Exceção de Incompetência

AutorManoel Antonio Teixeira Filho
Ocupação do AutorAdvogado
Páginas185-196

Page 185

1. Comentário

Conforme procuramos demonstrar nos Capítulos antecedentes, apenas a incompetência relativa pode ser objeto de exceção, ou seja, aquela que diz respeito ao território. A incompetência absoluta — em razão da matéria, da pessoa, da hierarquia —, no processo do trabalho, deve ser alegada na contestação, como preliminar (CPC, art. 337, II), embora possa ser alegada em qualquer tempo ou grau de jurisdição e deva ser declarada de ofício (CPC, art. 64, § 1.º).

No sistema do CPC de 2015, a incompetência relativa (rationae loci, portanto) passou a ser alegada como preliminar da contestação (art. 337, II), a exemplo do que já ocorria com a incompetência absoluta, desde o CPC de 1973.

Uma das diferenças quanto aos efeitos processuais entre a incompetência absoluta e a relativa é que somente a sentença proferida por juízo absolutamente destituído de competência pode ser atacada pela via rescisória (CPC, art. 966, II). Ao contrário do que se passa em sede de incompetência relativa, na absoluta não há preclusão. Convém elucidar, contudo, que a regra inscrita no art. 64, § 1.º, do CPC, encontra seu limite “temporal” no fenômeno da coisa julgada material. Assim, formada a res iudicata, é certo que a sentença proferida pelo juízo absolutamente incompetente produzirá efeitos jurídicos até que venha a ser desconstituída mediante ação rescisória — com acórdão transitado em julgado.

A exceção de incompetência figura como uma das respostas típicas do réu, no processo do trabalho. Trata-se, assim, de resposta excecional. O autor, em princípio, não pode arguir a incompetência do próprio juízo por ele escolhido para ingressar com a ação; permitir que o faça será transgredir uma regra de ordem lógica (porquanto o autor estará, em última análise, em antagonismo com o seu ato, consistente na escolha do juízo, sob o aspecto territorial) e ignorar o princípio legal de que o próprio silêncio do réu faz com que a competência se desloque para o juízo que não a possuía, levando em conta o fato de que a incompetência estava jungida, com exclusividade, ao aspecto territorial.

A despeito das considerações acima, não seria sensato de nossa parte afirmar, em caráter dogmático, que em nenhum caso será lícito ao autor alegar a incompetência relativa do juízo. Como alertamos anteriormente, a realidade da vida forense é muito mais rica do que possa prever a nossa imaginação, de tal sorte que seríamos imprudentes se fechássemos os olhos a essa realidade, viva e dinâmica. Admitamos, v. g., que a ação tenha sido ajuizada em Vara do Trabalho da cidade A, onde o conflito de interesses ocorreu. Passado o prazo

Page 186

para a resposta do réu (tendo esta sido oferecida, ou não), vem a ser criada e instalada na cidade B uma Vara do Trabalho. Diante disso, o juiz, por onde tramita o processo, equivocadamente, determina, por sua iniciativa, a remessa dos autos para a nova Vara, supondo que esta seja competente para dar continuidade ao processo. Ora, é elementar que, na hipótese, o autor poderia alegar, por meio de exceção, a incompetência relativa do juízo para o qual os autos foram remetidos (cidade B), pois, para tanto, possuiria interesse e legitimidade. O fato de este último juízo poder suscitar conflito negativo de competência não retira o direito do autor, no que tange a arguir a incompetência, até porque o referido conflito poderia não vir a ser suscitado.

Devemos nos ocupar, agora, com o procedimento característico da exceção de incompetência.

2. Procedimento
2.1. Petição inicial

No prazo de cinco dias, contado da data da citação, a parte deverá arguir a incompetência territorial do juízo em petição fundamentada e devidamente instruída ( CLT, art. 800), indicando o órgão jurisdicional para o qual declina. Esse prazo é contado em dias úteis (CLT, art. 775, caput).

Algumas anotações devem ser feitas, a respeito do assunto.

A petição inicial deverá, no processo do trabalho, ser elaborada mediante observância dos requisitos subjetivos e objetivos, com os quais nos ocupamos no Capítulo II, do Livro I, desta obra. Desse modo, a inicial haverá de ser precisa, clara e concisa (requisitos subjetivos), além de indicar o juízo a que é dirigida; os nomes e prenomes das partes (pode-se dispensar a referência ao estado civil, profissão, residência e domicílio, etc., porquanto essas informações já constam dos autos principais); o pedido, com as suas especificações (requisitos objetivos).

O valor da causa e as provas com que o excipiente pretende demonstrar a veracidade dos fatos alegados, mencionados no art. 319, do CPC (incisos V e VI, respectivamente), são inexigíveis no processo do trabalho, em face do art. 840, § 1.º, da CLT. Por outro lado, embora o referido dispositivo do digesto processual civil não aluda à data e à assinatura do advogado, esses elementos são necessários no processo do trabalho, por força do contido no art. 840, § 1.º, da CLT.

A petição inicial deve ser, ainda, fundamentada. Isso significa que o excipiente deverá mencionar as razões pelas quais entende ser incompetente, ratione loci, o juízo. A essa exigência se soma uma outra, consistente na indicação do juízo para o qual se declina. Articulando-se essas duas imposições legais, pode-se concluir que não basta o excipiente indicar os motivos pelos quais reputa ser o juízo incompetente: é necessário, ainda, que aponte aquele que, segundo julga, seja o competente, e para o qual deverão ser remetidos os autos.

Estamos pressupondo, por certo, que a petição inicial da exceção de incompetência seja escrita, até porque é por essa forma que ela habitualmente tem sido apresentada.

Page 187

Caso, no entanto, o excipiente queira arguir, oralmente, em audiência, a incompetência, o juiz não poderá impedir que o faça, pois ainda está em vigor o art. 846, da CLT, que prevê essa forma de resposta (defesa). Mesmo que a exceção seja oferecida oralmente, cumprirá ao excipiente atender aos requisitos legais, em especial, quanto à apresentação dos motivos que o levam a considerar o juízo incompetente e à menção daquele que reputa ser o dotado de competência.

Cabem, a propósito, algumas indagações: a) se a inicial não for fundamentada, deverá ser indeferida? b) se o excipiente deixar de mencionar o juízo para o qual declina a competência, a petição inicial merecerá indeferimento?; c) e se ele apontar, nessa peça, juízo diverso daquele que, efetivamente, detém a competência?

Passemos às respostas.

  1. Acabamos de ver que a exigência de que a petição inicial da exceção de incompetência seja fundamentada está jungida à necessidade de dar-se a conhecer ao juízo os motivos pelos quais se o considera incompetente em razão do território. Todavia, se, em determinado caso, o excipiente deixar de indicar essas razões jurídicas, a inicial não deverá ser indeferida, de plano. Conquanto a falta de motivação da inicial implique desrespeito ao art. 319, III, do CPC, caberá ao juiz fixar prazo de quinze dias para que a falta seja suprida (CPC, art. 321), vindo a indeferir aquela peça, tão só, se a sua determinação não for cumprida (ibidem, parágrafo único). Se assim dispõe o processo civil, a despeito de seu formalismo acentuado, por mais forte razão haverá de adotar-se essa providência no processo do trabalho, menos preocupado e menos comprometido com os aspectos formais do procedimento.

    Nossas considerações, acerca da ausência de motivação na inicial de exceção de incompetência, provavelmente se consumam no plano das abstrações, uma vez que nos parece muito rara, na prática, a possibilidade de o excipiente arguir a incompetência territorial do juízo sem mencionar as razões por que o faz.

    b) Pode acontecer, no entanto, de o excipiente apresentar, os motivos segundo os quais está convencido da incompetência do juízo, mas deixar de apontar qual o juízo que reputa ser competente. Como dissemos há pouco, é razoável exigir de alguém, que alega a incompetência de certo juízo, a indicação do competente. Uma coisa está, de maneira entranhada, enlaçada a outra.

    Não queremos, com isso, afirmar que a inexistência de menção ao juízo que seria o competente conduza, de imediato, ao indeferimento da petição inicial. Valem, aqui, as mesmas ponderações que fizemos na letra antecedente, quanto à falta de fundamentação dessa peça. Assim, o juiz, verificando que não há a especificação do juízo que o excipiente julga ser o competente, devera assinar-lhe o prazo de quinze dias, para que a omissão seja sanada (CPC, art. 321). Perguntamos, contudo: não cumprida a deter-minação, a inicial deverá ser indeferida, à semelhança do que ocorreria se a falta fosse de fundamentação? Sejamos sensatos: nem sempre. Embora o juiz não possa conhecer, ex officio, da incompetência relativa, essa particularidade não o inibe de, apresentada a exceção e convencendo-se da incompetência territorial alegada, ordenar a remessa dos autos ao juízo competente, ainda que este não tenha sido indigitado pelo excipiente.

    Page 188

    De tal arte, se, no sistema do processo civil, a falta de atendimento à determinação judicial constitua causa inexorável para o indeferimento da inicial, no terreno do processo do trabalho esse descumprimento nem sempre deve produzir tais consequências. Podemos, mesmo, dizer que este processo, em decorrência de seus princípios...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT