Holismo Metodológico Moderado: uma interpretação weberiana do modelo macro micro macro

AutorGert Albert
CargoDoutor e Livre Docente em Sociologia pela Universidade de Heidelberg
Páginas43-76
DOI: http://dx.doi.org/10.5007/2175-7984.2016v15n34p43
4343 – 76
Holismo Metodológico Moderado:
uma interpretação weberiana
do modelo macro-micro-macro1
Gert Albert2
Resumo
O artigo identif‌ica uma clara e indiscutível tendência antirreducionista na sociologia weberiana que
coloca em igual posição tanto o nível da ação quanto o nível da estrutura social. Com base nesse
pressuposto sugere-se que um paradigma weberiano poderia ser designado como um holismo me-
todológico moderado. Essa posição combina uma ontologia holista restrita com o modelo explica-
tivo macro-micro-macro. Com base nas atuais ref‌lexões sobre emergência, distingue-se o holismo
metodológico moderado de outras posições metodológicas, além de desenvolvê-lo adotando como
modelo explicativo os estudos weberianos sobre a ética protestante e a tipologia da dominação. Em
seguida demonstra-se que uma teoria da ação de tipo weberiano que adota o princípio “motivos
como causa” possui uma orientação fundamentalmente holista que, consequentemente, não exclui
da análise o nível da ordem social. Essa versão de um paradigma weberiano possui uma inclinação
de base ontológica com uma sociologia de orientação histórica e empírica.
Palavras-chave: Max Weber. Macro. Micro. Individualismo metodológico. Holismo metodológico.
Introdução
Weber costuma ser convencionalmente apresentado como um represen-
tante do individualismo metodológico. Se levarmos em consideração suas
declarações ociais sobre esse tema, isso não deixa de estar correto. Mas, jun-
to a tais manifestações, também podemos identicar em seus escritos uma
clara tendência antireducionista. Como arma Wolfgang Schluchter (2000a,
p. 91), em contraste com Mead, em Weber não existe um primado lógico
nem do indivíduo nem do processo social. omas Schwinn, da mesma
1 Tradução de Carlos Eduardo Sell.
2 Doutor e Livre Docente em Sociologia pela Universidade de Heidelberg e professor da Universidade das Forças
Ar-madas (Munique). Coordenador da coleção “Estudos para um paradigma weberiano da VS Editora de
Wiesbaden (Alemanha).
Holismo Metodológico Moderado: uma interpretação weberiana do modelo micro-macro | Gert Albert
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forma, é da opinião de que Weber evita privilegiar o nível individual ou o
nível estrutural em relação ao problema micro-macro, o que o transforma em
um interessante parceiro nas discussões atuais (SCHWINN, 1993, p. 235).
M. Rainer Lepsius, partindo de Weber, chega a armar que é o conito entre
as instituições que constitui o agente da história. Ele faz referência a famosa
frase de Marx e Engels e lhe confere um novo sentido: “a história de todas
as sociedades até hoje é a história das lutas entre as instituições” (LEPSIUS,
1997, p. 392). Naturalmente, essa armação não reete nenhuma concepção
macrossociológica pura, pois ele logo acrescenta: “as instituições operam sem-
pre através de atores e estes se orientam por certas ideias” (idem, p. 399). Por
m, Stefan Breuer, em seu esforço de desenvolvimento da sociologia da do-
minação de Weber, chega a uma conclusão semelhante, pois ele mostra coma
nos tipos de dominação existe uma prioridade do nível da ordem em relação
ao nível individual, na medida em que ele não entende a dominação racional
como institucionalização da racionalidade de ns, mas, com certo tom dur-
kheimiano, como “ordem sui generis” (BREUER, 1991, p. 194).
Tais armações parecem convergir tendencialmente para a posição que
Joseph Agassi, inspirado em Weber, formulou em seu famoso artigo de 1975
e que é chamada de “individualismo institucional” (ver também UDEHN,
2001, p. 218-221). No contexto do debate sobre individualismo e holismo,
que envolveu autores como Watkins, Popper, Gellner e Mandelbaum; Joseph
Agassi, representando a posição do racionalismo crítico, sustentou que: “ainda
assim, tanto o indivíduo quanto a sociedade podem ser considerados como
primários, ao menos no sentido de que não podemos reduzir a psicologia à
sociologia, nem a sociologia à psicologia” (AGASSI, 1975, p. 152). O indivi-
dualismo institucional de Agassi é uma tentativa de combinar o holismo com
o individualismo e é por isso, em contraste com o ponto de vista macrossocio-
lógico radical, que podemos falar de um holismo moderado.
Nesse artigo, inspirando-me também em Weber, busco desenvolver uma
interpretação holista-moderada do modelo macro-micro-macro. De que
modo essa interpretação se diferencia daquela elaborada pelo individualismo
metodológico da escolha racional? Para responder a essa pergunta procederei
da seguinte forma. Primeiramente, partindo das atuais discussões teóricas no
campo da losoa, esclareço a relação entre emergência e explicação causal.
Tomando essa discussão como pano de fundo, diferencio quatro posições so-
ciológicas: 1) individualismo metodológico radical, 2) individualismo meto-
dológico moderado3, 3) holismo metodológico radical e, por m, o 4) holismo
3 A distinção que Michael Schmid (1996, p. 63 e SS.) faz entre uma versão mais e outra menos radical do indi-
vidualismo metodológico converge com minha diferenciação entre uma versão radical e outra moderada.
Política & Sociedade - Florianópolis - Vol. 15 - Nº 34 - Set./Dez. de 2016
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metodológico moderado, a posição que defenderei aqui. Após, procuro mos-
trar como os estudos de Weber sobre a ética protestante, bem como sua so-
ciologia da dominação, podem ser compreendidos como modelos de uma
explicação sociológica de tipo holista, ainda que, é claro, moderada. A seguir
retomo a teoria weberiana da ação na perspectiva explicativo-compreensiva e,
a partir daí, formulo um argumento antireducionista. A conclusão pode ser
lida como a defesa de um paradigma weberiano entendido como um holismo
metodológico de tipo moderado (sobre o paradigma weberiano ver Albert
(2003) e Schluchter (2003 e 2005)).
Emergência e explicação causal
O holismo metodológico moderado compartilha com o individualismo
metodológico o modelo macro-micro-macro de explicação sociológica, mas
lhe confere uma interpretação diferente. Do holismo metodológico radical
(ou coletivismo) ele adota o pressuposto da emergência, mas, em contraste
com ele, assume uma posição individualista, baseada na teoria da ação, ou
seja, ele rejeita uma macrossociologia pura. Para esclarecer melhor essa posição
apresento quatro pontos de vista metodológicos que podem ser encontrados
atualmente na sociologia4:
"
4 O mesmo procedimento, mas com conclusões completamente diversas, é adotado por Bettina Heinz (2004).

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