Educação, maternidade e política cultural

AutorCarin Klein
Páginas175-196
Niterói, v. 7, n. 2, p. 17 5-196, 1. sem. 2007 Niterói, v. 7, n. 2, p. 17 5-196, 1. sem. 2007
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EDUCAÇÃO, MATERNIDADE
E POLÍTICA CULTURAL
Carin Klein
Resumo: O presente artigo discute e proble-
matiza alguns pr ocesso s d e p roduçã o e
veiculação de representações de maternida-
de, tomando como ref erência o Programa
Nacional Bolsa-Escola. Meu estudo insere-se
no campo da teorização cultural, principal-
mente na perspectiva dos Estudos Culturais e
dos Estudos Feministas, nas vertentes que têm
proposto uma aproximação crítica com a aná-
lise pós-estruturalista. Para a operacionalização
da pesquisa, selecionei um conjunto de docu-
mentos referentes a este Programa, produzi-
dos e publicados no período de 1999 a 2003.
Exploro os textos do Programa tomando como
base os conceitos de discurso, representação,
identidade, gênero e poder com o intuito de
analisar os dif erentes modos pelos quais a
maternidade é, ali, representada e significada.
Palavr as-ch ave: programa nacio nal b olsa-
escola; discurso; maternidade e relações de
gênero.
Este texto1 apresenta algumas discussões realizadas em um trabalho de pesqui-
sa que se insere no campo da teorização cultural, principalmente na perspectiva dos
Estudos Feministas e dos Estudos Culturais, nas vertentes que têm proposto uma
aproximação crítica com o pós-estruturalismo. Este artigo toma a maternidade como
um construto sociocultural, ou seja, como algo que não está inscrito na natureza
feminina, nem é proveniente de um suposto instinto biológico, inato e comum a
todas as mulheres. A investigação segue na direção contrária de argumentos que
buscam fixar ou justificar determinadas posições e comportamentos relativos à ma-
ternidade, argumentos que se repetem de forma insistente em diversos aparatos
culturais da sociedade contemporânea – uma insistência que não só nos permite,
1O artigo desdobra-se de minha dissertação de mestrado em Educação, intitulada: “... Um cartão [que] mudou
nossa vida”? Maternidades veiculadas e instituídas pelo Programa Nacional Bolsa-Escola (KLEIN, 2003). Este
trabalho foi apresentado no 1o Seminário Brasileiro de Estudos Culturais em Educação/ULBRA – Canoas – RS
2004 e contém al gumas discussões publicadas no artigo “A produção da maternidade no Programa Bolsa-
Escola”. (KLEIN, 2005b). A publicação “A educação de mulheres como mães e professoras no Programa Naci-
onal Bolsa-Escola” (KLEIN, 2005a) é um artigo que também se desdobra na dissertação aqui citada.
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E Educação, maternidade e política cultural
mas também nos convoca a pensar em como e por que a maternidade volta a ser
alvo de tantos investimentos neste contexto histórico.2
Entre estes investimentos, focalizo alguns documentos governamentais que
veiculam certas representações hegemônicas de maternidade, como é o caso da
revista elaborada em forma de quadrinhos intitulada O dia em que um cartão mu-
dou nossa vida (BRASIL, 2001c), enviada às escolas públicas brasileiras no segundo
semestre de 2001. Esse material pretende ensinar as mulheres-mães beneficiadas
pelo Programa Bolsa-Escola a cuidar “corretamente” do cartão magnético utilizado
no recebimento do dinheiro. O documento faz parte de uma complexa rede de
ensinamentos que estão presentes em propagandas televisivas, em panfletos envia-
dos às escolas públicas, em documentos oficiais, em matérias e artigos jornalísticos,
entre tantos outros meios destinados a gestores(as) públicos, professores(as),
voluntários(as) e às famílias, mas, sobretudo, às mães dos estudantes brasileiros ins-
critos no Programa.
A mudança a que se refere o cartão diz respeito à construção de uma socieda-
de mais justa, a ser moldada por um conjunto amplo de ações que faziam parte dos
programas integrantes da chamada Rede de Proteção Social, instituída no governo
Fernando Henrique Cardoso, da qual o Programa Bolsa-Escola foi um componente
importante. Tais programas têm como foco principal o combate à pobreza e à exclu-
são social, e a educação é neles posicionada como um meio fundamental para alcan-
çar tais objetivos.
No contexto da ampla discussão que se pode fazer sobre as implicações desses
ensinamentos na sociedade, interessa-me especialmente explorar o que eles dizem
sobre – e para – as mulheres-mães. Isso porque as “lições” dirigidas às mulheres para
que elas cumpram a tarefa de ser “boas mães” circulam por uma infinidade de lo-
cais, como revistas femininas, cadernos especiais dirigidos às mulheres, livros que
preconizam crenças e conceitos a partir da psicologia do desenvolvimento, propa-
gandas, apresentações e aconselhamentos escolares e, também, campanhas e pro-
jetos sociais que seguem divulgando e instituindo as chamadas qualidades mater-
nas. A partir dessa perspectiva, as políticas públicas educacionais e os programas
sociais nos quais elas se desdobram podem, então, ser tomados como instâncias nas
quais representações de maternidade vêm sendo produzidas e significadas desde o
advento da Modernidade.
Ao propor a análise das políticas educacionais sob o enfoque de gênero, Marília
Pinto de Carvalho (2000) aponta que considerações importantes nessa área têm-se
desdobrado de análises das políticas públicas mais amplas – incluindo, nessa abor-
dagem, a realização de pesquisas sobre os pressupostos de gênero embutidos em
2Atualmente, no doutorado, dou continuidade a esses estudos investigando os ensinamentos endereçados às
famílias de baixa renda que fazem parte do Primeira Infância Melhor (PIM/RS), de âmbito estadual, e como
essas prescrições buscam constituir formas mais “adequadas” de exercer a paternidade e a maternidade.
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