O setor agrícola nos países desenvolvidos e em desenvolvimento: comparação entre a América do Sul e União Européia por meio do índice Malmquist (1980-2002)

AutorAdayr da Silva Ilha/Rubia Cristina Wegner
CargoUniversidade de Viçosa (UFV). Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Universidade Federal de Santa Maria (UFSM).
Páginas13-26

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1 Introdução

Os ganhos de comércio da agricultura pela União Européia se sustentam especialmente por elevados subsídios agrícolas aos produtores (PERALES, 1994) de modo que não se explicam, necessariamente, pela maior produtividade em comparação aos países em desenvolvimento, no caso do presente estudo, os sulamericanos.

Por outro lado, o confronto da produtividade total dos fatores agrícola entre países desenvolvidos e em desenvolvimento, estudados anteriormente, tem demonstrado a queda da produtividade dos países em desenvolvimento (FULGINITI; PERRIN, 1997), destarte o intenso processo de modernização por que o setor desses países passou a denominada Revolução Verde.

Contudo, os percalços enfrentados pelo comércio agrícola vão além do protecionismo. Afinal, alimentos e matéria-prima estão subjugados às modificações e tendências estruturais dos seus respectivos mercados internacionais, ao lento crescimento da população nos países desenvolvidos, à baixa elasticidade renda da demanda e à substituição por produtos sintéticos, levando à redução nos preços (FAO, 1994; TODARO, 1991).

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Nessa perspectiva, incrementos na produtividade agrícola podem ser convertidos em suficiência alimentar e excedentes comerciais, além de representarem, por meio do progresso tecnológico, commodities agrícolas mais processadas (EHUI; DELGADO, 1999), sendo que, especialmente para os países em desenvolvimento, a capacidade em produzir mais produtos agrícolas, como grãos e gado, com menor quantidade de insumos é certamente o aspecto principal para o bom funcionamento do setor agrícola e, conseqüentemente, da economia como um todo.

Decompor a produtividade total dos fatores em variação tecnológica e variação de eficiência técnica proporciona uma forma alternativa de contrastar convergência no crescimento da produtividade, assim como identificar a inovação. (RODRÍGUEZ; AYUSO, 2004) entre países desenvolvidos e em desenvolvimento.

Dessa forma, na seção 1 levantam-se os principais percalços do setor agrícola nos mercados mundiais. Na seção 3 inicialmente se expõe o uso do índice Malmquist para averiguar o desempenho do setor agrícola em países com diferentes níveis de desenvolvimento econômico e, em seguida, apresenta-se a metodologia. Na seção 5 são traduzidos os resultados e a discussão dos mesmos e por fim, as considerações finais.

2 Objetivo

Os objetivos principais desse estudo são determinar as diferenças entre os países sul-americanos e União Européia nos ganhos de eficiência técnica e variação tecnológica; estabelecer uma relação entre o efeito catch-up (alteração da eficiência técnica) e variações positivas na fronteira de produção (progresso tecnológico).

3 -A agricultura e comércio nos países desenvolvidos e em desenvolvimento: União Européia e América do Sul

A agricultura se apresenta como setor primordial para o desenvolvimento econômico de um país, tanto pelos ganhos comerciais quanto pelas questões socioeconômicas que abarca. Desde a percepção de que o protecionismo agrícola articulado pelos países desenvolvidos era preterido das discussões nas rodadas do GATT, a conseqüente elaboração de propostas para a rodada do Uruguai, capazes de multilateralizar o máximo possível o comércio agrícola, as transformações na produção e no consumo de bens agrícolas constituem fatores responsáveis por evidenciar as diferenças entre países desenvolvidos em desenvolvimento no setor.

Essas transformações estruturais no comércio agrícola têm contribuído para a perda de importância relativa do fluxo comercial agrícola no comércio internacional como um todo (FAO, 2005), embora não tenha estagnado. O protecionismo em si leva ao crescimento das exportações agrícolas entre os países desenvolvidos, especialmente da União Européia, "[...] cuya participación en las exportaciones agrícolas totales ha pasado de algo más del 20 por ciento a comienzos del decenio de 1960 a más del 40 por ciento en la actualidad" (FAO, 2005, p. 16).

A agricultura nos países sul-americanos foi objeto de intenso e abrupto processo de modernização a partir dos anos 1950 até os anos 1980, a denominada Revolução Verde, embora as tecnologias e técnicas empregadas não tenham sido uniformes entre os mesmos (PIÑEIRO et al., 1983). Esse projeto modernizante assumiu caráter público em termos de envolvimento de instituições estatais nas pesquisas agropecuárias, porém manteve a estrutura oligárquica de posse de terras nesses países.

Estudos têm demonstrado por meio da aplicação do índice Malmquist para analisar a produtividade agrícola dos países em desenvolvimento que atravessaram a Revolução Verde, que os incrementos de produtividade agrícola, nesses países, foram relativamente pequenos, dado o contexto de introdução de novas técnicas agrícolas que envolveram esse período.

Do esgotamento da Revolução Verde, enquanto catalisadora do incremento da produtividade agrícola proporcionalmente ao crescimento populacional desses países e, assim, da formação de excedente exportável se promove a bio-revolução. Essa teria por maior objetivo reduzir a dependência dos países em desenvolvimento dos países desenvolvidos na obtenção de insumos agroquímicos, logo, possibilitaria uma produção agrícola com menores custos, maior produtividade, maior variedade de produtos.

Nessa perspectiva, a existência do efeito catch-up, o qual implica na redução das distâncias por parte dos países mais atrasados em relação aos mais ricos (BAUMOL et al, 1994). O crescimento da produtividade por meio da variação tecnológica tem desempenhado importante papel no crescimento da agricultura. Esse fato explica o porquê das taxas de crescimento da produtividade para grãos e gado serem também um fator determinante na mudança da composição do comércio agrícola (EHUI; DELGADO, 1999).

Quando a motivação do estudo é a diferença de crescimento da produtividade total dos fatores entre países desenvolvidos e em desenvolvimento, cabe ressaltar que essa diferença pode afetar o crescimento da produtividade por meio de efeitos das políticas agrícolas. Depreende-se, pois, políticas públicas que fomentariam a inovação tecnológica na agricultura, bem como

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a maneira como o governo interfere nas políticas de comércio internacional (COYLE et al, 1998).

Considerando-se que a produtividade é fundamental para o crescimento econômico e, no caso, da agricultura, é de fundamental importância avançar no diagnóstico das ferramentas e instrumentos capazes de levar a um conhecimento mais específico da produtividade ao longo do tempo.

4 Metodologia
4. 1 Compreensão do desempenho da agricultura por meio do índice Malmquist de produtividade total dos fatores: comparações e fundamentos teóricos

A presente subseção objetiva expor o uso da programação matemática -Análise Envoltória de Dados e, por conseguinte, do índice Malmquist de produtividade total dos fatores por meio de breve revisão bibliográfica de estudos que se valeram dessa metodologia. Assim, pretende-se mostrar as principais maneiras em que se dá a abordagem DEa-Malmquist. Ressalta-se que o estudo de medidas de eficiência fornecidas pelos métodos em questão, baseado em técnicas não-paramétricas surgiu da proposição de que cada unidade de produção fosse avaliada em relação às demais como um conjunto homogêneo e representativo.

A concepção de produtividade total dos fatores se fundamenta na relação entre tecnologia e formação de capital como determinantes das análises de crescimento. Dessa forma, a produtividade como fonte de crescimento consiste em mensurar o grau em que o produto cresce em função de fatores tecnológicos e quanto será destinado a formação de capital (HULTEN, 2000).

Produtividade total dos fatores é, logo, uma taxa de crescimento, sendo de interesse para comparações intertemporais para um dado pais ou região em diferentes períodos, embora "[...] a developing country may have a more rapid growth of total factor productitvity than a developed country because it starts from a lower level and is able to import technology." (HULTEN, 2000, p. 26). Portanto, comparar a produtividade de países em desenvolvimento e desenvolvidos incorre nessa possível distorção de resultados.

A Análise Envoltória de Dados (DEa) enquanto instrumento para obtenção de funções/distãncia e medidas de eficiência técnica na produção foi desenvolvida inicialmente por Charnes et al (1994), a qual permite mensurar a eficiência na produção de uma unidade produtiva em termos da quantidade pela qual o produto possa ser incrementado para aumentar a eficiência, dada à quantidade de insumo utilizada pela unidade produtiva analisada. Esse método surge como alternativa aos métodos estocásticos convencionais para análise da eficiência, constituindo-se numa técnica não-paramétrica que utiliza a programação matemática para analisar a eficiência relativa das unidades de produção.

Alauddin et al (2005) utilizaram o índice Malmquist de produtividade total dos fatores com fronteiras estocásticas de produção para determinar as funções-distância requeridas pelo índice. Analisaram, dessa maneira, possíveis crescimentos da produtividade total dos fatores de 111 países, incluindo Europa e América Latina, no período de 1970 a 2000. Os autores concluíram que embora tenham observado considerável progresso tecnológico, os incrementos de produtividade agrícola foram bastante modestos, além das condições que teriam determinado efeito catch-up teriam sido determinadas por recursos naturais, nos países analisados, de modo geral.

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