A Globalização, as Políticas Econômicas e seus Reflexos no Combate ao Trabalho Infantil

AutorMauro Vilela
CargoPadre da Congregação do Santíssimo Redentor ? mais conhecida como Missionários Redentoristas
Páginas182-192

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Ver nota 1

A temática que fomos convidados a refletir diz: "Globalização, políticas econômicas e seus reflexos no combate ao trabalho infantil", e eu venho completar, o que temos a contribuir nestes tempos "DESmodernizados". Estamos num umbral de um novo tempo. Passamos da pós modernidade para um tempo que ainda os estudiosos não definiram tão bem um termo próprio.

E para este novo tempo, quero dizer e reafirmar o compromisso da Igreja Católica nesta temática. E para ficar muito claro o sentido primeiro e geral de nossa reflexão, conto uma pequena história, que é uma lenda.

Deus ao criar o mundo, criou de tal maneira que tudo era muito perfeito, porque criou por amor. Criou o que existe e ali colocou o que poderia criar de mais genial: os seres humanos. Vivia-se a perfeita harmonia. Mas com o tempo, houve o distanciamento entre os seres criados com seu Criador. Com esta distância, os seres humanos começaram a esquecer o nome de Deus.

Deus quis lembrá-los de seu nome. Jogou do alto do céu uma moeda de ouro. Nessa moeda se podia ler o nome de Deus. Passado um tempo, o nome de Deus foi desgastado pelo tempo, e ficou difícil a leitura.

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Os judeus foram ler, e entenderam que estava escrito a perfeição e a majestade como nome de Deus.

Os gregos foram ler, tomados pelos óculos da filosofia, entenderam que estava escrito beleza e conhecimento para o nome de Deus.

Os romanos foram ler e viram que estava escrito sabedoria para o nome de Deus.

Um pobre pescador da Galiléia, de nome Pedro, achou essa moeda, lavou-a bem e conseguiu ler: AMOR! Deus é amor!

Deus é amor! Pode ser visto, como a grande definição de Deus, que a Igreja Católica vem tentando em suas várias formas de evangelizar, comunicar às pessoas. E a grande tarefa, não é entender racionalmente, mas entender pelo coração. E para entendermos pelo coração, só o fazemos pela experiência. Racionalmente somente, fica difícil. A razão ajuda a formarmos a consciência de que Deus é amor, mas o coração quebra as barreiras da frieza da razão, e nos leva diretamente à experiência concreta que Deus quer fazer conosco.

Agora, se Deus é amor, se tudo foi feito com amor e por amor, se amor nós entendemos como algo totalmente livre, desinteressado e gratuito, como pode os senhores e senhoras saírem de suas casas, de seus inúmeros compromissos, e estarem aqui dis cutindo sobre: Trabalho infantil? Ou melhor, exploração infantil, porque a palavra trabalho leva a algo nobre, vocação natural de todo ser humano. O trabalho enobrece a pessoa. E se falamos de trabalho infantil, ele teria que ser olhado como algo digno, porque o verdadeiro trabalho é nobre, é sagrado. Mas o trabalho infantil é algo ruim, significa de cara que não é trabalho, e a palavra que mais se assemelha ao que está se discutindo, é exploração. Exploração infantil! Pois já diz o jargão mais antigo, lugar de criança é na escola.

Se Deus é amor, se criou por amor, porque existe exploração infantil? E respondo.

Existe uma obra literária de Albert Camus intitulada Calígula.2 A questão que atormenta Calígula é a da dificuldade que parece ter o ser humano para alcançar a felicidade.

Não vamos jogar com com esta palavra e nem procurar fazer uma hermenêutica. Vamos olhá-la pelo lado mais simples e primitivo de seu significado: estar satisfeito com a vida!

Pois bem, Calígula acredita que poucos homens e mulheres, ao final de sua existência, têm a sensação de serem felizes ou de tê-lo sido.

E pensa que isso se deve ao fato de que, na prática, ninguém ou quase ninguém tenha chegado à meta que se havia proposto alcançar.

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Por que as pessoas não chegam a essa meta: serem felizes?

Calígula acredita que isso não se realiza porque as pessoas se distraem pelo caminho. Não se estruturam em seu caminhar no agir ferrenho de buscar a meta de serem felizes. Essa distração se dá que no caminhar na vida das pessoas, porque elas vivem de afetividade! Essa distrai a pessoa!

A afetividade faz com que a pessoa caminhe para finalidades secundárias, que não é a meta de serem felizes. A afetividade retira a preciosidade da energia da pessoa em busca da felicidade. A pessoa atada de afeto a outra, se depara com as palavras: Amor, Amizade, Lealdade. Ou seja, a pessoa se torna afetiva, ligada, próxima do outro. Para Calígula isso atrapalha a verdadeira felicidade.

Para Calígula a felicidade é egoísta. A pessoa para ser verdadeiramente feliz, precisa ser fechada em si mesma!

Calígula acredita que para ser feliz, se faz necessário explorar o outro em profundidade. Para ele o outro é um objeto que existe simplesmente para me satisfazer. O outro existe para ser usado. E para ser feliz, é preciso ser egoísta, pensar só em si, e colocar os pés por cima da cabeça do outro. O outro serve somente para satisfazer os desejos que tenho.

Ora, ao falarmos deste tema: trabalho (exploração) infantil, nos deparamos com o grande problema que é base fundamental para qualquer conversa acerca desse tema: egoísmo!

EGOÍSMO: PESSOA voltada para si! Aquele que roda ao redor de si mesmo! Ensimesmado! O que fica eternamente olhando seu umbigo!

As relações de hoje são marcadas por essa palavra.

Interessante que ao final da obra de Camus, nosso personagem não encontra sua meta de vida: a tal felicidade!

Exatamente não porque ele se distraiu na vida com afetividade. Mas simplesmente porque ele usou as pessoas, como um verdadeiro egoísta, usurpando tudo e todos para si próprio.

Morreu frustrado, porque não teve afetividade com os outros, ou seja, nunca teve um amigo, e pior, não achou a meta de sua vida, que seria a felicidade.

Concluímos que para existir um problema moral neste campo, sempre existirá a questão do egoísmo no meio. As pessoas são egoístas e querem tirar proveito e vantagem de alguma coisa quando estão envolvidas no trabalho infantil.

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Lógica do Cisne Negro3

Antes da descoberta da Austrália, as pessoas do mundo antigo estavam convencidas de que todos os cisnes eram brancos.

Era uma crença inquestionável, por ser absolutamente confirmada por evidências empíricas: ninguém viu um cisne negro.

Até os contos das Mais Belas Histórias, de Cassasanta, os cisnes eram concebidos somente como brancos.

Aconteceu que com a descoberta da Austrália, os ornitólogos, e outros que estavam preocupados com a coloração das aves, foram tomados de espanto e viram que não estavam sabendo tudo a respeito dos cisnes, que também poderiam ter a cor negra.

Isso ilustra a limitação e a fragilidade do nosso conhecimento.

Não podemos dizer que conhecemos tudo. Como dizia o grande teólogo Juan Luis Segundo, a vida é um eterno aprender a aprender!

Ou seja, para se tratar de qualquer problema moral, a pessoa tem que se colocar na situação do humilde, que por mais sábio e cientista, pesquisador que for, ele não sabe tudo!

Ninguém sabe tudo! Temos que nos colocar sempre numa posição de quem está aberto a aprender.

E quando nos depararmos com o cisne negro, que cria um quebra de paradigma na pessoa que nunca passou pela cabeça que tal ser poderia existir...

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