. Nesse quadro, este artigo analisa algumas das diversas políticas (tanto
governamentais quanto institucionais) visando a assegurar a permanência dos
estudantes até a conclusão dos cursos. Na verdade, este estudo é uma tentativa
de avançar na seguinte discussão proposta por François Dubet (2015): qual a
democratização possível para o nosso SES3? Se há indícios de que a fortíssima
expansão não reduziu padrões de desigualdade estrutural (medidas de prestígio
3 Sistema de Ensino Superior (SES)

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