Esplanada - Vara c�vel e de fam�lia

Data de publicação30 Junho 2023
Número da edição3362
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
V DOS FEITOS RELATIVOS ÀS RELAÇÕES DE CONSUMO, CÍVEIS E COMERCIAIS DE ESPLANADA
INTIMAÇÃO

8000270-30.2023.8.05.0077 Procedimento Do Juizado Especial Cível
Jurisdição: Esplanada
Autor: Celia Maria Leite Dos Santos
Advogado: Diego Sales Silva (OAB:BA45181)
Reu: Banco Do Brasil S/a
Advogado: Ricardo Lopes Godoy (OAB:BA47095)

Intimação:

Como se sabe, nos termos do art. 38 da Lei 9.099/95, “Art. 38. A sentença mencionará os elementos de convicção do Juiz, com breve resumo dos fatos relevantes ocorridos em audiência, dispensado o relatório.”.

De todo modo, entendo oportuno ressaltar o que se segue.

Cuida-se de ação judicial proposta por AUTOR: CELIA MARIA LEITE DOS SANTOS;

em face de REU: BANCO DO BRASIL SA

A parte autora afirmou que " A requerente é usuária dos serviços prestados pelo Banco Réu através da sua conta salário na agência nº 3838-5 e conta nº 5659-6, onde recebe seu salário mensalmente. Cumpre salientar que a Demandante possui um débito para com a instituição requerida decorrente de crédito pessoal/cartão de crédito/conta corrente, razão pela qual vem tentando renegociar o montante da dívida, contudo, sem êxito até a presente data.

Ocorre que no mês de dezembro/2022 a Autora foi surpreendida ao não conseguir fazer os pagamentos de suas despesas mensais por ausência de saldo, momento em que, a mesma emitiu um extrato e constatou que em 12/12/2022 a mesma recebeu os seus proventos no importe de R$2.300,07, e NO MESMO DIA o banco Réu promoveu a transferência TOTAL do referido valor para sua conta corrente a fim de amortizar a sua dívida para com a referida instituição bancária, senão vejamos:

[...]

Ou seja, o valor INTEGRAL do salário da Requerente foi INDEVIDAMENTE RETIDO, vez que não fora autorizado pela mesma. Vale salientar que a arbitrária atitude do banco Réu vem dificultando em muito a vida da Requerente no que diz respeito ao comprometimento de sua renda familiar, a qual se destina ao sustento de sua família, além dos pagamentos de outros serviços essenciais, tais como aluguel, água, energia, internet, entre outros.

A fim de solucionar o problema administrativamente, a Requerente dirigiu-se à uma agência bancária do Demandado, bem como, fez contato telefônico com o mesmo por meio da sua central de atendimento (protocolo nº 95718013), todavia, sem sucesso. Logo, por não conseguir resolver seu problema administrativamente, a Requerente não viu alternativa a não ser socorrer-se da Justiça para ver o seu caso solucionado e reparar os danos sofridos.” (sic).

Nos pedidos, pugnou por " c) A INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA, na forma do art. 6º, VIII da Lei 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor); d) Que seja reconhecida a ILEGALIDADE DA RETENÇÃO DE SALÁRIO realizada pela Requerida, devendo a mesma ser compelida à restituir o salário indevidamente retido da Autora, no valor de R$2.300,07 (dois mil trezentos e sete reais e sete centavos), valor este a ser acrescido de juros e corrigido monetariamente; e) A condenação da Requerida ao pagamento de INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS no valor de R$8.000,00 (oito mil) reais, em razão da angústia, sofrimento e abalo emocional causados à Autora pelo TOTAL comprometimento do seu orçamento familiar com a retenção indevida promovida pela Ré;” (sic).

Na contestação, a parte ré questionou a gratuidade de justiça e pugnou pela improcedência total dos pedidos.

Tentativa de conciliação restou infrutífera.

Autos vieram conclusos.

DO MÉRITO.

E, no meritum causae, razão assiste à parte autora.

De logo, destaco que a relação jurídica em exame se enquadra no conceito de relação de consumo, regulada pela Lei n.º 8078/90, norma de ordem pública, cogente e de interesse social, sendo a parte ré fornecedora de serviços e a parte autora consumidora, na forma dos artigos e do CDC.

O Código de Defesa do Consumidor tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito a sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria de sua qualidade de vida, bem como a transparência e a harmonia das relações de consumo, consoante dispõe o art. 4º da Lei nº. 8078/90.

O sistema adotado pelo Código de Defesa e Proteção do Consumidor consagra uma série de princípios, dentre os quais o da confiança, como dever anexo aos contratos de consumo, além da função social do contrato, que o transforma de simples instrumento jurídico para realização dos legítimos interesses do consumidor.

No caso presente, restou incontroverso que o salário da parte autora, mesmo depositado em CONTA SALÁRIO, restou integralmente retido pelo banco réu, mesmo sem autorização da parte autora.

Friso que o fato não é controvertido, uma vez que o próprio banco réu, em sua contestação, alega que agiu dentro de exercício regular de direito, uma vez que parte autora possui débitos com o banco.

Ocorre que a empresa acionada não apresenta a dívida em nome da autora, assim como não apresenta autorização contratual para reter valores a fim de amortizar os débitos constituídos. Em que pese não poder a parte se furtar ao pagamento da dívida, tal fato não concede a acionada o direito de reter todo o salário da parte autora para adimplemento da dívida.

Sobre o tema, o Superior Tribunal de Justiça decidiu pela possibilidade de desconto das parcelas do empréstimo, desde que prevista autorização contratual, além de ter que ser observado o limite de 30% (trinta por cento) da remuneração líquida do devedor:

RECURSO ESPECIAL. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. RENEGOCIAÇÃO DE DÍVIDA. DESCONTO EM CONTACORRENTE. POSSIBILIDADE. LIMITAÇÃO A 30% DA REMUNERAÇÃO DO DEVEDOR. SUPERENDIVIDAMENTO. PRESERVAÇÃO DO MÍNIMO EXISTENCIAL. ASTREINTES. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DO DISPOSITIVO DE LEI FEDERAL VIOLADO. ÓBICE DA SÚMULA 284/STF. 1. Validade da cláusula autorizadora de desconto em conta corrente para pagamento das prestações do contrato de empréstimo, ainda que se trate de conta utilizada para recebimento de salário. 2. Os descontos, todavia, não podem ultrapassar 30% (trinta por cento) da remuneração líquida percebida pelo devedor, após deduzidos os descontos obrigatórios (Previdência e Imposto de Renda). 3.Preservação do mínimo existencial, em consonância com o princípio da dignidade humana. Doutrina sobre o tema. 4. Precedentes específicos da Terceira e da Quarta Turma do STJ. 5. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO. ( REsp n. 1584501/SP , Relatório Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 6/10/2016, DJe 13/10/2016).

Nesse sentido, como não trouxe a empresa acionada nenhuma cláusula autorizadora dos descontos de amortização de débito, ao passo que também fez incidir o aludido desconto sobre a integralidade dos vencimentos da parte autora, faz-se necessária a restituição integral do valor retido.

DANO MORAL.

Quanto à existência de danos morais, imperioso o acolhimento parcial dos pleitos autorais.

Os fatos aqui narrados constituem crassa falha na prestação de serviço, além de evidenciar a total desorganização da ré.

No caso sub examine, é de se ver que a situação extrapola o que poderia ser razoavelmente tolerado, desviando a empresa ré para o campo do evidente desrespeito e descaso para com o consumidor.

De mais a mais, considerando as peculiaridades do caso vertente, constato que a retenção TOTAL do salário da consumidora, em sua conta SALÁRIO, para quitação de débito se mostra abusiva, além de não apresentar nenhuma base contratual, evidenciando a má prestação do serviço ( arts. , e 14 do CDC).

Tal fato extrapolou o mero dissabor dos problemas cotidianos, sendo necessário o dever de indenizar.

Em relação ao quantum indenizatório sopeso as seguintes variantes, que são balizadas pelos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, com o escopo de que o ressarcimento da lesão ao patrimônio moral da parte autora seja suficiente para recompor os prejuízos suportados, sem importar em enriquecimento sem causa da vítima:




1. a condição econômica das partes,

2. a abusividade do ato praticado pela parte ré

3. a gravidade potencial da falta cometida

4. a concretude dos fatos.




Considero que o ato ilício foi praticado por empresa de grande porte, extremamente renomada.




Levando tudo isso em consideração, bem assim valores fixados pela jurisprudência em casos semelhantes, entendo que o valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) para a parte autora, é adequado e proporcional, sem aptidão para gerar enriquecimento ilícito à parte autora, e dentro das capacidades financeiras da ré.

DISPOSITIVO

Isto posto, JULGO PROCEDENTES os pedidos da parte autora da ação, extinguindo o processo com resolução do mérito, nos termos do art. 487, I, do CPC, para:




-Condenar REU: BANCO DO BRASIL SA ao pagamento de indenização, a título de danos materiais devidos à parte autora no valor, já com a dobra legal, de R$2.300,07 (dois mil trezentos e sete reais e sete centavos), que deve ser devidamente corrigido pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor - INPC e acrescido de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a contar da data da citação (art.405 do CC).

-Condenar REU: BANCO DO BRASIL SA. ao pagamento de indenização, a título de danos morais...

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