Dos principais contratos envolvendo bens imóveis

AutorChristiano Cassettari, Marcos Costa Salomão
Páginas77-112
Capítulo 4
Dos prinCipAis ContrAtos
enVoLVenDo Bens imÓVeis
4.1 COMPRA E VENDA DE IMÓVEIS (ARTS. 481 A 532 DO CC)
4.1.1 Conceito
De acordo com o art. 481 do Código Civil, a compra e venda é o contrato em que
o vendedor compromete-se a transferir ao comprador a propriedade de um bem móvel
ou imóvel mediante o pagamento de certo preço em dinheiro.
Em razão de o vendedor se comprometer a transferir a propriedade, podemos afir-
mar que a compra e venda é um contrato translativo. Isso se torna importante porque
sabemos que a forma usual de transferência da propriedade imóvel se dá com o registro
do título translativo no Registro de Imóveis, e, assim, verifica-se ser a compra e venda
um exemplo disso.
Não podemos esquecer que o contrato de compra e venda, por si só, gera apenas
direito obrigacional, já que no Brasil a obrigação não gera eficácia real.
No sistema brasileiro, a propriedade é transferida pela tradição, no caso de bem
móvel, e pelo registro do título translativo, no caso de bem imóvel.
4.1.2 Elementos essenciais
São elementos essenciais à compra e venda:
a) Partes: que são os sujeitos da compra e venda (comprador e vendedor). Não po-
demos esquecer que, segundo o art. 104 do Código Civil, as partes em qualquer relação
contratual devem ser capazes, ou seja, devem possuir capacidade geral e especial (que
é aquela específica para a celebração de tal ato, e também é chamada de legitimação).
A capacidade geral refere-se às hipóteses descritas nos arts. 3º e 4º do Código Civil.
Já a capacidade especial, ou legitimação, pode ser exemplificada em razão da ne-
cessidade de pessoas casadas, segundo o art. 1.647 do Código Civil, necessitar de vênia
conjugal (autorização que o marido ou a esposa precisa dar ao consorte para a prática
de determinados atos) para vender bens imóveis. Porém, a vênia é dispensada se os
cônjuges casaram-se pelo regime da separação absoluta. Cumpre lembrar, também,
que o art. 1.657 do Código Civil autoriza quem casa no regime da participação final nos
aquestos a convencionar no pacto antenupcial a possibilidade de celebrar contrato de
compra e venda de bens imóveis, desde que particulares.
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REGISTRO DE IMÓVEIS • Christiano Cassettari
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Assim sendo, pergunta-se: o que é separação absoluta? Sabemos que o regime da
separação de bens pode ser convencional, que é aquele estabelecido pelas partes em
pacto antenupcial, ou legal, também chamado de obrigatório, que é o imposto pela lei
nas hipóteses descritas no art. 1.641 do Código Civil. Dessa forma, resta imperioso saber
qual separação é absoluta: a convencional ou a legal?
A separação convencional pode ser absoluta se no pacto antenupcial houver pre-
visão expressa de que nenhum bem se comunica, ou relativa, se houver alguma exceção
de bens comunicáveis.
Com relação à separação obrigatória, ou legal, a Súmula 377 do STF permite a
comunicação de bens adquiridos pelo esforço comum nessa modalidade de separação.
Por esse motivo surge a dúvida: seria a separação obrigatória absoluta ou relativa?
Como a citada súmula possui origem no art. 259 do Código Civil de 1916, que
não encontra correspondente no atual Código Civil, a sua vigência é questionável. Para
Francisco José Cahali, a súmula foi revogada. Já para Giselda Maria Fernandes Novaes
Hironaka, a súmula continua vigendo.
Se a posição de que a súmula foi revogada prevalecer, teremos que a separação
obrigatória é absoluta. Porém, se o posicionamento de que a súmula ainda está em vigor
se impuser, teremos que a separação obrigatória é relativa.
O STJ vem entendendo que a Súmula 377 do STF ainda está em vigor (que transfor-
ma a separação obrigatória em relativa), conforme decisão proferida no REsp 1.199.790-
MG (2010/0118288-3), rel. Min. Vasco Della Giustina (convocado do TJRS), v.u., j.
em 14-12-2010.
A ausência de vênia gera a invalidade do negócio jurídico. Porém, o Código Civil
de 1916 estabelecia que na sua ausência, em qualquer hipótese, inclusive na da separa-
ção absoluta, o negócio era nulo, mas o atual Código de 2002 determina ser o negócio
anulável. Por essa razão, pergunta-se: o que prevalece?
Como a questão da ausência de vênia está no plano da validade do negócio jurídico,
devemos verificar quando o negócio foi celebrado, pois, com relação à validade, a lei
vigente no momento da celebração do negócio jurídico é que determina a sanção. Por
esse motivo, se o negócio sem vênia conjugal foi celebrado à época do Código Civil de
1916, será nulo, e, se celebrado na vigência do Código Civil de 2002, anulável.
b) Coisa: a coisa objeto de compra e venda deve ser lícita, possível, determinada ou
determinável. Se a coisa é certa, significa que é determinada. Se incerta, é determinável,
tem existência potencial.
A coisa deve ser, ainda, alienável (estar no comércio). Como exemplos de coisa ina-
lienável, podemos citar o bem gravado com cláusula de inalienabilidade (que pode ser
quebrada judicialmente, ou seja, é relativa) e o bem público (pode ser de uso comum do
povo, de uso especial – com destinação específica ou afetado – e dominical – sem destina-
ção específica ou desafetado). Como relação aos bens dominicais, eles podem ser objeto
de compra e venda, conforme autoriza o art. 101 do Código Civil. É também exemplo de
coisa inalienável o bem de família voluntário, aquele previsto nos arts. 1.711 e seguintes
do Código Civil (o bem de família legal, previsto na Lei n. 8.009/90, é alienável).
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CAPítulo 4 • DoS PrINCIPAIS CoNtrAtoS ENVolVENDo BENS ImÓVEIS
c) Preço: os arts. 486 e 487 do Código Civil permitem a cotação do preço em mo-
eda estrangeira, em ouro (cláusula ouro) ou em bolsa, se houver posterior conversão
para a moeda nacional. Em caso de contrato de exportação, permite-se fixar o preço em
moeda estrangeira.
Essas regras não colidem com as que se encontram nos arts. 315 e 318 do Código
Civil. Este último artigo estabelece ser nulas as convenções de pagamento em ouro ou
moeda estrangeira, pois o art. 315 determina que as dívidas em dinheiro, em decorrência
do princípio do nominalismo, devem ser pagas em moeda nacional corrente.
Com isso, verifica-se que o preço na compra e venda pode ser fixado em ouro
(cláusula ouro) ou em moeda estrangeira, mas, na hora de realizar o pagamento, deve
ser feito em moeda corrente.
O art. 488 do citado diploma legal apresenta a solução para o caso de não haver
convenção sobre o preço no contrato, determinando que seja adotado: tabelamento
oficial; preço habitual do vendedor e termo médio fixado pelo juiz.
Tais soluções devem ser aplicadas na ordem acima descrita. O tabelamento oficial
não pode ser afastado pelo contrato, porque se trata de questão de ordem pública.
O preço não pode ser fixado por apenas uma das partes. A chamada “cláusula pague
o que quiser” faz com que o contrato seja nulo, conforme o art. 489 do Código Civil.
A fixação do preço, porém, pode ser deixada ao arbítrio de um terceiro de confiança
das partes. É o que se chama de preço de avaliação.
d) Vontade: o contrato de compra e venda deve ser isento de vícios.
4.1.3 Natureza jurídica do contrato de compra e venda
Bilateral ou sinalagmático: estabelece direitos e deveres para ambas as partes
(reciprocidade).
Oneroso: deve estar presente o elemento preço.
Comutativo: há prestações equivalentes e já conhecidas.
Aleatório: vem de álea, que significa sorte (ou risco). A compra e venda aleatória
pode ser classificada da seguinte forma: emptio spei (venda da esperança) – a contra-
prestação é devida mesmo se a prestação não existir. Exemplo: compra e venda de safra
futura; emptio rei speratae (venda da esperança com coisa esperada) – neste contrato
parte-se da premissa que a coisa existirá, mas em qualquer quantidade. Resolve-se o
contrato se a coisa não existir, já que o risco refere-se à quantidade.
Consensual: porque se aperfeiçoa com a simples vontade das partes.
Típico: já que seu regramento vem previsto em lei.
Quanto à solenidade, a compra e venda pode ser solene ou não solene – a soleni-
dade, modernamente, consiste na necessidade de celebrar o contrato no Tabelionato de
Notas. Segundo o art. 107 do Código Civil, o contrato de compra e venda é, em regra,
não solene, pois a solenidade depende de previsão legal expressa.
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