Diário dos Municípios Mineiros – Entidades de Direito Público, 23-10-2014

Data de publicação23 Outubro 2014
SeçãoDiário dos Municípios Mineiros
MINAS GERAIS DIÁRIO OFICIAL
DOS PODERES
DO ESTADO
Caderno 2 PubliCações de TerCeiros e ediTais de ComarCas
CIRCULA EM TODOS OS MUNICÍPIOS E DISTRITOS DO ESTADO ANO 122 – Nº 199 – 16 PÁGINAS BELO HORIZONTE, quINTA-fEIRA, 23 dE OuTuBRO dE 2014
VENdA AVuLsA: CAdERNO I: R$1,00 • CAdERNO II: R$1,00 www.iof.mg.gov.br
SUMÁRIO
Entidades de Direito Público ..............................................................1
Particulares e Pessoas Físicas ..............................................................3
Câmaras e Prefeituras do Interior ...........................................................6
Editais de Comarcas ....................................................................14
PUBLICAÇÕES DE TERCEIROS
E EDITAIS DE COMARCAS
Entidades de
Direito Público
Companhia Brasileira de Trens Urbanos - Superintendência Regional
de Trens Urbanos de Belo Horizonte - Aviso de Licitação – Pregão Ele-
trônico Nº 085-2014/GOLIC/CBTU-STU/BH - Objeto: Prestação de
Serviços de venda de bilhetes, cartões e créditos para cartões (integra-
ção intermodal); controle e scalização do acesso de usuários nas linhas
de bloqueios; atendimento ao público; acompanhamento da conferên-
cia dos valores arrecadados nas estações; suporte técnico de processa-
mento do sistema de bilhetagem automática. - Entrega das Propostas:
até 06/11/2014 as 10h00min. - Abertura das Propostas: 06/11/2014 as
10h00min. - Início da Disputa: 06/11/2014 as 10h30min. - Edital para
consulta na Gerência Operacional - Licitação e Compras – GOLIC,
na Rua Januária, 181, 4º andar, Floresta, BH/MG, de 09h00min as
11h00min e 14h00min as 17h00min, onde poderá ser adquirido ao
custo de R$ 0,15 (quinze centavos) por folha ou sem ônus no site www.
licitacoes-e.com.br (Número da licitação: 561710) ou através de soli-
citação pelo e-mail: hgsampaio@cbtu.gov.br. A licitação será realizada
no site do Banco do Brasil. Outras informações: E-mail: hgsampaio@
cbtu.gov.br. HENRIQUE GUIMARÃES SAMPAIO
PREGOEIRO
5 cm -21 622148 - 1
DESPACHO Nº 81, DE 19 DE
SETEMBRO DE 2014
A PRESIDENTA INTERINA DA FUN-
DAÇÃO NACIONAL DO ÍNDIO
FUNAI, em conformidade com o § 7º
do art. 2º do Decreto 1775/96, tendo
em vista o Processo FUNAI/BSB nº
08620.040804/2013-89, e a
determinação judicial proferida na Ação Civil Pública nº 1854-
98.2014.4.01.3807, em trâmite na 3ª Vara Federal de Montes Claros/
MG, e considerando o Relatório Circunstanciado de Identicação e
Delimitação, decide:
Aprovar as conclusões dos estudos de identicação e delimitação da
Terra Indígena Xacriabá, de ocupação tradicional do povo indígena
Xakriabá, localizada nos municípios Conego Marinho, Itacarambi e
São João das Missões, Estado de Minas Gerais, consubstanciadas no
resumo do citado Relatório Circunstanciado.
MARIA AUGUSTA BOILITRREAU ASSIRATI
RESUMO DO RELATÓRIO CIRCUNSTANCIADO DE REESTUDO
DE LIMITES DA TERRA INDÍGENA XACRIABÁ
Referência: Processo 08620.040804/2013-89. Terra Indígena:
Xacriabá. Localização: Municípios de Itacarambi, São João das Mis-
sões e Cônego Marinho, no Estado de Minas Gerais. Superfície apro-
ximada: 43.357 ha (quarenta e três mil, trezentos e cinquenta e sete
hectares). Perímetro aproximado: 184 Km. Povo Indígena: Xakriabá.
Tronco Macro-Jê, família Jê, subgrupo Akwen. População: 7.788 indi-
víduos (FUNASA/2009). Grupo Técnico constituído por meio da Por-
taria nº1096/PRES/2007 de 13 de novembro de 2007, coordenado pelo
antropólogo Jorge Luiz de Paula.
I. DADOS GERAIS
A origem do povo Xakriabá remete a uma cisão ocorrida entre grupos
falantes de língua Jê, tronco Macro-Jê, durante a travessia do rio São
Francisco. Tal informação é coerente com os estudos de etnolinguística
e a tradição oral dos Xerente e Xavante, que se referem às cisões ocor-
ridas ao longo do tempo que deram origem aos atuais Akwen. Esses
grupos teriam iniciado sua trajetória entre as nascentes dos rios São
Francisco e Araguaia e vivido dois movimentos de dispersão: o pri-
meiro há aproximadamente três mil e o segundo num período entre mil
e dois mil anos atrás. Embora hoje não se registre o uso franco da sua
língua pelos membros do grupo, considera-se um modo distintivo do
falar Xakriabá, uma espécie de registro dialetal do português. Esta
forma peculiar da língua vem sendo registrada nos materiais didáticos e
literários elaborados no âmbito do programa de formação de professo-
res indígenas. Existem informações de que parte do vocabulário
Xakriabá ainda seja reproduzida em contextos rituais, especialmente no
Toré, onde se ingere a Jurema (planta de efeito psicoativo). Existem
outras tentativas de registro da língua original, vericando-se que, por
diversas alternativas, há um desejo dos Xakriabá de resgatá-la. Datam
de meados do século XVI e início do século XVII as primeiras expedi-
ções portuguesas que atingiram o Vale do Alto-Médio São Francisco,
na região próxima à conuência dos rios Carinhanha e Verde, onde se
situam as terras indígenas Xacriabá e Xakriabá/Rancharia. Mas somente
no nal do século XVII se iniciou uma ocupação sistemática da região.
Na última década daquele século, o mestre-de-campo paulista Matias
Cardoso de Almeida foi autorizado a organizar uma expedição a m de
“restaurar a segurança dos sertões”. Tratava-se de franquear o sertão à
expansão da criação de gado, liberando também o caminho do São
Francisco dos ‘perigos’ que representavam os índios, quando já come-
çava a se rmar a atividade extrativa das minas recém descobertas.
Matias Cardoso, partindo de São Paulo em 1692, atingiu a margem
direita do São Francisco, na altura da conuência deste com o Rio
Verde, onde fundou um arraial. Os indígenas encontrados na região,
referidos genericamente como Caiapós ou como “Chacriabás”, foram
escravizados. Os Xakriabá também eram regionalmente conhecidos
como Gamela, denominação atualmente pouco frequente, empregada
em contextos jocosos. A partir do início do século XVIII registra-se o
nome de Januário Cardoso de Almeida, lho de Matias Cardoso, que
teria se estabelecido nesta região. Este encontrou o arraial fundado por
seu pai em decadência, povoado por parte da guarnição por este ali dei-
xada e por “íncolas mansos”, removendo por duas vezes o povoamento
e fundando um novo arraial, que se tornaria conhecido como Morri-
nhos, atual núcleo do município de Matias Cardoso. O rio São Fran-
cisco era povoado de grupos indígenas “bravios e desconados”, dentre
os quais dois grupos ditos Caiapós, respectivamente na região próxima
ao Rio Japoré e na zona entre os Rios Paracatu e Urucuia, margem
esquerda do São Francisco. A pacicação se iniciaria pela incorporação
das “tribos mansuetas” — cujas aldeias teriam sido transformadas em
arraiais —, seguida de guerra aos Caiapó, que veriam destruídas suas
principais aldeias: a dos Guaíbas e Tapiraçaba, localizadas em pontos
estratégicos para a navegação do rio. Em 1728, Januário Cardoso,
“administrador dos Índios”, doou terras aos índios aldeados, dando
ordem para que à Missão fossem recolhidos os que ainda andassem
pelas “fazendas alheias”. A doação, mais que um acordo entre coloniza-
dores e índios, deve ser vista como procedimento referendador da auto-
ridade colonial imposta aos índios, produto de um compromisso entre o
poder eclesiástico e o poder local. Em 1856 — logo após a promulga-
ção da Lei de Terras de 1850, que colocava em disponibilidade as terras
não reclamadas e não registradas em Cartório —, o termo de doação
assinado por Januário Cardoso foi registrado tanto em Ouro Preto como
em Januária. A doação foi incorporada à história oral e à identidade do
grupo, de tal forma que ela é recitada no ritual do Toré até hoje. A his-
tória dos Xakriabá está, portanto, intimamente ligada a esse fato, por ter
possibilitado a manutenção da posse comum indígena na área, sendo
que o território, socialmente reconhecido, é fator de identicação,
defesa e força do povo. Local e regionalmente, as terras doadas tornar-
se-iam conhecidas, no século XX, como as “terras” ou o “terreno dos
caboclos”, patrimônio indiviso de um conjunto de “herdeiros”: os
“sucessores dos índios de São João das Missões”. Até a efetiva inter-
venção da RURALMINAS, em meados da década de 1960, quando as
terras dos índios de São João das Missões foram declaradas devolutas,
os poderes públicos reconheciam os direitos dos sucessores dos índios.
Ao considerar os moradores da terra como não-índios, presumindo que
isso automaticamente extinguiria o direito dos sucessores à terra,
criou-se a possibilidade legal de classicação das terras como devolu-
tas. Entre os anos de 1960 e 1980, em meio a um contexto conituoso,
quando os Xacriabá procuraram a FUNAI em busca do reconhecimento
de seus direitos, houve um longo período em que foram levantadas sus-
peitas sobre a “indianidade” do grupo. Isso se devia ao fato de os
Xakriabá não apresentarem as características estereotipadas daquilo
que é considerado um grupo indígena pelo senso comum, perspectiva
etnocêntrica superada denitivamente com o advento da Constituição
Federal de 1988. Com base na legislação da época e fruto de negocia-
ções entre a FUNAI e o Governo do Estado de Minas Gerais, foram
estudadas várias propostas de delimitação da terra indígena, levando
em conta principalmente critérios políticos e sociais – não critérios téc-
nicos –, buscando minimizar os impactos da demarcação sobre a popu-
lação não índia e sobre os projetos de colonização em curso. Aventou-se
a hipótese inicial de demarcação de apenas 10.000 ha, depois de 25.000
ha e, nalmente, optou-se pela demarcação dos 46.000 ha que foram
efetivados em 1987 (conforme Decreto nº 94.608, de 14.07.87). Toda-
via este processo excluiu indevidamente signicativa parcela da popu-
lação Xakriabá, tanto que a própria aldeia Rancharia, uma das maiores
aldeias existentes na época, que era conhecida e frequentemente citada
no processo de demarcação, sendo assistida pelo Posto Indígena (PIn)
Xakriabá desde o início dos anos de 1970, foi excluída da demarcação.
Essa falha somente veio a ser corrigida anos depois, com os estudos de
identicação e delimitação da Terra Indígena Xakriabá/Rancharia
determinados pela Portaria 1.012/PRES, de 11.11.1996. A TI Xakriabá/
Rancharia foi homologada por meio do Decreto s/nº, de 05.05.2003,
com superfície de 6.798 ha. Mas, logo após a Terra Indígena Xakriabá/
Rancharia ter sido declarada, a FUNAI recebeu contestações das pró-
prias lideranças Xakriabá. Em 2001 membros da comunidade Xakriabá
da aldeia Peruaçu informaram que esse segundo procedimento adminis-
trativo, além de ter dividido ao meio a comunidade de Rancharia,
excluíra outras localidades tradicionalmente utilizadas, como a Lagoa
da Jaíba, a Mata da Jurema, parte do Boqueirão, Missões, Dizimeiro,
Jequitibá do Morro Vermelho, Imburana, Coqueiro, Tenda e Morrinho.
Soma-se a isso o início de um movimento capitaneado pelo índio
Xakriabá Santo Caetano Barbosa, da aldeia Morro Vermelho, que reu-
niu um grupo de índios “desaldeados” que moravam na periferia da
cidade de São João das Missões, reivindicando a demarcação de terras
para seu grupo. Em função dessa reivindicação, o antropólogo-coorde-
nador do GT Xakriabá/Rancharia voltou a campo em 2003 e reconhe-
ceu a existência de ocupação tradicional indígena fora da terra demar-
cada e, portanto, admitiu o erro na proposta de limites apresentada pelo
GT. Por esse motivo, a FUNAI, no ano de 2006, enviou outro antropó-
logo à área, que conrmou a existência de erro, fato que motivou o pre-
sente procedimento administrativo.
II. HABITAÇÃO PERMANENTE
Em termos demográcos, segundo dados de 2009, os Xakriabá for-
mam uma população de 7.788 indivíduos, distribuída em 27 aldeias
e 25 “subaldeias”, totalizando, portanto, 52 localidades. Os Xakriabá,
para se referir às unidades locais de seu território, podem usar o nome
“comunidade”, que tem sentido mais abrangente, podendo se referir a
qualquer aglomerado de casas ou a uma área que englobe certo número
de unidades residenciais isoladas. Porém, é comum que usem os ter-
mos “aldeia” e “subaldeia”. A diferença entre uma aldeia e uma subal-
deia é denida, principalmente, pela existência ou não de uma lide-
rança política de prestígio e relativamente autônoma na localidade. Na
atualidade, este sistema é expresso na liderança de um Cacique-Geral,
eleito em assembleia. Em termos sociopolíticos, tem-se que o sistema
político Xakriabá é baseado em uma liderança hegemônica centrali-
zada, transmitida pela linhagem familiar dos Gomes de Oliveira. Tal
sistema é sustentado pela existência de outras lideranças familiares que
o reconhecem e que exercem poder em esfera local. O Cacique-Geral
governa associado a um Conselho de representantes locais, os quais
exercem a chea em cada aldeia. A localização das aldeias é condicio-
nada à disponibilidade de água, se organizando em torno de espaços
onde há olhos d’água ou cursos perenes. Esse modelo de ocupação é
de certo modo previsível, por se tratar de uma região com severo dé-
cit hídrico, sendo a presença de corpos d’água um fator determinante
para a sobrevivência. As aldeias estão distribuídas de forma a ocupar
todas as fronteiras da terra indígena, assegurando a posse indígena do
território. A região menos povoada é a das aldeias Dizimeiro e Riacho
dos Buritis, dominada pelo cerrado, onde há pouquíssima disponibili-
dade de água. Porém, trata-se de região de extrema importância para os
Xakriabá, especialmente pelos recursos de caça e coleta, estando bem
preservada ambientalmente. A vulnerabilidade desta região e também
da área de Poções se conrma pelas notícias de invasões de caçadores
não-índios. Ao longo dos controversos processos de demarcação ante-
riores, vários subgrupos Xakriabá foram excluídos, embora mantives-
sem laços de parentesco, sociais e políticos com os Xakriabá das aldeias
localizadas no interior das duas terras indígenas demarcadas. As comu-
nidades Xakriabá existentes no interior da terra indígena ora delimitada
são: Caraíbas, Vargem Grande, Dizimeiro, Poções, Remanso, Ilha do
Capão, Morro Vermelho e parte da comunidade Rancharia, que cou
excluída da TI Xakriabá /Rancharia devido à construção da rodovia BR
135, que divide a comunidade ao meio.
III. ATIVIDADES PRODUTIVAS
As terras onde os Xakriabá habitam tradicionalmente são marcadas
pelo clima semi-árido, que condiciona e muitas vezes limita as possibi-
lidades de desenvolvimento de atividades produtivas. Por este motivo,
a exploração econômica de seu território sempre dependeu da presença
da água e do uso seletivo dos recursos naturais disponíveis. Isso implica
acesso aos diferentes tipos de ambiente existentes em seu território. O
Termo de Doação já considerava esta necessidade, reconhecendo a ocu-
pação dos Xakriabá e assim estabelecendo o rio para as pescarias, os
“geraes” (cerrado) para as caçadas e “meladas” (coleta de mel de abe-
lhas) e o brejo para a morada e o plantio. As terras atualmente demar-
cadas não abrigam esta diversidade de ambientes e foram degradadas
ao longo dos anos. Os rios que nelas existem são de pequeno porte e já
não são perenes. Boa parcela do cerrado foi transformada em pastos e
as matas são escassas. Entre as interferências negativas estão os gran-
des empreendimentos de irrigação, os quais visaram exclusivamente o
atendimento à demanda dos produtores não índios. Dentre eles, desta-
ca-se a barragem construída pela Companhia de Desenvolvimento do
Vale do São Francisco -CODEVASF no rio Itacarambi, que provocou
a inundação de terras férteis que os Xakriabá utilizavam. A agricultura
praticada pelos Xakriabá é, na maior parte, voltada para subsistência.
Um eventual excedente da produção é comercializado na própria terra
indígena ou nos municípios vizinhos (São João das Missões e Itaca-
rambi). Para os Xakriabá, a fertilidade de uma área está intimamente
ligada à exuberância da vegetação que lá existia. As regiões de “mata”
próximas aos rios são as mais visadas para esta prática. As culturas
agrícolas produzidas podem ser divididas de acordo com o domínio
de bioma (“Gerais” e “Mata”). Na região da “Mata” há produção de
milho, feijão, mandioca, abóbora, feijão catador, cana-de-açúcar, fei-
jão de arranca, melancia, batata-doce, limão, laranja, abacate, acerola,
manga, maracujá, goiaba e horticulturas. Na região dos “Gerais” o uso
do solo é mais restrito e ocorrem predominantemente plantações de
mandioca, mamona, feijão (catador, andu e de arranca) e algumas fru-
tas, como a melancia e a manga. Os índios que vivem na região dos
“Gerais” complementam sua produção com o extrativismo de frutos do
cerrado. A escassez de animais para caça é atribuída à caça predatória e
à devastação de áreas de refúgio provocadas por não índios. As princi-
pais espécies caçadas são: paca, cutia, mocó, tatu, perdiz, lambu, juriti,
caititu. São animais considerados impróprios para a caça, por fazerem
a chamada “limpa” (predam animais “indesejados”), a ema e a seriema.
A principal técnica de caçada é a “espera” nos “barreiros”, locais em
que os animais vêm lamber o barro onde existe sal de origem mine-
ral. Também são especialmente procuradas para a “espera” árvores que
estão produzindo frutos ou ores apreciados pelos animais, dentre as
quais o Ipê, cujas ores são alimento para os veados; o Pequi, usado na
dieta dos caititus, queixadas, tatus e veados; o Umbu d’anta, o Buriti e
diversas outras árvores frutíferas, que são atrativos para diversos tipos
de caça (anta, veado e porcos). Para a caça de aves são usados “pios”,
instrumentos de sopro que imitam os sons das aves, para atraí-las. A
caça praticada pelos Xakriabá não tem qualquer interesse comercial e
sua importância enquanto fonte protéica é relativa, mas ainda relevante,
especialmente nos períodos de maior carência alimentar. Ao levantar as
espécies vegetais utilizadas pelos Xakriabá, percebe-se que há extrati-
vismo de recursos em toda parte (“gerais”, “mata”, vegetação secundá-
ria, matas ciliares etc.). As principais espécies levantadas foram: pequi,
umbu, pimenta-da-costa, sucupira-branca, umburana, buriti, jatobá-do-
cerrado, entre outros. Alguns produtos de coleta têm potencial mercado
para venda, como a favela e a pimenta de macaco. Os Xakriabá estão
articulados com a Cooperativa Grandes Sertões, que busca introduzir
no mercado produtos da agricultura familiar. São criados animais ao
redor das casas, como galinhas, bode/cabrito, cabra, carneiro, peru,
cocá (galinha d’angola), pato e porco. O gado é criado em sua maior
parte “na solta”, em áreas de pasto ou de vegetação secundária. Tem
havido um grande investimento das famílias na aquisição de gado,
tanto leiteiro quanto para corte. Também são criados equinos e muares,
importantes meios de transporte. Os Xakriabá de todas as aldeias costu-
mavam ir até o Rio São Francisco para pescar, porém, com a implanta-
ção de grandes fazendas e o cercamento dos lotes, tornou-se difícil essa
prática, ainda mais devido ao permanente estado de conito fundiário
vericado desde a década de 1970. Na Ilha do Capão e na comunidade
do Remanso, localizadas à beira do rio São Francisco, há um consumo
da carne de peixe consideravelmente maior e tradições mais voltadas
para o pescado. O rio Itacarambi teve sua capacidade pesqueira dras-
ticamente diminuída devido a intervenções antrópicas. A implantação
da barragem da CODEVASF e outras de pequeno porte para captação
de água para irrigação e o assoreamento das nascentes têm prejudicado
muito a proliferação da ictiofauna. A produção artesanal de cerâmica é
uma das atividades tradicionais dos Xakriabá que vem perdendo espaço
no seu cotidiano, mas ainda se fabricam telhas, tijolos e potes para
água; está sendo desenvolvido um projeto de artesanato em cerâmica
na Casa de Cultura dos Xakriabá. No projeto se pode constatar que o
artesanato ainda está vivo, principalmente na memória das mulheres, as
quais estão ensinando aos mais jovens como fazer panelas, pequenos
animais, bijuterias e outras peças. Estudos recentes sobre a situação
econômica atual dos Xakriabá tratam das mudanças no modo de vida
decorrentes da redução do acesso a terras férteis, diminuição dos recur-
sos hídricos e deterioração ambiental, associadas às transformações
demográcas (crescimento populacional), econômicas (acesso a recur-
sos nanceiros de programas de governo), políticas (ascensão dos indí-
genas na gestão dos recursos públicos) e à popularização dos meios de
comunicação e acesso aos meios de transporte modernos.Vericou-se,
porém, que as ligações que os Xakriabá mantêm com os municípios do
entorno são eventuais e consistem sobretudo em relações de trabalho.
Enfatize-se que, apesar da crescente monetarização das relações, da
ligação com mercados e agentes externos e da degradação ambiental do
entorno, a população Xakriabá guarda características de uma sociedade
indígena tradicional, características essas expressas em suas relações de
troca e nas formas de convivência e de organização social.
IV. MEIO AMBIENTE
A TI Xacriabá está inserida na região do polígono das secas no norte
de Minas Gerais, sujeita a prolongadas estiagens e com diferentes índi-
ces de aridez. A região se caracteriza por alto grau alto de antropiza-
ção, com áreas nos mais diferentes estágios de sucessão, desde a total
degradação até zonas de estágio sucessional avançado. Na economia
destacam-se a pecuária extensiva de corte e a agricultura. Situa-se
numa zona de transição entre dois grandes biomas, o Cerrado e a Caa-
tinga. O regime pluviométrico condiciona os Xakriabá a fazerem des-
locamentos sazonais dentro e fora das terras indígenas demarcadas.
Aqueles que moram nas áreas ribeirinhas, como as comunidades de
Remanso e Ilha do Capão, durante as cheias do Rio São Francisco são
obrigados a se deslocarem para áreas mais altas. Tradicionalmente, eles
iam para áreas que hoje estão ocupadas por fazendas de gado, mas que
antes abrigavam matas e grande variedade de recursos de caça e coleta.
Da mesma forma, durante as secas, os índios que habitavam as regiões
mais áridas se deslocavam para as margens dos rios, especialmente o
São Francisco, onde podiam sobreviver com a pesca e com os recur-
sos das matas ciliares. Hoje, diante da indisponibilidade das áreas das
margens do São Francisco, as grandes secas obrigam parte dos índios a
migrarem para regiões mais distantes, em busca de trabalho temporário
em canaviais, carvoarias e outros. Tal condição tem afetado gravemente
a estabilidade social dos Xakriabá. A terra indígena está inserida em
quatro compartimentos geomorfológicos: o Compartimento do Planalto
dos Gerais, conhecido pelos Xakriabá como “Gerais” ou “Tabuleiro”,
especialmente utilizado pelos índios para a caça e coleta. É a área onde
se encontra grande parte das plantas de uso medicinal. Devido ao seu
baixo aproveitamento para agricultura, constitui-se num dos ambien-
tes mais bem preservados no interior da terra indígena ora delimitada.
No Compartimento da Zona de Transição, o aumento da erosão afeta
diretamente o Compartimento Carsticado, principalmente as cavernas
nele existentes. O Compartimento da Depressão do São Francisco cons-
titui a área que apresenta menores restrições quanto ao uso e ocupa-
ção do solo. Constitui-se como uma importante área para manutenção e
sobrevivência do povo Xakriabá, pois o solo fértil e o ciclo de enchen-
tes e vazantes viabilizam a agricultura de subsistência. Quanto à hidro-
graa, o rio Peruaçu, originalmente perene, possui atualmente porções
onde a água é corrente somente durante o período chuvoso. O rio Ita-
carambi é marcado por alto grau de intervenção antrópica e degrada-
ção, desde assoreamento de nascentes, passando por construções de
barragens até a adução para irrigação feita de forma indiscriminada,
de modo que sua foz natural no Rio São Francisco já quase não verte
mais água. Percebe-se que praticamente todas as aldeias se encontram
instaladas à beira de um curso d’água, seja ele intermitente ou perene.
Quanto à vegetação, destaca-se o seu uso para o extrativismo, especial-
mente para complementação da dieta e para uso medicinal. Dentre os
frutos e sementes mais coletados pelos Xakriabá podemos citar: umbu,
pequi, maracujá-do-mato, cabeça de nego (panã), grão-de-galo, coco
cabeçudo, cagaita, coquinho indaiá, buriti, mangaba, favela, araticum,
caju. Também importantes são os umbuzeiros (Spondias tuberosa), a
aroeira (Myracrodruon urundeva) e a baraúna (ou braúna/pau-preto,
como é regionalmente conhecida – Schinopsis brasiliensis), sendo que
as duas últimas constam na lista de espécies ameaçadas de extinção do
Estado. Destacam-se, ainda, várias espécies de ipês (Tabebuia spp.),
as barrigudas (Cavanillesia arbórea), também ameaçadas de extinção,
e as mandiocas bravas do gênero Manihot. As atividades produtivas
e o uso dos recursos naturais desempenhados pelos índios Xakriabá
estão ligados ao processo histórico de ocupação das terras e à aptidão
das mesmas para a agricultura irrigada e a pecuária. Os meios de pro-
dução dos índios ao longo do tempo sofreram inuências da situação
de contato, mantendo-se porém até hoje as práticas tradicionais. O seu
modo de vida forma um mosaico com conexões entre as diferentes
paisagens e condições impostas pelo ambiente da região. Destaque-se
que somente na região de acesso ao rio São Francisco ocorre a Jurema,
espécie vegetal sagrada para os Xakriabá, da qual se faz um chá de
efeito psicoativo, através do qual os iniciados no culto têm contato com
o mundo sobrenatural. Tal ritual é referência de identidade e de organi-
zação social para todos os Xakriabá. Em suma, os aspectos ambientais
determinantes para a presente proposta de limites são: acesso a água,
acesso a solos férteis e acesso a áreas de coleta de recursos naturais.
Na área denominada Dizimeiro, na porção oeste da TI Xacriabá, pre-
domina a vegetação de cerrado, importante para extrativismo vegetal
(frutos e plantas medicinais) e caça. Destaca-se também o acesso ao rio
Peruaçu para atividade de pesca e a implantação de pequenas lavouras
comunitárias para subsistência. Nas porções sudoeste, sul e sudeste da
TI Xacriabá, ocorre sobreposição com o Parque Nacional das Cavernas
do Peruaçu - PNCP, em área ainda hoje ocupada por fazendeiros, não
estando plenamente sob controle do Instituto Chico Mendes de Prote-
ção à Biodiversidade (ICMBio), bem como sobreposição com a APA
Peruaçu. Mesmo assim, é uma das áreas mais preservadas dentro dos
limites propostos. Essa região era intensamente utilizada pelos ances-
trais Xakriabá e ainda é nos dias atuais, apesar da presença das cercas
e das proibições dos fazendeiros e do ICMBio, por ser uma região rica
em recursos extrativistas. O próprio Plano de Manejo da unidade de
conservação – que ainda não se consolidou na prática – reconhece a
ocupação antiga e duradoura dos Xakriabá, responsáveis, em grande
parte, pela sua preservação. Ademais, as cavernas encontradas na
região possuem importância simbólica e religiosa para os Xakriabá,
pois são a morada da Yáyá-Cabocla, a mulher-onça mítica, mãe da cul-
tura Xakriabá. As pinturas rupestres presentes em muitas dessas caver-
nas são uma referência aos antepassados dos tempos míticos. Parte
dessa área está situada no Compartimento da Depressão do São Fran-
cisco, de fundamental importância para os Xakriabá, devido ao acesso
ao rio São Francisco, importante fonte de recursos hídricos e pesquei-
ros. A área ora delimitada permitirá a recomposição ambiental de todo o
território, abrangendo diversas unidades de paisagem complementares,
o que certamente favorecerá a reprodução física e cultural do povo em
termos ecologicamente equilibrados, apesar das diculdades do clima.
Neste sentido, verica-se potencial para estabelecer um plano conjunto
de administração da área sobreposta com a UC, respeitados os usos,
costumes e tradições dos Xacriabá, nos termos do Decreto n º 7.747, de
05 de junho de 2012 (PNGATI).
V. REPRODUÇÃO FÍSICA E CULTURAL
A população Xakriabá é bastante jovem. Entre 1987 e 2003 registrou-se
um incremento absoluto muito grande no grupo de 0 a 4 anos, que, ao
longo desses 16 anos, mais do que dobrou, sendo que a participação
do grupo de 0 a 14 anos aumentou de 27,7% para 45,1%, enquanto
os demais grupos etários mantiveram-se quase constantes. Como não
se conhece o passado demográco dessa população, supõe-se que seu
rejuvenescimento seja decorrente da redução dos níveis de mortalidade
nas idades mais jovens, associada ao aumento da fecundidade. Em
2009, segundo os dados do SIASI/FUNASA, fornecidos ao GT pelo
Pólo Base de Saúde de São João das Missões, a população Xakriabá
atingiu a totalidade de 7.788 pessoas, com um crescimento médio de
3,48% ao ano. Em termos culturais, tem-se que os Xakriabá se cons-
tituem como grupo diferenciado a partir de ritos e mitos baseados em
rico universo cosmológico, que engloba o “segredo” ou “segredo de
índio”; aí se incluem as festas e danças não católicas, o Toré, as práticas
de cura “dos antigos”, as relações intensas com os “Encantados”, o uso
ritual de substâncias psicoativas, entre outros. Nesse sentido, é mar-
cante a crença na Yayá Cabocla, uma onça mítica, que se transforma em
mulher. Há várias narrativas sobre a origem de Yayá, girando em torno
dos mesmos temas. Um dos mais importantes é a relação que se faz da
Yayá Cabocla com a presença dos não índios na região. O motivo de a
índia se transformar em onça é a fome, surgida com a presença dos não
índios. Para matar a fome, não havia outra saída senão matar o gado
dos fazendeiros, ele mesmo o responsável pelas mudanças ambientais
que estavam resultando no desaparecimento da caça, na perda da posse
sobre a terra e das condições de sobrevivência. Mas Yayá não vem ape-
nas matar a fome de carne do seu povo, ela também vem proteger, reu-
nir e organizar o povo diante dos novos tempos de diculdade. A pre-
sença da Yayá regula a ordem social a ponto de atingir todos os foros

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT