Embargos do devedor - Arts.914 e 917 do NCPC (Arts. 736, 738 e 745 do CPC)

AutorJosé Gilmar Bertolo
Páginas1423-1440

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EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA ..ª VARA CÍVEL DO

FORO CENTRAL DA COMARCA DE ................. - ..

Distribuição por dependência

Autos n. .............

Execução de Título Extrajudicial

........................, brasileiro, casado, aposentado, portador do RG n. ..................... e CPF n. ........................, residente e domiciliado na Av. ........................, n. ......, na cidade de ........................ - ..., conexo ao presente, vem, por seu procurador signatário (doc. procuratório incluso), com escritório profissional na Rua .................., n. ....., sala ......, centro, na cidade de .................. - ..., com suporte nos arts. 914 e seguintes do Novo Cânone Processual Civil (arts. 736, 738 e 745 de 1973), propor EMBARGOS À EXECUÇÃO FUNDADA EM TÍTULO EXTRA-JUDICIAL, que lhe move ................................, pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ sob o n. ........................, com sede na Av. ........................, n. ......, na cidade de ........................ - ...., pelos seguintes fatos e fundamentos a seguir expostos:

DOS FATOS E FUNDAMENTOS

O embargante está sendo executado como fiador de 6 (seis) contratos de mútuo, entabulados entre a Embargada e a sua filha .........................., relativo a Crédito Educativo visando a custear o curso universitário desta.

Relata a Embargada, na execução, que juntamente com o contrato de mútuo foram emitidas Notas Promissórias - no valor correspondente às parcelas, todas avalizadas pelo embargante, e que segundo seus cálculos importam nesta data em R$ ........, .. (.........................) -, as quais não foram pagas, dando ensejo à presente demanda.

Em que pesem as pretensões da Embargada, atua ela no Ramo de Financiamento de Crédito Educativo, um dos setores que, ao invés

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de auxiliar no desenvolvimento sociocultural de nosso país (que possui um índice baixíssimo de pessoas que concluem o terceiro grau), castiga, massacra, aquele que de alguma forma necessita de seu auxílio, cobrando valores impagáveis.

Ademais, o contrato de mútuo firmado com a Embargada foi cumprido parcialmente, restando parte a pagar, tendo a afiançada procurado por diversas vezes saudar seu compromisso, não tendo conseguido, ante a irredutibilidade da embargada, parcelar de forma que tornasse possível a quitação, a qual aumentou de forma exorbitante pela aplicação dos juros, taxa administrativa e multas contratuais, conforme os demonstrativos apresentados pela Embargada.

O Embargante é pessoa idônea, aposentado, vivendo dos parcos ganhos de sua aposentadoria.

DO DIREITO

  1. Dos Contratos de Adesão

    Os contratos de adesão são uma forma de contratação em massa, uma adaptação dos fornecedores de bens e serviços à necessidade de rapidez que o mercado atual impõe.

    Alguns conceitos de contrato de adesão são expostos a seguir, conforme se encontram na doutrina:

    Cláudia Lima Marques, em Contratos no Código de Defesa do Consumidor, 3. ed., Ed. Revista dos Tribunais, 1999, p. 53:

    Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas são preestabelecidas unilateralmente pelo parceiro contratual economicamente mais forte (fornecedor), ne varietur, isto é, sem que o outro parceiro (consumidor) possa discutir ou modificar substancialmente o conteúdo do contrato escrito.

    Nelson Nery Júnior, Código Brasileiro de Defesa do Consumidor

    Comentado pelos Autores do Anteprojeto, 5. ed., Ed. Forense Universitária, 1998, p. 455:

    A doutrina faz distinção entre os contratos de adesão e os contratos por adesão. Aqueles seriam forma de contratar onde o aderente não pode rejeitar as cláusulas uniformes estabelecidas de antemão, o que se

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    dá, geralmente, com as estipulações unilaterais do poder público (...). Seriam contratos por adesão aqueles fundados em cláusulas também estabelecidas unilateralmente pelo estipulante, mas que não seriam irrecusáveis pelo aderente: aceita-as, em bloco, ou não as aceita.

    O Código de Defesa do Consumidor fundiu essas duas situações estabelecendo um conceito único de contrato de adesão.

    Orlando Gomes, Contratos, 15. ed., Ed. Forense, 1995, p. 109:

    O contrato de adesão caracteriza-se por permitir que seu conteúdo seja pré-constituído por uma das partes, eliminada a livre discussão que precede normalmente à formação dos contratos, mas até este seu traço distintivo continua controvertido.

    A imposição da vontade de um dos contratantes à do outro seria o traço distintivo do contrato de adesão, mas essa caracterização importa em reconhecer, na figura do contrato de adesão, uma deformação da estrutura do contrato. (...)

    No contrato de adesão uma das partes tem de aceitar, em bloco, as cláusulas estabelecidas pela outra, aderindo a uma situação contratual que se encontra definida em todos os seus termos. O consentimento manifesta-se como simples adesão a conteúdo preestabelecido da relação jurídica.

    Dos conceitos acima apontados, destaca-se a característica dominante dos contratos de adesão: a falta da autonomia da vontade. Não existe prévia discussão, nem modificação das cláusulas unilateralmente estabelecidas por uma das partes.

    Essa nova modalidade de contratação está presente em muitos setores da sociedade atual, e tem se tornado impossível aos indivíduos absterem-se de contratar de acordo com as regras estabelecidas pelos fornecedores de bens e serviços.

    Os contratos de massa não obedecem à clássica teoria dos contratos, uma vez que não há manifestação livre da vontade das partes. Assim, seu tratamento deve ser diferenciado, uma vez que as disposições do Código Civil foram baseadas nessa teoria clássica.

    Ao invés de descaracterizar o contrato de adesão, não o admitindo como contrato (uma vez que não possui o requisito mais importante de validade, segundo a teoria clássica), o legislador brasileiro o admitiu no ordenamento jurídico (art. 54, CDC). E, admitindo-o, precisou criar um regramento para regular sua aplicação. Esse regramento é o Código de Defesa do Consumidor.

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    Dessa forma foi possível admitir a contratação de adesão e, ao mesmo tempo, criar mecanismos de controle que procurassem trazer maior equilíbrio à relação contratual.

    Como conclusão, diga-se, as disposições do Código Civil relativas aos contratos não mais se aplicam aos contratos de adesão no âmbito das relações de consumo, em virtude de existir lei posterior, e especial, que disciplina a matéria.

  2. Das Cláusulas Abusivas

    1. Contrato redigido de modo a dificultar sua compreensão - infração do art. 46, CDC.

      De uma análise superficial do instrumento contratual, que lastreia a Execução movida contra o Embargante, vê-se que este está eivado de nulidade.

    2. A fonte (tamanho da letra) utilizada no formulário pré-impresso é muito pequena, o que dificulta em muito a sua leitura. Essa prática é comum nos contratos de adesão, e tem como propósito desestimular os aderentes a lê-los.

      Some-se a isto o fato de o contrato não ter sido redigido de forma clara, com cláusulas incompreensíveis, se for levado em conta o nível cultural do homem comum.

      Qualquer leigo, como é o caso do Embargante, terá enormes - talvez intransponíveis - dificuldades em compreender como são calculados os juros do contrato.

      Nesse sentido, o art. 46 do CDC diz que "os contratos que regulam as relações de consumo não obrigarão os consumidores se não lhes for dada a oportunidade de tomar conhecimento prévio de seu conteúdo, ou se os respectivos instrumentos forem redigidos de modo a dificultar a compreensão de seu sentido e alcance".

      Claudia Lima Marques, op. cit., p. 341, a respeito do assunto:

      Os fornecedores que os utilizarem (os contratos de adesão) deverão cuidar para que os contratos sejam redigidos em termos claros e com caracteres ostensivos e legíveis de modo a facilitar a sua compreensão pelo consumidor (art. 54, § 3º), sob pena de ser aplicado o art. 46, não obrigando o consumidor o contrato firmado.

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    3. Falta de Estipulação e Variação Unilateral da Taxa de Juros - infração dos arts. 51, X, e 52, II, CDC.

      O contrato firmado pela Embargada com o Embargante não fixou a taxa de juros a ser aplicada. No quadro "Características da Operação", os campos "Forma de Atualização, 1 e 2", "Taxas de juros" e "Comissão Abert. Créd. (CAC)" estão em branco (instrumento fls. ..). Assim, o Embargante não soube, nem no momento da contratação, qual seria a taxa de juros do crédito aberto.

      Mas isso não é tudo. O contrato faculta ao Réu a alteração, unilateral, da taxa de juros, a qualquer momento:

      Ao CREDITADO não se faculta ao menos a possibilidade de tomar conhecimento prévio da alteração nos juros, quanto mais negociá-los.

      É basilar o que Nelson Nery Júnior diz no comentário ao art. 51 do CDC (op. cit., p. 427):

      Inclui-se na proibição do dispositivo comentado a alteração unilateral das taxas de juros e outros encargos.

      Havendo modificação no modelo da economia nacional, as partes devem reavaliar as bases do contrato, com possibilidades de alteração no preço e taxas de juros e outros encargos, de modo bilateral, discutindo de igual para igual as novas situações, a fim de que seja preservado o equilíbrio que deve presidir as relações de consumo (art. 4º, n. III, CDC) e respeitado o direito básico do consumidor de ver assegurada igualdade nas contratações (art. 6º, n. II, CDC).

      Transcreve-se, abaixo, acórdão relacionado ao assunto:

      CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO EM CONTA-CORRENTE - Juros - Cláusula estabelecendo a possibilidade de estipulação posterior unilateralmente pelo Banco - Abusividade - Inteligência dos arts. 51, X, e 52, II, da Lei 8.078/90.

      Ementa da Redação: É abusiva a cláusula...

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