Atualização das figuras da subjetividade revolucionária: Proletariado versus Multidão

AutorFlávio Bezerra de Farias - Juliana Carvalho Miranda Teixeira
CargoUniversidade Federal do Maranhão (UFMA) - Université Paris 8/Universidade Federal do Maranhão (UFMA)
Páginas171-176
171
ATUALIZAÇÃO DAS FIGURAS DA SUBJETIVIDADE REVOLUCIONÁRIA: Proletariado versus Multidão
R. Pol. Públ., São Luís, Número Especial, p. 171-176, julho de 2014
ATUALIZAÇÃO DAS FIGURAS DA SUBJETIVIDADE REVOLUCIONÁRIA !Proletariado
versus Multidão
Flávio Bezerra de Farias
Universidade Federal do Maranhão (UFMA)
Juliana Carvalho Miranda Teixeira
Université Paris 8 / Universidade Federal do Maranhão (UFMA)
ATUALIZAÇÃO DAS FIGURAS DA SUBJETIVIDADE REVOLUCIONÁRIA !Proletariado versus Multidão
Resumo: O artigo examina a noção de subjetividade revolucionária em autores diversos e em situações históricas
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proletariado como uma totalidade concreta; e, no segundo caso, a multidão como uma totalidade abstrata.
Palavras-chave: Subjetividade revolucionária, pós-modernidade, proletariado, multidão.
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%56789:7 The article examines the notion of revolutionary subjectivity in different authors and in different historical
situations. Locates the postmodernity to the discussion around the idea that Marxism and negrism depart from certain
#6/.0/#!1%='6/0!#%5/'.A'(*!$.8%'#.'0/*0/"/$#'95)0/"'.A'0/<.>
a concrete totality; and, in the second case, the crowd as a whole abstract.
Keywords: Revolutionary subjectivity, postmodernity, proletariat, multitude.
Recebido em: 03.10.2013. Aprovado em: 06.01.2014.
172 Flávio Bezerra de Farias e Juliana Carvalho Miranda Teixeira
R. Pol. Públ., São Luís, Número Especial, p. 171-176, julho de 2014
1 INTRODUÇÃO
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processuais”, potencialmente subversivas diante da
dinâmica mesmo de uma sociedade já em crise.
Contudo, somente uma práxis consciente
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A%8'1.$"!5.'-/"-.'$.'3)% 0.'"!#)% .'*%0%'%=L-' .'
fordismo e na era da globalização. No decorrer desta
grande transformação social e histórica, importa
fazer um balanço analítico crítico dos movimentos
altermundialistas para elaborar antecipações
1.$10/#%"'3)/'1.$#0!:)%-'*%0%'%"'=)#%"'0/%!"'1.$#0%'
as diversas manifestações das opressões classistas
(dominação, exploração e humilhação).
Componentes de movimentos assumidamente
altermundialistas estão estimulados a participar de
um debate em torno da subjetividade revolucionária
(sejam as tendências e as latências, sejam o
proletariado marxista e a multidão negrista) no
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mais uma crise do capitalismo global.
2 DETERMINAÇÃO DA SUBJETIVIDADE
REVOLUCIONÁRIA
Para além dos tempos líquidos (BAUMAN,
2007) e das antinomias pós-modernas (JAMESON,
1997), com a crise global do capitalismo do início do
século XXI, a subjetividade revolucionária deve se
atualizar sob uma forma capaz de ser apreendida,
com referências, delimitações, dimensões e apoios
3)/' =6/' */0-!#%-' )-%' 1.$"1!/$#/' 0/#.-% %' /'
fôlego e vigor na dinâmica das lutas emancipatórias.
A subjetividade revolucionária escapa da
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uma !"#$% &'( )#'*+,,"$-( 3)/@' /-' 8' /' "/'
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progressivamente determinado[...]” – pois, tanto as
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são ainda muito pouco determinadas.
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de maneira alguma, mas as revela
exatamente superando-as, abrindo-as
para o futuro delas mesmas.” (BLOCH,
1981, p. 143-144).
(.:0/'.'3)/'"/0>' /#/0-!$% .@'(*!$.8%'%.)'
um princípio dialético decisivo seja em abordagens
marxistas (MARX, 1976, p. 671), seja em abordagens
estruturalistas (NEGRI, 1982, p. 135; NEGRI, 2010,
*&'R'/#'"/3&S' %'"):;/#! /'0/<.>0!%@'%'"%:/0@
omnis determinatio est negatio. T%=/' 0/""%=#%0' 3)/'
a ontologia spinozista é profundamente marcada
pela ideia da multiplicidade. O indivíduo é uma
composição de múltiplos elementos. Desta forma, as
multiplicidades, os distintos indivíduos estão aptos a
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origem de todas as coisas. Cada coisa é composta de
uma multiplicidade determinada e participa de tantas
outras formas múltiplas de organização (TEIXEIRA,
2011). Para Spinoza,
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concebe uma coisa determinada e de
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portanto, não pertence ao ser da coisa,
mas indica o seu não ser. Portanto,
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a determinação é negação e, assim,
ela não pode ser algo, mas só uma
negação. (SPINOZA, 2007, p. 283-284).
[)%$#.'%'!"#.@'#/-,"/'3)/'FO&&&P'%'A.0-%'\.'-. .'
de ser da singularidade) pode ser concebida como
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-.-/$#.' /' /#/0-!$%72.' %'95)0%' /'#. %'1.!"%'9$!#%'
exprime a relação de todo ser singular ao ser-outro dos
outros seres [...]” (LUKÁCS, 2009, p. 168-169).
Assim, a dialética marxiana parte desta ideia
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)$!91%-@'a priori, como força de trabalho da população
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de uma imensa superpopulação relativa, tornando-se
95)0%' %'.0 /-'.:;/#!@'0/=%1!.$% %'1.-'.'*0.1/"".'
de acumulação do capital historicamente determinado,
conforme será mostrado a seguir.
;<=! #8>?@798A9B> ! a subjetividade revolucionária
marxista
A elaboração da subjetividade revolucionária
*0+*0!%'H' %:.0 %5/-'-%04!"#%' #/'1.-.' *.$#.' /'
partida efetivo a ideia de população, “representação
caóticaG@' %:"#0%72.' 3)/' "/' .:#L-' 3)%$ .' "/'
despreza as classes que a compõem”. Como
decorrência mesmo da aplicação do método da
economia política, dos “conceitos cada vez mais
simples” restituiu a população “[...] com uma rica
totalidade de determinações e relações diversas
[...]” (MARX, 1982, p. 14).
As abstrações procedidas por Marx teve como
fundamento, tal como salientado anteriormente, o
princípio dialético spinozista determinar é negar,
*/01/*#U=' $.' 1.$10/#.' */$"% .' %' 95)0%' .'
173
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*0.=/#%0!% .' /$3)%$#.' )$! % /' 3)/' 0/=%' %"'
diversas condições do ser social no seio de uma
1.$95)0%72.' ".1!./1.$]-!1%' *%0#!1)=%0&' W%' busca
.$,( !"#$,(.$('#.+/('01+234$5 as categorias “[...]não
"/'1.$#/$#%-@'/$#2.@' /' 0/*0. )8!0@' /'0/M/#!0@'-%"@'
elas próprias, fazem evoluir suas formas de maneira
objetiva.” (BLOCH, 1981, p. 154).
O ser, segundo as elaborações de Marx
(1982), distingue-se em três grandes tipos, a saber,
a natureza inorgânica, a natureza orgânica e a
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Figura 1 - Figuração processual marxista da
formação socioeconômica
)>C7@ Marx, (1982), Farias, (1988).
^)_>1"' \`aaR@' *&' bRS' "):=!$6.)' 3)/' %'
coexistência destes três grandes tipos de ser, com
suas interações e diferenças essenciais, torna-se
uma referência
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1.$6/1!-/$#.' .'-)$ .'3)/'"/' /" .:0/'
neste terreno, nenhum conhecimento de
si do homem seriam possíveis se não
se reconhecesse como primordial um
fundamento tão variado.”
Servindo de base para uma práxis consciente.
Neste contexto, a particularização dos seres da
natureza orgânica e inorgânica determina o seu outro,
a saber: o ser social como forma de existência distinta,
3)/'"/' #.#%=!8%'1.$#0% !#+0!%'/' 1.$10/#%-/$#/' $)-%'
formação socioeconômica. Nesta, a dinâmica da base
econômica'c'3)/'/$1/00%'%'1.$#0% !72.'A)$ %-/$#%='
entre produção coletiva e apropriação privada
L'.' 3)% 0.'$.' 3)%='%#)%' %'lei geral da acumulação
capitalista@' 3)/' 0/5/' %' !"#$%&'( )#'*+,,"$- do
conjunto e dos subconjuntos da força de trabalho
ativa e da superpopulação relativa (MARX, 1976).
Figura 2 - Proletariado em Marx
Os subconjuntos da força de trabalho são
6!"#.0!1%-/$#/' /#/0-!$% ."' /' 95)0% ."' 1.-.' o
múltiplo de um mesmo'\d^IYe@' fRgfS@' /-' 3)/' .'
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"):1.$;)$#."' 3)/' .' )$!91%-' /@' /"#/' -. .@' .'
resumem; o conjunto da força de trabalho aparece
no tempo e no espaço, encerrando a multiplicidade
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Trata-se de
O&&&P' %03)L#!*."' 3)/' "/' 0/*0. )8/-'
aparentemente sem mudança,
mas não permanecem de maneira
alguma prisioneiros do passado [...] É
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%*0//$ /0'%'*%""%5/-' ."'%03)L#!*."'H"'
categorias autênticas deste gênero, ou
mais precisamente sua revelação nelas
um desvendar incontestavelmente
1%00/5% .' /')-'1.$#/V .'3)/'$2.'#/-'
nada de comum com conceitos gerais
puramente formalistas. (Ibidem, p. 152,
tradução nossa).
h.0'.)#0.'=% .@'1.$"! /0%,"/'3)/'%' .-!$%72.'
estatal do homem pelo homem na era da globalização
*. /0!%'"/0'/4*0/""%'$%'95)0%'"/5)!$#/Q
)ADE89! F! G! O modo estatal capitalista global e o
imperialismo global
)>C7@ !Farias (2013a; 2013b)
Na esfera destes contextos historicamente
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#%$#.'%'/4*=.0%72.'3)%$#.'%'6)-!=6%72.' .'6.-/-'
*/=.' 6.-/-' *%0%' %=L-' .' 3)% 0.' /' .-!$%72.'
ilustrado, determinam a unidade e a diversidade
do proletariado, condição atualizada conforme o
/4*0/"".'$%'95)0%'%:%!4.&'
Figura 4 - Unidade e diversidade do proletariado
)>C7@ !Farias (2013a; 2013b)
)>C7@ !MARX (1982).
174 Flávio Bezerra de Farias e Juliana Carvalho Miranda Teixeira
R. Pol. Públ., São Luís, Número Especial, p. 171-176, julho de 2014
W/""%' 95)0%72.' *0.1/"")%=@' %"' !0"%"'
condições do proletariado foram determinadas por
intermédio da negação, referenciada no núcleo
/-' 3)/' "/' /$1.$#0%' %' A.07%' /' #0%:%=6.' %#! I'
proletariado exprime-se em conjunto e subconjuntos
da força de trabalho, cujas condições de unidade e
diversidade dependem da dinâmica da acumulação
do capital. As cores representam as particularidades
%"' 1.$ !7J/"' /' M)#)%$#/@' =%#/$#/' /' /"#%5$%$#/&'
Z$3)%$#.' 3)/' ."' U$ !1/"' f' /' `' %*.$#%-' *%0%'
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condição própria da superpopulação discriminada
relativamente ao proletariado ativo.
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1.00/"*.$ /'6.;/' H'1.$ !72.' ."'%""%=%0!% ."'3)/'
se ajustam aos contratos com duração determinada
ou provisórios, sem estabilidade. A superpopulação
latente constitui a imensa parte do exército de
reserva, imediatamente atraída pelo capital
/" /' 3)/' "/;%' $/1/"">0!.&' Y.00/"*.$ /' 6.;/' H'
A0%72.' /' /"/-*0/5% ."'H' /"*/0%' /' #0%:%=6.' /'
imediatamente empregáveis. A terceira categoria
da superpopulação relativa, a estagnante, se situa
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1.-*."#%' /' #0%:%=6% .0/"' 3)/' *."")/-' *.)1%"'
chances de serem recrutados pelo capital (seja pela
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[)%$ .'/-*0/5% ."@'"2.' ."'-%!"' /"3)%=!91% ."'
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processual situada no tempo e no espaço evidencia
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atual, a opressão classista se amplia, mas com
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E"'95)0%"'0/A/0/$1!% %"'$%'%:.0 %5/-'10U#!1%'
e revolucionária marxiana
[...] não poderiam ser pensadas e só
são, além do mais, possíveis realmente
$.' 3)% 0.' /' )-' *0.1/"".' 3)/' %"'
transforme, as empurre mais longe
/' 3)/' L' /=/' *0+*0!.' )#+*!1.' /' %:/0#.&'
(BLOCH, 1981, p. 164).
Na superação do capitalismo global por
intermédio do socialismo, no contexto da utopia
concreta' .' 1.-)$!"-.@' FOiP' 95)0%"' *0.1/"")%!"'
dialéticas se evadem delas próprias, pertencem
%.' *0.1/"".' 1.-.' 95)0%"' /' #/$"2.@' 95)0%"' /'
tendências.” (BLOCH, 1981, p. 158).
; %! HE?7ABI> ! subjetividade revolucionária
negrista
A tentativa de atualização mais recente da
subjetividade revolucionária, bem como do momento
histórico atual, foi feita por Negri em parceria com
Michael Hardt (2000; 2004). Mas já no início dos
anos 1980, Negri (1982) esboçou as primeiras
=!$6%"' %'#/.0!%' /-'#.0$.' %' FOiP'95)0%' .' ");/!#.'
político da constituição democrática. Pós-moderna
– a multidão – de inspiração também spinoziana,
")*/0%$ .'%""!-@'/'/-'*%0#/@'.'%*/5.'#/+0!1.'H'95)0%'
do operário-massa, ora saudada pelo operaísmo
italiano logo após os acontecimentos de 1968.
Ao proclamar a pós-modernidade de bem-
aventurança, Negri e os seus adeptos desprezaram,
como os demais pós-modernos, a premissa da
sociedade dividida em classes e a luta de classes
A.!'0/ )8! %' %.'/"3)/-%' !1.#]-!1.,%$#!$]-!1.' %'
multidão versus o Império pós-moderno.
A multidão de singularidades ora subsumida
pelo Império manifesta duas maneiras de ser-
multidão'\WZjkl@' `afa@'*&'fff'/#'"/3&S. A primeira
é o próprio ser-multidão'/'0/A/0/,"/'H' 0/=%72.'/$#0/'
%"' "!$5)=%0! % /"' 3)/' %' 1.$"#!#)/-m' %' "/5)$ %' L'
caracterizada pelo fazer-multidão, “[...] processo
material e coletivo dirigido pela paixão comum
[...]” (NEGRI, 2010, p. 112). Em outros termos, é
o movimento da multidão contra'3)%$ .'/=%'L'FO&&&P'
aprisionada e transformada no corpo do capital
global, ela é tomada no processo de globalização
capitalista e se opõe.” (HARDT; NEGRI, 2004, p.
f`nS@'/$3)%$#.'multidão a favor do reino do comum
(HARDT; NEGRI, 2004, p. 99).
Ainda, neste mesmo movimento teríamos
%$#%5.$!1%-/$#/@' FO&&&P'"/-' -/ !%72.' /' 3)%=3)/0'
tipo” (HARDT; NEGRI, 2000, p. 474) os dois referidos
*.=."@'l-*L0!.'/'-)=#! 2.@'1.-'1.$95)0%7J/"'3)/'"/'
!A/0/$1!%-' H'-/ ! %' 3)/' %'-)=#! 2.' c' alternativa
vivaz que cresce no seio do Impériodescobre
“[...] o comum' 3)/'=6/'*/0-!#/'1.-)$!1%0' /'%5!0'/-'
conjunto [...]” pela “[...] transformação do mundo
[...]” (HARDT; NEGRI, 2004, p. 7; 401). Destaca-
"/' 3)/' *%0%' ."' $/50!"#%"' /""%' 0/=%72.' $2.' ".A0/'
as interferências da dialética cujo poder “[...] foi
/9$!#!m'WZjkl@'`aaa@'
p. 487).
Na era da mundialização, o Império pós-
moderno “[...] estende em escala planetária sua rede
Legenda
Assalariados Superpopulação relativa
F1 + F2 + FAFlutuante = F1 + F2Latente = L1 + L2
Estagnante = E1
+ E2
)>C7@6 Marx (1976); Farias (1988).
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de'6!/0%03)!%"'/' /' !1);%'A)$72.'L' /'-%$#/0'
a ordem através de novos mecanismos de controle e
/'1.$M!#.'!$1/""%$#/'O&&&PG'\eEk?o@'WZjkl@'`aap@'*&'
7), subsumindo a multidão de pobres empregados em
trabalhos materiais e imateriais e desempregados a
esse processo, bem como ao modelo “republicano”
de democracia.
Antagonicamente e ao mesmo tempo,
1.-*0//$ ! .'3)/'/""%'0/=%72.'FO&&&P'L')-'1.$#0%"#/'
3)/' $2.'%1%:%' /' "/' *0. )8!0@' )-'1.$M!#.' 3)/' "/'
continuamente.” (NEGRI, 2010, p. 43), esta
-)=#! 2.' -)=#!1.=.0! %' /' *.:0/"' \3)/' 1.$"#!#)!' %'
própria imagem invertida desse Império) já resiste
com a proposição altermundialista “[...] de criar
uma sociedade alternativa” (HARDT; NEGRI, 2004,
*&' bqfS@' H' FO&&&P'"):")$72.' 0/%=' %' ".1!/ % /'O&&&PG@'
do “[...]c omunismo do capital [...]” (NEGRI, 2010,
p. 36; 76) em nome do projeto do comum, de “[...]
desenvolvimento de uma verdadeira democracia
revolucionária das lutas [...]” pela força subversiva
do amor e da imaginação (NEGRI, 2010, p. 25; 78).
Deste modo, a ideia de multidão negrista cai num
relativismo histórico destruidor@'.'3)%='*0/1!"%-/$#/'L'
“[...] excluído pelo excedente presente
$%"' 1%#/5.0!%"@' )-' /41/ /$#/' 3)/'
*0. /-' *%0#/' /' %03)L#!*."' /=/"'
*0+*0!."' 0!1."' /-' /41/ /$#/"' /' 3)/'
impedem as categorias de murcharem
num sistema frágil, desencarnado e
/"3)/=L#!1.@' !5$.' /' )-' */$"%-/$#.'
rígido por falta de imaginação.” (BLOCH,
1981, p. 154).
Das inúmeras metáforas lançadas
pelos negristas para tentar explicar a estrutura
contemporânea do biopoder e da resistência dos
pobres, 1.$1/:/,"/' .' /"3)/-%' 95)0>=' %:%!4.'
3)/' 0/!91%' #%$#.' %' !$N-!1%' 1.$#/-*.0N$/%'
.' 1%*!#%=!"-.' /-' 10!"/@' 3)%$#.' %' 1.$ !72.' %'
subjetividade revolucionária. Trata-se de uma
1.$1/*72.'/"#0)#)0%=!"#%' /')-%'95)0%72.' %:"#0%#%'
3)/'!1)=%'"/-' V /'1.$#/V .@'-%"'
somente por meio do recurso a elementos típicos
/')-%' %$#!$.-!%' 3)/'#0%8' %'-%01%' .'16.3)/' /'
civilizações.
?/"#/' -. .@' %"' 95)0%"' .' l-*L0!.' /' %'
D)=#! 2.' #.0$%0%-,"/' .'%03)L#!*.' %' "):;/#!
revolucionária pós-moderna, conforme a Figura 4,
abaixo. Esta abordagem estruturalista
O&&&P' */0-%$/1/@' 3)%$#.' %' /=%@'
incontestavelmente prisioneira de um
recurso arcaizante, em razão de sua
insistência sobre a permanência de uma
A.0-%' /'*0/"/$7%'3)/'91%'<.>
o passado. (BLOCH, 1981, p. 152).
Além disso, e
O&&&P' .' -/"-.'-. .'3)/' ."'%03)L#!*."'
não têm a sua sorte ligada ao destino
do arcaico, as categorias não são mais
.' 3)/' /=/"' =!5% %"' H' L*.1%' /' "/)'
nascimento e de sua validade, isto é,
redutíveis a períodos de maneira tal
3)/' 1% %' )-%' /""%"' L*.1%"' #/0!%'
sua própria doutrina das categorias. Ao
contrário, percebe-se justamente sua
validade persistir e avançar na história,
trazendo-lhe seu concurso e seu
testemunho [...] (BLOCH, 1981, p. 153).
Figura 5 - Figuração especulativa negrista da
subjetividade revolucionária
)>C7@ Farias, (2005), Teixeira (2011).
Embora traga elementos novos, este
%03)L#!*.' *+",-. /0$.' -' /' )-%' )#!=!8%72.'
*%""% !"#%' /'/"#0)#)0%"'%01%!1%"'3)/'"/'*/0*/#)%-'
inalteravelmente “[…] em tipos originários
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[...]” (BLOCH, 1981, p. 151).
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Na era pós-moderna, os movimentos
altermundialistas veem-se diante da necessidade
de uma atualização da categoria da subjetividade
revolucionária. Como visto acima, para o
altermundialismo marxista, a atualização dialética
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1.-.' %03)L#!*.' )$!0"%=@' $)-' *0.1/"".' /'
democratização socialista,
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não permanecem vinculadas ao
primeiro momento de sua formulação,
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mítico. Em vez disso, atravessam a
história vendo constantemente mudar
sua função e podem até mesmo
experimentar aí um novo nascimento
[...] (BLOCH, 1981, p. 152).
Para o altermundialismo pós-marxista, está-
se indubitavelmente diante da práxis revolucionária
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176 Flávio Bezerra de Farias e Juliana Carvalho Miranda Teixeira
R. Pol. Públ., São Luís, Número Especial, p. 171-176, julho de 2014
antecipação de um comunismo, paradoxalmente
94% .'1.-.' 95)0%'!-+='$.' 3)% 0.'*%""% !"#%' %'
democracia burguesa formal.
REFERÊNCIAS
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Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2007.
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1981.
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(Mestrado em Ciências Sociais) – Universidade
Paris X, Nanterre, 2011.
Flávio Bezerra de Farias
Economista
Doutorado de Terceiro Ciclo em Economia e Gestão
pela Universidade de Amiens, Doutorado de Estado em
Economia pela Universidade Paris-Nord.
Professor do Departamento de Economia e do Programa
de Pós-Graduação em Políticas Públicas da UFMA
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Juliana Carvalho Miranda Teixeira
Assistente Social
Doutoranda da Université Paris 8 / Universidade Federal
do Maranhão (UFMA)
E-mail: juliana.cmt@gmail.com
Universidade Federal do Maranhão (UFMA)
Avenida dos Portugueses, 1 - Bacanga, MA,
CEP: 65085-580, São Luís – MA, Brasil.
Université Paris 8
2 Rue de la Liberté, 93200 Saint-Denis, França

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