Investigando os determinantes individuais da confiança política entre os brasileiros

AutorEdnaldo Aparecido Ribeiro
CargoProfessor do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Estadual de Maringá.
Páginas271-298
Artigo
Investigando os determinantes individuais
da confiança política entre os brasileiros
Ednaldo Aparecido Ribeiro*
Resumo
Uma das principais explicações sobre o fenômeno da desconfiança política
nas atuais democracias afirma que a mesma seria resultado de um processo
de mudança cultural que estaria conduzindo ao estabelecimento da cidada-
nia crítica, combinação de uma postura desafiadora com uma clara opção
pela democracia. Embora consistente no cenário dos regimes solidamente
estabelecidos, críticos têm apontado que essa tese não poderia ser esten-
dida às jovens democracias. Nesses países o fenômeno seria explicado pela
desilusão dos cidadãos com o funcionamento concreto do sistema político,
que não estaria satisfazendo as expectativas geradas ao longo do processo
de transição. Nesse trabalho tratamos dessa polêmica ao testar essas hipó-
teses no contexto brasileiro, investigando os determinantes individuais da
desconfiança política. Utilizando dados produzidos pelo projeto World Values
Survey, propomos um modelo de análise que confronta simultaneamente
diferentes hipóteses para o fenômeno e concluímos que a tese da desilusão
tem maior consistência empírica para o caso nacional.
Palavras-chave: confiança política, democracia, desilusão, mudança cultural.
1. Introdução
Desde a segunda metade de século XX a expansão da democracia
tem sido um fato amplamente documentado pela literatura po-
lítica. Sobretudo após a chamada terceira onda de democratização
(HUNTINGTON, 1991), com o surgimento de jovens democracias em
todos os continentes, essa forma de governo alcançou relativa he-
* Professor do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Estadual de
Maringá. Endereço eletrônico: ednaldorip@uol.com.br.
272 p. 271 – 297
Volume 8 – Nº 15 – outubro de 2009
gemonia mundial. Tal expansão, entretanto, tem sido acompanhada
nas últimas décadas pelo declínio acentuado dos níveis de confiança
política manifestos pelos cidadãos em relação às suas instituições
fundamentais. Com diferentes intensidades, uma verdadeira síndro-
me de desconfiança atinge atualmente tanto regimes consolidados,
quanto aqueles que ainda lutam para estabelecer suas bases (NYE,
1997; LEVI, 1998; KLINGEMANN, 1999; WARREN, 1999; NORRIS,
1999a; DALTON, 1999, 2004; CATTERBERG & MORENO, 2005).
As pesquisas recentes têm revelado a complexidade e diver-
sidade desse fenômeno que se manifesta de maneiras distintas em
diferentes grupos de sociedades. Nas democracias que se consolida-
ram por volta dos meados do século passado, por exemplo, verifica-
se a ocorrência de um cinismo endêmico e enraizado, explicado em
grande medida por recentes escândalos relacionados à corrupção
e também pela manifesta incapacidade das novas instituições para
atender os anseios da população. Situação ainda mais preocupante
tem ocorrido nas democracias mais antigas como os Estados Unidos,
Inglaterra e França, onde o declínio tem sido dramático (NEWTON
& NORRIS, 2000; DALTON, 1999; KLINGEMANN, 1999). O caso das
democracias que se estabeleceram no contexto da terceira onda
de democratização representa um capítulo à parte nessa agenda
de pesquisas, pois a profunda diversidade de nações envolvidas
nesse grande grupo conduz a situações bastante distintas que ainda
merecem ser analisadas com maior cuidado.
Coerentemente com essa diversidade de manifestações, as
explicações propostas são também bastante variadas e em boa me-
dida concorrentes. Não pretendemos apresentar uma revisão teórica
sobre essas perspectivas1, mas uma rápida menção as principais
proposições pode ser útil.
Fundamentando-se em argumentos sócio-psicológicos alguns
estudiosos interpretam a questão da confiança a partir dos tipos
de personalidades individuais, formadas fundamentalmente pelos
processos de socialização primária (ROSENBERG, 1957; GABRIEL,
1995). De acordo com essa interpretação, em decorrência de seus
1 Revisão bastante interessante com atenção especial à pertinência das diferentes
abordagens para o caso brasileiro pode ser encontrada em Moisés (2005).

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