Geni, a pedra e a súmula 385 do STJ

AutorFabio Schwartz
Ocupação do AutorDoutor em Direitos, Instituições e Negócios pela Universidade Federal Fluminense. Mestre em Direito Econômico e Desenvolvimento pela Universidade Cândido Mendes. Autor do 'Manual de Direito do Consumidor - Tópicos & Controvérsias' (Editora Processo) e Defensor Público do estado do Rio de Janeiro.
Páginas359-362
GENI, A PEDRA E A SÚMULA 385 DO STJ
Fabio Schwartz
Doutor em Direitos, Instituições e Negócios pela Universidade Federal Fluminense.
Mestre em Direito Econômico e Desenvolvimento pela Universidade Cândido Men-
des. Autor do “Manual de Direito do Consumidor – Tópicos & Controvérsias” (Editora
Processo) e Defensor Público do estado do Rio de Janeiro.
Composta por Chico Buarque em 1978 como parte do espetáculo “Ópera do
Malandro”, a música “Geni e o Zepelim” conta a história de uma meretriz hostilizada
na sua cidade pelo seu modo de vida.1 A canção se transformou em uma espécie de
senha para se referir às pessoas que em determinadas circunstâncias, tornam-se alvo
de discriminação e execração pública.2
Pois bem, passados alguns séculos desde as ordenações do rei, (ordenações
afonsinas, seguidas pelas ordenações manuelinas e estas pelas ordenações f‌ilipinas),
as quais estabeleciam a tão temida pena de degredo para os que não pagassem suas
dívidas,3 observa-se ainda no século 21 imenso desprezo e ressentimentos pela f‌igura
do devedor.4
Não foi por outro motivo que o projeto de lei que tratava do fenômeno do supe-
rendividamento, mesmo precedido de amplo debate na sociedade, através de inúmeras
audiências públicas realizadas por todo país, com a presença de uma enorme gama
de entidades representativas dos consumidores, gestou por mais de uma década no
Congresso Nacional, até sua devida aprovação.
Assim é que até este advento, tínhamos no Brasil a esdrúxula situação em que às
pessoas jurídicas era disponibilizada imprescindível ferramenta para recuperação de
suas dívidas, antes da decretação da falência, ao passo que à pessoa física só restava
um caminho: a insolvência civil. Situação em total afronta ao princípio da isonomia,
ante o discrimen injustif‌icado e, ainda, ao princípio da dignidade da pessoa humana.
Tais fatos apenas demonstram os resquícios de uma arraigada ojeriza pela f‌igura
do devedor pessoa física, que na atual sociedade do consumo, onde o ato de consumir
se tornou um requisito de pertencimento e aceitação social, não pode continuar a ser
1. A letra da música, na íntegra, pode ser consultada em: https://www.letras.mus.br/chico-buarque/77259/.
2. OLIVEIRA, Mário Oscar Chaves. Joga Pedra na Geni. Artigo publicado no site Migalhas, em 30 de março
de 2011. Consultado em 14 de fevereiro de 2022.
3. TORRES, Simei Maria de Souza. O degredo como punição: a pena de degredo para o Brasil no Livro V das
Ordenações Filipinas. Revista do Corpo Discente do PPG-História da UFRGS. Disponível em: f‌ile:///C:/
Users/00284941727/Downloads/73080-314777-1-PB.pdf. Consultada em 18 de fevereiro de 2022.
4. A pena de degredo no Direito Português consistia em uma espécie de exílio, em que a pessoa era enviada a
um outro país por determinado período de tempo como represália pelo não pagamento de suas dívidas.

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