Guernica: perdoar, mas nunca esquecer

AutorJosé Raimundo Gomes Da Cruz
CargoMestre e Doutor em Direito
Páginas1-3

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As recentes explosões terroristas do trem espanhol, com mortes, mutilações e sofrimentos de inúmeros civis inocentes me fizeram me lembrar de leitura feita em vôo de regresso da Califórnia, no jornal New York Times da data, 24/7/2000: "Em Guernica, determinação para 'perdoar, mas nunca esquecer'", texto assinado por Herbert Mitgang.

Haveria alguma contradição? Afinal, a anistia envolve os dois aspectos, conforme seu conceito: "Extinção da punibilidade de atos definidos como crimes, fazendo desaparecer a própria figura delituosa. Originário do grego, o termo anistia significa esquecimento de certos tipos de infrações, em geral de natureza política." ("Anistia". José Pedro Galvão de Souza, Clovis Lema Garcia e José Fraga Teixeira de Carvalho. Dicionário de Política. São Paulo : T. A. Queiroz, 1998). Trata-se de uma das manifestações do chamado direito de graça, decorrente da soberania do Estado e que conta argumentos contrários, por certa incoerência. Mesmo quando "as revoluções ainda não haviam atingido todo o caráter de Revolução - Revolução Mundial, patrocinada por solertes conexões ideológicas e municiada por superpotências - a anistia veio a ser usada no Brasil como instrumento de pacificação e restauração da ordem" (Souza, Garcia e Carvalho, ob. e loc. cit.).

Contudo, a resposta se encontra naquilo que afirmamos sobre o artigo XIV da Declaração Universal dos Direitos Humanos, cuja segunda parte "afasta o asilo no 'caso de perseguição legitimamente motivada por crimes de direito comum ou por atos contrários aos propósitos ou princípios das Nações Unidas'. Sendo evidente a motivação relativa aos chamados crimes comuns, no tocante a outros supostos crimes políticos, devem ser lembradas as salvaguardas da Lei Fundamental alemã, que, segundo Günter Dürig, consagram o princípio: Nenhuma liberdade aos inimigos da liberdade" ("Einführung zum Grundgesetz". Grundgesetz mit Verfassungsreform G 1994. 32. ed. Munique : C. H. Beck, 1994. p. XVI. Cf. José Raimundo Gomes da Cruz. "50 anos da Declaração dos Direitos Humanos". APMP Revista. v. 27. p. 26). O esquecimento puro e simples não justificaria tão sábia e justa previsão.

Mitgang, passeando pela tranqüila cidade basca de Guernica, ao norte de Bilbao, acha difícil imaginar a cena ocorrida há mais de sessenta anos, "quando uma inesquecível atrocidade aconteceu, nas vésperas da 2ª Guerra mundial. Só algumas marcas da devastação física ainda estão visíveis, mas o estrago humano permanece...

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