A Prova Ilícita no Direito de Família e o Conflito de Valores

AutorRolf Madaleno
Ocupação do AutorAdvogado e Professor de Direito de Família e Sucessões na PUC/RS; Diretor Nacional do IBDFAM; Vice-Presidente do IARGS.
Páginas557-573

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Conflito de ValoresConflito de Valores
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SUMÁRIO: 1 A Prova. 2 A Formação da Convicção pela Prova. 3 Princípios da Prova. 4 Provas Típicas e Atípicas. 5 Prova Ilícita e Prova Ilegítima. 6 Provas Ilícitas. 7 A Utilização das Provas Ilícitas no Direito de Família. 8 Princípio da Proporcionalidade.

1 A Prova 1 A Prova1 A Prova 1 A Prova1 A Prova

Segundo Francesco Carnelutti1, entre todos os fatos afirmados pelas partes em um processo, existe uma zona neutra de ações afirmadas tão-só por uma ou algumas das partes, mas não admitidos, embora possam existir ou não. São acontecimentos havidos por controvertidos e, portanto, se constituem em matéria de prova, deparando-se o julgador com a afirmação positiva de um e a negativa do outro, sendo necessário proporcionar os meios processuais de prova para a solução do impasse entre duas aparentes, mas contraditórias verdades.

A função da prova processual é fornecer ao juiz os elementos e argumentos de sua decisão, afastando suas dúvidas e inquietações, para que possa concluir com convicção e segurança.

Assim, só haverá necessidade de prova a despeito de alguma alegação contestada, cuja exatidão e verossimilhança precisarão ser comprovadas, de regra, pela iniciativa das partes interessadas na sua demonstração processual, com influência no resultado da sentença, sendo certo aduzir que o juiz não está restrito à iniciativa probatória dos litigantes, porque não atua na demanda como se fosse um mero espectador, mas, ao

* Advogado e Professor de Direito de Família e Sucessões na PUC/RS; Diretor Nacional do IBDFAM;

Vice-Presidente do IARGS. .

1 CARNELUTTI, Francesco. La prueba civil. 2. ed. Buenos Aires: Depalma, 1982, p. 15.

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contrário, pode e até deve, de ofício, comandar a busca dos elementos comprobatórios havidos como necessários à instrução do processo, inclusive indeferindo as diligências inúteis ou meramente protelatórias (art. 130 do CPC).

Contudo, salvo expressas exceções, quem alega tem a tarefa de demonstrar a veracidade entre o fato constitutivo de seu direito e o fundamento jurídico de seu pedido, pois disto depende a formação de convencimento do juiz, cuja avaliação da prova é discricionária, atendendo aos elementos constantes dos autos, ainda que não alegados pelas partes, mas ditará na sua sentença os motivos que lhe formaram o convencimento (art. 131 do CPC).

2 A Formação da Convicção pela Prova
2 A Formação da Convicção pela Prova2 A Formação da Convicção pela Prova


2 A Formação da Convicção pela Prova2 A Formação da Convicção pela Prova

Como é da estrutura do procedimento ordinário brasileiro, há uma fase do processo destinado especificamente à instrução da demanda, desta feita destinada à coleta de um conjunto complementar e tradicional de provas, consistente nos depoimentos pessoais das partes e audiência das testemunhas arroladas e, se necessário e viável, também pode ser realizada prova pericial. A rigor, contudo, a fase de instrução do processo não responde a um momento exato do procedimento, e assim acontece porque, por exemplo, no tocante às provas materiais, o autor tem a obrigação de instruir a petição inicial com os documentos indispensáveis à propositura da ação (art. 283 do CPC) e, por sua vez, tem o réu o ônus de especificar as provas que deseja produzir, juntando com a contestação o acervo material relacionado à sua defesa para servir de contraprova processual.

Entretanto, nenhum rigor absoluto comanda a instrução do feito, mesmo porque nem toda a demanda prescinde da determinação de provas, quando, por exemplo, a questão de mérito for apenas de direito, ou, sendo de direito e de fato, não houver necessidade de produzi-la em audiência, ou, ainda, quando ocorrer a revelia, permitindo possa o juiz conhecer diretamente do pedido, proferindo sentença (art. 330 do CPC), não se tratando de direitos indisponíveis (art. 320, II, do CPC), como usualmente são aqueles provenientes das relações de família.

Também não dependem de prova os fatos notórios afirmados por uma das partes e confessados pela outra, bem como aqueles admitidos como incontroversos e, por fim, aqueles fatos em cujo favor milita presunção legal da existência ou de veracidade (art. 334 do CPC).

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O art. 212 do Código Civil admite a prova do fato jurídico pela confissão, documento, testemunha, presunção ou perícia, enquanto que o art. 440 do Código de Processo Civil também abre a possibilidade da inspeção judicial de pessoas ou coisas, como importante elemento de pesquisa da verdade dos acontecimentos.

Em qualquer caso, pode o juiz determinar de ofício ou a requerimento da parte as provas necessárias à instrução do processo, indeferindo as diligências inúteis ou meramente protelatórias (art. 130 do CPC), apreciando livremente a prova, atento aos fatos e circunstâncias constantes dos autos, ainda que não alegados pelas partes; embora deva indicar na sentença os motivos que lhe formaram o convencimento (art. 131 do CPC).

Neste contexto, os meios probatórios buscam alcançar a verdade e a partir dela ou o mais próximo possível da realidade realizar a justiça das decisões judiciais, mas não uma justiça a qualquer preço e sem nenhum limite, tendo em conta que certos meios probatórios podem ser vetados, quando afetam direito fundamental considerado mais relevante.

3 Princípios da Prova
3 Princípios da Prova3 Princípios da Prova
3 Princípios da Prova3 Princípios da Prova


A função atual do Direito é a de estimular o desenvolvimento social

da ação humana, no pertinente ao valor supremo da dignidade pessoal; em seu nome são criadas as regras jurídicas a serem aplicadas pelo juiz. Entretanto, na dinâmica da vida e dos interesses sociais, nem sempre o Direito tem seu sistema de regras inteiramente contextualizadas, não sendo nada raro deparar com lacunas e antinomias, ou simplesmente não encontrar respostas para o caso concreto e não previsto em lei.

Também a realidade muda e o Direito precisa contemplar estes novos parâmetros sociais, o que tem sido obtido com o uso da jurisprudência, ao promover o harmonioso encontro do Direito com os novos padrões de conduta, sintonizados com a felicidade e a realização da pessoa humana.

Portanto, numa dimensão acima das regras, figuram os princípios, como base de sustentação de todo o sistema legal brasileiro, quer no campo do direito material como processual.

Assim também sucede no âmbito da prova no processo civil, instituto envolto em diversos princípios, todos eles atuando como pilares fundamentais de sua estrutura e direção. Sendo o processo judiciário uma ciência autônoma, a prova está dotada de princípios próprios, considerados verdadeiros enunciados, muitos deles com assento na Constituição Federal,

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como “o do contraditório, da ampla defesa, da oralidade, da imediatidade física do juiz, da concentração, da publicidade, da verdade real, do livre convencimento motivado, da comunhão, da imaculação”, ou da proibição de prova obtida por meios ilícitos (art. 5º, incisos XII e LVI, da CF)2.

Disposição estabelecida por igual, no art. 332 do Código de Processo Civil, de serem admitidos todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados no Código. Destarte, na conformidade do art. 332 do CPC, como princípio de prova, todos os meios legais são aptos para demonstrar a verdade dos fatos, sobre os quais se funda o pedido da ação ou da defesa, ainda que não tenham sido legalmente previstos, mas só servirão como prova se forem moralmente legítimos.

Impõe assim a Carta Federal restrições à liberdade probatória, não admitindo a prova ilícita, que rompe o equilíbrio das partes no processo, tal qual aquela obtida por meios moralmente ilegítimos, como ocorre com a violação do sigilo de correspondência, podendo integrar este rol a inter-ceptação da correspondência virtual, e das comunicações telegráficas, ou de dados e comunicações telefônicas, à exceção, nesta última hipótese, quando realizada por ordem judicial para fins de investigação criminal ou instrução processual penal (art. 5º, inciso XII, da CF).

O valor maior a ser protegido é o da dignidade da pessoa humana, o que, portanto, permite consignar a possibilidade de relativização da garantia constitucional de vedação da prova ilícita, quando estiver em risco a supremacia dos direitos da pessoa humana, sua honra e sua dignidade.

4 Provas Típicas e Atípicas
4 Provas Típicas e Atípicas4 Provas Típicas e Atípicas


4 Provas Típicas e Atípicas4 Provas Típicas e Atípicas

As provas textualmente identificadas em lei são denominadas de típicas, em contraponto com as provas chamadas de atípicas ou inominadas3. São provas não reguladas expressamente em lei; contudo, tampouco vetadas, mas, ao contrário, surgem de diversas passagens da legislação processual, tanto que o juiz pode buscar nestas outras fontes de convencimento, maiores subsídios para atender aos postulados judiciais. Estas provas atípicas ou menos convencionais podem servir como úteis elementos de

2 GIORGIS, José Carlos Teixeira. O Direito de Família e as provas ilícitas. In: Welter, Belmiro Pedro; Madaleno, Rolf Hanssen. (Coords.). Direitos fundamentais do Direito de Família. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004, p. 140.

3 CAMBI, Eduardo. A prova civil, admissibilidade e relevância. São Paulo: RT, 2006, p. 40.

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