A família matrimonializada e o concubinato adulterino: questões patrimoniais

AutorLuciana Vidal Fernandes
CargoDiscente do curso de Direito da Universidade Norte do Paraná (UNOPAR)
Páginas57-62

    Artigo originado de trabalho de conclusão de curso, orientado pela professora Ms. Cíntia Laia dos Reis e Silva Pupio.

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1 Introdução

O tema em questão tem como objetivo analisar os dispositivos legais que tutelam a família, mais especificamente a família matrimonializada, quando há a ocorrência de um segundo relacionamento simultaneamente com o casamento, denominado concubinato adulterino.

E, por conseqüência, verificar o posicionamento jurisprudencial quanto à concessão ou não de direitos a esses relacionamentos concubinários.

Nos primórdios da existência humana, não havia a formação da família. Os indivíduos viviam em casamentos por grupos, segundo os mandamentos do direito materno, onde não se podia identificar com certeza a paternidade.

Com a evolução da civilização e principalmente com o homem tomando a direção da casa, houve a necessidade da extinção do casamento por grupo para garantir a certeza de paternidade dos herdeiros.

Para esse fim, a infidelidade feminina passou a ser combatida e rigorosamente punida, enquanto para infidelidade masculina não se faziam objeções.

Nota-se que a finalidade da monogamia se consistiu unicamente devido à exigência econômica da época, ou seja, na procriação dos filhos com a certeza da paternidade para que pudessem suceder os pais na posse dos bens, e não "fruto do amor sexual individual", conforme assevera Engels (2000, p. 70).

Ao homem era permitido conviver com mais de uma mulher e, à medida que a idéia de propriedade se aperfeiçoava, os homens passaram a diferenciar as mulheres em esposas e concubinas.

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Repudiavam o adultério, mas a convivência em concubinato, masculina, era perfeitamente justificável.

Pode-se dizer, então, que, com a abolição do estágio primitivo em que vivia o homem, estabeleceu-se a necessidade e até mesmo a obrigação da fidelidade.

A partir de então, o adultério passa a ser repudiado e castigado, cunho de imoralidade que passa a pertencer a todos os períodos da evolução da civilização até os dias atuais.

Dessa forma, impregnado de imoralidade advinda do adultério, todas as relações que não fossem constituídas segundo as regras matrimoniais vigentes estavam maculadas e, conseqüentemente, à margem da sociedade. Assim ocorreu com o concubinato.

O presente ensaio visa abordar as questões sobreditas, ainda que perfunctoriamente, sem qualquer pretensão de exaurir a matéria, mas possibilitar uma visão pontual e de iniciação científica da mesma.

2 O Concubinato no Brasil

No Brasil, desde o início da formação étnica brasileira, nota-se a presença do concubinato.

O concubinato foi visto pela sociedade, principalmente devido às influências religiosas, como um pecado social grave e considerado um fato ilícito, sendo-lhe negada eficácia jurídica mesmo quando se tratava do concubinato honesto2 .

As Ordenações vigentes no Brasil, desde a época imperial, estão impregnadas de influências religiosas da Igreja Católica e de mandamentos advindos das Ordenações de Portugal, algumas tendências, inclusive, persistindo até os dias atuais.

Profundamente inspirado pelo Concílio de Trento3 , o direito eclesiástico definia como grave pecado o concubinato de pessoas solteiras, mas gravíssimo e de especial desprezo o concubinato de pessoas casadas, como definiu Ronaldo Vainfas (1987, p. 39).

Ao que tudo indica, a grande preocupação do direito eclesiástico colonial estava mais em relação ao adultério do que com o concubinato; e mais ainda em relação à dissolução matrimonial que com o adultério.

Quanto às Ordenações advindas de Portugal, notase influências inclusive em legislações atuais, a exemplo o artigo 1642, V do Código Civil que dispõe sobre a vedação de doação feita pelo cônjuge adúltero ao seu concubino.

A herança de imoralidade atribuída às relações concubinárias, presentes até mesmo nos dias de hoje, devia-se à associação deste ao adultério, pois entendiam

que o concubinato mais estava ligado à amante do homem casado que com à vida marital.

Mesmo depois da admissão do divórcio pela Emenda Constitucional nº 9 de 1977, continuou vigorando a situação de marginalização das uniões livres.

Os conflitos decorrentes das relações concubinárias, na maioria das vezes, eram tratados pelos Tribunais, que se arriscavam a decidir as questões.

Lembra Washington de Barros Monteiro (2001) que a verdadeira história das grandezas e misérias do concubinato só pode ser encontrada nas decisões pretorianas.

Por grande período, permaneceram às margens do ordenamento brasileiro as uniões livres. Aos poucos, surgiram leis, decretos e súmulas regulando os conflitos decorrentes das relações de concubinato.

O Código Civil de 1916 em nada reconheceu os direitos ao concubinato, exceto quanto à possibilidade de investigação de paternidade4 .

Entretanto, com a crescente freqüência dos conflitos decorrentes do concubinato, houve a necessidade da resolução desses conflitos.

Por volta de 1963, o Superior Tribunal Federal editou a Súmula 380 que estabelecia a concessão de direito à partilha entre os concubinos, verificando-se o esforço comum de ambos na constituição do patrimônio.

Com a Constituição Federal de 1988, houve o reconhecimento da união estável como forma legítima de constituição de família, ampliando-se, assim, o conceito de família que, além da união estável, incluiu a família monoparental.5

3 Relações Familiares e a Nova Constituição da República

A Constituição da República apenas reconheceu "status" jurídico ao que já era produto de construção jurisprudencial. A regulamentação da união estável só ocorreu com as Leis 8.971/94 e 9.278/96.

A partir de então, os termos concubinato e concubino passaram a ser utilizados para se referirem a indivíduos que constituíssem uma relação onde pelo menos um deles fosse possuidor de impedimentos de ordem legal ou biológica.

E para os indivíduos desimpedidos que constituíssem união estável, passou-se a utilizar, preferencialmente pelos legisladores, os termos conviventes ou companheiros.

No rol de impedidos, incluem-se os casados, constituindo o concubinato adulterino, os que possuem

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impedimentos de ordem biológica, no denominado concubinato incestuoso e os que já estão em união...

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