Ibotirama - Vara cível

Data de publicação20 Dezembro 2022
SeçãoCADERNO 3 - ENTRÂNCIA INTERMEDIÁRIA
Número da edição3238
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
V DOS FEITOS DE REL DE CONS CIV E COMERCIAIS DE IBOTIRAMA
INTIMAÇÃO

8000541-75.2020.8.05.0099 Procedimento Do Juizado Especial Cível
Jurisdição: Ibotirama
Autor: Higor Santana Guimaraes
Advogado: Higor Santana Guimaraes (OAB:BA53080)
Reu: Departamento Estadual De Transito (detran)-bahia
Advogado: Maria Auxiliadora Torres Rocha (OAB:BA6916)

Intimação:

Vistos, etc.

Dispensado o relatório conforme permite o rito.

HIGOR SANTANA GUIMARÃES ajuizou AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C DANOS MORAIS, DEMORA INJUSTIFICADA LIBERAÇÃO DE EMPLACAMENTO/DOCUMENTO VEÍCULO contra DEPARTAMENTO ESTADUAL DE TRÂNSITO DA BAHIA, alegando, em síntese, que adquiriu um veículo moto, Honda, CG 125, KS, ano 2011/2012, chassi de n° 9C2JC4110CR479935, em um leilao realizado na cidade de Barreiras – BA, em 06/05/2020, e que já se passaram mais de 03 (três) meses da arrematação do bem e da entrega dos documentos ao acionado para efetuar a devida transferência, porém até a presente data nada foi feito, razão pela qual requer seja julgado totalmente procedente a acao, obrigando o Reu, liminarmente, a fazer a liberacao do emplacamento e do documento do veiculo, bem como condenando o Reu ao pagamento de danos morais no montante nao inferior a R$ 20.000,00 (vinte mil reais).

Em defesa, a ré alega, em síntese, que o impeditivo da transferência alegado pela parte autora trata-se de um erro sistêmico que ocorre quando o veículo nunca foi emplacado bem como não possui registro em sua base de dados. Que a Comissao de Leilao ao tomar conhecimento do problema sistemico em relacao aos veiculos de 1o emplacamento, de pronto registrou o Chamado - ID 114647 no sistema SGA, em 22/06/2020, a fim de que o setor de Tecnologia da Informacao desta Autarquia pudesse solucionar o imbroglio, juntamente com a Diretoria de Veiculos, ja que o problema ocorre na base de registro de veiculos, nao sendo por causa de dados de leilao. No mérito, sustentou pelo descabimento do pedido de inversão do ônus da prova com a inaplicabilidade do CDC na presente lide, bem como pela ausência de reparação por danos morais.

DECIDO.

JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE

Esclareço que o juiz, enquanto destinatário das provas (art. 370 do CPC), tem o dever de promover o julgamento imediato da lide quando presentes os requisitos para tanto, dado os princípios da duração razoável do processo (art. 5º, inc. LXXVIII, da CF) e primazia da resolução de mérito (art. 4º do CPC).

No mais, verifico que o processo se encontra formalmente em ordem, sem nulidades a serem sanadas, trata-se de prova exclusivamente documental, não havendo requerimento para produção de provas, de modo que, presentes os pressupostos processuais e as condições da ação, passo ao exame do mérito.

MÉRITO

Inicialmente, cumpre destacar que, de acordo com o Código de Defesa do Consumidor, os órgãos públicos, bem como as suas empresas, devem prestar um serviço adequado, eficaz, sob pena de ser responsabilizado em caso de descumprimento total ou parcial de sua obrigação, conforme se pode extrair do dispositivo abaixo:

Art. 22. Os orgaos publicos, por si ou suas empresas, concessionarias, permissionarias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, sao obrigados a fornecer servicos adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, continuos.


Paragrafo unico. Nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigacoes referidas neste artigo, serao as pessoas juridicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados, na forma prevista neste codigo.


De acordo com o dispositivo supramencionado, verifica-se que o comando normativo abrange a todos os servicos publicos, como também prevê a responsabilidade por sua atuacao contraria aos ditames do referido Codigo. Desta feita, não há dúvidas quanto a incidência do CDC ao presente caso.


Em que pese a alegação da ré no sentido de que a presente demanda se trata de obrigação de fazer no que diz respeito a prestação de serviço público ofertado por Pessoa Jurídica de Direito Público, integrante da Administração Pública Indireta, e não de atividade fornecida no mercado de consumo, o CDC é claro quanto a sua aplicabilidade também aos órgãos públicos.

Neste sentido, Rizzatto Nunes sustenta que: “o prestador público está submetido exatamente a todas as normas que recaem sobre o prestador de serviço privados”. (RIZZATTO NUNES, Luiz Antonio. Curso de Direito do Consumidor. 7. Ed. São Paulo: Saraiva, 2012. P. 169).

O autor alega nos autos que participou de um leilão organizado pelo Detran/BA, na cidade de Barreiras-BA, ocasião em que adquiriu a motocicleta descrita na inicial. A despeito de ter efetuado o pagamento da arrematação e de todos os tributos incidentes sobre o bem, não conseguiu circular livremente, uma vez que o órgão estava demorando em dar baixa no gravame incidente sobre a motocicleta, além de atrasar a documentação de transferência.

A alegação da parte ré, em sua contestação, no sentido de que a Comissão de Leilão, ao tomar conhecimento do problema relacionado ao emplacamento dos veículos leiloados, sob a égide de que o impeditivo da transferência se deu por conta de um erro sistêmico ocorrido quando o veículo nunca foi emplacado, bem como pela falta de registro na base do Detran, não justifica sequer o vasto lapso temporal para realização da autorização de emplacamento do veículo, vez que o comprador encontra-se até a presente data impossibilitado de usufruir do veículo adquirido a fim de utilizá-lo para exercer as suas atividades laborais.

Ademais, o Termo de Condições do Leilão (ID 72776967) juntado aos autos é claro em seu tópico 7.11 de que o arrematante é o responsável pela regularização e transferência da propriedade do veículo, a qual deverá ocorrer no prazo de 30 (trinta) dias, a contar de sua liberação pelo órgão. Neste sentido, nota-se que o bem fora retirado do pátio no dia 29/05/2020, tendo o acionante realizado a vistoria veicular no dia 06/06/2020. Ocorre, contudo, que mesmo o veículo estando apto para ser transferido para o nome do requerente, somado ao fato do requerente já ter entregado todos os documentos necessários no referido órgão, não justifica, portanto, as alegações suscitadas pela autarquia ré no tocante a demora para a prestação da obrigação devida.

Outrossim, os documentos juntados pela parte ré nos Ids 92303958/ 92304000/ 92304065/ 92304065/ 92304135 não restou comprovado, tampouco justificou a carência de efetividade para o cumprimento da presente obrigação firmada como o autor.

Observa-se ainda, que a ré juntou no ID 92304135 o documento relativo ao chamado (ID 114647) realizado em 22/06/2020 perante o sistema SGA. Em que pese a realização do referido chamado, verifica-se que não fora solucionado o imbróglio alegado, vez que o autor ainda se encontra com o seu veículo parado, de forma ilegal, pela falta do emplacamento e da documentação devida.

No que se refere ao dano moral está ele também amplamente assegurado pelo Ordenamento Jurídico Nacional, precipuamente no art. 5º, X, da Constituição Federal que proclama ser inviolável a honra e assegura a indenização pelo dano moral decorrentes da respectiva violação.

É também nesta linha que o Código Civil, em seu art. 186, reconhece expressamente a existência de dano moral ao dispor, verbis: "Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”. (grifei)

Daí a palavra abalizada do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro sobre dano moral: "Todo e qualquer dano causado a alguém, ou ao seu patrimônio, deve ser indenizado, de tal obrigação, não se excluindo o mais importante deles, que é o dano moral, que deve ser autonomamente levado em conta" (Rev. dos Tribunais 497/203).

A indenização por danos morais não pode ser avaliada mediante apenas um cálculo matemático, pois tem ela outro sentido: além o da punição, se propõe a compensar a sensação de dor da vítima. Portanto, tal paga em dinheiro deve representar para a vítima uma satisfação psicológica, capaz de neutralizar o sofrimento impingido.

O Tribunal de Justiça de São Paulo, em caso semelhante, assim decidiu: “A vítima de lesão a direitos de natureza não-patrimonial (Constituição Federal, art. 5º, inciso V e X) deve receber uma soma que lhe compense a dor e a humilhação sofridas, e arbitradas segundo as circunstâncias. Não deve ser fonte de enriquecimento, nem ser inexpressiva”.

De mais a mais, é salutar ressaltar que o Superior Tribunal de Justiça, apesar de posição divergente na doutrina, já entendeu que os prejuízos decorrentes do dano moral não precisam ser provados, apenas sendo necessária a comprovação da violação do direito constitucionalmente assegurado, veja:

"A concepção atual da doutrina orienta-se no sentido de que a responsabilização do agente causador do dano moral opera-se por força do simples fato da violação (damnum in re ipsa), não havendo que se cogitar da prova do prejuízo" (REsp nº 23.575-DF, Relator Ministro César Asfor Rocha, DJU 01/09/97). "Dano moral - Prova. Não há que se falar em prova do dano moral, mas, sim, na prova do fato que gerou a dor, o sofrimento, sentimentos íntimos que os ensejam (...)"...

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