Instrumentos de intervenção urbanística

AutorPaulo Afonso Cavichioli Carmona
CargoJuiz de Direito Titular da 3ª Vara Criminal de Ceilândia (TJDFT)

Juiz de Direito Titular da 3ª Vara Criminal de Ceilândia (TJDFT), Professor de Direito Administrativo da Fundação Escola Superior do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios - FESMPDFT, mestre em Direito Urbanístico pela PUC-SP, autor do livro "O Consórcio Imobiliário como instrumento de intervenção urbanítica", pela Editora Fórum.

1. Introdução

A Lei n. 10.257/01, autodenominada Estatuto da Cidade, tendo como base os estudos e discussões acerca do moderno direito urbanístico, ofereceu para as cidades um conjunto inovador de instrumentos de intervenção sobre seus territórios, além de uma nova concepção de planejamento e gestão urbanos.

As inovações contidas no Estatuto no tocante aos novos instrumentos de natureza urbanística partiram do pressuposto de que instrumentos tradicionais e de larga utilização - tais como desapropriação, servidão administrativa, limitação administrativa e tombamento - são amplamente insuficientes para resolução dos crescentes e complexos problemas urbanos.

Dentre as principais novidades, se bem que nem todas são originais, podemos mencionar, entre os institutos jurídicos e políticos, previstos no inciso V, do artigo 4º, os seguintes: concessão de uso especial para fins de moradia; parcelamento, edificação ou utilização compulsórios; usucapião especial de imóvel urbano; direito de superfície; direito de preempção; outorga onerosa do direito de construir e de alteração de uso; transferência do direito de construir; operações urbanas consorciadas; e consórcio imobiliário, este previsto apenas no art. 46.

Pretendemos, no presente texto, realizar decomposição rápida do extenso rol previsto no art. 4º do Estatuto da Cidade.

2. Análise perfunctória do rol constante do artigo 4º do Estatuto da Cidade

O Estatuto da Cidade surgiu como um passo importante na solução dos problemas urbanos. Para tanto, disciplinou diversos instrumentos fundamentais para se conceber uma política urbana justa e eficiente. Ao lado disso, apresentou uma extensa relação de instrumentos - novos e antigos - constante do seu artigo 4º, verbis:

"Art. 4ºPara os fins desta Lei, serão utilizados, entre outros instrumentos:

I - planos nacionais, regionais e estaduais de ordenação do território e de desenvolvimento econômico e social;

II - planejamento das regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões;

III - planejamento municipal, em especial:

  1. plano diretor;

  2. disciplina do parcelamento, do uso e da ocupação do solo;

  3. zoneamento ambiental;

  4. plano plurianual;

  5. diretrizes orçamentárias e orçamento anual;

  6. gestão orçamentária participativa;

  7. planos, programas e projetos setoriais;

  8. planos de desenvolvimento econômico e social;

    IV - institutos tributários e financeiros:

  9. imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana - IPTU;

  10. contribuição de melhoria;

  11. incentivos e benefícios fiscais e financeiros;

    V - institutos jurídicos e políticos:

  12. desapropriação;

  13. servidão administrativa;

  14. limitações administrativas;

  15. tombamento de imóveis ou de mobiliário urbano;

  16. instituição de unidades de conservação;

  17. instituição de zonas especiais de interesse social;

  18. concessão de direito real de uso;

  19. concessão de uso especial para fins de moradia;

  20. parcelamento, edificação ou utilização compulsórios;

  21. usucapião especial de imóvel urbano;

  22. direito de superfície;

  23. direito de preempção;

  24. outorga onerosa do direito de construir e de alteração de uso;

  25. transferência do direito de construir;

  26. operações urbanas consorciadas;

  27. regularização fundiária;

  28. assistência técnica e jurídica gratuita para as comunidades e grupos sociais menos favorecidos;

  29. referendo popular e plebiscito;

    VI - estudo prévio de impacto ambiental (EIA) e estudo prévio de impacto de vizinhança (EIV)."

    Como acuradamente salientou a ilustre urbanista, RAQUEL ROLNIK (in Estatuto da Cidade - Instrumentos para as cidades que sonham crescer com justiça e beleza; disponível em: , 06 de agosto de 2001; acesso em: 12 de julho de 2003), "Na verdade, pela primeira vez em nossa história, temos uma regulação federal para a política urbana que se pratica no país, definindo uma concepção de intervenção no território que se afasta da ficção tecnocrática dos velhos Planos Diretores de Desenvolvimento Integrado, que tudo prometiam (e nenhum instrumento possuíam para induzir a implementação do modelo idealizado proposto!)".

    Antes, porém, de analisarmos - ao menos superficialmente - o enunciado referido, há necessidade de relevar que o aparato legal introduzido pela Lei n. 10.257/01 mostra-se necessário, mas não suficiente, porque o Poder Público deverá ter disposição de aplicá-lo concretamente tendo em vista a obtenção de uma cidade sustentável - primeira diretriz do artigo 2º do Estatuto.

    É que o direito precisa ser efetivamente aplicado para existir realmente, conquanto ocorra que certos textos, mesmo inaplicados, conservem sua utilidade.

    Optando por apresentar um extenso rol de instrumentos e esclarecendo que tal relação não é exaustiva, o legislador federal tornou claro o escopo de ampliar, ao máximo, as ferramentas colocadas à disposição do Poder Público local e, por conseguinte, acabou por dilatar a capacidade de gestão do solo urbano, inclusive inovando nas formas possíveis de parcerias entre Poder Público e a iniciativa privada.

    Observe-se que, sendo o referido rol meramente exemplificativo, outros instrumentos poderão ser criados pelos Estados-membros, Municípios ou Distrito Federal, bem como assinala a legalidade daqueles criados e utilizados anteriormente à promulgação do Estatuto da Cidade, tais como as operações interligadas implantadas nos Municípios de São Paulo (desde a Lei n. 10.209/86) e Rio de Janeiro (Lei n. 2.128/94), os convênios urbanísticos de interesse social, previstos no Plano Diretor do Município de Belo Horizonte (Lei n. 7.165/96).

    Passaremos à análise superficial dos instrumentos de...

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