GÊNERO, HISTÓRIA E MEMÓRIA: EXPERIÊNCIAS COTIDIANAS DAS MORADORAS DE SERRA DO NAVIO E VILA AMAZONAS (1960 A 1985)

AutorRomulo Moraes de Sousa, Sidney Lobato
Páginas237-253
GÊNERO|Niterói|v.20|n.1| 237|2. sem.2019
GÊNERO, HISTÓRIA E MEMÓRIA: EXPERIÊNCIAS CO-
TIDIANAS DAS MORADORAS DE SERRA DO NAVIO E
VILA AMAZONAS (1960 A 1985)
Romulo Moraes de Sousa1
Sidney Lobato2
Resumo: Esse artigo discorre sobre experiências femininas ocorridas entre os
anos de 1960 e 1985 nas company towns amapaenses Vila Amazonas e Serra
do Navio, criadas pela empresa Indústria e Comércio de Minérios S.A. (Icomi).
Objetivamos compreender estas experiências, situando-as nos espaços pú-
blicos e privados e tendo em conta os discursos normativos que permearam o
cotidiano das trabalhadoras. As sociabilidades das mulheres e os discursos he-
gemônicos foram enfocados por meio de artigos da revista Icomi-Notícias e de
entrevistas com antigos moradores e moradoras dos núcleos urbanos citados.
Palavras chave: Experiências; Gênero; Icomi.
Abstract: TThis article discusses female experiences that occurred between 1960
and 1985 in the Amapá’s company towns Vila Amazonas and Serra do Navio, crea-
ted by the company Indústria e Comércio de Minérios S.A. (Icomi). We aim to unders-
tand these experiences, placing them in public and private spaces and considering
normative discourses that permeated the daily lives of workers. Women's sociability
and hegemonic discourses were focused on through articles from Icomi-Notícias
magazine and interviews with former residents of the urban centers mentioned.
Keywords: Experiences; Gender; Icomi.
Palavras iniciais
Em meado da década de 1940 foi descoberta, no recém-criado Território
Federal do Amapá (1943), uma grande jazida de manganês localizada no atual
município de Serra do Navio, distante 208 quilômetros de Macapá (capital). A
exploração da citada jazida foi realizada pela empresa Indústria e Comércio de
Minérios S. A. (Icomi), ao longo de várias décadas. Para fixar seus funcionários
nas áreas de extração (mina) e escoamento (porto), a Icomi construiu duas mo-
1 Mestre em Desenvolvimento Regional pela Universidade Federal do Amapá (Unifap). Professor de História na
rede pública estadual do Amapá. E-mail: r_moraes_ap@hotmail.com.
2 Doutor em História Social pela Universidade de São Paulo (USP). Fez estágio pós-doutoral na École des Hau-
tes Études en Sciences Sociales (EHESS-Paris). Professor da Unifap. E-mail: lobato.sidney@yahoo.com.br.
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dernas company towns: Serra do Navio e Vila Amazonas1. Esses núcleos urba-
nos – dotados de escolas, hospitais, clubes recreativos e outros – começaram a
ser construídos no ano de 1955 e foram concluídos respectivamente em 1959
e 1960. Além de abrigar trabalhadoras e trabalhadores, essas cidades-empresas
destinavam-se a mantê-los sob o controle da mineradora durante 24 horas di-
árias, pois mesmo fora do expediente de trabalho os funcionários e funcionárias
estavam submetidos às regras da Icomi.
As company towns icomianas foram planejadas com base no modelo
de cidade-jardim (CORREA, 2014) e foram divididas em três setores:
vila administrativa, com casas amplas onde moravam os membros do staf
da empresa; vila especializada, destinada ao segundo escalão; e vila operária,
que abrigava os trabalhadores de mais baixa remuneração (ver imagem n. 1).
Segundo o discurso institucional, essa divisão não representava discriminação
social, mas se justificava pelas diferenças culturais existentes entre os mora-
dores. Na verdade, tal setorização, feita por meio da separação espacial e da
diferenciação das casas, naturalizava e reforçava um distanciamento já exis-
tente nos espaços de produção. Aí a distinção social se expressava por meio
dos salários e do poder de dar ordens. Em outras palavras, essa organização do
espaço urbano reproduzia no quotidiano dos operários a hierarquização social
cuja origem eram as relações produtivas estabelecidas pela Icomi.
Imagem 1: Planta de Serra do Navio
Fonte: Arquivo Pessoal de Sidney Lobato.
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