A execução trabalhista Um panorama atual
Autor | Maria Alice Batista Gurgel do Amaral |
Cargo | Doutora em Direito do Trabalho pela Faculdade de Direito da USP |
Doutora em Direito do Trabalho pela Faculdade de Direito da USP - Universidade de São Paulo. Estágio na Université Laval, Québec, Canadá, em Direito do Trabalho junto ao Prof. Dr. Pierre Verge. Professora Universitária. Funcionária do Poder Judiciário Trabalhista.
Superada a fase de conhecimento do processo trabalhista, em que a certeza do direito já está explicitada na sentença proferida pelo juiz, surge a necessidade de transformar esse direito teórico em direito vivo, a fim de, efetivamente, dar cumprimento à tutela jurisdicional, prestada pelo Estado, através do Poder Judiciário.
É a sentença condenatória que declara o direito existente (função declaratória), mas a essa se acrescenta outra função consistente na aplicação da sanção ao caso decidido (função sancionadora). A sentença declara a existência do direito do credor e a respectiva obrigação do réu condenado ao cumprimento da obrigação: declara a certeza do credor1 e formula a regra sancionadora concreta.
As modalidades de títulos dotados de força executória2, no processo do trabalho, não são tão amplas como no direito comum, dada a própria natureza do problema trabalhista.
Assim, são títulos hábeis para a instalação da execução trabalhista: a sentença transitada em julgado ou das quais não tenha havido recurso com efeito suspensivo; os acordos, quando não cumpridos; os termos de ajuste de conduta firmados perante o Ministério Público do Trabalho; os termos de conciliação firmados perante as Comissões de Conciliação Prévia; e os créditos previdenciários devidos em decorrência de decisão proferida pelo juízo trabalhista, resultantes de condenação ou homologação de acordo (CLT, art. 876, caput e § único e art. 625-E e § único), assim como a certificação de custas, os honorários do perito e do advogado.
A existência de um crédito insatisfeito não é, porém, suficiente para que se possa pedir a execução.3 É, ainda, necessária a existência de sentença, legalmente pronunciada, verificando esse fato e condenando o devedor. Tal ato tem a eficácia de título executório e funciona como condição necessária e suficiente da execução, segundo o princípio tradicional: nulla executio sine titulo.
A sentença é ato jurídico-processual, que se exterioriza através de formalidades previstas em lei4 (CPC, art. 162, § 1º): "A sentença é o ato pelo qual o juiz põe termo ao processo, decidindo ou não o mérito da causa".
Na sentença definitiva, o juiz transfunde o direito objetivo no caso concreto em que a lide se configura, a fim de compor esta secundum jus, dando a cada litigante o que é seu5. E ele assim se pronuncia, através de declaração de vontade, baseada no juízo lógico e em operações mentais com que resolve as questões de fato e de direito que a lide suscitou.
Essa declaração de vontade torna imperativa, para os litigantes, a regra jurídica aplicada, impondo-a às partes, como lei do caso concreto6.
Sentença de mérito - porque soluciona a lide - a sentença definitiva é o ato processual com que a jurisdição atua, para prestar a tutela estatal7 que foi pedida em relação a determinado litígio.
As sentenças definitivas classificam-se em razão da natureza da tutela jurisdicional concedida8.
De acordo com a ação de que provém, a sentença pode ser declaratória, condenatória ou constitutiva.
A sentença condenatória, ao mesmo tempo em que decide a lide julgando procedente a ação, configura-se como título executivo, constituindo, por isso mesmo, o ato final do processo de conhecimento e elemento inicial do processo de execução.
A sentença condenatória proferida em primeiro grau não encerra, necessariamente, o processo9. No anseio de assegurar a melhor decisão possível, a lei submete toda sentença à possibilidade de controle de sua validade extrínseca e de sua justiça intrínseca por parte do juiz que a proferiu ou do juiz superior. Os meios para provocar este controle são os recursos, cuja interposição pode ter, por efeito, a reforma da sentença recorrida, e a sua substituição por decisão diferente. Atinge-se, assim, necessariamente, o momento em que nenhum recurso é mais admissível e a decisão torna-se imutável e irretratável. Diz-se, então, que a sentença transitou em julgado.
Considerando a gravidade dos efeitos práticos da execução e, ainda, o fato de serem, freqüentemente, irreparáveis as suas conseqüências, mesmo na hipótese de se querer depois revogar10 aqueles efeitos, haveria muita imprudência em permitir que se pudesse promover a execução, com fundamento em sentença ainda sujeita a reforma em grau de recurso. Eliminase este inconveniente, com todos os perigos que ele comporta, atribuindo-se a exeqüibilidade, unicamente, às decisões transitadas em julgado, não mais expostas ao perigo de serem reformadas depois de feita a execução.
Este é, justamente, o caminho que a lei adotou. O Código do Processo Civil, art. 587, preceitua que "a execução é definitiva quando fundada em sentença transitada em julgado ou em título extrajudicial; é provisória, quando a sentença for impugnada mediante recurso, recebido só no efeito devolutivo".
Quando a sentença é exeqüível11, apesar de não ter transitado em julgado, a execução que se promover estará sujeita à eventualidade da reforma da sentença em grau de recurso e, conseqüentemente, à possibilidade de se dever desfazer o que foi feito, restabelecendo o estado anterior. Por isso, a lei a considera "provisória" e dita algumas regras especiais, que visam a facilitar aquele restabelecimento, e que estão contidas no Código do Processo Civil, art. 588.
A sentença passada em julgado é indiscutível e coativa. Sendo indiscutível, não admite revisão posterior e, mesmo não impedindo a instauração de outro processo futuro sobre o mesmo assunto, ao menos assegura a imutabilidade do que tenha sido decidido anteriormente.
Mas é pelo fato de ser coativa12 que a sentença oferece ao litigante uma série de possibilidades muito mais vastas que sob o aspecto anterior. A coação permite algo que, até o momento da coisa julgada, era juridicamente impossível: a invasão da esfera individual alheia e a sua transformação material para dar satisfação aos interesses daquele a quem a sentença haja conferido a vitória. Já não se trata de obter alguma coisa com o concurso do adversário, senão, justamente, contra a sua vontade.
Inicia-se, pois, a execução trabalhista, em que o comando emergente da sentença traz consigo a sanção, que vai caracterizar essa fase processual.
A execução é "o conjunto dos atos destinados a assegurar a eficácia prática da sentença", é a assertiva de Eduardo J. Couture.
Desta maneira, enquanto as decisões pronunciadas com finalidade de simples declaração13 de certeza ou com finalidade constitutiva esgotam a função jurisdicional e encerram o processo, a decisão de condenação encerra a fase de cognição, mas abre a de execução forçada. A coação não pode ser posta em prática, senão quando exista uma declaração de certeza que a autorize (título executivo); e a forma...
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