In claris cessat interpretatio? Algumas considerações em torno dos limites da interpretação jurídica

AutorTercio Sampaio Ferraz Jr.
Páginas153-166
IN CLARIS CESSAT INTERPRETATIO?
ALGUMAS CONSIDERAÇÕES EM TORNO DOS
LIMITES DA INTERPRETAÇÃO JURÍDICA
Tercio Sampaio Ferraz Jr.
Sumário: 1. A interpretação jurídica. 2. A norma como comunicação. 3. O jogo interpretativo:
códigos fortes e códigos fracos. 4. Limites à interpretação: limitação normativa. 4.1 Norma
legal sobre nova jurisprudência. 4.2 Lei interpretativa. 5. Limitações principiológicas ou dou-
trinárias. 6. A limitação mediante o sentido normal das palavras. 7. A limitação mediante o
brocardo in claris cessat interpretatio. 8. Revisão pragmática da noção de clareza. 9. Clareza:
nem ponto de partida nem ponto nal da interpretação.
1. A INTERPRETAÇÃO JURÍDICA
A interpretação jurídica, como tarefa dogmática, ocorre num amplo espectro de
possibilidades. Envolve o direito como um fenômeno complexo de comunicação, na
perspectiva da decidibilidade de conf‌litos. O jurista não interpreta do mesmo modo em
que o faz o ser humano, ordinariamente, quando procura entender a mensagem de alguém
numa simples conversa. A comunicação jurídica ocorre sempre entre três emissores que
são ao mesmo tempo receptores.
A interpretação jurídica tem por objeto determinar o sentido vinculante da nor-
matividade. Que está no ato, na omissão, no comportamento, nas prescrições, nas reco-
mendações, nas políticas, na organização etc. Por simplif‌icação e abstração, costuma-se
dizer que interpretamos normas jurídicas. Ora o sentido do seu dever-ser, ora o sentido
daquilo que por elas deve-ser, ora o sentido do seu dever-ser para os destinatários, ora
o sentido do seu dever-ser para quem dita normas. Na prática, ora nos f‌ixamos num
desses pontos: interpretamos ou sua validade ou o seu signif‌icado ou a sua ef‌icácia ou
a sua função. Fixar num desses pontos signif‌ica atribuir-lhe relevância em vista de um
objetivo. Esse objetivo pode ser percebido num processo de comunicação.
2. A NORMA COMO COMUNICAÇÃO
A comunicação ocorre em dois níveis: um diz respeito à mensagem (relato), outro
à relação entre os comunicadores (cometimento). Por exemplo, o uso da forma impe-
rativa: feche a porta contém uma mensagem cujo conteúdo é a ação de fechar a porta e,
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