O governo Fernando Henrique Cardoso e a inserção do Brasil em um mundo globalizado

AutorJuan Claudio Epsteyn
Páginas241-257
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Capítulo 14
O GOVERNO FERNANDO HENRIQUE CARDOSO E A
INSERÇÃO DO BRASIL EM UM MUNDO
GLOBALIZADO
Juan Claudio Epsteyn1
Introdução
Este capítulo pretende analisar as características essenciais
da Política Externa Brasileira (PEB) do governo Fernando Henrique
Cardoso (1995 2002). Nosso trabalho parte do princípio de que as
ideias e quadros conceituais são elementos chave que influenciam a
tomada de decisões dos encarregados da política externa
(GOLDSTEIN; KEOHANE, 1993). Será dada, portanto, uma ênfase
especial às crenças, percepções e interpretações sobre a realidade
internacional que foram empregadas pela diplomacia brasileira para
decidir e justificar as principais posturas internacionais no período
estudado.
A política externa do governo Cardoso foi o resultado da
culminação de um sofisticado esforço intelectual cuja finalidade era
assegurar uma “adaptação criativa” da agenda externa do país a uma
nova realidade dominada por quatro fatores centrais. Dois eram
internacionais: a emergência de uma nova ordem internacional no
1 Doutor em Ciência Política IUPERJ. Mestre em Relações Internacionais
FLACSO/Buenos Aires. Professor do Curso de Relações Internacionais do
IBMEC. Foi pesquisador do Instituto de Relações Internacio nais (IRI) da
Universidade Nacional de La Plata (Argentina), do Observatório Político
SulAmericano (OPSA) do IUPERJ e da Rede Latino -Americana de Política
Comercial (LATN) E-mail: epsteyn@outlook.com
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pós-guerra fria e a globalização. Os outros dois eram de natureza
doméstica: a consolidação democrática e a conjuntura econômica.
Partimos do pressuposto de que os fatores de natureza doméstica
tiveram um impacto limitado muitas vezes indireto sobre as
“grandes estratégias” concebidas pelo Itamaraty. Acreditamos,
entretanto, que o cenário externo caracterizado pela globalização,
a revitalização do multilateralismo, a preeminência dos temas
econômicos, a unipolaridade e a divisão do mundo em blocos
condicionou decisivamente o novo modelo de inserção internacional
adotado a partir dos primeiros anos da década de 1990.
1. Os antecedentes da política externa do governo FHC
O processo de “adaptação criativa” que desencadeou a
renovação das bases conceituais da política externa não começou em
1995. Foi consequência da crise profunda que, a partir do final dos
anos 80, provocou o desgaste do antigo consenso “autonomista” em
torno da inserção externa do País, vigente desde o governo Geisel.
Alguns elementos da política exterior de FHC remontam,
deste modo, às inovações introduzidas por Sarney dez anos antes
direitos humanos e meio ambiente e à dedicação com que Celso
Lafer último chanceler de Collor de Mello buscou recompor a
política externa, em plena crise de credibilidade que derivou no
afastamento de Collor, em outubro de 1992. As propostas brasileiras
na Conferência Rio-92 sobre meio ambiente constituíram a primeira
demonstração notável de que a diplomacia nacional tinha optado
pelo caminho da renovação paulatina, sem rupturas, através de uma
“adaptação criativa”.
A breve gestão de FHC como ministro das Relações
Exteriores (outubro de 1992 a maio de 1993) durante a presidência
de Itamar Franco contribuiu para a preservação da orientação geral
construída pouco antes por Lafer. O retorno de embaixadores ligados
à velha corrente terceiro-mundista ao comando do Itamaraty, após a
transferência de FHC para o Ministério da Fazenda, em maio de

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