Fatores do declínio dos Orçamentos Participativos na região sul do Brasil

AutorLígia Helena Hahn Lüchmann
CargoProfessora do Depto de Sociologia e Ciência Política e do Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Ciência Política da UFSC
Páginas206-232
DOI: https://doi.org/10.5007/2175-7984.2022.e.86440
206206 – 232
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Fatores do declínio dos Orçamentos
Participativos na região sul do Brasil
Lígia Helena Hahn Lüchmann1
Resumo
Considerado como uma das principais inovações democráticas do mundo contemporâneo, o
Orçamento Participativo (OP) completou mais de 30 anos desde o seu surgimento em Porto
Alegre, capital do Estado do Rio Grande do Sul, no ano de 1989. No Brasil, após o processo de
expansão ocorrido até meados dos anos de 2000, esta instituição participativa vem sofrendo uma
queda no decorrer dos anos, alcançando um maior patamar de declínio a partir das eleições de
2016. Diante disso, o trabalho pretende, a partir da atualização dos dados (de 2019) de ocorrência
de OPs nos três Estados do sul do país – Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul –, analisar
o fenômeno da extinção dos OPs na região, mobilizando alguns fatores, como a derrota do PT
nas eleições municipais, problemas nanceiros, baixa participação social, perda de importância
estratégica eleitoral do OP, e a adoção de outras modalidades menos exigentes de participação, a
exemplo das Audiências Públicas.
Palavras-chave: Orçamento participativo. Declínio. Audiências públicas. Região sul. Brasil.
1. Introdução
Se o Brasil foi considerado um exemplo no tocante à criação de diver-
sas instituições participativas, como são os casos dos conselhos gestores,
das conferências e dos orçamentos participativos (OP), servindo, inclusi-
ve, como referência de difusão internacional, nos últimos anos o país foi
perdendo espaço e peso nos debates sobre as inovações democráticas no
mundo, processo que se acentuou de forma mais dramática a partir da
eleição de Jair Bolsonaro. No caso mais especíco dos OPs, alguns estudos
1 Professora do Depto de Sociologia e Ciência Política e do Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Ciência
Política da UFSC.
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Política & Sociedade - Florianópolis - Vol. 21 - Nº 50 - Jan./Abr. de 2022
têm se dedicado à compreensão da diminuição progressiva dessa moda-
lidade de participação no país (SPADA, 2014; BEZERRA; JUNQUEI-
RA, 2018; SOUZA, 2015; FEDOZZI; FURTADO; RANGEL, 2018;
LÜCHMANN, ROMÃO; BORBA, 2018; BEZERRA, 2020) a partir de
meados dos anos de 2000, como podemos visualizar na tabela a seguir e
que apresenta o número de cidades (acima de 100.000 habitantes) que
adotavam o OP no período de 1989 a 2016.
Tabela 1 – Programas de OP em cidades com mais de 100.000 habitantes
1989-1992 1993-1996 1997-2000 2001-2004 2005-2008 2009-2012 2012-2016
11 29 49 112 93 74 73
Fonte: Lüchmann, Romão e Borba (2018)2
Analisando as cidades com mais de 50.000 habitantes, Spada (2014)
também notou que, após um pico de implementação de OPs no período
de 2001 a 2004, ocorreu uma sensível redução de casos nos anos seguintes.
De acordo com o autor, essa queda está relacionada à mudança de orien-
tação do Partido dos Trabalhadores (PT) após a vitória nas eleições presi-
denciais de 2002, quando o partido abandonou o orçamento participativo
como estratégia política. Essa via interpretativa também é encontrada no
trabalho de Souza (2015), ao apontar para o fato de o PT ter mudado suas
estratégias político-eleitorais e político-institucionais quando alcançou a
esfera de governo federal, priorizando outras modalidades participativas, a
exemplo dos conselhos e das conferências nacionais de políticas públicas3.
Além disso, a literatura apresenta outros fatores, sejam de ordem econômi-
ca, como restrições orçamentárias e crises scais, sejam de ordem política,
a exemplo dos efeitos negativos decorrentes da ampliação das coligações
2 Dados obtidos da compilação realizada por Paolo Spada, e que agrega os estudos de Ribeiro e Grazia (2003) para
o período de 1997-2000, Avritzer e Wampler (2008) período de 2001-2004, e outros anos anteriores, além dos
dados do próprio Spada (2012) do período de 2008-2012, disponível em: http://participedia.net/en/con-
tent/brazilian-participatory-budgeting-census. Os dados de 2013-2016 foram coletados por Wagner de
Melo Romão e sua equipe vinculada à pesquisa financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de
São Paulo (FAPESP).
3 Foram realizadas 93 conferências entre 2003 e 2016, em diversos setores de políticas públicas e direitos, em
processos que provocaram milhares de conferências municipais e centenas de conferências estaduais (LÜCH-
MANN; ROMÃO; BORBA, 2018).

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